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Crônicas e Artigos

Ano 10 - N° 474 - 17 de Julho de 2016

ROGÉRIO COELHO
rcoelho47@yahoo.com.br
Muriaé, MG (Brasil)

 

 
 
Os males só vêm para o bem

Se hoje a borrasca cai forte e inclemente,
amanhã voltará o Astro Rei a brilhar

“No mundo tereis aflições, tende bom ânimo.” - Jesus (Jo., 16:33).
 

Não obstante ser um dos mais dedicados apóstolos de Jesus, e quase não ser mencionado nas Escrituras Neotestamentárias, Bartolomeu acompanhou desde os primeiros tempos as pregações à margem do Tiberíades, e incompreensivelmente padecia de uma tendência para a depressão. Pudera! Em sua vida tudo parecia dar errado!... Havia ficado órfão de sua mãe há pouco... Ela que era o anjo bom de sua vida, e ele a “perdera”... De sua família consanguínea restaram-lhe os intratáveis irmãos e o pai severo e insensível, de personalidade tosca, rude... Maltratavam-no por nonadas e não lhe tinham o menor respeito. E a relação degenerou-se ainda mais quando ele começou a seguir aquele Carpinteiro nazareno (segundo eles) meio louco que andava por aquelas bandas com ares de revolucionário... Àquele tempo (e hoje também) eram inúmeros os falsos messias que apareciam pelas bandas de Cafarnaum, Dalmanuta e adjacências com suas utopias... O mais recente qualificativo que lhe pespegaram era “traidor das tradições de seu povo”, uma vez que se bandeara para o lado daquele estranho Carpinteiro em detrimento da Antiga Lei Moisaica a que se acomodavam...

Mas suas vicissitudes não se encerravam aí!... Tinha sérios problemas com seus auxiliares da pesca. Bartolomeu dedicava-se à pesca na cidadezinha de Dalmanuta. Seus problemas com os mercadores da praça aos quais vendia seus peixes também não eram pequenos. Normalmente regateavam com o preço dos peixes que com tantos riscos pescava durante as noites indormidas...

Certa feita, em uma feliz oportunidade, ficou sozinho com Jesus e aproveitou para abrir seu coração apertado. Então, queixou-se a Jesus sobre suas amargas tristezas e frustrações...

Após ouvi-lo com ternura e atenção, Jesus lhe disse: “ora, Bartolomeu, o Evangelho é a Boa Nova de alegria. Uma boa notícia deve ser dada com alegria. Deixe que meus ensinamentos floresçam em seu coração e espalhe esse tesouro de bênçãos como perfume benfazejo aos que estejam à sua volta. Eu não ocultei a Verdade, Bartolomeu! Eu disse: “no mundo tereis aflições”, mas sempre estarei por perto, fortalecendo e guiando meus discípulos sinceros e queridos. Se hoje a borrasca cai forte e inclemente, amanhã voltará o Astro Rei a brilhar em seu caminho! Meu Pai nos dá a Eternidade para a conquista definitiva da felicidade sem mescla e da paz imarcescível... Estes momentos tormentosos presto passarão, mas minhas palavras não passarão! Então, acenda as claridades da alma e caminhe sem tergiversações!

Meu pai não nos deixará órfãos e eu também não os deixarei órfãos... Lá no futuro haverá o grande reencontro do Pastor com o rebanho unificado, mas o hoje exige sacrifícios, renúncias, compreensão, benevolência para com todos, indulgência para com os erros alheios e perdão incondicional das ofensas.

Assim, “perdas” de entes queridos, negócios fracassados ou espinhosos, parentes difíceis, criaturas deseducadas, vicissitudes mil são as pedras com as quais tropeçamos no roteiro evolutivo, mas tudo são convites para a sementeira do amor não amado.

Eu estou deixando a todos a minha paz, mas em nada parecida com a paz do mundo e o convite continuará pelos séculos vindouros: trabalhemos na sementeira do amor, do conhecimento, da luz do Mais Alto. Persevere, filho querido, e você receberá a coroa da vida.

As novas aragens espantaram, enfim, as nuvens borrascosas da vida de Bartolomeu, que foi fiel até o fim no trágico martírio do testemunho. (Foi esfolado vivo.)

Pela abendiçoada mediunidade de Chico Xavier, informa o Irmão X[1] que “Bartolomeu logrou converter todos os desalentos num cântico de alegria, ao sopro regenerador dos ensinamentos do Cristo. A partir da grande mudança que se operou em sua intimidade, todos o observaram com admiração, exceto Jesus, que conhecia com júbilo a nova atitude mental de Seu discípulo.

No sábado seguinte, o Mestre demandou as margens do lago, cercado de Seus numerosos seguidores. Ali, aglomeravam-se homens e mulheres do povo, judeus e funcionários de Ânticas, a par de grande número de soldados romanos.

Jesus começou a pregar a Boa Nova e, a certa altura, contou, conforme a narrativa de Mateus, que – ‘o reino dos céus é semelhante a um tesouro que, oculto num campo, foi achado e escondido por um homem que, movido de gozo, vendeu tudo o que possuía e comprou aquele campo’.

Nesse instante, o olhar do Mestre pousou sobre Bartolomeu, que O contemplava, embevecido; a luz branda de seus olhos generosos penetrou fundo no íntimo do Apóstolo, pela ternura que evidenciava, e o pescador humilde compreendeu a delicada alusão do ensinamento, experimentando a alma leve e satisfeita, depois de haver alijado todas as vaidades de que ainda se não desfizera, para adquirir o tesouro divino, no campo infinito da vida.

Enviando a Jesus um olhar de amor e reconhecimento, Bartolomeu limpou uma lágrima. Era a primeira vez que chorava de alegria. O pescador de Dalmanuta aderira, para sempre, aos eternos júbilos do Evangelho do reino”. Não mais tristezas e tampouco depressões...

Segundo a nobre Mentora Joanna de Ângelis[2] “(...) muitos indivíduos desassisados vivem a remoer mentalmente os acontecimentos afligentes, a comentá-los com tanta frequência que dão a impressão de haver sido a sua caminhada uma via-crúcis sem trégua.

Detêm-se em relatórios amargos dos momentos difíceis, como se fossem anjos perseguidos em sua imácula pureza, num atestado de rebeldia e ingratidão para com o Pai Soberano que os favoreceu com preciosos recursos capazes de anular aqueles pequenos incidentes, aliás, necessários ao processo de autoidentificação e de vinculação de segurança com a vida.

São tantas as concessões de paz e de saúde, de inteligência e de arte, de pensamento e de trabalho, de convivência agradável com as demais pessoas, que praticamente desaparecem as ocorrências que foram penosas enquanto duraram, deixando benefícios incalculáveis. Esse posicionamento raia, às vezes, à condição patológica de masoquismo, em face do prazer mórbido de privilegiá-lo em detrimento das ocorrências felizes e favorecedoras de alegria.

Esse, sem dúvida, é um comportamento injustificável quando se trata de um cristão em particular ou de um espírita em especial, por conhecerem ambos as razões morais que desencadeiam tais acontecimentos. Uma atitude lúcida deve oferecer ao indivíduo o sentimento de gratidão pela ocorrência do sofrimento, chegando até mesmo a amá-lo, em razão dos benefícios que proporciona.

A admirável senhora Helen Keller, embora cega, surda e muda, viveu em constante alegria, tornando-se uma semeadora de esperança e de bom humor para milhões de outros seres atormentados nas suas expiações retificadoras, havendo dedicado a existência a encorajar o próximo por meio de memoráveis discursos e livros formosos.

Louis Braille, igualmente padecendo de cegueira, transformou os seus limites em bênção para os companheiros invidentes, criando o alfabeto para o tato, de resultados surpreendentes, e que hoje lhe guarda o nome.

Beethoven, em surdez total, utilizou-se do silêncio profundo para compor as últimas sinfonias da sua existência e, particularmente, a 9a, A coral, considerada como um verdadeiro coroamento da sua obra.

O Aleijadinho, apesar da injunção perversa da hanseníase, transformou pedras em estátuas deslumbrantes, esculpindo com maestria e tornando-se um artista incomum...

Apesar da tuberculose que o consumia, Louis Pasteur prosseguiu nas suas investigações em torno dos micróbios, oferecendo incalculáveis benefícios à saúde da humanidade.

Ninguém atravessa os caminhos humanos isento dos sofrimentos.

Seres humanos valorosos que foram enviados à Terra com limitações e impedimentos quase superlativos demonstraram a grandeza de que eram portadores, transformando a existência em um hino de alegria, tornando-se missionários do Amor e da Ciência, da Tecnologia, da Arte, da Fé religiosa, estimulando o progresso e trabalhando em seu benefício.

Possuidor de mil recursos preciosos, o indivíduo não tem por que queixar-se das dificuldades que o promovem, quando enfrentadas com sabedoria e superadas, dando-lhe dignidade e elevação moral.

As provações devem ser abençoadas por aqueles que as experimentam, porque nada acontece que não tenha razões ponderosas para a sua ocorrência, e, naquilo que se refere ao sofrimento, é claro que tem ele o papel de educador rigoroso, porém, gentil, indispensável ao crescimento espiritual dos seres humanos.

Reflexiona (quando nas tuas dores) as ocorrências da vida de Jesus, e compreenderás que Ele, sem culpa, lição viva de amor e de abnegação, experimentou agressões e escárnio, apedrejamento e coroa de espinhos, calúnias e perseguições, culminando na cruz da desonra, sem qualquer reclamação...”

Segundo a nobre psiquiatra suíça, Drª. Elizabeth Kübler Ross, escreveu o seguinte em seu último livro[3]: “(...) todas as penúrias que sofremos na vida, todas as tribulações e pesadelos, todas as coisas que poderíamos considerar castigos de Deus são, na realidade, presentes. São oportunidades para crescer, que é a única finalidade da vida”. É impressionante que ela tenha chegado a estas conclusões sem nunca ter tomado conhecimento dos livros básicos do Espiritismo.

Completa Joanna de Ângelis[4]: “(...) O ser autodescoberto já não pode adiar a sua contribuição em favor do meio social onde vive, passando a agir de maneira infatigável. As suas ações se tornam fator preponderante para o progresso de todos os demais seres, que agora se lhe tornam irmãos, companheiros da mesma jornada”.

Isabel de França lega-nos belíssima e oportuna página onde aborda com peregrina clareza o modo pelo qual devemos encarar os atos e equívocos de nossos irmãos rebelados. Diz ela[5]: “(...) deveis amar os desgraçados como criaturas que são, de Deus, às quais o perdão e a misericórdia serão concedidos, se arrependerem, como também a vós, pelas faltas que cometeis contra Sua Lei. Considerai que sois mais repreensíveis, mais culpados do que aqueles a quem negardes perdão e comiseração, pois, a mais das vezes, eles não conhecem Deus como O conheceis, e muito menos lhes será pedido do que a vós”.

Superemos, portanto, as aflições do caminho, as provações, os percalços, não olvidando que, quando a noite te faz mais escura, é o justo momento do começo das claridades.   


 

[1] - XAVIER, Francisco Cândido. Boa nova. 37. Ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2014, cap. 8, p. 58.

[2] - FRANCO, Divaldo. Vitória sobre a depressão. 2. ed. Salvador: LEAL, 2-13, p.118-121.

[3] - Dra. Elizabeth Kübler-Ross. La rueda de la vida”. Barcelona. Ediciones B, AS, 1997, p. 378.

[4] - FRANCO, Divaldo. Vida: desafios e soluções. Salvador: LEAL, 1997, p. 118.

[5] - KARDEC, Allan. O Evangelho seg. o Espiritismo. 129. ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2009, cap. XI, item 14.



 


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 Revista Semanal de Divulgação Espírita