Divindade emergente
Uma vez purificada, a Alma se liberta da roda dos
nascimentos
“O propósito da reencarnação é dar-nos oportunidade para
aprendermos a transcender a condição humana.” Giordano
Bruno
Viajando pela cultura
oriental, concluiu Elizabeth C. Prophet:
“(...) ao longo da vida na Terra as Almas emaranham-se
na ignorância, dor e sofrimento; criam laços cármicos
que as obrigam a retornar continuamente em novos corpos.
Um texto hindu compara o universo à uma roda à qual
estão ligadas todas as criaturas sujeitas ao nascimento,
morte e renascimento.
“Carma” em
sânscrito significa ato, ação, trabalho ou obra. No
Hinduísmo, o significado da palavra carma foi evoluindo
até referir-se às ações que aprisionam a alma ao mundo
da existência.
“Assim como um fazendeiro ao plantar certo tipo de
semente obtém uma determinada colheita, o mesmo acontece
com as boas ou as más ações”, diz
o Mahabharata, um texto épico hindu. Por termos semeado
o bem e o mal, precisamos retornar para fazer a
colheita.
O hinduísmo reconhece que
as Almas se sentem felizes fazendo isto, vida após
vida. Desfrutam a vida na Terra com sua mistura de
prazer, dor, sucesso e fracasso. Vivem, morrem e tornam
a viver, provando o sabor agridoce do bom e do mau carma
que semearam. Mas existe outra senda para aqueles que
estão cansados deste retorno infindável: a união com
Deus. Cada vida, como explicou o novelista francês
Honoré de Balzac, deve ser vivida para “(...)
alcançar a estrada onde brilha a Luz. A morte marca
etapas nesta jornada”.
Quando as Almas decidem
retornar à sua origem, a sua meta é purificar-se da
ignorância e das trevas. Esse processo pode levar muitas
vidas. O Mahabharata compara o processo de purificação
ao trabalho de um ourives que refina o seu metal,
lançando-o sucessivamente ao fogo. Uma vez purificada, a
Alma se liberta da roda do nascimento e une-se a Brahman,
atingindo assim a “Imortalidade”.
Os budistas também veem o ciclo de renascimento como uma
roda a que estamos presos até podermos quebrar as
correntes cármicas. Siddharta Gautama (563 - 483a.C.),
fundador do Budismo, começou a vida como hindu. Tomou
emprestadas as ideias do hinduísmo sobre carma e
reencarnação e desenvolveu-as.
O Dhammapada, um dos
textos budistas mais conhecidos, explica o carma da
seguinte forma: “(...)
o que somos hoje provém dos nossos pensamentos de ontem,
e nossos pensamentos atuais constroem a nossa vida de
amanhã. A nossa vida é criação da mente. Se um homem
fala ou age com uma mente impura, o sofrimento o segue
assim como as rodas da carroça seguem os animais que a
puxam... Se um homem fala ou age com uma mente pura, a
alegria o acompanha como a sua própria sombra”.
Hoje a palavra carma está na moda como um
substituto para destino. Mas a crença no carma
não é fatalista. O carma, de acordo com os hindus, pode
fazer com que a pessoa nasça com certas tendências ou
características, mas não a obriga a agir de acordo com
estas características. O carma não nega o
livre-arbítrio. Cada pessoa “pode seguir a tendência
que criou ou lutar contra ela”, como explica a
Sociedade Vedanta, uma organização que promove o
hinduísmo no Ocidente.
Lemos na Enciclopédia de
Filosofia e Religião Orientais. “o carma não é
determinista”; os
atos realmente determinam como o indivíduo renascerá,
mas não são as suas ações. O carma determina a
situação, não a resposta à situação”.
O Budismo concorda com esse conceito. Buda ensinou que a
compreensão do carma nos dá a oportunidade de mudar o
futuro. Para ele, a crença no determinismo era a mais
perigosa de todas as doutrinas. “Em vez de nos
entregarmos a um destino irreversível” - ensinava
ele -, “a reencarnação permite-nos agir hoje para
mudar o futuro”.
O Dhammapada explica: “(...)
assim como um homem que volta de uma longa viagem é
recebido com alegria por seus parentes e amigos, as boas
obras de um homem em uma vida recebem-no na vida
seguinte, com a alegria de um amigo recebendo outro
amigo que retorna”.
Segundo os hinduístas e budistas, o nosso carma exige
que continuemos a reencarnar até alcançarmos a união
divina. Essa união com o Atman – segundo eles -,
pode ocorrer em etapas enquanto estamos vivos e
tornar-se permanente depois da morte.
Os cristãos primitivos reencarnacionistas podem ter
recebido do hinduísmo algumas de suas ideias sobre a
reencarnação. Também eles acreditavam que a Alma contém
uma parte de Deus, uma semente ou centelha, e que tem o
potencial para integrar-se com esta centelha e tornar-se
Deus. Também acreditavam que tornar-se Deus é um
processo gradual.
O que teria – mais tarde – causado o cisma entre os
cristãos no que respeita à reencarnação? Entendemos que
o confronto entre os reencarnacionistas e cristãos
ortodoxos tornou-se inevitável, devido às suas visões
divergentes sobre o mundo. Os ortodoxos eram
literalistas; tinham crenças que muitos cristãos de hoje
consideram inaceitáveis. Por exemplo: acreditavam que o
Jardim do Éden era um local real na Terra.
Os reencarnacionistas, por outro lado, raramente
interpretavam a Bíblia literalmente. Buscavam símbolos
ocultos. Para eles, o Éden não era um local histórico,
mas um estado eterno em que as Almas faziam parte de
Deus. As Almas, de alguma forma, perderam este estado e
foram colocadas na Terra para recuperá-lo. Como o corpo
humano é finito e fraco, os reencarnacionistas
acreditavam que as Almas poderiam precisar de mais de
uma vida para completar este processo. Para eles, a
ideia de reunião com Deus caminhava de mãos dadas com a
ideia da reencarnação.
Os reencarnacionistas viam Jesus como um homem que nos
mostrou a forma de nos unirmos a Deus. Os ortodoxos, ao
contrário, viam Jesus como alguém completamente
diferente de nós – para ser adorado, não emulado. Embora
ensinassem que os cristãos deveriam imitar as admiráveis
qualidades humanas de Jesus, como a humildade e a
bondade, não acreditavam que os seres humanos tinham
capacidade para se tornarem Filhos de Deus.
Vejo a todos como filhos de Deus que têm o potencial de
tornar-se o Cristo, como fez Jesus. A cristicidade não é
algo que apenas Jesus possui. É algo que Ele alcançou
fazendo da vontade do Pai a Sua comida.
De Pitágoras aos místicos judeus medievais, dos
professores gnósticos do século III, como Orígenes de
Alexandria, vemos sempre o mesmo tema: oportunidade
infinita igual a possibilidade infinita. Só
a reencarnação pode nos oferecer no tempo e no
espaço a definitiva alforria espiritual.
Tornar-se “perfeito como perfeito é o Pai Celestial” conforme
exortação de Jesus não é uma ideia que atrai a todos.
Muitos mesmo acreditam ser isso apenas uma utopia; e
ademais, algumas pessoas estão felizes com a vida que
levam. Sem embargo, a reencarnação também lhes oferece
uma saída: a oportunidade de continuarem a retornar à
Terra até que estejam satisfeitas e prontas para buscar
as formas de existências mais elevadas. Mesmo que
estejam contentes com a vida, podem estar na estrada que
conduz à união com Deus e não sabê-lo. Se alguma vez se
sentiram parte do todo que é a vida, seja através de um
sentimento de integração com a Natureza, com um ser
amado ou com a humanidade, é porque já iniciaram esse
processo”.
Com este excelente livro
histórico de Elizabeth Clare Prophet podemos compreender
que - provavelmente - os Apóstolos e discípulos de Jesus
possuíam rudimentos do conhecimento da reencarnação
provenientes da cultura hinduísta. Daí a oportunidade
da pergunta feita ao Mestre ante o cego de nascença: “Senhor
quem pecou para que este homem nascesse cego?”
Jesus, ao Seu tempo só teve condições de esboçar
palidamente a questão dos renascimentos na carne, porque
até mesmo os considerados intelectuais da época tinham
enormes dificuldades para entender isso, haja vista o
episódio do Seu diálogo com o doutor Nicodemos.
Nos tempos atuais, a Doutrina Espírita, concretizando a
promessa de Jesus acerca do “Consolador” ensina-nos “todas
as coisas” de forma clara, objetiva e com fatos,
inclusive e em especial a reencarnação e os mecanismos
da Lei de Causa e Efeito.
Assim, vemos que somos os artífices do nosso destino e a
Luz Divina ínsita em cada um de nós deverá emergir na
medida em que o nosso livre-arbítrio for direcionado
para as boas obras.