Seguramente culpável
A frase está ali nas entrelinhas e passa
despercebida numa leitura sem atenção.
Mergulhe-se atentamente no texto, todavia, e
vamos encontrando essas orientações seguras.
Seguras e diretas, sem rodeios. Já não podemos
alegar ignorância, dada sua lógica e clareza.
Ela está na segunda linha do item 12 do capítulo
XVIII – Muitos os chamados e poucos os
escolhidos, de O Evangelho Segundo o
Espiritismo. Esse item está imediatamente na
sequência do subtítulo Muito se pedirá àquele
que muito recebeu, que traz transcrito nos
itens 10 e 11, as anotações, respectivamente, de
Lucas (XII, 47, 48) e João (IX, 39 a 41), que
fazem referência exatamente ao subtítulo.
A frase, que é do próprio Kardec, está, pois, no
início do valioso texto (íntegro no item 12),
com sete parágrafos, é a seguinte:
“(...) Todo aquele que conhece os preceitos do
Cristo é culpável, seguramente, de não os
praticar (...)”.
Note-se, pois, a vinculação imediata do
conhecimento com a responsabilidade. O que é
óbvio, pois que conhecendo, adquire-se o
compromisso de viver o que se sabe. É o que
ocorre com a disseminação dos ensinos de Jesus,
porta voz direto das Leis Divinas, que Ele mesmo
viveu integralmente, ensinando seus irmãos
menores, que somos os aprendizes.
Nessa linha de raciocínio, escreve o
Codificador: “(...) O ensinamento dos Espíritos,
que reproduz estas máximas sob diferentes
formas, que as desenvolve e as comenta para
pô-las al alcance de todos, tem a
particularidade de não ser circunscrito a cada
um, letrado ou iletrado, crente ou incrédulo,
cristão ou não, pode recebe-lo, uma vez que os
Espíritos se comunicam por toda a parte; nenhum
daqueles que o recebem diretamente, ou por
intermediários, pode pretextar ignorância; não
pode se desculpar, nem por sua falta de
instrução, nem pela obscuridade do sentido
alegórico. (...)”
Uma clareza inquestionável, que não dá brechas a
desculpas. O ensino está disponível.
E prossegue:
“(...) Aquele, pois, que não as aproveita para o
seu adiantamento, que as admira como coisas
interessantes e curiosas sem que o seu coração
por elas seja tocado, que não é nem menos vão,
nem menos orgulhoso, nem menos egoísta, nem
mesmo apegado aos bens materiais, nem melhor
para o seu próximo, é tanto mais culpado, quanto
tenha maiores meios de conhecer a verdade.
(...)”.
Raciocínio lógico. O Evangelho é Lei de Deus e
visa nossa melhora moral. Conhecê-lo e não nos
tornarmos melhores (objetivo do Espiritismo),
torna-nos incoerentes com o que vamos
conhecendo, distanciados da responsabilidade do
conhecimento sem a vivência correspondente.
No parágrafo seguinte, há referência a essa
mesma sintonia com a prática mediúnica. Deixo de
transcrever, recomendando ao leitor sua leitura
integral diretamente na obra.
A conclusão, todavia, da presente reflexão,
extraímos do próprio texto, na obra em
referência:
“(...) Aos espíritas, pois, será pedido muito,
porque receberam muito, mas também àqueles que
tiverem aproveitado, será dado muito. O primeiro
pensamento de todo espírita sincero deve ser o
de procurar, nos conselhos dados pelos
Espíritos, se não há alguma coisa que possa lhe
dizer respeito. (...)”.
Note-se que as expressões “pedido muito” ou
“receberam muito” abre outras perspectivas de
análise, o que não faremos aqui, deixando para
outra oportunidade. Mas o “procurar nos
conselhos dados pelos Espíritos (...)” algo que
nos diz respeito é atitude altamente
recomendável, prudente e protetivo de possíveis
lágrimas no futuro.
A menção de culpa, todavia, não deve ser
direcionada para punição. Ela está toda na
avalição feita pela própria consciência de cada
um, que cria os arrependimentos e remorsos que
se apresentam no futuro, nos confrontos
inevitáveis conosco mesmo. Uma vez que sabíamos,
porque não seguimos ou fizemos?
Aí surgem os remorsos, exigindo reparações. A
Lei, todavia, é de amor, de misericórdia, e nos
abre contínuas portas para reconstruirmos a
própria paz, comprometida por comportamentos
incompatíveis com o que já sabíamos.
É um processo lento, gradativo, mas,
convenhamos, muito justo.
É um aprendizado. Ele trará amadurecimento que
nos libertará das algemas dos condicionamentos,
vícios e vai abrindo espaços novos para outros
empreendimentos na conquista da evolução.