WILSON GARCIA
wilson@visaointernet.com
Recife, PE (Brasil)
|
|
Dá-me algo para
ver. E também
para tocar
A
experiência
fundamenta o
saber, mas o
tempo que se
perde na prisão
dos sentidos
retarda seus
efeitos
benéficos
A história de
Tomé - e sua
incredulidade -
simboliza ainda
hoje a do ser
humano sequioso
da segurança
psicológica,
aquele que age
como quem tem a
posse da
percepção pelo
olhar e o tato,
pelos quais pode
conhecer e
decidir sobre
sua relação com
o mundo. Quer
não apenas ver
com os olhos,
mas também com
os dedos, as
mãos e mais
aonde o sentido
tátil alcança,
sem viver a
experiência
direta no mais
das vezes, mas
encontrar
prontas imagens
e coisas e
servir-se destas
oferendas de
outrem, em quem
depositam total
confiança.
Não se pode
negar que há um
princípio de
razão e ciência
no ser que não
se conforma com
a informação, a
lógica e a
crença
compartilhada
por outrem.
Porém, se este
princípio aí
está, está na
sua forma
latente no mais
das vezes, pois
o que move o ser
que deseja crer
apenas depois do
ver e tatear,
quando dominado
pela busca do
consolo que
estabilize,
mesmo que
aparentemente ou
provisoriamente,
o seu equilíbrio
psicológico, é
muito mais
dar-se uma
resposta que
assegure as
decisões a tomar
do que
propriamente o
agir racional,
científico.
A doutrina
espírita, na
forma como
Kardec a
apresenta,
oferece ao olhar
um mundo de
imagens para ver
e a matéria em
toda a sua
extensão para
tocar. O corpo é
e está em
contato com a
matéria e os
sentidos visuais
permitem a
percepção
daquilo que
ocorre ou é
oferecido à
retina. Essa
doutrina, porém,
formaliza uma
ação racional
para embasamento
do que se vê e
se toca, com
suas explicações
sobre as causas
e os efeitos, as
origens e as
finalidades, as
estruturas
fundamentais da
matéria e do
espírito, como a
dizer que os
sentidos
presentes no
corpo precisam
do
direcionamento
da razão e do
agir científico,
desde as coisas
mais simples até
as complexas.
Mas a doutrina
nem sempre é
disponibilizada
em seu quadro
geral, com suas
partes
integradas. As
lideranças
espíritas, o
mais das vezes,
têm feito opção
pelas partes da
totalidade que
mais lhes tocam,
com escolhas que
recaem
preponderantemente
sobre aquilo que
responde aos
sentidos
imediatos, aí
centralizando as
atenções na
duração que
domina o tempo e
não dá, também,
no mais das
vezes,
oportunidade
para
complementar o
agir consolador
com os
fundamentos
racionais da
vida. Oferecem
nossas
lideranças as
imagens para o
olhar e a
matéria para o
toque,
valorizando um
crer com pouca
ciência, ou com
a oferta de
razões
repetitivas a
partir de um
discurso
autoritário,
centrado num
compartimento
específico onde
se alojam causas
e razões
parciais, que
passam a
dominantes, como
se a totalidade
ali se
encontrasse.
O discurso
autoritário
substitui o
discurso
libertário;
aquele porque se
mostra de mais
fácil aplicação,
pois dispensa
razões extensas,
que demandam a
posse de
conhecimentos
amplos da
doutrina; já o
discurso
libertador, que
integra a razão
espírita e se
apoia na
experiência que
o ser humano
pode escolher –
e escolhe,
quando livre –,
como forma única
de progredir,
este discurso é
negado nas
práxis do
cotidiano, seja
por preguiça,
seja por opção
enganosa das
lideranças.
O sentido
consolador, na
sua face mais
imediatista,
assume o
controle dos
discursos e das
oferendas feitas
ao olhar e ao
toque, de modo
tal que as
mudanças, que só
podem ocorrer de
fato quando a
compreensão
abastece a
consciência,
ficam premidas
pela percepção
das respostas
mágicas, das
soluções
aparentes, dos
sentimentos
superficiais, a
embalar mitos,
fantasias e
desejos
irrealizáveis.
Passa-se do
convite ao saber
que liberta,
assim oferecido
pela doutrina,
ao crer que
mantém a
ignorância, mas
consola os
corações em
descompasso com
promessas de
futuro embebidas
no pano da
ingenuidade.
Jesus, o homem,
que o
Espiritismo
recolocou acima
dos milagres e
em consonância
com a natureza,
é de novo
elevado ao monte
das oliveiras
dos sonhos e ali
volta a ser
adorado, na
medida exata da
exaltação pelo
nome, como se o
crer por
acreditar fosse
suficiente para
conduzir o ser a
atingir suas
metas
evolutivas.
Novos andores
foram concebidos
para colocar
sobre eles os
santos que a
massa passou a
admirar e a
incluir nos seus
rosários sem
contas,
alimentando-se,
pois, de suas
capacidades de
garantir o
futuro. São os
Bezerras, Chicos
e outros tantos,
que tomam o
tempo e o espaço
no SOS dos
perigos que a
vida teima em
apresentar.
Os olhos, sem o
embasamento do
saber, são
incapazes de
superar a ilusão
intrínseca das
imagens naturais
ou culturais.
Não à toa Kardec
chama a atenção
para os perigos
da vidência
enquanto
fenômeno
mediúnico,
alertado por
seus sentidos de
que o imaginário
é pródigo em
produzir efeitos
aparentes e
confundi-los com
a realidade que
foge aos
sentidos comuns.
A solução para a
interpretação
das imagens está
na palavra e a
palavra é o
verbo em suas
diversas e
diferentes
conjugações. Os
olhos podem,
assim, ser a
porta da
percepção da
natureza ou a
entrada para o
autoengano.
A seu turno, o
tato não vai
além das
propriedades
aparentes da
matéria e sua
função mais
precisa está em
complementar
aquilo de que o
saber se
apropriou. O que
foi armazenado
no cérebro é o
que vai
direcionar no
seu emprego.
Portanto, a
carência de
conhecimento
implica na
percepção
incompleta,
quando não,
também,
ilusória.
As lideranças
espíritas têm
duas opções para
o desempenho de
seus
compromissos:
fomentar o
conhecimento
racional,
resultado de uma
base teórica e
da experiência
na vida, para
sustentar o
sentimento, as
emoções e seus
efeitos, aí
incluídas as
virtudes todas,
ou estimular a
permanência do
ser que acorre
aos recintos dos
centros
espíritas na
sustentação das
ilusões,
oferecendo-lhes
apenas o consolo
que dura somente
o curto tempo
que intermedeia
o centro
espírita e sua
residência,
onde, de volta à
realidade do
mundo da vida,
ninguém consegue
fugir das
escolhas e das
decisões a serem
tomadas.
No primeiro
caso, trata-se
de optar pelo
discurso da
liberdade, base
do verdadeiro
amor, e no
segundo, pelo
discurso de
autoridade, base
da dominação.