O dever
Buscamos a paz. Falamos
nela, dela e,
decididamente, não a
encontramos seja dentro
ou fora de nós, porque
ainda não conseguimos
perceber que a busca
deve ser feita de dentro
de nós para o mundo que
nos cerca.
Será que isso acontece
porque vivemos a falsa
ilusão de que conhecemos
o que nos dá paz? É bem
provável que sim. Essa
questão nos remete a uma
passagem do Evangelho de
Lucas, capítulo 19,
versículo 42, quando
Jesus, junto a
Jerusalém, fala a essa
cidade – na verdade,
falava para todos os
homens – o seguinte:
“Ah, se tu conheceras
por ti mesmo, ainda
hoje, o que é devido à
paz! Mas isto está agora
oculto aos teus olhos”.
As palavras do Mestre
nos convidam a pensar no
que seria do mundo se
cada um de nós
conhecesse o que,
realmente, necessitamos
para ter paz interior.
E, na procura desses
bens encontramos, para
começar, as infinitas
oportunidades de serviço
de que dispomos no
presente. Oportunidades
que são nossas por
benesse divina. Depois,
podemos também perceber
que possuímos a
possibilidade de
refletir sobre o que
poderíamos ter feito no
passado e não fizemos.
Tendo somente esses dois
bens, já podemos
observar que os convites
de trabalho aí estão
para quem deseja
realizar algo. Todavia,
antes de nos atirarmos,
inadvertidamente, aos
trabalhos só porque nos
sentimos culpados, é
aconselhável que cada um
de nós procure
compreender, com
dignidade, seus próprios
deveres, isto é, os
compromissos morais a
que estamos sujeitos com
todos aqueles que nos
cercam – encarnados e
desencarnados –,
sobretudo com nosso
grupo familiar. Essa
compreensão é importante
porque, às vezes,
deixamos de atender
pequeninas exigências
que são, na verdade,
mais benéficas a nós do
que aos outros.
Todos nós temos
consciência de que nossa
conta corrente com as
leis divinas está em
saldo devedor. Por essa
razão, se cada um de nós
cuidasse de cumprir suas
obrigações para saldar
esse débito, grande
parte dos problemas
sociais do mundo se
resolveria naturalmente,
e todos os fantasmas da
inquietude que rondam
nossa existência seriam
afastados.
Mas, por que é tão
difícil o cumprimento
desses compromissos
morais? Por duas razões:
a primeira delas é que,
na ordem dos
sentimentos, o dever se
encontra em posição
antagônica com as
seduções do interesse e
do coração; e em segundo
lugar, porque ele está
entregue ao
livre-arbítrio, ao
direito que temos de
escolher entre o certo e
o errado, entre o fazer
e não fazer. O
interessante nesse
processo é que a
consciência nos adverte
quando nos enganamos,
nos estimulando e
sustentando para que
decidamos sempre pelo
certo, pelo bem.
Entretanto, o não
interessante é que quase
sempre sucumbimos.
Agora, já que estamos
buscando conhecer o que
temos para conquistar a
paz, é bom procurarmos
saber, também, onde o
dever moral começa e
onde termina – vale
lembrar que não estamos
tratando aqui do dever
profissional.
Em O Evangelho
segundo o Espiritismo,
capítulo 17, o item 7
lembra que ele tem
início quando ameaçamos
a felicidade ou a
tranquilidade do próximo
(por exemplo, o
desrespeito às normas
estabelecidas na
convenção de
Condomínios, a fim de
que todos possam viver
em harmonia), e termina
no limite em que
interferimos na livre
escolha do outro (por
exemplo, excessos de
cuidados ou
superproteção que
impedem o crescimento ou
as livres escolhas do
outro).
Outro ponto importante
do qual não podemos nos
esquecer é o da confusão
que ainda fazemos entre
obrigação social e dever
moral, tomando-se o
significado do primeiro
pelo segundo. Um exemplo
bem simples que pode nos
esclarecer é o seguinte:
quando visitamos nossos
pais ou avós, caso não
moremos com eles, ou
doentes, sejam
familiares ou não, é
imaginarmos que estamos
cumprindo um dever moral
(fraternidade) quando,
na verdade, desejaríamos
adiar essa visita
indefinidamente.
Nesse momento, é bom
prestarmos atenção às
nossas atitudes. Se não
existe alegria ou amor
no gesto, melhor será
fazer mudanças,
entendendo que é preciso
amar o dever e não
apenas executar as
obrigações que a
sociedade nos impõe
(o que o outro vai dizer
se eu não for). André
Luiz diz na lição 17, do
livro Sinal Verde,
psicografado por
Francisco Cândido
Xavier, que “quando o
trabalhador converte o
trabalho em alegria, o
trabalho se transforma
na alegria do
trabalhador”.
A diferença então se
estabelece quando
percebemos que o dever é
sempre estimulado pela
consciência e não pelas
regras sociais. Por tudo
isso, podemos concluir
que o convite ao bem, à
prática do dever moral,
sempre nos acompanhou,
apesar de dificilmente o
percebermos. Isso
aconteceu através dos
nossos pais, das
leituras que fizemos e
que ainda fazemos, do
sentimento religioso que
nos consola e nos
impulsiona ao exercício
do amor ao próximo, dos
amigos encarnados e
desencarnados que nos
auxiliam. E se já
possuímos algum
conhecimento dos
ensinamentos de Jesus e
já temos alguma
consciência de que
somente através do dever
cumprido encontraremos a
paz que tanto buscamos,
por que ainda esperamos
para fazer o que deve
ser feito?
O trabalho de
transformação de nossas
disposições íntimas
necessita ser iniciado
hoje, continuado amanhã,
a cada minuto da nossa
vida, até encontrarmos a
divindade que existe em
nós.
Afirma Cairbar Schutel,
no livro Parábolas e
Ensinos de Jesus –
“Deveres Espíritas”: “O
homem que cumpre seu
dever, a nada fica
obrigado. Quando o homem
faz o que pode, Deus faz
por ele o que ele por si
não pode fazer”.
Bibliografia:
XAVIER, F. C. - Fonte
Viva – ditado pelo
Espírito Emmanuel – 31ª
ed., FEB, Rio de
Janeiro/RJ – lição 100.
_____________
Caminho, Verdade e Vida
- ditado pelo Espírito
Emmanuel – 17ª ed., FEB
– Rio de Janeiro/RJ –
lição 138.
_____________ O
Consolador – ditado
pelo Espírito Emmanuel –
17ª ed., FEB – Rio de
Janeiro/RJ – Parte II –
“Dever”.
DENIS, Léon – Depois
da Morte – 19ª ed.,
FEB – Rio de Janeiro/DF
- Parte Quinta – O
Caminho Reto, XLIII – “O
Dever”.