Especial

por Orson Peter Carrara

Dois Corações 
e
 O Guarani

 

Estive recentemente em Campinas, terceira cidade mais populosa do estado de São Paulo, exatamente no dia de comemoração de seus 250 anos (14 de julho de 1774 é a data oficial de sua fundação). A marca expressiva em números redondos sensibilizou-me. Eu não estava ligado à história da cidade e surpreendi-me com a coincidência daquele domingo.


O Guarani

A surpresa aumentou e a sensibilidade aflorou expressiva quando, por ocasião da palestra que fui proferir na União Espírita Antonio Carlos, o violinista Paulo Simões premiou-nos com trecho da fabulosa composição musical O Guarani, autoria do compositor campinense Carlos Gomes (1836-1896). Vale ressaltar que referida música foi escrita entre 1867 e 1868, mas ela só foi finalizada mais tarde e teve sua estreia no dia 19 de março de 1870, no Teatro Alla Scalla de Milão, na Itália. É a mais famosa composição do autor.

Carlos Gomes foi o mais importante compositor de ópera brasileiro. Destacou-se pelo estilo romântico, com o qual obteve carreira de destaque na Europa. Foi o primeiro compositor brasileiro a ter suas obras apresentadas no renomado Teatro Alla Scala, acima citado.

A União Espírita Antonio Carlos foi fundada por Fortunato Gallani em 8 de abril de 1938 e localiza-se na rua Sacramento, 283 no centro da cidade. É uma homenagem ao grande compositor que usava a mediunidade de Fortunato, mas solicitou – no dia da fundação – que não se colocasse o sobrenome para evitar problemas futuros. A instituição mantém amplo programa social e doutrinário na região central de Campinas.

E nosso violinista, acima citado, Paulo Simões da Silva Filho, tem uma história também envolvente. Natural de São Paulo, capital, começou a estudar violino com seu pai, quando ainda criança; aos 14 anos entrou na Escola Municipal de Música em São Paulo e aos 18 anos já era profissional na Orquestra Sinfônica de Campinas, apresentando-se posteriormente em várias Orquestras no Brasil, ficando a maior parte da vida profissional no Teatro Municipal de São Paulo. Atualmente em Campinas com o curso de música na União Espírita Antonio Carlos, Orquestra Filarmônica de Valinhos e também na Orquestra do Conservatório Carlos Gomes. De seu belo portfólio, extraímos a existência da Orquestra e Banda Arcobaleno, objeto de reportagem da revista VEJA (24/9/2000) com o título A música mais perto do céu, Curso e Aulas de Violino e Viola na sede da UEAC, para crianças acima de 7 anos, adolescentes e adultos, além de histórico profissional em várias instituições. E também seu registro profissional como músico, constando a Inscrição e Carteira número 25.682, da Ordem dos Músicos do Brasil – Conselho Regional do Estado de São Paulo., datado de 22/07/1983, indicando o gênero erudito. Sem dúvida, um nome bastante credenciado, com experiência e esforços a serem valorizados. Apresentou-se impecavelmente antes de minha palestra e permaneceu durante o tempo de confraternização dos presentes.


Dois Corações

Por outro lado, o dobrado (1) Dois Corações, com manuscrito original de Pedro Salgado (1890-1973), datado de 14 de janeiro de 1920, é considerado o hino das bandas de música do Brasil. Seu autor é também chamado de “Rei dos Dobrados”. A letra fala de amor e a suavidade da melodia, com ritmo agradável de acompanhar, é quase um convite à perseverança na boa convivência, estimulando a harmonia dos relacionamentos. É sempre apresentação que não pode faltar nos desfiles cívicos e mesmo nas tradicionais bandas de coreto. Particularmente gosto muito de ouvir, em face de minha história com a música na primeira infância, acompanhando familiares que integravam a banda municipal.

Esse universo musical com seus estilos variados, ritmos intensos ou suaves, que inspiram compositores, cantores, trilhas de novelas e filmes, tão marcantes, é realmente fascinante. Junte-se à variedade de instrumentos e seus sons característicos e estaremos mergulhados na arte que tanto sensibiliza. O gosto e preferência é de escolha pessoal, mas a linguagem da música é universal. Não importa a origem.


Uma visão espírita

Em O Livro dos Espíritos há uma única pergunta feita aos espíritos sobre a música. É a de número 251, mas a Revista Espírita é pródiga em outras abordagens, ampliando o tema e não restrito à música, sendo que O Livro dos Médiuns refere-se aos médiuns musicais.

A propósito específico sobre Mediunidade Musical, lembramos o caso de Rosemary Brown, a médium inglesa (1916-2001) que se tornou-se conhecida pela comunicação com espíritos de compositores célebres de música erudita, havendo recebido deles, em processo similar à psicografia, mais de 400 partituras. Entre esses espíritos estão Liszt (com o qual tinha contato mis frequente), Chopin, Schubert, Beethoven, Bach, Mozart, entre outros. Rosemary Brown obteve destaque na mídia nos anos 1970. Apareceu em programas de TV, dentre eles um documentário para a emissora britânica BBC, em abril de 1969. Nessa ocasião, chegou a psicografar diante das câmeras uma partitura inédita de Liszt.

Entrevistei em 2002 o professor Érico Bonfim, pesquisador das composições obtidas pela mediunidade de Rosemary (2). O leitor poderá pesquisar o vídeo no youtube digitando o título do vídeo: ROSEMARY BROWN - A médium da música - ÉRICO BOMFIM - Prog Orson 9h30-#95-DF-pm. Érico é professor na UFMT, lecionando principalmente Harmonia e Contraponto, sendo a cadeira de Estruturação Musical. Ele é natural do Rio (RJ) e reside atualmente em Cuiabá (MT).

Tudo isso faz refletir sobre a grandeza de viver e os instrumentos disponíveis para que aprimoremos a nós mesmos. As artes em geral, e particularmente a música, tem influência muito expressiva para esse objetivo. Aqui nos referimos a apenas duas muito conhecidas, mas como sabe o leitor há infinitos conteúdos musicais disponíveis, agora facilitado o acesso pelas plataformas digitais.

Trazer O Guarani e Dois Corações foi apenas um meio de estimular a busca musical, asserenando emoções.

Chego mesmo a pensar que, coletivamente, precisamos resgatar essas lindas composições que moveram os ideais no passado para, atualmente, resgatarmos a dignidade brasileira e o amor à Pátria, dispensando essas disputas tolas que só perturbam e angustiam o ambiente nacional.

Imagine o leitor se em cada cidade, pequena ou de grande porte, valorizarmos novamente as bandas musicais pelas ruas centrais, ou em bairros, no caso de grandes cidades, para execução dessas maravilhosas harmonias musicais.

A música tem grande poder de sensibilização coletiva. Talvez seja esse um dos caminhos para estabilizar o país.

Fico a imaginar quantos outros Paulos Simões podem existir em nosso país, nesse bendito esforço de ensinar música às crianças e adolescentes. Esse é um trabalho nobre, educativo, distribuído por escolas variadas e instituições religiosas. Aliás, em toda parte onde houver dignidade e amor ao próximo, idealismo perseverante, é inevitável: lá estão surgindo essas iniciativas que alimentam o sabor de viver, com alegria e entusiasmo. Parabéns e gratidão a vocês todos!


(1) No Brasil, a palavra dobrado é usada para indicar um subgênero das marchas militares, muito popular entre as bandas militares e nas bandas municipais do nosso país. 

(2) Na edição 894 desta revista foi publicada a entrevista que o professor Érico Tourinho Bomfim nos concedeu. Para acessá-la basta clicar neste LINK

    

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita