Faz mais de cinquenta
anos que integro o
quadro de trabalhadores
da Legião Espírita, na
cidade de Porto Alegre,
no extremo sul do
Brasil. Esta sociedade é
integrante da Federação
Espírita do Estado do
Rio Grande do Sul, que
por sua vez é filiada à
Federação Espírita
Brasileira. No decorrer
de todo esse tempo, ao
estudar a doutrina e
exercer as mais variadas
funções nesta casa, de
recepcionista a
presidente, foi se
solidificando em mim a
forte convicção de que o
Espiritismo é amor ao
próximo, Ciência,
Filosofia e... também
Religião, por que não? E
quero aproveitar esta
crônica para difundir
minha opinião sobre o
tema, que é idêntica à
da Legião Espírita, pois
muitos antagonistas dos
nossos ideais e até
mesmo algumas correntes
que se intitulam
espíritas insistem na
afirmação de que o
Espiritismo não é
Religião.
Baseiam-se no fato de
não termos liturgia,
dogmas ou um corpo
sacerdotal organizado.
Convenhamos, isso é algo
que nunca nos fez falta.
Alegam também que Allan
Kardec não considerou o
Espiritismo uma
Religião. Sob esse
enfoque, basta lembrar
que na época do
Codificador a ideia de
religiosidade estava
ligada à intolerância, à
dominação e ao
proselitismo. Havia
também uma orgulhosa
casta sacerdotal, com
todo seu cortejo de
hierarquias e
cerimônias, onde se
pregava o temor a Deus,
deixando em segundo
plano a sua infinita
bondade. Os líderes
religiosos de então
estavam ligados ao poder
político e tinham por
hábito rituais de muita
pompa. Ora, a doutrina
que Kardec codificou não
tem nada disso. Prima
pela simplicidade, é
desprovida de interesses
mundanos e nela cada um
tem que ser o seu
próprio sacerdote, sem
privilégios. Entretanto,
apesar destes
contrastes, mesmo
cercado de tantas ideias
distorcidas sobre
Religião, na conclusão
de O Livro dos
Espíritos, o Codificador
já vislumbrava que o
“primeiro e mais geral
efeito do Espiritismo
consiste em desenvolver
o sentimento religioso
até naquele que, sem ser
materialista, olha com
absoluta indiferença
para as questões
espirituais”.
E como Kardec sempre
asseverou que esta é uma
doutrina evolucionista,
convém admitirmos que –
se antes não era – o
Espiritismo evoluiu até
tornar-se uma Religião
nos dias de hoje, pelo
menos, nos termos em que
é praticado no Brasil e
em Portugal... É
Religião no legítimo
sentido etimológico
desta palavra, ao
religar a criatura ao
seu Criador, através do
Evangelho redivivo de
Jesus, nossa prática
diária. Quanto à sua
parte científica, o
Espiritismo trata da
origem, da natureza e do
destino dos Espíritos,
além das relações entre
o mundo corporal e
espiritual. Como
Filosofia mostra que
somos os autores do
nosso próprio destino,
que o nosso hoje é
consequência do nosso
ontem, assim como neste
momento estamos a
construir o nosso
amanhã.
Emmanuel, o saudoso
mentor de Chico Xavier,
estava com a razão
quando asseverou que:
“no aspecto religioso
repousa a grandeza
divina do Espiritismo,
por constituir a
restauração do Evangelho
de Jesus Cristo”. E a
inspirada Joanna de
Ângelis, pela
psicografia de Divaldo
Franco, afirma: “à
Religião cumpre a tarefa
relevante de invitar o
homem aos deveres mais
elevados, que são os
espirituais, armando-o
com recursos hábeis e
preciosos para
lográ-lo”. Não é
exatamente isso que o
Espiritismo faz com
todos nós? Assim, da
próxima vez que um
pesquisador bater em
nossa porta e perguntar
que Religião praticamos,
respondamos alto e bom
som, com entusiasmo e
alegria: Espiritismo.
Caso contrário, ele pode
assinalar que somos
ateus...
Pedro Fagundes Azevedo,
ex-presidente da Legião
Espírita de Porto
Alegre, é jornalista.