EUGÊNIA PICKINA
eugeniamva@yahoo.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil)
A necessidade
humana da
misericórdia
Se teu coração
te condena, Deus
é maior do que
teu próprio
coração.
(Jo, I, 3:21.)
Jesus, tal como
o Pai, não se
fixa no mal e
isso não quer
dizer que o
ignore, mas onde
os outros
enxergam um
ladrão, um
traidor, um
devedor, uma
prostituta, Ele
observa, com
misericórdia, um
ser humano em
sofrimento.
Conhecedor do
coração humano,
o Mestre de
Nazaré
compreende os
equívocos, as
imperfeições. E,
na parábola da
mulher adúltera,
Ele surpreende a
massa humana que
a condenaria com
a morte pelo
apedrejamento,
segundo o antigo
preceito da
ordem social
israelita, à
medida que, no
lugar da pena
capital, dá a
ela o eflúvio da
misericórdia,
que lhe consola
com a
oportunidade de
absolvição e de
recomeço.
A misericórdia,
cujo termo
composto agrega
em sua raiz os
vocábulos
miseri
(miséria,
aflição) e
cordia
(coração), serve
de base para a
compreensão das
situações
difíceis ou dos
enganos
cometidos pelos
outros. Nesse
encalço, a
misericórdia
rebate a dureza
do coração, pois
ela se mistura,
como um alento,
à compaixão.
Esta última é
avivadora da
esperança para
aquele que cai
em erro, que
peca, que erra o
alvo, caso
utilizemos o
ponto de vista
etimológico da
palavra pecado (hamartia).
E é essa dureza
do coração que
Jesus rechaça ao
ensinar a
urgência da
compaixão e do
esquecimento das
ofensas aos
enfermos e
condenados de
toda sorte e,
pelo itinerário
de seus
exemplos,
destaca a
caridade e
repele o
ressentimento da
vingança ou da
desmedida
condenação, dos
quais ainda
somos legatários
em lembrança à
dura lei de
talião.
Infelizmente,
ainda hoje,
precisamos
reconhecer que
temos mais
facilidade para
julgar (e
condenar) que
amar. E por isso
o aprendizado do
perdão, da
reconciliação,
da compaixão, é
tão imperativo
para o nosso
viver e
conviver,
segundo a
essencial
internalização
das parábolas do
bom samaritano,
da mulher
adúltera, entre
outras, para
nosso processo
regenerador.
Cristo sabia da
nossa fraqueza
em amar e
perdoar. Se não
fossem nossos
estados
miseráveis de
amor e caridade,
enraizados nos
vícios do
orgulho e do
egoísmo, não
teria sentido
Jesus vir à
Terra, pois, na
melhor das
hipóteses, cada
um de nós tem
uma oscilante
chama de amor.
Com isso, sua
paciência em nos
ensinar o fim
último de todas
as lições: o
viver no amor. O
amor é prelúdio
para toda
espécie de
entendimento.
Desse modo, faz
eco acalentador
em nossos
Espíritos quando
Pedro nos diz
que a
misericórdia de
Deus é abundante
(I, 1:3), pois
ela se derrama
em toda parte.
Francesco
Carnelutti,
jurista
italiano,
pondera com
sabedoria sobre
a dificuldade
humana em lidar
com a
misericórdia, de
acordo com o
efetivo
esquecimento das
ofensas: “A
pena, se não
mesmo sempre,
nove vezes em
dez não termina
nunca. Quem em
pecado está é
perdido. Cristo
perdoa, mas os
homens não”.
Para nossa
regeneração,
Cristo nos legou
uma série de
lições e
exemplos. Logo,
como uma terapia
de ajuda em
benefício de
nosso progresso,
a parábola da
adúltera pode
nos ensinar a
sondar nosso
coração. Esta
sondagem íntima
pode nos
conduzir ao
aprendizado das
leis divinas
para o
autoconhecimento
e não para o uso
inapropriado do
julgamento
alheio, pois
quantos de nós
descobriríamos,
no uso da
auto-reflexão,
nossas covardias
e atos
inadequados –
pensados ou
praticados... No
mínimo, uma
visita ao nosso
íntimo nos faria
cientes da nossa
comum situação
de carentes da
máxima: “Não
julgueis, pois,
para não serdes
julgados.”
(Mateus, VII:
1-2)
Bibliografia:
Carnelutti,
Francesco. As
misérias do
processo penal.
Tradução de José
Antonio
Cardinalli,
Campinas: Conan,
1995, p.77.