Obsessão pacífica
O desânimo pode ser diagnosticado como uma
obsessão pacífica
“(...) Cada dissabor que experimentes sem
descoroçoamento, na estrada do bem, é um êxito
no entesouramento de bênçãos íntimas.” Joanna
de Ângelis
O pessimista costuma dizer: “nada posso; tudo
é contra mim; só vejo trevas; sou um caso
perdido; moro no azar; sou sempre infeliz; a
vida é uma carga insuportável”.
Em contraposição a estas argumentações do
pessimista, ensina Emmanuel: “(...) na fieira
de semelhantes condenações, não se lembra de que
cada qual de nós tem o seu mundo particular e se
induzimos o nosso próprio mundo ao fracasso,
quem nos livrará do fracasso, se somos todos
criaturas de Deus com a faculdade de criar os
nossos próprios destinos?!
Consideremos isto, selecionando expressões e
afirmações compatíveis com a nossa condição de
Espíritos imortais, ante as leis do Universo...
Uma frase estabelece determinada disposição;
determinada disposição produz certa atividade
específica; certa atividade específica gera
circunstâncias e circunstâncias constroem a
vida.
Não ignoramos as vossas dificuldades e lutas:
intentais a realização maior, buscais a zona
mais elevada das responsabilidades do dia que
corre, todavia impedimentos de vária ordem se
antepõem à vossa marcha. Não desencorajeis,
porém, o coração, entregando-vos ao campo
sombrio do desalento. Somos com o Cristo uma
caravana de forasteiros e peregrinos que não se
dissolverá. De quando em quando, a ventania das
provas remissoras tentará o afastamento deste ou
daquele componente do nosso grupo de
fraternidade cristã, contudo o nosso guia maior
é Jesus!
Em todos os lances da existência, procuremos
palavras de esperança e fé, alegria e bênção,
para usá-las a nosso benefício, vez que, ainda
mesmo nos últimos degraus do sofrimento,
dispomos nós todos, do amparo de Deus, do
privilégio de renovar e da felicidade de
servir”.
Profundo
conhecedor dos percalços da caminhada evolutiva
e da superlativa fraqueza humana, Jesus
proclamou em várias oportunidades: “tende
bom ânimo!...”
E para o caso de
persistir o desânimo, ratificando a assertiva,
obtemperou de maneira consoladora: “vinde
a mim, todos os que estais cansados e oprimidos,
e eu vos aliviarei”.
Na verdade, uma vez descartadas as causas
puramente fisiológicas, o desânimo pode ser
diagnosticado como uma obsessão pacífica,
induzido e dinamizado pelos agentes das trevas que
insuflam – persistentemente – ideias que levam
suas vítimas à autodepreciação. Tal atuação é
facilitada pelos condicionamentos deletérios
incrustados em nossa economia espiritual,
corolários de nossas ancestrais defecções
geradoras de remorsos, sentimento de culpa e
quejandos, oferecendo o “plug” do encaixe
malsão.
Os Espíritos inferiores “sopram” em nosso
psiquismo, na acústica da alma, as ideias
anestesiantes, conforme nos mostra Neio Lúcio no
capítulo 29 do livro “Ideias e Ilustrações” da
abençoada lavra mediúnica do Cândido Francisco
Xavier: “(...) um valoroso servidor do Pai
movimentava-se galhardamente em populosa cidade
de pecadores, com tamanho devotamento à fé e à
caridade, que os Espíritos do mal se
impacientaram em contemplando tanta abnegação e
desprendimento...
Depois de armarem os mais perigosos laços, sem
resultado, conseguiram imobilizá-lo com um
ardiloso plano: enviscaram-no de pensamentos de
desvalia acerca de sua pretendida
insignificância, desfechando-lhe perguntas
mentais assim: como te atreves a admitir algum
valor em tuas obras destinadas ao pó? Não te
sentes simples joguete de paixões inferiores da
carne? Não te envergonhas da animalidade que
trazes no ser? Que pode um grão de areia perdido
no deserto? Não te reconheces na posição de
obscuro fragmento de lama?...
O valoroso colaborador interrompeu as atividades
que lhe diziam respeito e, depois de escutar
longamente as perigosas insinuações, olvidou que
a oliveira frondosa começa no grelo frágil, e
quedou-se, desalentado, no leito do desânimo e
da humilhação, para despertar somente na hora em
que a morte lhe descortinava o infinito da
vida”.
Estamos
muitíssimo endividados com as Leis Divinas para
nos embaraçarmos na rede do desânimo. Nossa
onipresente labilidade pede compensação. Mas
como podemos compensar nossa voluntária
inutilidade? A resposta vem com o exemplo
pessoal de Joseph Maître em
fase de reparação, que é a última etapa do
ressarcimento de uma dívida: “(...) espero
recomeçar brevemente por existência que me
permita ser útil ao próximo, reparando por esse
meio a inutilidade da minha anterior
reencarnação”. Ser útil ao próximo,
portanto, é uma forma de compensar a nossa
inutilidade.
Um Espírito Amigo que se deu a conhecer pelo
nome de Agostinho vincula a felicidade à
oportunidade de servir ao próximo dizendo: “(...)
na estrada da purificação em que nos
regozijamos, o discípulo mais feliz é aquele que
se sente defrontado pelas maiores oportunidades
de servir à elevação dos outros, ainda mesmo com
absoluto sacrifício de si próprio à maneira de
lâmpada que se consome para iluminar”.
Isso está bem de
acordo com as palavras de
Jesus quando foi abordado pela mãe dos filhos de
Zebedeu, ao ripostar: “aquele
que quiser entre vós fazer-se grande, seja vosso
serviçal”.
Os Espíritos
Superiores realçam bem as consequências do
desânimo ao serem perguntados pelo Mestre Lionês: “donde
nasce o desgosto da vida, que, sem motivos
plausíveis, se apodera de certos indivíduos?
“Efeito da ociosidade, da falta de fé e, também,
da saciedade... Para
aquele que usa de suas faculdades com fim útil e
de acordo com as suas aptidões naturais, o
trabalho nada tem de árido e a vida se escoa
mais rapidamente. Ele lhe suporta as
vicissitudes com tanto mais paciência e
resignação, quanto obra com o fito da felicidade
mais sólida e mais durável que o espera”.
Nesse passo, atentemos nos ensinamentos de
Joanna de Ângelis1: “o desfalecimento
na luta traduz, não raro, a fraqueza nos
propósitos abraçados. Quando essa ocorrência
incide nos expressivos labores que objetivam os
ideais de enobrecimento humano, com vistas à
comunidade onde o trabalhador se acha inserido,
a atitude de desânimo se faz mais grave pelas
implicações de que se reveste: não apenas
constitui fator dissolvente na coragem de todos
como se revela debilidade de convicção.
Quem se dispõe ao ministério da iluminação
própria, alargando possibilidades em relação ao
próximo, deve estar consciente de que o seu
empreendimento é sacrificial, e todo o esforço
deve ser empregado sem as amplas aspirações de
recompensa imediata, entendimento geral, aplauso
público...
No serviço deve-se descobrir a emulação para o
desiderato, conscientizando-se cada vez mais do
quanto deve ainda fazer, ao constatar insucesso
no serviço realizado. Momento a momento, ação a
ação, esforço a esforço lograrás a meta, se
prosseguires sempre, sem pressa, todavia sem
desânimo, vez que toda dificuldade defrontada no
desdobrar dos esforços torna-se um convite a
mais eficiente reflexão para segura superação.
Aquele que desiste, vitimado pelo receio
injustificado ou arrimado ao desânimo
indesculpável, perde o excelente veículo da
oportunidade que lhe propiciaria o triunfo sobre
si mesmo, granjeando a felicidade pela farta
sementeira do amor a assimilar-lhe o caminho
vencido.
Portanto, aos sinais de cansaço, inquietação
íntima, desânimo sorrateiro ou indiferença em
plena atividade fraternal, resguarda-te na
oração e cuida-te!! Inimigos embaraçosos que
se exteriorizam de ti mesmo bloqueiam os centros
de interesse, frenando os teus impulsos nobres,
com iminente perigo de arrojar-te nas rampas da
desdita e da loucura... Impõe-te vigilância e
porfia.
- BÍBLIA,
N.T. Mateus.
Português. O novo testamento.
Tradução de João Ferreira de Almeida.
Rio de Janeiro: Imprensa Bíblica
Brasileira, 1983, cap. 9, vers. 2
-
KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. 51.ed.
Rio [de Janeiro]: FEB, 2003, 2ª parte –
cap. VIII – Expiações terrestres
- BÍBLIA,
N.T. Mateus.
Português. O novo testamento.
Tradução de João Ferreira de Almeida.
Rio de Janeiro: Imprensa Bíblica
Brasileira, 1983, cap. 20, vers. 27.
-
KARDEC, Allan. O Livro dos
Espíritos. 88.ed. Rio [de Janeiro]:
FEB, 2006, q. 943.