O aborto e a psicologia fetal
Tem-se tornado comum a leitura, na imprensa, de opiniões
de médicos defendendo com equívocos a “normalização” do
aborto. Colocam-se em defesa da mulher, de suas
prerrogativas sociais e de seus direitos à saúde, dignas
do reconhecimento de todos nós. Porém, parecem ignorar
totalmente que a maior vítima do aborto será sempre a
criança que está por nascer.
Numa análise superficial da evolução recente da
Medicina, podemos notar uma sequência de contribuições
importantíssimas ocorridas na área da contracepção, para
poder dispor a própria mulher da opção de engravidar ou
não. Do ponto de vista social, a evolução foi também
notória. O nível de informação da menina-moça de hoje é
quase completo e desinibido.
Reduziram-se as pressões sociais contra a mulher
solteira que engravida, e as relações sociais que regem
o “convívio afetivo” entre pessoas que se afeiçoam estão
cada vez mais liberais e criativas.
O caminho a percorrer, tanto na área médica como social,
ainda deverá ser longo, até que toda questão da gravidez
“não esperada” seja resolvida. Ainda teremos que redigir
o “Estatuto da Criança que está por nascer” e a
sociedade deverá compartilhar com a mulher-mãe o
compromisso da vida de maneira solidária.
Venho nos últimos anos estudando o “Complexo
cérebro-mente” procurando identificar como se processa
esta relação entre os fenômenos físicos e sua
transformação em respostas ou percepções psicológicas.
Parece muito claro que o cérebro, por si só, não é capaz
de justificar toda a capacidade da Mente Humana e o
conhecimento científico é muito limitado para alcançar
as razões filosóficas da natureza humana e do seu
destino.
Tenho uma visão espiritualista que me permite
identificar a mente como uma entidade corporificada que
instrumentaliza o cérebro para se inserir na realidade
física em que vivemos. A mente humana tem-se aprimorado
dentro do mesmo processo que forçou, pela seleção
natural, a evolução das formas físicas dos organismos
que vivificam o nosso mundo biológico.
Na semiologia neuropsicológica, frequentemente se
confunde a mente com os nossos processos psicológicos,
parecendo que estes às vezes são a causa e não o
efeito.
A instrumentação neurológica de hoje só nos permite
identificar os fenômenos psíquicos através da semiologia
grosseira de estímulo-resposta, provocando reações
através do cérebro. Ainda falta muito para aprendermos a
avaliar, por exemplo, o conteúdo da consciência, a
extensão dos fenômenos intuitivos e o grau superlativo
das nossas percepções interiores.
Para Freud, o “Aparelho Psíquico” de cada um de nós
começa a se estruturar apenas após o nascimento através
da atividade motora. O gesto da criança que toca o seio
materno vai-lhe inspirando segurança e, com os
movimentos do corpo, ela vai-se relacionando com o mundo
exterior. A partir daí passa a fazer identificações e
expor suas inclinações.
A Neuropsicologia de hoje está, no entanto, antecipando
cada vez mais o aparecimento de expressões do psiquismo
no ser humano. Bem antes do nascimento, as manifestações
de vivência agradáveis ou não da mãe já imprimem na
mente da criança que vai nascer reações que logo após o
parto podem ser semiologicamente confirmadas.
Análises com figuras ou retratos mostrando, por exemplo,
o rosto da mãe podem ser estímulos eficazes para o
recém-nascido que, se supõe, pode até distinguir um
rosto com um sorriso de outro que expressa seriedade.
Estímulos sonoros correspondentes à voz humana também
podem ser discriminados pelo recém-nascido,
especialmente quando se trata da voz da sua própria mãe.
Nos congressos de neuropediatria já estão incluídos em
sua temática estudos e trabalhos sobre o Psiquismo
Fetal. Esta é uma área tão intrigante como foram as
revelações sobre o Inconsciente após os estudos de
Freud. Antes dele ninguém podia suspeitar de uma ligação
materno-infantil tão fortemente ligada à sexualidade,
nem se poderia compreender as paixões que o Complexo de
Édipo esclareceu.
É claro que continuamos com perguntas fundamentais
aguardando novas revelações.
Qual é a essência do “Psiquismo Fetal”, quando ele se
inicia e qual a sua interdependência com os pais?
Parece que estão certos os orientais que começam a
contar a idade de suas crianças pela data da concepção.
A confirmação de um “Psiquismo Fetal”, intimamente
ligado ao “Psiquismo Materno”, implica mais um motivo
para nossa meditação quando falamos de aborto.