A exaltação da
cortesia
Neio Lúcio
À frente da multidão de sofredores e
desalentados, relacionou o Mestre as
Bem-Aventuranças, destacando, com ênfase, a
declaração de que os mansos herdariam a
Terra.
A afirmativa, porém, soou entre os
discípulos de maneira menos agradável.
Tal asserção não seria encorajamento à
ociosidade mental?
Se o Evangelho reclamava espíritos valorosos
na sementeira das verdades renovadoras, como
acomodar a promessa com a necessidade do
destemor?
Se o mal era atrevido e contundente, em
todos os climas e posições, como estabelecer
o triunfo inadiável do bem através da
incapacidade de reagir, embora
pacificamente?
Nessas interrogações imprecisas, reuniu-se a
assembleia familiar no domicilio de Pedro.
Iniciados os comentários edificantes da
noite, entreolhavam-se os discípulos entre a
indagação e a curiosidade.
O Divino Amigo parecia perceber os motivos
da expectação, em torno, mas esperava,
sereno, que os seguidores se pronunciassem.
Foi então que Judas, rompendo o véu de
respeito que aureolava a presença do Mestre,
inquiriu, loquaz:
- Senhor, por que atribuíste aos mansos a
posse final da Terra? Os corações
acovardados gozarão de semelhante bênção? Os
incapazes de testemunhar a fé, nos momentos
graves de luta e sacrifício, serão
igualmente bem-aventurados?
Jesus não respondeu, de imediato.
Vagueou o olhar, através dos circunstantes,
como a pedir-lhes a exposição de quaisquer
dúvidas que lhes povoassem a alma.
Pedro cobrou ânimo e perguntou:
- Sim, Mestre: se um malfeitor visitar-me a
casa, não devo recordar-lhe os imperativos
do acatamento recíproco? entregar-me-ei sem
qualquer admoestação fraternal aos seus
delituosos caprichos, a pretexto de guardar
a mansidão a que te referiste?
O Cristo sorriu, como tantas vezes, e
enunciou, calmo:
- Enganaram-se todos, naturalmente. Eu não
fiz o elogio da preguiça, que se mascara de
humildade, nem da covardia que se veste de
cordura para melhor acomodar-se às
conveniências humanas.
As criaturas que se afeiçoam a semelhantes
artifícios sofrerão duramente os
instrumentos espirituais de que o mundo se
utiliza para reajustar os caracteres
tortuosos e indecisos. Exaltei, na
realidade, a cortesia de que somos credores
uns dos outros.
Bem-aventurados os homens de trato ameno que
sabem usar a energia construtiva entre o
gesto de bondade e o verbo da compreensão!
Bem-aventurados os filhos do equilíbrio e da
gentileza que aprendem a negar o mal, sem
ferir o irmão ignorante que o solicita sem
saber o que pede!
Abençoados os que repetem mil vezes a mesma
lição, sem alarde, para que o próximo lhes
aproveite a influenciação na felicidade
justa de todos!
Bem-aventurados aqueles que sabem tratar o
rico e o pobre, o sábio e o inculto, o bom e
o mau, com espírito de serviço e
entendimento, dando a cada um, de
conformidade com os seus méritos e
necessidades e deixando os sinais de
melhoria, de elevação, bem-estar e
contentamento por onde cruzam!
Em verdade vos digo que a eles pertencerá o
domínio espiritual da Terra, porque todo
aquele que acolhe os semelhantes, dentro das
normas do amor e do respeito, é senhor dos
corações que se aperfeiçoam no mundo!
Alívio e alegria transbordaram do ânimo
geral e, de olhos fitos, agora, nas águas
imensas do grande lago, o Senhor pediu a
Mateus encerrasse o fraterno entendimento da
noite, pronunciando uma prece.
Do livro Jesus
no Lar, obra mediúnica psicografada pelo
médium Francisco Cândido Xavier.