Destino versus escolha
das provas
Dogmas são preceitos
apresentados como certos
e indiscutíveis e cuja
verdade se espera que as
pessoas aceitem sem
questionar.
Por princípio, a
Doutrina Espírita não é
dogmática, mas,
sobretudo, ciência e
filosofia, com
conseqüências
religiosas. Por isso,
dias atrás, estranhou-me
ouvir uma pessoa
(querida) afirmar, não
sem fundamentação, que
via no livre-arbítrio um
dogma do Espiritismo.
Segundo sua lógica, o
princípio do
livre-arbítrio
contrariava outro
pressuposto do
Espiritismo, que é o
destino, entendido este
no sentido de um
programa reencarnatório.
À primeira vista,
pareceu-me que havia
razão naquela
afirmativa. Pois, de
fato, se tudo o que nos
acontece na vida
presente estivesse
previsto, o
livre-arbítrio seria uma
balela. No entanto,
recusei-me a aceitar a
lógica apresentada e
procurei
estudar o assunto,
segundo o ensinamento
dos Espíritos
Superiores, base do
Espiritismo, tendo
chegado às seguintes
conclusões,
resumidamente:
1) Antes de nova
existência corpórea, o
Espírito escolhe o
gênero de provas a
que deseja se submeter;
nisto consiste o
livre-arbítrio na
escolha das provas.
Entretanto, Deus, ao
conceder ao Espírito a
liberdade de escolha,
deixa-lhe a
responsabilidade dos
seus atos e das suas
conseqüências.
2) Na escolha das
provas, o Espírito, via
de regra, segue uma
orientação: o desejo de
sua própria evolução.
Por isso, o Espírito não
escolhe as provas menos
penosas. Liberto da
matéria, o Espírito não
vê nas provas somente
seu lado penoso, mas um
atalho que o faça
alcançar mais
rapidamente um estado
melhor, como um doente
pode escolher um remédio
mais desagradável para
se curar logo.
3) A despeito do
livre-arbítrio, Deus
pode impor certa
existência a um
Espírito, quando este
não estiver apto a
compreender o que lhe
seria mais proveitoso.
4) O Espírito escolhe o
gênero das
provas: os detalhes são
conseqüências da posição
escolhida e,
freqüentemente, de suas
próprias ações. O
Espírito, escolhendo um
caminho, sabe de que
natureza são as
vicissitudes que irá
encontrar; mas não sabe
que acontecimentos o
aguardam. Os detalhes
nascem das
circunstâncias.
5) Por fim, o Espírito
pode escolher prova que
esteja acima das suas
forças e então sucumbir.
Por outro lado, pode
escolher outra que não
lhe dê proveito algum,
como um gênero de vida
ociosa e inútil. Nesses
casos, voltando ao mundo
espiritual, percebe que
nada ganhou e pede para
recuperar o tempo
perdido.
Da forma exposta,
compreendi melhor os
princípios do
livre-arbítrio e do
destino. Compreendi que,
apesar de à primeira
vista termos a impressão
de que um desses
pressupostos contraria o
outro, tal lógica
incorreta, do ponto de
vista espírita, é
motivada pela confusão
que fazemos, tomando por
destino os mínimos
detalhes de nossas
vidas. O certo é que nem
tudo está previsto, mas
apenas o gênero das
provas a que nos
submetemos a cada vez:
isto, sim, é fruto da
nossa própria escolha,
ou das escolhas que
fizemos e decisões que
tomamos em vidas
passadas.
É certo que muito mais
ainda há a se dizer
sobre o tema. De modo
que, se Deus assim o
permitir, poderei, de
uma próxima feita,
continuar discorrendo
sobre determinismo e
livre-arbítrio.
Encerro com um princípio
da justiça da Lei
Divina, muito apropriado
a toda essa reflexão (e
que nos serve de
estímulo à prática do
bem): “A ação positiva
do presente corrige
efeitos do passado
negativo”.