Realmente foram enviados
A prodigalidade do conteúdo doutrinário constante das
obras da Codificação Espírita é encantadora. Em cada
trecho analisado atentamente nos deparamos com riquezas
de orientações. O que não percebemos na primeira leitura
perceberemos mais adiante, surpreendendo o leitor e
pesquisador interessado na busca dessas pérolas
constantes nas entrelinhas, em trechos embutidos nos
parágrafos ou mesmo em sutilezas textuais que só o tempo
nos faz perceber. Por isso a recomendação constante de
sempre estudar os trechos de Kardec. Eles são
insuperáveis, atuais, oportunos e lançam luz sobre
vários ângulos de uma mesma questão.
Podemos, erroneamente, pensar que tais instruções se
referem apenas às relações mediúnicas, mas percebe-se,
com clareza, sua aplicação também nas avaliações entre
nós mesmos, os encarnados. Especialmente num capítulo
que destaca a questão dos espíritos fraudulentos
(condição temporária de espíritos ainda em processo mais
largo de amadurecimento).
Encontrei nova pérola escondida. No riquíssimo capítulo
XXI – Haverá falsos cristos e falsos profetas (de O
Evangelho Segundo o Espiritismo), encontro no item 8
(já compondo o subtítulo Instruções dos Espíritos), com
o título Os falsos profetas – exclusivo no citado
item assinado por Luís, em 1861, o texto que destaco
parcialmente. Vamos ao estudo, acompanhe conosco.
Referida abordagem foi inspirada pelo capítulo 73 -
Seara Espírita, constante do Livro da Esperança, de
Emmanuel/Chico Xavier (edição CEC/FEB), que recomendo ao
leitor na íntegra e que não será difícil localizar
também virtualmente. A obra é muito conhecida e foi
lançada originariamente em 1964.
No capítulo em referência, o autor espiritual destaca
trecho de Lucas (6:44), transcrevendo que “(...) cada
árvore se conhece pelo seu próprio fruto, pois não se
colhem figos no espinheiro nem uvas nos abrolhos.”. E
acrescenta igualmente trecho parcial do capítulo XXI,
item 8, acima citado, de O Evangelho Segundo o
Espiritismo. É apenas um parágrafo, mas suficiente
para largas reflexões sobre nós mesmos, os espíritos
ainda em caminhada. Transcrevo exclusivamente o
parágrafo na íntegra, para avalição do leitor:
“É assim, meus irmãos, que deveis julgar; são as obras
que deveis examinar. Se os que se dizem investidos de
poder divino revelam sinais de uma missão de natureza
elevada, isto é, se possuem no mais alto grau as
virtudes cristãs e eternas: a caridade, o amor, a
indulgência, a bondade que concilia os corações; se em
apoio das palavras, apresentam os atos, podereis então
dizer: Estes são realmente enviados de Deus”.
Notem com que clareza o autor classifica os que
realmente foram enviados por Deus. É para nenhum de nós
se iludir com promessas ou falsas aparências – que não
estão somente entre os comunicantes desencarnados, mas
também entre nós os encarnados –, pois o comportamento,
as ações é que devem ser avaliadas. Quanta ilusão ainda
alimenta pretensões de todo tipo.
Quem de nós, verdadeiramente, na condição comum e
humana, se enquadra naquela classificação de possuir no
mais alto grau as virtudes cristãs e eternas? Ou cujas
palavras são sancionadas pelos atos? É um critério
perfeitamente aplicável a todos nós, os encarnados,
cujas ilusões levam alguns a se afirmarem enviados...
E, voltando ao capítulo do Livro da Esperança, acima
citado, Emmanuel coloca nos parágrafos em sequência uma
série de situações das rogativas humanas (por isso
recomendo que o leitor busque o capítulo em referência),
mas conclui:
“(...) Se o Plano Superior já te permite pisar na seara
espírita não te limites à prece. Todos os tipos de
rogativa que se voltem para o Bem Infinito são
respeitáveis, no entanto, pensa em nosso Divino Mestre
que orou auxiliando e realiza algo de bom, em favor dos
irmãos em Humanidade, que ele mesmo nos apresenta.
Espiritismo é Cristianismo e Cristianismo quer dizer
Cristo em nós para estender o Reino de Deus e servir em
seu nome.”
A rogativa é direta: “(...) realiza algo de bom (...)”,
como a dizer que esse é o programa para a Seara
Espírita, sem nos iludirmos com pretensões – nossas e
alheias, diga-se de passagem –, compreendendo que não
temos que seguir pessoas (essas somos aprendizes ainda
bem limitados), mas seguir o programa iluminado do
Evangelho.
E quando surgirem os pretensos enviados, que assim se
afirmam – em todos os segmentos da vida social,
acrescente-se, não só religiosa –, compadeçamo-nos
deles. Estão iludidos pelas seduções variadas a que
estamos sujeitos em nossa imaturidade. Essa compaixão
não nos impede, todavia, de reconhecer referida ilusão
ou pretensão. Afinal, quem de nós poderá afirmar-se
imune?
É essa prodigalidade, repito, que me encanta. Em cada
trecho encontramos conteúdos que nos auxiliam a
compreender a vida e seus desafios, especialmente nesses
choques inevitáveis dos relacionamentos, individuais e
coletivos. Sim, coletivos também. A convulsão social que
se vive é fruto dessa imaturidade e inconsciência humana
que ainda se vive. Mas será superada no tempo e no
espaço, pois não há como impedir a Lei do Progresso. O
tema, porém, comparece como advertência que nos pede
reflexão.
Para serem realmente os enviados, suas obras precisam
corresponder às palavras.