Entrevista

por Orson Peter Carrara

Dedicada seareira com larga folha de serviço fala-nos ao sentimento


 
Graduada em Pedagogia pela UFBA (1977) e tendo concluído Bacharelado em Jornalismo (2024) pela UniFACs, Edinólia Pinto Peixinho (foto) é natural de Cansanção (BA), mas reside em Salvador, capital do estado. Vinculada à Federação Espírita do Estado da Bahia (FEEB) em algumas funções como direção do DIJ, organização de congressos, presidência da Diretoria Executiva em duas gestões, Diretoria de Ação Federativa, desde 2022 atua no Sistema Espírita de Comunicação Social, na coordenação do Núcleo Memórias, que objetiva resgatar a história das instituições espíritas da Bahia, contemplando seus respectivos pioneiros. Viúva de André Luiz Peixinho, recém-desencarnado, Edinólia fala-nos sobre sua vivência espírita:

 

Quando e como se tornou espírita?

Comecei a frequentar o Centro Espírita Deus Cristo e Caridade (CEDCC) na cidade de Serrinha, em 1967, impulsionada por uma hilária solicitação de André.

Nesta época, quando ele estava se deslocando para Salvador para cursar o segundo grau, amigos, colegas e familiares o acompanhamos ao ponto de ônibus para a despedida. O pai dele, Aristóteles Peixinho (Tio Peixe) então presidente do centro supra citado, dirigiu-se a André, nos seguintes termos: “André, como é que você passa tantos anos sendo colega de turma de Edinólia, e agora você vai estudar e morar em Salvador, e ela não é espírita”?

Então André, já adentrando no veículo, voltou-se para mim, e disse: “Me defenda aí!”

Desta forma, comecei a frequentar o Centro, participando inicialmente do movimento juvenil, e progressivamente, da tribuna jovem da instituição, na promoção de eventos, a exemplo da criação do Encontro Espírita Sertanejo e representando a diretoria da casa nas reuniões da União Social Espírita da Bahia (USEB), já na condição de vice-presidente do CEDCC.

E o que mais lhe chama atenção no conhecimento espírita?

 A visão que ele nos traz a respeito da condição de espíritos em evolução a atuar no mundo, de acordo com suas habilidades adquiridas em vivências anteriores, com possibilidades de aprimorá-las em cada momento reencarnatório.

A Terceira Parte de O livro dos espíritos é a que muito me chama a atenção no vivenciar dos meus dias e me orienta, por meio das leis morais, a melhormente me conduzir no contexto da sociedade, com conhecimento de causa, diante dos ameaçadores desafios do existir. 

E como conheceu Peixinho?

Conhecemo-nos, de fato, durante a chamada dos alunos contemplados no exame de admissão ao Ginásio Estadual Rubem Nogueira. Ele estava curioso por conhecer uma pessoa de sobrenome Peixinho, que curiosamente estava entre os quatro concorrentes com melhor aproveitamento no concurso. Essa ‘Peixinho’ era eu. Durante quatro anos, fomos colegas de sala, e, nesse percurso, nos aproximamos muito em função das tarefas escolares, sempre estudando juntos na preparação para as provas pertinentes. Claro que ele se comportava sempre como um professor e eu ficava a observar aquela garoto todo compenetrado que estimulava os colegas mais velhos a se dedicarem com maior seriedade ao estudo. E essa aproximação de prima, amiga e colega foi cada vez mais se estreitando num sentimento intenso, o que nos levou a assumir a condição de marido e mulher. Casamo-nos, pois. 

Dessa convivência com Peixinho, o que gostaria de destacar?

A amorosidade constante que permeou a nossa trajetória, num clima de respeito e, principalmente, de liberdade. A inteligência privilegiada, o bom humor, a criatividade, o desprendimento às coisas materiais, a lhaneza, a capacidade da escuta e o respeito às pessoas (em suas mais variadas formas de pensar e de agir), sem julgamentos. Aliam-se a tudo isso a capacidade de acolhimento e o foco na educação.

Quando eu respeitosa e amorosamente, lhe chamava atenção para as inúmeras coisas que ele se responsabilizava a fazer, ‘bahianamente’, respondia: ‘Oxente’, só existe um foco em todas as atividades com as quais me ocupo: a busca da evolução!

Enfim, só tenho que agradecer ter merecido conviver com uma pessoa tão sábia e, ao mesmo tempo, tão simples.

E a experiência na Federação Espírita do Estado da Bahia?

Antes de participar presencialmente da Federação Espírita do Estado da Bahia (FEEB), já compartilhava do trabalho federativo por meio da recepção de visitas ao Centro Espírita Deus Cristo e Caridade, realizadas por um grupo responsável pelo processo de união dos espíritas e pela unificação do movimento. O propósito desse grupo era a organização de uma rede federativa, no sentido de distribuição das casas espíritas a atuarem por regiões. Esse esforço resultou, depois de muitas visitas para esclarecimento às diretorias das casas espíritas, na criação e um anteprojeto para apreciação e sugestões, que contemplava uma divisão territorial em 20 Regiões Geo-Espiríticas do Estado da Bahia.   Estas regiões, só a partir do devido entendimento dos requisitos exarados no devido regimento, oficialmente se transformavam no órgão federativo com instalação paulatina das Alianças Regionais Espíritas.  Nesse caso, o centro de Serrinha e a das cidades do entorno constituíram a ALIANÇA REGIONAL ESPÍRITA 06, atualmente, Conselho Regional 06. Aprendi muito com esse pessoal.

Ao acompanhar esses esforços realizados com tanto empenho, me sensibilizei sobremaneira em participar da FEEB, quando me mudei para Salvador.  Essas vivências me inspiraram para criar em minha gestão, enquanto presidente da FEEB, a Caravana Bahiana da Fraternidade, que tem o objetivo de visitar os centros espíritas do Estado; os encontros Macrorregionais que pressupõem reunir três os quatro Conselhos Regionais na cidade de um deles, para tratar dos setores pertinentes à casa espírita. Dentre outras realizações em nível de integração das instituições espíritas da Bahia, destaque para a realização junto à FEB e o CEI, da Conferência Espírita Brasil Portugal, em comemoração aos 500 anos do ‘descobrimento do Brasil’, com a presenças de mais de 100 participantes de fora do país e representantes oficiais de 26 federativas do Brasil e demais participantes do nosso país.

Como enxerga o movimento espírita brasileiro?

Como um movimento sempre focado na união dos espíritas e na unificação das federativas estaduais, que por sua vez, reproduzem esses objetivos entres os centros pertinentes à sua jurisdição. Vejo o movimento como um processo que amadurece à proporção que suas metas são mais esclarecidas e, consequentemente, compreendidas pelo público alvo. Importante salientar que esse trabalho tem um caráter agregador, sem, contudo, interferir nas demandas interna das instituições, e sem nenhum caráter de subserviência dos centros adesos aos órgãos federativos. Um movimento comprometido com a divulgação do Espiritismo à luz do Evangelho, atendendo a todas as faixas etárias, pedagogicamente organizadas, para melhor entendimento dos princípios básicos da doutrina.

Considero um movimento robusto em suas metas e persistência no ideal unificador, sempre no esforço de agregar com leveza e amorosidade com acolhimento e fraternidade.

Em termos da Bahia, especialmente considerando os vultos históricos, o que gostaria de dizer ou relatar?

Considero o pioneirismo de Luiz Olímpio Telles de Menezes o ponto de relevância na história do Espiritismo na Bahia. Carece de um estudo mais aprofundado, no sentido da percepção de sua ímpar personalidade, que mesmo se declarando “católico”, supera todas as investidas do Clero para interceptar seus anseios na divulgação do Espiritismo; afirma ter sido o “primeiro a desposar o Espiritismo em terras da Bahia”; ao criar o Grupo Familiar de Espiritismo, já com ensaios de organização estatutária,  sugere a criação de sociedades similares pelo resto do país; 1866, ao escrever e lançar em Salvador, o  opúsculo:  O espiritismo  -introdução ao estudo da doutrina espirítica, ele não esperava que,  em seguida, o Arcebispo Primaz do Brasil lançaria uma carta pastoral “prevenindo seus diocesanos contra os erros perniciosos do espiritismo”;  em 1897, Telles  publica carta aberta ao Arcebispo da Bahia, D. Manoel Joaquim da Silveira, e começa   seu discurso declarando-se “católico de nascimento e de crença”; explica o conteúdo do opúsculo com delicadeza e lisura, relacionando algumas passagens citadas no livreto, com fatos contidos no Velho Testamento; curiosamente,  encerra a missiva  beijando as mãos da autoridade em pauta; lança, em 1869,  O Echo D´Alêm Tumulo, o primeiro periódico espírita do Brasil, que vira notícia na Revista Espírita de Allan Kardec; por fim, consegue registrar a primeira instituição espírita do Brasil, na Bahia, apesar de toda a resistência do Clero, e críticas severas na revista Bahia Ilustrada, de grande circulação. Não desiste, porém.

De suas lembranças qual a mais marcante nesses anos todos de vivência espírita?

Pessoalmente, comungar com André dos mesmos objetivos do espiritualismo espírita. Federativamente, ter realizado, anualmente as visitas da Caravana Bahiana da Fraternidade, a percorrer os mais distantes rincões da Bahia, num clima de alegria e fraternidade. Uma verdadeira festa de congraçamento espiritual! Como os centros Espíritas tem nos acompanhado e nos recebido com carinho!  A ‘poética do encontro humano’ é enriquecedora, inesquecível, inusitada, incomparável!  

Algo mais a acrescentar?

Só agradecer a oportunidade de livre expressão e louvar por esses órgãos de comunicação voltados para a divulgação do Espiritismo, com vistas a difundir conceitos facilitadores para o crescimento espiritual da pessoa humana. 

Suas palavras finais.

Um agradecimento especial ao nosso codificador Allan Kardec, por nos oportunizar esses conhecimentos que tem norteado a vida de muitos viajores por este planeta. Por certo, a aprendizagem tem sido ainda tênue para a grandeza das necessidades, embora saibamos que com a observância da Parábola do Semeador, havemos de entender que a semente medrará de acordo com a qualidade do terreno.

Metaforicamente falando, o ensino cala na intimidade de cada um, de conformidade com as capacidades do espírito em evolução. Contudo, tenho sempre um sonho numa divulgação do Espiritismo que ultrapasse as quatro paredes de uma instituição, no sentido de contribuir mais efetivamente para a minimização da predominância do paradigma materialista. Kardec cita que o Espiritismo há de destruir o materialismo. Dessa forma, esperar é preciso!

 
 

 

     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita