A condenação do Eu
Vivemos reclamando liberdade sem percebermos o que nos
aprisiona.
Quando falamos em falta de liberdade, surge-nos logo a
ideia dos outros, o quanto nos sentimos sujeitos a
abdicarmos de nossa liberdade para não chocarmos com os
outros.
A ideia mais generalizada, é que, sentimos falta de
liberdade porque não podemos fazer o que queremos, pois
vivemos em grupo e temos de sujeitar, anulando as nossas
vontades e desejos.
A um determinado nível superficial de consciência, esta
é uma imagem que nos parece verdadeira. Os outros agem e
nós temos de sujeitar ou temos vontades de fazer
diferente e temos de conter.
A análise de nossa parte é feita numa “zona” de
consciência muito superficial, não é aqui que acontece a
falta de liberdade.
Nós sentimos de forma inata essa falta e associamos ao
que nos parece lógico, por o nosso nível de consciência
ser tão superficial e limitado.
Jesus diz-nos que um dia conheceremos a verdade e que
esta nos libertará, pois somos escravos e nem nos
apercebemos.
Sentimo-nos prisioneiros por não agirmos como queremos,
mas se entrarmos um pouco mais em nós, podemos perguntar
de onde nasce essa vontade.
As vontades são um resultado da formação de carácter,
levando em consideração a nossa individualidade.
A psicologia chama isto de Ego. Estas formas de vontade
nascem do inconsciente, como impulsos, mas nós só as
vemos no consciente em forma pensamento, acreditando que
foi uma escolha nossa naquele momento.
Nós falamos português, não por escolha, mas porque é o
que sabemos, ou seja, um condicionamento mental e não
uma liberdade.
Se formos a uma pastelaria, escolheremos o que mais
gostamos, não por liberdade, mas por condicionamento do
passado. Nós achamos que escolhemos por liberdade,
porque a imagem que nos surge, é de nós em frente a
vitrine e escolhemos o que gostamos.
Porque escolhemos o que gostamos? Em determinada altura
do passado, experimentamos e elegemos aquele doce como
um dos preferidos, então no futuro, nasce em nós o
desejo desse condicionamento, até trocarmos por outro.
Assim acontece a nossa vida, temos tudo eleito, nascendo
do inconsciente as escolhas automatizadas perante a vida
e chamamos isto de liberdade.
Quanto mais difícil for o nosso carácter, com maior
apego aos defeitos humanos, mais escravizados somos,
menos liberdade temos.
Quem deseja ter a liberdade de exercer a agressividade
ou a raiva? Ou são impulsos que não conseguimos conter,
que muitas das vezes nos arrependemos depois de
acontecerem?
As más tendências humanas nascem do inconsciente e
levam-nos como tsunamis gigantes, sem exercermos
qualquer escolha.
Nas más tendências, tais como nos vícios, podemos ver
com facilidade a falta de liberdade que temos. Nas
vontades “comuns” temos maior dificuldades, por estas
serem a maior parte, mas podemos perceber que resultam
dos hábitos.
Não existe liberdade nos hábitos, pelo contrário, é uma
repetição de algo, como um vício. Como não rotulamos de
vício, achamos que é liberdade, e quando não os podemos
exercer, apelidamos de falta de liberdade. Na forma
lógica de raciocínio podemos concluir que o hábito é um
impulso repetidor do passado que nos inibe da verdadeira
liberdade.
O carácter é a acumulação de hábitos ao longo do tempo,
em especial na altura infantil, que nos levam a repetir
a forma de funcionamento. Os vícios morais, como a
maledicência, o orgulho ou o egoísmo, nascem desta forma
de estar, que chamamos carácter e que a psicologia
apelida de Ego.
O carácter é o velho Eu a funcionar, com a repetição do
que achou melhor para si, ao longo das experiências,
qual a liberdade que encontra nisto?
Na teoria, conseguimos perceber tudo isto, mas a prática
é bem diferente. Da próxima vez que surgir uma resposta
mental de indignação a um acontecimento, pergunte se lhe
estão a roubar a liberdade de ser diferente ou se a
liberdade que pede não é apenas um impulso que lhe rouba
a verdadeira liberdade?
O Mestre da Vida, diz-nos que conheceremos a verdade e
esta nos libertará. Podemos perceber que a liberdade
acontecerá da libertação dos condicionamentos de nós
próprios, a maioria nem percebe que os tem. Os desejos,
os impulsos, que aparecem em forma pensamento são
condicionamentos, no entanto para nós, o condicionamento
é não poder realizar o desejo, não compreendendo que
aquela realização é o fortalecimento do condicionamento
do ser, aumentando uma forma de ser repetitiva de
hábito.
Olhe para dentro de si, perceba o funcionamento
condicionado a que estamos sujeitos, procure compreender
esse funcionamento. Questione de onde vem e como é
formado.
A liberdade é uma conquista do autoconhecimento que nos
eleva a moral e aumenta o livro arbítrio que é
condicionado pela repetição dos hábitos desejosos e
viciantes, onde se inclui as formas de carácter.
O Eu ou Ego está condenado a sua própria prisão, onde
não consegue ver as grades por se formarem dos hábitos
que o constrói.
|