RITA CÔRE
garciacore@hotmail.com
Laje do Muriaé, Rio de
Janeiro (Brasil)
O gosto amargo das acusações
Temos visto, no meio
espírita, companheiros que
se referem a atividades
mediúnicas alheias ou à
atuação de palestrantes e
conferencistas com veemente
tom de reprovação.
Justificam-se eles, em seus
escritos e na tribuna, que
assim o fazem em apoio à
bandeira da fidelidade
doutrinária. No entanto, a
própria Codificação e os
ensinamentos de Jesus
apontam-nos outros caminhos
para se corrigirem
equívocos.
Allan Kardec deu-nos o
exemplo, através das
atitudes de equilíbrio e
bom-senso, nos momentos de
crise. A Doutrina Espírita,
por sua vez, é um sublimado
compêndio de pedagogia a nos
mostrar, entre incontáveis
lições, que as sombras só se
dissipam com a luz e não com
outras sombras que a elas se
assemelham.
Estabelecer polêmicas
inúteis, enfim, não leva
ninguém à libertação pelo
conhecimento nem ao
aprimoramento moral, é mero
exercício de paixões
personalistas, que acabam em
cinzas e amargura.
Circulam, é verdade, no
Movimento Espírita,
publicações marcadas de
mágica fantasia ou de
suposições precipitadas que
nada acrescentam, gerando
confusão e mal-estar. Mas
não será acusando este ou
aquele companheiro que se
resolverão os desvios de
rota.
O esclarecimento através do
estudo e o exemplo dos que
buscam a paz e o
entendimento serão mais
fortes aliados nessa luta
pelo saneamento dos enganos
do que as acusações, muitas
vezes, incitadas pelo
orgulho de um saber ao qual
falta sabedoria de conviver.
Quando se denunciam erros,
supostos ou verdadeiros, de
um líder espírita, com o
verbo exaltado da revolta,
gera-se um clima que
incentiva competição e
inveja, mesmo que não tenham
sido estes os móveis da
ação.
Erros, todos os cometemos.
Porém, a palha no olho do
irmão não deve constituir
objeto de denúncias amargas
em exposições públicas.
Atitudes dessa categoria são
um desserviço ao Movimento
Espírita, a despeito da
máscara das boas intenções
de revelar “verdades” que a
ninguém ajudam. Ao
contrário, faríamos melhor
se nos ocupássemos com a
divulgação da Doutrina em
suas bases seguras e
autênticas, para que os
próprios leitores e ouvintes
se capacitassem para separar
o joio do trigo.
Não se trata de estar
conivente com as distorções
doutrinárias que ferem a
razão, nem de se acovardar
em omissões
comprometedoras. A
diferença está no “como”
agir.
O papel de quem fala em nome
da Doutrina Espírita é
divulgá-la, é esclarecer as
mentes ingênuas e mágicas
que, por falta de estudo,
centram seu interesse nos
fenômenos, estacionando na
curiosidade e desconhecendo
que o Espiritismo se
fundamenta, de fato, em sua
filosofia.
Divulgar a Doutrina é,
portanto, o meio mais eficaz
de evitar a atenção que se
tem dado a revelações
inoportunas e irrelevantes
para o progresso do
Espiritismo no Brasil.
Se o freqüentador da Casa
Espírita, em suas Reuniões
Públicas, descobrisse que a
reencarnação é oportunidade
de crescimento e que
especulações a seu respeito
não passam mesmo de
especulações e, por isso,
não têm a importância que
lhes dão, teria respaldo
teórico e doutrinário para
não cair nas malhas da
proliferação de psicografias
sensacionalistas. Portanto,
não é preciso acusar, mas
esclarecer.
Se o mesmo amigo tivesse
notícia de que existem
pesquisas científicas sérias
a respeito do processo
reencarnatório, mesmo fora
dos círculos espíritas e que
somente através de
comprovações metódicas ou de
evidências indiscutíveis é
que se pode afirmar ser um
determinado Espírito o mesmo
de outras eras; se tivesse
aprendido que a mediunidade,
embora fundamental, é às
vezes escorregadia,
tornando-se fonte de enganos
e que não há médiuns
perfeitos; se tivesse tomado
conhecimento de que o método
de Kardec para a seleção dos
ensinamentos dos Espíritos
foi a sua concordância e a
conseqüente universalidade
da informação, teria também
descoberto que o Espiritismo
está na Codificação e não
nesta ou naquela obra
mediúnica isoladamente. Mais
uma vez, não é preciso
acusar, mas sim
esclarecer.
A luz do conhecimento e da
autêntica evangelização é
que pode dissipar as sombras
da ignorância e do
carreirismo mediúnico. Mas
um dos entraves, para que se
instale de fato essa
dinâmica entre nós, está
evidenciado no Movimento
Espírita como uma perigosa
antítese: de um lado, os
mágicos; de outro, os
fundamentalistas.
Os mágicos supervalorizam a
mediunidade, especialmente a
própria, e negligenciam a
orientação doutrinária e os
ensinamentos de Jesus que
respaldam a fé raciocinada;
os fundamentalistas negam o
valor das obras mediúnicas,
atendo-se apenas a Kardec,
como se ele mesmo não
tivesse recorrido aos
médiuns para nos trazer a
Doutrina que, afinal, é dos
Espíritos.
Enfim, nem tanto ao mar, nem
tanto à terra. Não se pode
negar a importância da
mediunidade responsável, nem
se julgar um médium por esta
ou aquela obra, mas avaliar
suas produções como um todo,
observando sua utilidade e
descartando os focos
passíveis de dúvidas, frutos
da imaginação exaltada.
Quanto mais se chama a
atenção para um fato, por
julgá-lo inconveniente, mais
ele se divulga.
Nesses dias de terceiro
milênio, na contagem do
nosso tempo, a hora é de
construir a paz e a tão
almejada unificação. O
Movimento Espírita não
carece de polêmicas
insensatas, mas de obras,
não necessariamente
mediúnicas, que tenham a
marca dos saberes que
amadurecem, que apontam
roteiros seguros de bem
viver, acompanhando o
progresso da Ciência e as
constatações da História,
sem sustos ou
deslumbramentos.
Levantem–se, pois, as vozes
de boa vontade para
esclarecer e pacificar. Mas
que não estacionem na
palavra, traduzindo o verbo
em ação. As boas obras se
reconhecem pelos seus
frutos. A vida acaba por
mostrar quem é quem. E aos
que se comprazem em usar a
palavra para acusar e
dividir só lhes restará, ao
se levantar o véu das
vaidades, o gosto amargo das
acusações.