Artigos

por Arleir Bellieny

 

Psicologia, mediunidade e Espiritismo


Ao longo de três décadas na prática clínica, atendendo pessoas de todas as idades, sexo e credos religiosos diversos, ouço com frequência questões como as que seguem abaixo, destas breves anotações. É notório o grau de desinformação da sociedade sobre a prática da psicologia clínica.

Uma pessoa me procurou dizendo ter sido orientada para tratamento com um psicólogo espírita, dizendo ter problemas de mediunidade e obsessão, e que, no seu entendimento, somente um psicólogo espírita poderia compreender. Preocupado em saber se eu já havia cuidado de alguém como ele, e se o caso era grave e se teria cura. Angustiado com a situação, confessou estar sofrendo muito e que não estava mais suportando viver assim. Havia estado em diversos lugares em busca da cura recebendo promessas e garantias de livramento etc.

Lamentável o que ocorre com os fanáticos religiosos, ansiosos para atrair fiéis para suas ‘causas’ ou ‘núcleos de prática espiritualistas’, que prometem a cura para todos os males, em nome de Deus, promovendo rituais que vão desde o exorcismo nos templos, às oferendas robustas, muitas vezes exigindo do fiel quantias em moedas, que sugere recorrer a empréstimos para realizar, agudizando ainda mais a situação psicológica e o estado geral do quadro clínico, quer seja de ansiedade, depressão, pânico, angústia, solidão, insegurança, medo e, um pouco mais acentuado teremos os sintomas das psicoses, das esquizofrenias, etc...

Trata-se de históricos que levantamos nas anamneses clínicas, muito mais frequentes do que se imagina acontecer. Não há nenhuma crítica religiosa ou quebra de sigilo clínico nestes relatos. Apenas e tão somente um alerta aos colegas que atuam na clínica psicológica, e na clínica médica, em especial na psiquiatria, favorecendo a identificação diagnóstica, para o encaminhamento para as devidas especialidades. Lembramos que desde 1998 a Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu o bem-estar espiritual como uma das definições de saúde, ao lado dos aspectos físico, mental e social. Antes, a OMS definia a saúde como o estado de completo bem-estar biológico, psicológico e social do indivíduo, desconsiderando o bem-estar espiritual, ou seja, o sofrimento da alma.

A partir da data mencionada, passou a definir a saúde como o estado de completo bem-estar do ser humano integral: biopsicossocioespiritual. Assim sendo, a obsessão espiritual oficialmente passou a ser conhecida na Medicina como possessão e estado de transe, que é um item do CID (Código Internacional de Doenças) que permite o diagnóstico da interferência obsessora. No item F.44.3 define estado de transe e possessão como a perda transitória da identidade com manutenção de consciência do meio ambiente, fazendo a distinção entre os normais, ou seja, os que acontecem por incorporação ou atuação dos espíritos, dos que são patológicos, provocados por doença. Com isso, a psiquiatria já faz a distinção entre o estado de transe normal e o dos psicóticos que seriam anormais ou doentios. No DSM IV, a Associação Americana de Psiquiatria, chama a atenção dos médicos para terem o cuidado para não diagnosticar de forma equivocada como alucinação ou psicose casos de pessoas de determinadas comunidades religiosas que dizem ver e ouvir espíritos de pessoas mortas. Isso pode não significar alucinação ou loucura. 

Importante esclarecer que a psicologia é uma ciência com metodologia e proposta definida, com filosofia e técnicas diferenciadas de acordo com a abordagem clínica, segundo a escola de maior identificação da escolha do profissional. São quatro as grandes escolas psicológicas: Psicologia Comportamental, Psicanálise, Psicologia Analítica e a Psicologia Transpessoal. Atualmente, estamos caminhando para uma quinta escola que é a Psicologia Positiva. A escola psicológica que considera o Ser Espiritual, com todas as suas nuances e atuação sobre o mundo material, é a Psicologia Transpessoal, que desenvolveu uma leitura, olhar e escuta biopsicossocioespiritual na prática clínica. O psicólogo que tem essa leitura facilita de fato a compreensão dos casos que apresentam os fenômenos das manifestações da mediunidade e da obsessão.

Nos estudos metodológicos da prática da Terapia de Vida Passada, o componente da obsessão é tratado como “presenças” no setting terapêutico. Consideramos que essa energia espiritual ligada ao psiquismo da pessoa encarnada, provocando sugestões e ideias negativas, sugere a influência de entidades perturbadoras; enquanto aquelas que manifestam sugestões positivas pode tratar-se de entidades mentoras, protetores espirituais ou espíritos familiares que nos antecederam na espiritualidade. Em ambas as situações, confirmam a faculdade mediúnica, e a indicação para uma instituição espírita que realize esse tipo de atendimento deve ser considerada. Certamente a pessoa irá tomar conhecimento de que: “Há diversidade de dons espirituais, mas a espiritualidade é a mesma. Há diversidade de mistérios, mas é o mesmo Senhor que a todos administra. Há diversidade de operações para o bem; todavia, é a mesma Lei de Deus que tudo opera em todos. A manifestação espiritual, porém, é distribuída a cada um para o que for útil. Assim é que a um, pelo espírito, é dada a palavra da sabedoria divina e, a outro, pelo mesmo espírito, a palavra da ciência humana. A outro é confiado o serviço da fé e a outro o dom de curar. A outro é concedida a produção de fenômenos, a outro a profecia, a outro a faculdade de discernir os Espíritos, a outro a variedade das línguas e ainda outro a interpretação dessas mesmas línguas. No entanto, o mesmo poder espiritual realiza todas essas coisas, repartindo os seus recursos particularmente a cada um, como julgue necessário.” “Em mediunidade, portanto, não te dês a preocupação de admirar ou provocar admiração. Procuremos, acima de tudo, em favor de nós mesmos, o privilégio de aprender e o lugar de servir.” (*)

Devo acrescentar que o psicólogo faz uso da psicologia com o propósito de “cuidar” e não de “curar” como pensava a pessoa em questão. Quanto à indicação para procurar um “psicólogo espírita”, na verdade, é mais adequado dizer para procurar um “espírita psicólogo”.

 

(*) Xavier, Francisco Cândido, Emmanuel (Esp.), Seara dos Médiuns, 4ª edição, página 145, 1983.
 
 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita