CHRISTINA NUNES
cfqsda@yahoo.com.br
Rio de Janeiro,
RJ (Brasil)
O médium e o
profissionalismo
religioso
Minha secretária
chega
eletrizada,
contando o caso
acontecido há
uns dias com uma
senhora na casa
de quem
trabalhou há
tempos. Disse
que a tal
senhora teve o
marido adoentado
e precisado de
atendimento num
hospital, em
função de
complicações
intestinais.
Assim,
acompanhada de
seu segundo
filho,
levaram-no e, ao
chegarem lá,
foram atendidos
por um médico
para quem
comentou, no
decorrer do
atendimento:
−
O senhor se
parece com o meu
falecido filho,
que também era
médico.
Ao que o médico,
agradável e
cordato,
devolveu a
curiosa
observação.
−
A senhora também
me lembra um
pouco a minha
mãe...
−
e, atendo-se ao
caso em curso
que pedia
presteza, após
realizar alguns
exames iniciais
no paciente
idoso,
acrescentou para
a senhora em
expectativa:
−
Eu preciso dos
exames
anteriores do
seu marido. A
senhora os tem?
−
solicitou,
aludindo a
exames recentes
que ela havia
mencionado ter o
seu marido
realizado há
pouco tempo, em
razão de
problemas
semelhantes.
Embora
estranhando um
pouco, ela
confirmou. Só
que não os
trouxera. E se
dispôs a ir
rápido com o
filho mais novo
até em casa para
pegar o que se
pretendia,
deixando o
marido à espera
no hospital, em
companhia do
médico.
Para seu
espanto, lá
chegando,
encontrou um
tumulto. Rolos
de fumaça se
desprendiam do
seu apartamento,
enquanto pessoas
nervosas do
condomínio se
ajuntavam, na
correria para
sanar o problema
inaudito. Ela
havia esquecido
no fogo uma
panela que,
quando afinal
conseguiram
entrar na casa
às pressas,
constataram já
se achar
calcinada no
fogaréu, com a
ameaça de
incendiar não
apenas todo o
seu apartamento,
mas também o
edifício!
Após a correria
e o tumulto,
mais tarde, eis
que, ainda
pálida e
nervosa, ela
retorna para o
hospital
empunhando os
exames. E o
médico,
recebendo-a de
volta e
agradecendo à
Providência,
perguntou, logo
de saída:
−
Estava tudo bem
na sua casa?
A mulher, ainda
sobressaltada,
não se deu conta
da estranha
oportunidade da
pergunta
tranqüila e
interessada
dirigida pelo
agradável doutor
e se precipitou
logo em contar:
−
Imagine! Mal
sabe o senhor
quanto foi
providencial me
mandar em casa
para pegar estes
exames! Meu
apartamento ia
incendiar!
Esqueci uma
panela no fogo,
e lá cheguei bem
a tempo de
evitar o
sinistro!
Ao que, para o
seu maior pasmo,
o digno
profissional
respondeu-lhe
aos comentários
angustiados com
uma revelação
extemporânea e
inimaginada:
−
Sim, eu sei; foi
bem o seu filho,
que ali está,
próximo a nós,
que me pediu que
lhe mandasse em
casa em razão de
alguma
emergência que
lá ocorria...
−
e, com um
sorriso bondoso,
esclareceu,
indicando os
exames antigos
que ela lhe
entregara...
−
Eu não
precisava, em
absoluto, destes
exames!... E,
ante o olhar
pasmo da
senhora,
apontava,
amável, para o
espaço vazio ao
lado da cama do
seu marido...
O médico era
espírita
−
e médium! Um
daqueles casos
nos quais a
Espiritualidade,
nos acompanhando
e assistindo da
dimensão
invisível da
vida, intercede
decisivamente
para, ainda uma
vez, não apenas
nos prestar o
auxílio valioso
e impagável, mas
para confirmar a
patente e
ininterrupta
interação
existente entre
os dois lados da
vida!
Agora imaginem,
caríssimos, este
mesmo
acontecimento
com outro
desfecho:
imaginem se,
noutra hipótese,
fosse este
profissional da
área médica um
espírita,
médium, mas
inescrupuloso,
que encerrasse o
episódio
acrescentando à
sua revelação à
senhora
maravilhada que
o escutava,
tomada de
evidente
encanto:
−
(...) foi o seu
filho que me
pediu que lhe
mandasse em
casa. Gostaria
que, de alguma
forma, a senhora
retribuísse o
meu concurso
neste caso, já
que a minha
intercessão
certamente a
salvou de um
grave e trágico
acontecimento.
Aceitaria alguma
retribuição
financeira.
Afinal, os
médicos vêm
passando por
dificuldades
salariais...
Imaginem o caso
concluído deste
modo. Que se
pensaria de tal
espírita e, mais
ainda, de um
médium que
mercadeja com
algo que mais
não é do que um
dom
−
e inerente à
natureza humana,
de vez que todos
o possuem de uma
ou de outra
forma, mais ou
menos
evidenciado
−
diferindo
determinados
médiuns que o
externam mais
acentuadamente
nalgum momento
do seu trajeto
evolutivo e
cármico, apenas
e no mais das
vezes pelo
compromisso
sério vinculado
ao histórico de
suas vidas
passadas, que os
conduz a um
estágio corpóreo
programado para
o trabalho
ostensivo com a
mediunidade
reveladora do
intercâmbio
entre ambos os
lados da vida?
Eis aí a razão
básica e ética
de o médium
consciencioso
desempenhar o
seu trabalho na
área espírita
−
seja aí o da
cura, ou na área
da literatura
mediúnica, ou
onde for
−
mantendo-se,
decididamente,
distanciado da
objetivação do
lucro material
por intermédio
do exercício
peculiar deste
dom, cabendo
maior
responsabilidade
ainda aos que,
em se situando
em posição
privilegiada do
ponto de vista
financeiro, se
valem do
eventual retorno
assalariado de
certos trabalhos
da seara
espírita, qual a
publicação de
obras
psicografadas,
para se
robustecerem
materialmente.
A incoerência é
a mesma e tão
gritante quanto
a que existiria
no caso exposto,
já que este
gênero de
atividade
comporta no seu
próprio
desempenho e na
confiabilidade
que nos
depositam os
verdadeiros
autores das
obras a ela
vinculadas
−
laborando
conosco a partir
da banda
invisível da
vida – o
reconhecimento
suficiente e o
"pagamento",
reais e
adequados.
Mera questão de
ética da
cidadania
universal
porque, se seria
aviltante que um
médico portador
de uma mensagem
de urgência de
um habitante do
invisível
cobrasse o que
mais não se
revela do que
obrigação do
intermediário
mediúnico em
favor do bem
estar alheio,
também não
procede de forma
alguma que
medianeiros da
palavra da
espiritualidade
empenhada no
despertar da
consciência
humana para as
realidades
maiores que nos
aguardam se
ponham a
mercadejar com
um dom que lhes
surge exacerbado
com a finalidade
única da
prestação de
serviço útil aos
reencarnados,
assim como se
faria revoltante
que alguém que
se dispusesse a
guiar um cego
nas vias
públicas, numa
eventual
necessidade, lhe
cobrasse em
seguida pelo que
se lhe
constituiu num
mero dever de
consciência e de
cidadania, na
boa aplicação do
seu sentido da
visão.