“Cuidado paliativo
não é uma alternativa de
tratamento, e sim uma
parte complementar e
vital de todo
acompanhamento
do paciente.”
- Dame Cicely Saunders
Desde há alguns anos, é
comum lermos ou ouvirmos
a busca pelos cuidados
paliativos, porém pouco
se sabe sobre eles e é
comum encontrarmos
pessoas que tenham
dúvidas sobre sua
funcionalidade ou mesmo
qual o profissional que
está habilitado a
prestar esses cuidados.
Para esclarecer o
público, a Associação
Médico-Espírita do
Brasil, através de seu
Departamento de Cuidados
Paliativos, elaborou a
cartilha Cuidados
Paliativos – conhecer e
multiplicar, com a
finalidade de trazer
informações aos
interessados no assunto.
Aqui você confere uma
breve entrevista com o
coordenador desse
Departamento, o médico
geriatra Luís Gustavo
Mariotti, que também é
membro da AME-São Paulo:
Por que é crescente a
procura pelos cuidados
paliativos?
Segundo a Organização
Mundial da Saúde (OMS),
o Cuidado Paliativo é
uma abordagem de caráter
multiprofissional,
dirigida a toda pessoa
portadora de uma doença
que ameaça a
continuidade da vida,
progressiva e incurável,
com o objetivo de
melhorar a qualidade de
vida, prevenir e aliviar
o sofrimento na medida
em que há a
identificação precoce e
o controle impecável dos
sintomas das diversas
dimensões do ser
(física, social,
psicológica e
espiritual). Nessa
modalidade de
assistência, os
familiares e os
cuidadores também
recebem todos os
cuidados necessários
para o melhor
enfrentamento da doença
apresentada pelo doente.
Trata-se de uma
abordagem que reconhece
a pessoa dentro de uma
dimensão
biopsicossocioespiritual.
Muitos fatores têm
promovido a expansão do
oferecimento de Cuidados
Paliativos. Um deles é a
grande demanda de
pessoas. Estima-se que
cerca de 40 milhões de
pessoas em todo o mundo
necessitam de Cuidados
Paliativos, entre elas
crianças, adultos e
idosos. São pessoas que
apresentam doenças que
podem incapacitar e/ou
trazer a perda da
independência funcional,
resultar em vários
sintomas físicos e
emocionais, afetar nos
relacionamentos e nos
papéis desempenhados
pelos doentes no
trabalho e dentro da
família, que podem
trazer sofrimento aos
familiares e cuidadores
e que podem levá-los, na
maioria das vezes, ao
contexto do morrer e da
morte física.
São muitos os benefícios
trazidos aos portadores
de doenças ameaçadoras
da vida através do
oferecimento dos
Cuidados Paliativos. Os
estudos apontam que
essas pessoas podem
viver por mais tempo,
permanecem menos tempo
internados nos
hospitais, apresentam
melhor controle dos
sintomas físicos e
emocionais, maior
bem-estar espiritual e
com maior qualidade de
vida. Eles têm a
oportunidade de discutir
melhor com os médicos
sobre as indicações,
riscos, benefícios e o
recebimento ou não dos
tratamentos propostos,
sobre a escolha do local
de preferência para
morrer, e morrem com
mais conforto e
dignidade. Outros
estudos apontam
benefícios também aos
familiares e cuidadores,
como a redução do
estresse.
A visibilidade do
Cuidado Paliativo
enquanto especialidade é
outro fator que auxilia
na sua divulgação e
expansão. Em alguns
países do mundo (como os
Estados Unidos e a
Inglaterra), o Cuidado
Paliativo é uma
especialidade médica. No
Brasil, desde 2011, a
Medicina Paliativa é
reconhecida como uma
área de atuação médica,
possibilitando a
capacitação de um número
cada vez maior de
profissionais para
oferecerem os Cuidados
Paliativos.
Atualmente, o Cuidado
Paliativo é requerido
por diversas
organizações
internacionais como um
direito humano,
baseando-se no direito
ao mais alto nível
possível de saúde física
e mental. Isto
sensibilizará cada vez
mais governos e
instituições de saúde
para a sua
multiplicação.
A quem se destinam esses
cuidados?
Pessoas de todas as
faixas etárias
necessitam de Cuidados
Paliativos. O número
estimado de pessoas que
necessitam desses
cuidados no fim da vida
é de cerca de 20
milhões. A maior
proporção corresponde
aos adultos (94%), dos
quais 69% têm mais de 60
anos de idade e 25%
estão na faixa dos 15 a
59 anos de idade. Apenas
6% de todas as pessoas
que necessitam de
Cuidados Paliativos são
crianças.
Os portadores de doenças
cardiovasculares (como
nos casos de
Insuficiência Cardíaca),
de câncer, de demências
(como no caso da Doença
de Alzheimer e de outras
formas de demência) e de
outras doenças
neurológicas
progressivas (como a
Esclerose Lateral
Amiotrófica, Esclerose
Múltipla, Doença de
Parkinson), doenças
pulmonares crônicas,
doença renal crônica,
cirrose hepática,
HIV/AIDS são alguns
exemplos de pessoas que
apresentam indicação de
cuidados paliativos.
Também existe alguma
abordagem voltada para
crianças e jovens?
Sim, crianças e jovens
também podem ser
acometidas por doenças
que ameaçam a
continuidade da vida. No
Brasil, já existem
alguns serviços
liderados por
paliativistas. Destaco
alguns: Instituto da
Criança no HC-FMUSP/SP,
AC Camargo Câncer Center,
Hospital Infantil Albert
Sabin (Fortaleza/Ceará),
Hospital Boldrini
(Campinas/SP), TUCCA
Hospice Francisco
Leonardo (SP), Hospital
Pediátrico de Barretos
(SP), Instituto do
Câncer (RJ).
Recentemente, tivemos a
oportunidade de
acompanhar junto com
outros integrantes da
equipe de Cuidados
Paliativos do Hospital
do Servidor Público
Estadual (SP) um caso de
um bebê que desde o
quinto mês de gestação
foi diagnosticado com
uma anomalia neurológica
grave. Permaneceu na UTI
pediátrica por cerca de
30 dias e depois foi
transferido para a
enfermaria, ainda muito
fragilizado e sem
condições de sobreviver
sem ajuda de aparelhos
respiratórios. Faleceu
no 36º dia de vida em
decorrência da própria
evolução da doença.
Portanto, é importante
destacar que os Cuidados
Paliativos devem ser
oferecidos
preferencialmente desde
o diagnóstico de uma
doença que pode levar o
indivíduo à morte ou que
se caracterize como
progressiva e incurável,
independentemente da
faixa etária.
Quanto a espiritualidade
e a Doutrina Espírita
podem auxiliar esse
período para pacientes,
familiares e
profissionais de saúde?
As crenças e práticas
espirituais, religiosas
e culturais desempenham
um papel significativo
na vida dos pacientes
que estão em Cuidados
Paliativos, pois a
maioria deles é
religiosa e elas
fornecem uma base
teórica e ética para a
tomada de decisões
clínicas. Elas
estabelecem um quadro
conceitual para a
compreensão da
experiência humana sobre
a morte e o morrer,
sobre o significado da
doença e do sofrimento.
Muitos médicos têm
dificuldades para
abordar
espiritualidade/religiosidade
com os pacientes. Muitos
acreditam que não lhes
compete essa abordagem,
que os pacientes podem
sentir-se constrangidos,
têm medo de impor uma fé
religiosa ou se sentem
inseguros para abordar
assuntos espirituais.
Entretanto, a maioria
dos pacientes gostaria
de discutir esses
assuntos com seus
médicos.
O papel de uma equipe de
saúde é o de reconhecer
e acolher as
necessidades
espirituais. Alguns
pontos são fundamentais
para isso:
·
Ter uma escuta ativa,
empática, compassiva e
fraterna é muito
importante. Deve-se
estar preparado para
abordar os assuntos
espirituais se o
paciente manifestar
desejo;
·
Compreender as reações
dos pacientes e
familiares relacionadas
às perdas ou limitações
(condições físicas,
sociais, financeiras,
emocionais).
·
Estar preparado para
lidar com situações e
sentimentos dos
pacientes e seus
familiares como, por
exemplo, a raiva, a
negação, tristeza, o
desespero, o medo, a
desesperança.
·
Estruturar e manter uma
rede de suporte
espiritual (com
conselheiros espirituais
ou capelanias) de acordo
com a religião e desejos
do paciente e de seus
familiares.
·
O profissional da saúde
ou o voluntário jamais
deve impor ou discutir
seus próprios pontos de
vista religiosos com o
paciente ou familiares.
Para eles, algumas
vezes, falar sobre o
significado e o sentido
de suas vidas é mais
pertinente que abordar
aspectos religiosos.
Quanto ao papel da
Doutrina Espírita,
acredito que esta pode
auxiliar o doente, sua
família e os prestadores
de cuidados através da
possibilidade de ser
fonte de fé, esperança,
paciência, resignação e
de dar explicações sobre
o porquê das aflições,
auxiliando o Ser numa
maior compreensão sobre
a natureza humana, sua
destinação e o processo
de aprendizado e
evolução que permeia a
nossa existência. Além
disso, há um elo de
convergência entre a
filosofia dos Cuidados
Paliativos e a Doutrina
Espírita em relação ao
oferecimento de cuidados
multidimensionais para
aliviar o sofrimento do
ser e à compreensão da
morte como um processo
natural.
O que as pessoas vão
encontrar na cartilha
produzida por
profissionais ligados à
AME-Brasil?
A cartilha tem por
objetivo trazer
informações fundamentais
e de maneira sintetizada
sobre o que são os
Cuidados Paliativos,
seus princípios, suas
indicações e a quem
devem ser oferecidos,
sobre como abordar a
espiritualidade e como
oferecer cuidados
espirituais aos
pacientes e familiares
na prática paliativista.
É uma oportunidade para
o conhecimento inicial
sobre o tema e um
convite para o ingresso
ao Departamento de
Cuidados Paliativos da
AME-BRASIL por aqueles
que se interessarem.
Nota da Autora:
A cartilha Cuidados
Paliativos – conhecer e
multiplicar está
disponível na página
www.amebrasil.org.br
(no item Departamento de
Cuidados Paliativos) ou
no facebook da AME
Brasil -
https://www.facebook.com/ame.brasil/