EURÍPEDES
KÜHL
euripedes.kuhl@terra.com.br
Ribeirão Preto, SP
(Brasil)
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A intenção é
tudo
Intenção é o
desejo
deliberado de
alguém realizar
alguma ação.
Allan Kardec
preocupou-se
muito em
esclarecer, do
ponto de vista
espiritual, como
Deus ajuíza e
quantifica o
mérito ou
demérito de cada
ação humana.
Simplificando:
quais os graus
de inocência ou
culpa, de
atenuantes ou
agravantes
(bônus ou ônus)
de cada ato, de
cada homem.
Considerando a
sublime
plataforma na
qual Kardec se
posicionou para
levar adiante a
Codificação da
Doutrina dos
Espíritos, óbvio
que também esta
sua pesquisa foi
direcionada
inteiramente
para os
consequentes
morais de tudo
aquilo que o ser
realiza.
Resulta notável
a intuição de
Kardec ao
enfocar este
aspecto em
particular, no
longo roteiro
evolutivo de
cada Espírito e
cumpre atentar
que, à sua
época, a Ciência
de então, de par
com a Religião,
eram
predominantes,
ambas, no
pensamento
humano e
abominavam a
reencarnação.
Por conseguinte
havia (como
ainda hoje há)
desconhecimento
generalizado da
Lei Divina de
Justiça, naquilo
que
consubstancia
ação e reação,
plantação e
colheita,
consoante
magistralmente
Jesus enunciou:
“A cada um a
retribuição será
de acordo com o
seu
comportamento”.
Nesse contexto,
uma vez mais
desponta a
abençoada
argúcia e o
filantropismo de
Kardec,
preocupando-se
em pavimentar
com
esclarecimentos
lógicos a
sinuosa estrada
da caminhada
terrena, onde
tantos paradoxos
parecem
atropelar os que
nela trilham —
maioria da
Humanidade — sem
o entendimento
da Justiça
Divina.
Pois, de fato,
vem de longe a
inexplicabilidade
de uma Justiça
Superior que
permite a
réprobos morais
prosperar, ao
passo que
tragédias
alcançam pessoas
de boa conduta e
até mesmo
crianças de
tenra idade...
Tais fatos, de
aparente
injustiça, se
submetidos ao
sol do meio-dia
(a lógica) e
focados pelas
lentes da
reencarnação,
certamente
aquecerão com
entendimento as
mentes
desabrigadas e
ao frio da
desconfiança na
Sabedoria e no
Amor do Criador.
Voltando à
intenção, não há
negar que
raramente ela é
impulsionada por
apenas um vetor,
a chamada
“primeira
intenção”, no
caso, intenção
única.
Intenção única é
aquela na qual o
agente visa
apenas a um
objetivo, uma
resultante.
Talvez seja
permitido supor
que Jesus, ao se
deslocar dos
alcândores
celestiais para
conviver
conosco, teve a
intenção
exclusiva de nos
ajudar mais
diretamente,
agindo por amor.
Só por amor!
Nesse diapasão
de fraternidade,
Allan Kardec,
predispondo-se a
codificar o
Espiritismo,
objetivou
colocar ao
alcance da
Humanidade as
sublimidades
recebidas do
Plano
Espiritual, via
processualística
inédita, que tão
bem soube
apropriar da
mediunidade.
Exceção daquilo
que fazem os
homens de bem,
minoria no nosso
planeta, quase
tudo o que aqui
é feito tem por
fulcro a
resultante da
segunda, da
terceira ou até
de mais ações,
as quais se
encadeiam, como
elos da
corrente.
O homem assim
procede, para o
bem ou para o
mal, consciente
ou
inconscientemente.
É dessa forma
que, sem
generalizar,
vê-se:
- aquele que se
especializa tem
por meta
conseguir bom
emprego, bom
salário... mas
também vida
confortável;
- o médico que
se forma
pretende curar
doenças... mas
também uma
posição
profissional
relevante;
- o político se
esforça para ser
eleito para
ajudar a
comunidade...
mas também ser
aclamado e, logo
mais, ser
reeleito;
- o atleta que
treina com
denodo mira
superar
marcas... mas
também o êxtase
do pódio, da
vitória, da
fama;
- o espírita
estuda as lições
do Espiritismo
para compreender
cada vez mais a
razão da
existência...
mas também para
promover a
autorreforma e
seguir em busca
da evolução.
Assim é que
quase sempre a
primeira
intenção não é a
verdadeira, ou
melhor, não é a
única, a
principal, mas
um alicerce para
a construção de
um projeto, que
pode se dirigir
a outros focos.
É por isso que
na vida há
surpresas: boas
ou más...
O homem
desconfia do
próprio homem e
amiúde se ouve:
“fulano agiu
assim com
segunda
intenção”. Ou,
então, perguntas
expressas ou
ocultas: “quais
serão as
intenções desse
acontecimento?”,
“o que será que
ele/ela quis
dizer com
isso?”, “com que
objetivo fulano
fez tal coisa?”.
Num exemplo
singular,
referente aos
danos da
competição, que
é uma das
maiores causas
de desavenças e
infelicidades,
num inocente
jogo de xadrez
os competidores
agem
inexoravelmente
com intenções
ocultas, para
não dizer
sub-reptícias...
O jornal “O
Atibaiense”, da
cidade de
Atibaia/SP, na
edição nº 7.569,
de 14/Jan/2006,
publica
reportagem
citando que uma
pessoa especial,
daquela cidade,
no ano de 1997
assombrou o
mundo
enxadrístico ao
jogar
simultaneamente
(vários
adversários ao
mesmo tempo) e
em uma das
partidas
anunciar que
daria xeque-mate
em 12 lances,
fossem quais
fossem as
jogadas do
respectivo
competidor! E
isso aconteceu!
Eu e muitos da
Humanidade,
ainda limitados
no mourejo da
estrada
evolutiva,
dificilmente
agimos só com
intenção única.
E foi por causa
disso que Kardec
houve por bem
dirigir algumas
perguntas aos
Esclarecedores
Siderais, cujas
respostas ele,
em boa hora,
deixou
registradas no
“O Livro dos
Espíritos”.
Ei-las, por
números:
658.
Agrada a Deus
a prece?
“A prece é
sempre agradável
a Deus, quando
ditada pelo
coração, pois,
para ele, a
intenção é tudo.
(...)”.
(Grifei.)
670.
Dar-se-á que
alguma vez
possam ter sido
agradáveis a
Deus os
sacrifícios
humanos
praticados com
piedosa
intenção?
“Não, nunca.
Deus, porém,
julga pela
intenção. (...)”
672.
A oferenda
feita a Deus, de
frutos da terra,
tinha a seus
olhos mais
mérito do que o
sacrifício dos
animais?
“Já vos
respondi,
declarando que
Deus julga
segundo a
intenção.”
747.
É sempre do
mesmo grau a
culpabilidade em
todos os casos
de assassínio?
“Já o temos
dito: Deus é
justo, julga
mais pela
intenção do que
pelo fato.”
749.
Tem o homem
culpa dos
assassínios que
pratica durante
a guerra?
“Não, quando
constrangido
pela força; mas
é culpado das
crueldades que
cometa,
sendo-lhe também
levado em conta
o sentimento de
humanidade com
que proceda.”
Mais à frente,
ainda em “O
Livro dos
Espíritos”, na
4ª Parte, Kardec
aborda de modo
enfático as
variáveis do
equivocado ato
do suicídio.
Algumas:
948.
É tão
reprovável, como
o que tem por
causa o
desespero, o
suicídio daquele
que procura
escapar à
vergonha de uma
ação má?
“O suicídio não
apaga a falta.
(...) Deus, que
julga, pode,
conforme a
causa, abrandar
os rigores de
sua justiça.”
949.
Será
desculpável o
suicídio, quando
tenha por fim
obstar a que a
vergonha caia
sobre os filhos,
ou sobre a
família?
“O que assim
procede não faz
bem. Mas, como
pensa que o faz,
Deus lhe leva
isso em conta,
pois que é uma
expiação que ele
se impõe a si
mesmo. A
intenção lhe
atenua a falta.
(...)”
951.
Não é, às
vezes, meritório
o sacrifício da
vida, quando
aquele que o faz
visa salvar
a de outrem, ou
ser útil aos
seus
semelhantes?
“Isso é sublime,
conforme a
intenção, e, em
tal caso, o
sacrifício da
vida não
constitui
suicídio. (...)”
NOTA: A
propósito de
alguém se matar
pensando em ser
útil a outrem,
cito dois casos
de suicídio,
autodeliberados,
de certa forma
similares e de
difícil
enquadramento
quanto à
culpabilidade:
1º - No caso “O
pai e o
conscrito”,
em 1859, um pai
de família, ao
saber que seu
filho fora
convocado para
ir combater na
guerra da
Itália, não
podendo livrá-lo
desse
compromisso
militar,
suicidou-se,
para que esse
filho não fosse,
já que pela lei
passaria a ser o
“arrimo de
família” (da
mãe, então
viúva). Evocado,
o Espírito
reportou que
sofria muito,
justamente, mas
que teve
abrandamento da
pena, pois
compreendia que
sua ação não
deixou de ser
má. O Espírito
São Luís
acrescentou que
nesse caso o
motivo propiciou
atenuante, e que
“Deus, que é
justo e vê o
fundo dos
corações, não o
pune (ao
suicida) senão
de acordo com
suas obras”.
2º - A
inolvidável
médium Yvonne A.
Pereira
(1906-1984)
narra que na
cidade de
Pirapora/MG,
na época da II
Guerra Mundial
(1939-1945), uma
pobre senhora
“sem orientação
espiritual
eficiente, tinha
um filho que era
a razão do seu
viver, as
primícias da sua
vida”. Sendo
esse filho
convocado para
partir para a
Itália, a mãe,
conquanto muito
religiosa,
católica, fez
veemente
promessa a Deus
de dar a própria
vida em troca da
vida e da saúde
desse filho,
caso ele
retornasse da
guerra são e
salvo. Foi o que
aconteceu.
Sabendo da
promessa da
senhora, muitos,
inclusive o
vigário local,
tentaram
dissuadi-la
desse equivocado
propósito.
Debalde. Um ano
depois ela se
atirou às
violentas águas
da cheia do Rio
São Francisco,
vindo a falecer.
Comenta Yvonne:
“que o leitor
amigo nos ajude
a classificar
esse caso de
suicídio,
porque, em
verdade, não
sabemos como
apreciá-lo.
Auto-obsessão?
Obsessão real?
Enfermidade
nervosa? Revolta
contra Deus e a
Vida? Ignorância
das leis de
Deus? Amor
materno elevado
ao fanatismo?
Desequilíbrio
mental pelo
horror à guerra?
Nas nossas
observações não
encontramos caso
igual. Todavia,
as intenções
pesam muitíssimo
para as leis
divinas, embora
não cheguem a
tudo
justificar”.
954.
Será
condenável uma
imprudência que
compromete a
vida sem
necessidade?
“Não há
culpabilidade,
em não havendo
intenção, ou
consciência
perfeita da
prática do mal.”
NOTA: O caso dos
“camicases” (do
japonês:
kamikases),
pilotos que na
II Guerra
Mundial, tanto
quanto
atualmente os
“homens-bomba”
(conflitos
Palestina x
Israel, Iraque x
EUA),
terroristas de
diversas
nacionalidades,
que ao se
sacrificarem o
fizeram ou fazem
por
“patriotismo”,
ou por ilusão de
vida paradisíaca
após a morte,
expõe
desconhecimento
da vida
contínua. Não
objeta imaginar
que Deus levará
em conta essa
ignorância e a
intenção, não
obstante a
necessidade de
dolorosa
reconstrução com
a qual terão que
arcar, em face
do mal que
causaram a
outrem. Contudo,
mais
responsabilizados
e penalizados
pela própria
consciência
serão os líderes
que induzam seus
subordinados a
assim proceder,
conquanto também
eles assim
procedam por
ignorância das
vidas
sucessivas.
Kardec abordou
as nuanças da
intenção em
outras duas
oportunidades:
a.
Referindo-se com
severidade ao
delicadíssimo
tema do
charlatanismo e
do embuste,
estabelece
enérgica
diferença entre
os médiuns que
cometem abuso e
aproveitamento
(especuladores),
daqueles que,
impedidos de
trabalhar,
dedicam-se (com
retribuição) de
forma
eminentemente
séria e útil.
Reporta que
“conforme o
motivo e o
fim
podem, pois, os
Espíritos
condenar,
absolver e, até,
auxiliar. Eles
julgam mais a
intenção do que
o fato
material”;
b.
Na mesma obra,
referindo-se às
“Reuniões
espíritas”,
promulga
enfaticamente
que cada uma
delas “é um ser
coletivo”, pelo
que, vinte
pessoas,
unindo-se com
a mesma intenção,
vibrando em
uníssono, terão
mais força do
que uma só.
(Grifei).