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por Anselmo Ferreira Vasconcelos

 

As mesas girantes: passo vital à espiritualização da Humanidade


Uma das mais significativas promessas feitas por Jesus à humanidade foi a referente ao envio do Consolador. Conforme registrado pelo amado Apóstolo, “Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito” (João, 14:26). No devido tempo e com a humanidade demonstrando certo amadurecimento intelecto-moral, eis que o Espiritismo moderno se instala, primeiramente com o advento mediúnico envolvendo as irmãs Fox, em 31 de março de 1848, uma noite de sexta-feira, no condado de Hydesville, no Estado de Nova York, nos EUA.

Evento considerado absolutamente marcante através do qual, após exaustivas tentativas de contato com um Espírito que atazanava toda a família Fox devido ao ruído produzido, a filha menor, Kate, teve a ideia de bater palmas conseguindo, enfim, ser bem-sucedida. Soube-se posteriormente que se tratava de um mascate chamado Charles B. Rosma assassinado pelo antigo inquilino na residência em que a família estava vivendo.

Conforme relatos de Arthur Conan Doyle, os acontecimentos se repetiram na noite seguinte atraindo mais de duzentas pessoas reunidas ao redor da casa. No dia 2 de abril constatou-se que “os arranhões tanto se produziam de dia quanto de noite”.1 A partir daí, as manifestações mediúnicas proliferaram impressionantemente pelo país ensejando investigações de toda ordem, não se limitando, cabe frisar, apenas à família Fox.  Nas palavras de Doyle, “Era como uma nuvem psíquica, descendo do alto e se mostrando nas pessoas suscetíveis”. Desse modo, ficou evidente que tais “forças invisíveis” iam muito mais além e atingindo igualmente outras pessoas.

De fato, outros médiuns notáveis tornaram-se conhecidos, bem como suas admiráveis potencialidades espirituais. Entre eles, vale ressaltar, Andrew Jackson Davis (1826-1910), que revelou ter recebido uma mensagem peculiar: “Esta madrugada um sopro fresco passou pelo meu rosto, e ouvi uma voz, suave e firme, dizer-me: ‘Irmão, foi dado início a um bom trabalho; contempla a demonstração viva que surge.’ Pus-me a cismar no significado de tal mensagem”. Lembram ainda Zêus Wantuil e Francisco Thiesen que, devido a esse fato, o citado médium recebeu a alcunha de “O Profeta da Revelação”.2

No período inicial explodiram comunicações mediúnicas mais, digamos, primitivas tais como rappings, noises knockings, além da espantosa forma denominada de mesa movente (table-moving). Em fins de 1850, uma nova forma de comunicação foi introduzida pelos Espíritos. Ou seja, os participantes das sessões se colocavam ao redor de uma mesa sobre a qual punham as mãos. Nessa modalidade, a mesa levantava um dos seus pés e dava, enquanto se recitava o alfabeto, uma pancada toda vez que a letra proferida correspondesse ao desejo do Espírito para a formação das palavras. Importante frisar que a mesa executava outras operações além da descrita, movendo-se em todos os sentidos, girando sob os dedos dos experimentadores e até mesmo elevando-se ao ar por meio desconhecido.

Esclarece Zeus Wantuil que “Sendo curiosíssima essa nova maneira de proceder, não houve quem não se sentisse fortemente atraído para essas experiências, e destarte a moda das mesas girantes falantes tomou de assalto as cidades norte-americanas” (ênfase minha).3 Cabe esclarecer que essas manifestações mediúnicas foram submetidas a severo escrutínio por personagens de reputação ilibada e nada de natureza fraudulenta foi encontrado. Na verdade, até os indivíduos mais céticos e materialistas renderam-se à veracidade dos fatos. Enquanto tal revolução se sucedia nos EUA, a imprensa francesa, por sua vez, mantinha-se calada. Vale também mencionar que outros países europeus também foram visitados por médiuns americanos, como a Escócia, por exemplo. Em maior ou menor grau, o fenômeno espiritual atingiu outras nações, despertando curiosidade e atenção. No entanto, no mês de maio de 1853, as mesas giravam por toda a França, chegando a serem descritas como “o maior acontecimento do século”. Wantuil descreve que “Nos primeiros dias de maio, o ex-poderoso império de Bonaparte assistia, sob exclamações de espanto a assombro, a rotação de mesas de pé de galo (guéridons), de mesas pesadas, de chapéus, de pratos, de bacias, de cestas, enfim, de tudo quanto estivesse ao alcance e servisse ao objetivo em vista”.3

A população francesa, por sua vez, encarou os fenômenos, pelo menos no princípio, como um divertimento e distração, ao passo que nos salões da alta sociedade parisiense, era desfrutado como uma forma exótica de “matar o tempo”. Enquanto isso, os homens de ciência embebidos do seu suposto saber declinavam qualquer comentário a respeito provavelmente por lhes faltar explicações consistentes a respeito. Como sói acontecer em revelações paradigmáticas, não obstante o fato de tal novidade (espiritual) ser conhecida desde a antiguidade, “Somente os espíritos elevados sentiam a importância da hora que se atravessava, somente estes vislumbravam a alvorada de novos e radiosos dias para o coração humano aflito e desorientado. À grande maioria não interessava sequer a causa dos fenômenos, quanto mais o objetivo deles!”.3 Ou seja, médiuns e fenômenos mediúnicos sempre fizeram parte do cenário terreno indicando claramente tratar-se de uma latente capacidade humana. No entanto, o fator contrastante produzido pelas mesas girantes em relação aos anteriores era a sua dimensão tornando-o, assim, um fenômeno reconhecidamente popular. Em outras palavras, se tratava de algo meticulosa e inteligentemente introduzido no contexto material com o intuito de despertar a curiosidade humana para algo muito sério.

Desse modo, “Bem cedo a novidade mostrou na França outra faceta assombrosa. As mesas, além de girarem, também falavam! E até se elevavam e se mantinham suspensas no ar, sem qualquer meio de sustentação!”, conforme observa Wantuil.3 Homens sérios de várias áreas do saber se debruçaram sobre o assunto a fim de entendê-lo, e Hippolyte Léon Denizard Rivail – confessou que ouvira sobre o assunto pela primeira vez em 1854 - foi um deles, não obstante demonstrar inegável ceticismo no início das suas observações, como o externado ao Sr. Fortier, um conhecido magnetista, que lhe relatou entusiasmado a novidade:

“[...] Só acreditarei quando o vir e quando me provarem que uma mesa tem cérebro para pensar, nervos para sentir e que possa tornar-se sonâmbula. Até lá, permita que eu não veja no caso mais do que um conto para fazer-nos dormir em pé.”4

Com efeito, no seu modo de pensar o movimento da mesa decorria de uma força mecânica e, desconhecedor da causa e a lei atuante no fenômeno, seria, em sua visão, insensatez atribuir-se inteligência a algo eminentemente material. Como as manifestações prosseguiam, em maio de 1855 Rivail aceitou participar de uma reunião noturna na casa da Sra. Plainemaison. E lá, rendendo-se às surpreendentes e insofismáveis evidências apresentadas, humildemente reavalia a sua posição inicial, ao afirmar que:

“Foi aí que, pela primeira vez, presenciei o fenômeno das mesas que giravam, saltavam e corriam em condições tais que não deixavam lugar para qualquer dúvida. Assisti então a alguns ensaios, muito imperfeitos, de escrita mediúnica numa ardósia, com o auxílio de uma cesta. Minhas ideias estavam longe de precisar-se, mas havia ali um fato que necessariamente decorria de uma causa. Eu entrevia, naquelas aparentes futilidades, no passatempo que faziam daqueles fenômenos, qualquer coisa de sério, como que a revelação de uma nova lei, que tomei a mim estudar a fundo.”4

Como bem sabemos, o resto é história. Posto isto, Rivail recebe uma mensagem mediúnica explicando o seu papel na investigação dos fenômenos; adota o pseudônimo de Allan Kardec; dedica-se com fervor, paixão e competência ao entendimento da revelação e publica o pentateuco espírita; funda uma revista focada no assunto; assume a direção do movimento e cumpre uma sagrada promessa de Jesus: Não vos deixarei órfãos; voltarei para vós” (João, 14: 18). Assim sendo, o Espírito da Verdade continua iluminando as consciências humanas para a aquisição de valores sagrados verdadeiramente libertadores.

O fenômeno das mesas girantes foi um passo vital para o despertamento da humanidade para outra realidade imanente, isto é, a realidade espiritual. É preciso, pois, reconhecer que não estamos e nunca estivemos desamparados pelos maiorais da espiritualidade. De fato, temos sido ajudados e guiados à aquisição do bem e ao nosso aperfeiçoamento moral por toda a nossa trajetória nesse mundo ainda repleto de dores e sofrimentos excruciantes. A bondade e misericórdia divina nunca nos abandonou. Porém, a gravidade da hora em curso demanda de nossa parte o uso equilibrado do nosso livre-arbítrio, bem como a definitiva aceitação e, sobretudo, internalização do imperativo da imortalidade da alma e das leis divinas que regem todo o universo às quais estamos submetidos.

Creio que os cineastas, dramaturgos, novelistas e simpatizantes em geral do Espiritismo têm, igualmente no histórico e avassalador evento acima resumidamente abordado, uma valiosíssima oportunidade de recordar a bondade e coerência do Senhor. Seria muito benvinda, portanto, a iniciativa de se resgatar um episódio - tão rico e singular nas suas nuances e características - pouco lembrado, exceção, é claro, ao meio espírita, que antecedeu a codificação do Consolador prometido pelo Messias. Há, a propósito, farta e sólida literatura a respeito disponível a todos os interessados em conhecer tão extraordinário acontecimento regido sob a égide do Mais Alto.

Diante de tantas bênçãos recebidas, sigamos em frente com Jesus rumo às conquistas imperecíveis!

 

Bibliografia:

1. Doyle, Arthur Conan. (2014). História do Espiritismo. 21ª edição. São Paulo, SP: Editora Pensamento.

2. Wantuil, Zêus e Thiesen, Francisco. (1987). Allan Kardec (Pesquisa Bibliográfica e Ensaios de Interpretação) Vol. II. 3ª edição. Brasília, DF: Federação Espírita Brasileira.

3. Wantuil, Zêus. (2019). As Mesas Girantes e o Espiritismo. 6ª edição. Brasília, DF: Federação Espírita Brasileira.

4. Kardec, Allan. (2005). Obras Póstumas. (Edição digital). Rio de Janeiro, RJ: Federação Espírita Brasileira.
 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita