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por Rodolfo Collevatti

 

Diz-me com quem andas e eu te direi quem és


Podemos afirmar qual é o caráter e a natureza de uma pessoa só observando com quem ela convive?

Ou será que somos tão fracos intelectual e moralmente, a ponto de podermos ser arrastados para o mal pela simples aproximação, como um ímã atrai a certos metais, como nos diz o ditado: “passarinho que dorme com morcego amanhece de cabeça para baixo”?

Apesar de observamos pessoas em situação de fragilidade, estando assim mais expostas à influência de gente mal-intencionada pelos mais diversos motivos, pensar que o mal sempre prevalece nos parece como uma sentença fatal, tanto para quem se acha o passarinho do ditado, quanto para aqueles julgados por nós como morcegos.

Esse receio de sermos influenciados não é nada novo. O Velho Testamento tem várias outras citações nessa linha, como por exemplo em Provérbios 22:24-25, onde somos aconselhados a não nos associarmos a pessoas de mau humor, ou coléricas, para não nos acostumarmos com tais atitudes e cairmos numa cilada para nossa vida.

Já as cartas de Paulo nos trazem mensagens de certa forma conflitantes: as más companhias corrompem os bons costumes, reza a primeira carta aos Coríntios. Já em Efésios, somos chamados a imitar o Divino Mestre, que se sentava à mesa com os cobradores de impostos e pecadores, e respondendo às críticas dos fariseus, no Evangelho segundo Mateus, afirmou ter vindo para chamar os pecadores e não os justos.

Jesus também ressaltou seu desejo por misericórdia, se comparando a um médico em busca de doentes e não de pessoas com saúde. Se não bastasse, em Mateus, 21:31, explicou uma das consequências de nossos preconceitos, afirmando aos sacerdotes: “os cobradores de impostos e as prostitutas entrarão antes de vocês no Reino de Deus”.

Nesse sentido, a Doutrina Espírita nos traz ensinamentos interessantes para refletirmos um pouco melhor sobre o tema.

O Livro dos Espíritos nos ensina que os homens atraem os Espíritos em função de suas tendências, e os Espíritos, por sua vez, vão aonde estão seus semelhantes. Assim, os Espíritos não somente nos influenciam, mas podem até dirigir nossas ações. Por outro lado, a evolução moral, coletiva ou individual, tende a afastar os Espíritos que estejam trilhando maus caminhos e atrair os bons.

No entanto, de forma geral somos Espíritos imperfeitos, ainda no começo de nossa caminhada evolutiva, e assim lutamos contra o apego à matéria, o orgulho e o egoísmo que nos tornam expostos à influência do mal.

Dessa forma, como nos ensina André Luiz no livro Conduta Espírita, cabe afastar-nos de ambientes viciosos, de forma discreta e evitando críticas. O cristão, porém, sabe se relacionar nesses lugares para prestar colaboração fraterna em favor dos necessitados. Ora, entendemos que André Luiz deixou implícitas algumas qualidades do cristão, tais como a preparação moral e intelectual para o trabalho, pois, em Missionários da Luz, do mesmo autor espiritual, aprendemos a respeito da importância da disciplina e da educação, entre outras condições necessárias para exercício do trabalho no bem.

Retornando à questão da influência negativa de terceiros em nossa caminhada, O Livro dos Espíritos nos explica que somente somos levados a fazer o mal quando assim o desejamos. Só poderia ser assim, pois temos liberdade de escolha. Ninguém reencarna para fazer o mal. Importante assumirmos a responsabilidade de nossos atos, resultante de nosso livre-arbítrio.

Nesse sentido, à medida que vamos reparando nossos erros, cumprindo provas e missões, vamos progredindo espiritualmente e, ao longo de nossa caminhada rumo à perfeição relativa, não retroagimos moral ou intelectualmente. 

Ora, como todos chegaremos a Espíritos puros, sabemos que o mal é passageiro, e que a influência positiva é mais forte. Assim, à medida que um Espírito evolui moralmente, este pode se expor ao convívio com outros irmãos em grau menor de evolução, sem estar sujeito a voltar à situação anterior. Ou seja, certamente, com o tempo, os passarinhos ajudarão os morcegos a aprender como dormir de cabeça para cima!

Enquanto estamos aqui na Terra, ao recusarmos a caminhar com quem seja diferente de nós, estamos de certa forma manifestando nosso orgulho, nos colocando num patamar acima dos outros. Mostramos assim também nosso egoísmo ao não nos importamos com quem julgamos ser inferior a nós.

É comum nos afastarmos de pessoas que se aproximam de outro alguém com quem não temos afinidade ou de quem evitamos por desentendimentos passados. Muita vez, pessoas que pensam diferente de nós são canceladas de nossas vidas, como se tivéssemos o monopólio da razão, ou a autoridade moral de poder rotular o próximo como errado e, portanto, mau. Ouvimos comumente pessoas afirmarem ter desistido de certos confrades, cuja diferença preferem deixar para acertar numa próxima encarnação. Tais pessoas, com certeza, se acham passarinhos bonzinhos, se afastando de morcegos malvados, quando estão de fato perdendo oportunidade incrível de fazer as pazes com desafetos enquanto se encontram no caminho com eles, como nos aconselhou também Jesus.

Nesses processos de afastamentos e cancelamentos, dando asas ao nosso orgulho e egoísmo, deixamos de tentar atender outro chamado desafiador feito pelo Cristo, o de amar nossos inimigos. Interessante observar que, no capítulo 6 do Evangelho segundo Lucas, em seguida de seu convite, Jesus nos pede para não julgarmos para não sermos julgados.

Ora, a atitude de não julgar nos abre a possibilidade de entender que estamos todos em níveis espirituais muito parecidos e, portanto, temos muito a ganhar nos preparando e nos esforçando para fazermos a diferença positivamente na vida de pessoas menos privilegiadas moral ou intelectualmente, em lugar de nos afastar delas.

Entender e reconhecer tais atitudes em nós pode gerar a decisão de mudarmos para melhor.

De fato, como espíritas, temos obrigação não só de não fazer o mal, mas de fazer o bem no limite de nossas forças e somos responsáveis também pelo mal que ocorre por deixarmos de fazer o bem.

Não aprendemos que o espírita não faz proselitismo, mas arrasta pelo exemplo?

Como vamos dar exemplo se não saímos de nossa zona de conforto?

Pensamos que o convívio com a diferença nos permite aprender com o próximo, nos conhecermos melhor, podermos evoluir e gradualmente adquirir as virtudes ensinadas por Jesus, como a caridade, a mansidão, a humildade, o amor ao próximo, e a nós mesmos. Quando chegarmos lá, não precisaremos amar nossos inimigos pois não mais teremos desafetos!

Trabalhemos então para nos fortalecermos e fazermos a nossa parte, estudando a Doutrina Espírita, praticando a caridade de forma ativa, vigiando e orando como devemos. Assim poderemos pouco a pouco nos transformar moralmente e sem medo de más influências, ajudar outros irmãos a fazer o mesmo.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita