A inveja como aliada
Pode parecer estranho o título acima, principalmente,
por ser a inveja um sentimento negativo de nossa alma,
difícil mesmo de ser revelado por quem quer que seja.
Inúmeras expressões metafóricas são utilizadas para nos
referirmos a alguém que julgamos ser invejoso: roer-se
de inveja, a inveja dói, contaminado pela febre da
inveja, cego de inveja, a inveja queima ou envenena, e
vai por aí afora.
A característica principal da inveja é a comparação
desfavorável do “status” de uma pessoa em relação à
outra, muito mais do que estar associada a um objeto.
Quando sentimos inveja, estamos supervalorizando a
figura do outro e subestimando tudo o que temos ou
conquistamos.
É preciso ser o que é. Nem colocarmos as criaturas num
pedestal, nem nos rebaixarmos à condição de capachos.
Por outro lado, percebemos com muita tristeza que a
civilização moderna impõe necessidades, muitas
absolutamente fictícias, sem que as criaturas saibam
limitar seus desejos e por isso acabam, por consequência,
sentindo inveja daqueles que elas acreditam estarem em
patamares superiores aos seus, ou serem mais
privilegiados, mais amados, mais queridos, enfim, que a
situação dos outros é muito melhor que a delas.
Ermance Dufaux, no livro Laços de Afeto, capítulo
17, diz que “...a inveja é uma das mais cruéis
imperfeições morais, porque é filha queridíssima do
orgulho e, sendo assim, é dos sentimentos que a criatura
menos confessa a si mesmo e que os limites entre a
inveja e a necessidade de progresso, o desejo de lograr
metas que outros venceram, é muito sutil e demanda
autoconhecimento”.
Na verdade, a inveja reflete a fragilidade em que o
nosso espírito ainda vive, deixando-se consumir em
desejos inconsistentes, até mesmo ilusórios,
principalmente de ordem material. Podemos dizer que a
inveja é resultante da limitada compreensão da lei de
causa e efeito, aplicada a nós mesmos.
Feitas essas considerações, vamos ao ponto mais
relevante que é termos a inveja como nossa aliada. De
que forma?
Quem nos auxilia neste tópico, mais uma vez, é Ermance,
quando ela nos ensina que “a inveja tem por função
educativa nos colocar em comparação com alguém e isso
não é algo ruim, porque essa função da inveja visa
mostrar que aquilo que lhe causa inveja é sinal de vida
de uma qualidade ou de um talento seu que está
adormecido e você não percebe. A pior consequência dessa
comparação é você fechar os olhos para os seus próprios
valores e só enxergá-los nos outros”.
Desse modo, depreendemos que invejar pode significar que
você tem algo tão bom quanto o que inveja em alguém, ou
que pode fazer algo tão bem quanto o que o outro faz.
Se começarmos a pensar que não existem pessoas melhores
ou piores, mas diferentes, e que tudo na vida é uma
questão de luta, de merecimento, de esforço pessoal,
poderemos alcançar nossos objetivos, assim como os
outros também alcançam.
Quando a inveja aparecer, perguntemo-nos: O que eu posso
fazer a respeito dessa situação para me sentir melhor? O
que esse sentimento está querendo me mostrar a meu
próprio respeito através dessa pessoa? O que há de bom
no outro que pode ser melhor em mim? O que preciso
aprender sobre o que falta em mim?
Desse modo, tanto para a inveja como para tantas outras
situações vivenciadas por nós na nossa luta existencial,
questionemo-nos sempre, procurando saber o que os nossos
sentimentos revelam sobre nós, procurando entender que
admirar, elogiar, compartilhar e incentivar vitórias é a
formação do hábito da solidariedade relacional no
coração e exercício afetivo preventivo contra a inveja,
combatendo-a.
Admitir sua existência no coração é o primeiro passo.
Conhecer suas formas de manifestação, estudar suas
razões através da viagem interior, adquirindo o controle
sobre as reações emocionais, sabendo servir
harmoniosamente com ela, transformando-a para o bem,
serão medidas salutares para aceitarmos o que ainda não
podemos ter, lembrando que temos o que merecemos e o que
semeamos.