O paralítico de Kiev
Apresentamos uma síntese do conto supracitado,
constante da obra Ressurreição e Vida, autoria
do espírito Leon Tolstói, psicografado por
Yvonne A. Pereira, a belíssima narrativa
transcorrida em Kiev, maior cidade e capital da
Ucrânia, cuja descrição nos transporta ao século
XIX, na antiga Rússia Imperial.
O capitão conde Dimitri Stepanovich Dolgorukov
fora heroi da Crimeia, guerra travada pela
Rússia contra a França, a Inglaterra, a Turquia
e Piemonte (uma parte da Itália), entre 1854 e
1855, para adquirir a península no Mar Negro –
Crimeia; na atualidade, ainda assistimos,
infelizmente, ao conflito secular entre aquelas
nações.
Após voltar das batalhas, Dimitri ficou
paralitico aos 30 anos na parte inferior do
corpo e dependente de uma cadeira de rodas; se
não bastasse tudo isso, ele perdeu a mãe também,
D. Maria, e ficou profundamente desolado; diante
de tal desgraça, ele julgou enlouquecer de
angústia. Passou a viver somente com os criados
na rica propriedade, possuía em Melânia, que era
pupila de sua genitora, a governança da mansão,
além de um relevado amparo, porque ela também
cultivava um afeto pelo rico senhor. Com o
transcurso do tempo, o conde foi dominado pelo
mau-humor e pouco se dirigia aos serviçais, até
que um dia, ouviu a conversa entre Melânia e o
jovem irmão dela, e o assunto girava em torno de
outro paralítico.
Dimitri pediu informações e soube sobre o
paralítico - Yvan Fedorovitch estava em piores
condições do que ele. Resolveu visitar o
paralítico e ficou surpreendido com a resignação
em que se encontrava Yvan, que não tinha a
paralisia como um infortúnio há de anos, e
agradecia a ajuda que recebia de seus familiares
e no diálogo falou ao conde sobre outro
paralítico – um terceiro aleijado, em pior
condição do que ele; no caso, Yvan citou Tito
Jerkov, paralítico há quase vinte anos, também
lutou na Guerra da Crimeia. E vivia bem pobre.
Após a visita a Yvan, Dimitri resolveu visitar o
terceiro paralítico - Tito e assim aconteceu.
Para a sua surpresa, Tito Jerkov vivia em total
miséria, sozinho, estirado em uma cama, cego e
contava com a ajuda de vizinhos que levavam
alimentos, agasalhos e o auxiliavam na higiene
pessoal. Surpreendido com o relato resignado de
Tito, que fora um trabalhador sadio e adoeceu
durante a Guerra da Crimeia, com muita fé no
Senhor e muito tolerante, indicou-lhe um quarto
paralítico em piores condições, nesse caso,
seria Elias Peterof.
O conde Dimitri providenciou a visita ao quarto
paralítico. Elias vivia em uma casa de madeira
velha, com muita desordem, junto deles haviam
cães, galinhas e cabras, ele era cuidado pela
mãe, uma senhora sexagenária, revoltada com a
condição do filho e o considerava um desgraçado
e um martírio em sua vida. Elias era surdo, mudo
e cego, além de paralítico, Dimitri tentou, em
vão, acalmar a irritação da genitora do sofredor
que o recebera e demonstrava impaciência com a
condição do filho paralítico, ela ainda lhe
indicou um quinto paralítico em piores condições
- Kozlovsky, o qual vivia com a ajuda de um anão
Karl. Dimitri providenciou nova visita e
encontrou o quinto paralítico em decomposição
corporal em face da lepra em adiantado grau. O
rosto estava deformado; para surpresa do conde,
era um homem que falava sobre o Evangelho de
Jesus, demonstrava muita cultura, entendimento
de sua condição física, instruído acerca da
doutrina espírita, pois conhecia os periódicos
que o anão recebia e lia para ele. Kozlovsky se
apresentava como a reencarnação de Yvan IV, o
terrível, soberano russo célebre por suas
crueldades, daí, ele expiava um passado de
maldades.
Dimitri voltou emocionado da visita. O conde
passou dias a meditar sobre os quatro
paralíticos que encontrara, os sofrimentos e as
aceitações de cada um diante das dores e das
desgraças em que se alojaram. Ele resolveu
ajudá-los financeiramente e investiu nas
reformas de suas casas; assim, encaminhou
ajudantes para as tarefas domésticos
necessárias. Passou tempo, o movimento espírita
expandiu pela Europa e América, sábios,
cientistas e filósofos dedicavam-se às
investigações espíritas.
Allan Kardec desencarnara (1869) deixando sua
obra organizada à humanidade. Dimitri orientado
pelo paralítico Koslovsky para que procurasse o
russo Alexandre Aksakof, o qual vivia em São
Petersburgo e investigava a ciência espírita,
ele decidiu fazer nova visita. Aksakof o recebeu
muito bem e orientou-o sobre a imortalidade da
alma, a comunicabilidade dos espíritos e a
materialização, esse fenômeno era bastante
desenvolvido na época por Aksakof.
Alexandre Aksakof preparou uma sessão de
materialização com ajuda de um médium na
presença do conde Dimitri (naquela época
utilizava-se de uma sala escura e uma gaiola
onde o médium o ficava dentro do ambiente para
permitir que se observasse qualquer movimento
que por ventura o mesmo fizesse). E, diante de
uma surpresa, manifestou-se um espírito que
animou na última encarnação uma mulher – era a
mãe de Dimitri, e o espírito orientou-o sobre a
vida, especialmente sobre sua relação com o
próximo, e revelou-lhe que a paralisia era-lhe
uma criação mental, e que o filho se curaria,
caso perseverasse no bem.
Após regressar de São Petersburgo, o conde
inaugurou o Hospital Kozlovsky, o paralitico
havia desencarnado nesse meio tempo, passado
algum tempo, Dimitri transformou-se em discípulo
do Cristo e aderiu à ciência espírita, ele se
locomovia amparado por duas bengalas, porque
havia renovada a mente e se fortaleceu pela
reforma moral que se impôs e reabilitou o
sistema nervoso. Ele se casou com Melânia, a
qual era simpatizante do Espiritismo, eles
receberam um filho que chegou ao lar; a obra
filantrópica cresceu para ajudar os sofredores.
Portanto, o Conde Dimitri definiu novo rumo à
sua existência, modificado para melhor, com um
olhar altruístico instalado em sua forma de
viver.
Roni Ricardo Osorio Maia atua no
movimento espírita de Volta Redonda (RJ).