RENATO COSTA
rsncosta@terra.com.br
Rio de Janeiro,
RJ (Brasil)
Faz Jesus sofrer
a seus amigos?
Uma das vidas
relatadas pelo
Espírito que
ditou a Eudaldo
Pagés e Amália
Domingo Soler a
obra
Perdôo-te
é facilmente
identificada
como sendo a de
Teresa D’Avilla,
a notável
mística
espanhola do
século XVI.
Naquela
magnífica
autobiografia,
Teresa
(Espírito) conta
em detalhes como
soube, com
certeza, que
seus escritos
seriam
adulterados após
a sua morte, de
modo a ficarem
conformes a uma
visão tolerada
pela alta
hierarquia da
Igreja de
então.
A despeito da
advertência da
própria Teresa
(Espírito), no
entanto, existe
um relato de uma
passagem na vida
daquela grande
médium da
Igreja, contado
na obra Os
Santos que
Abalaram o Mundo,
de René
Fülöp-Miller,
que nos parece
muito propícia a
um estudo. Se
verdadeira na
autenticidade do
relato
histórico, ou
vítima de uma
adulteração
cuidadosa e
sábia feita
posteriormente,
o fato é que o
dito relato algo
importante nos
tem a ensinar.
Conta
Fülöp-Milller
que, já estando
no final da
vida, com o
corpo cansado
pelas muitas
provações que
sofrera, a
destemida amiga
de Jesus havia
partido com uma
caravana para
fundar um novo
convento em
Burgos. As
estradas estavam
inundadas pelas
chuvas e era
necessário
atravessar o Rio
Arlazón antes de
se chegar ao
destino. Tendo
sido destruída a
ponte pela força
das águas,
segundo relata o
autor, Teresa
atirou-se
bravamente à
travessia,
conclamando suas
companheiras com
alegria e
determinação: “Venha
o que vier. Se
desmaiardes no
caminho, se
morrerdes na
estrada, se o
mundo for
destruído, tudo
isto está bem,
se atingirdes o
vosso alvo”.
Desse modo,
conclamando
todas a
segui-la,
avançou
corajosamente
pela água
gelada. Foi,
então, que uma
onda a fez
escorregar para
a parte mais
funda do rio.
Sem se mostrar
aterrorizada,
Teresa
dirigiu-se, como
costumeiro, ao
amado Mestre
pedindo ajuda.
Vamos, pois, ao
diálogo.
– Oh! Senhor,
por que puseste
tais
dificuldades em
nosso caminho?
Aparecendo sobre
as águas, na
visão espiritual
da médium
Teresa, Jesus
respondeu:
– É assim que
trato meus
amigos.
Ao que Teresa,
que segundo
Fülöp-Miller
jamais perdia a
oportunidade de
uma resposta,
retrucou:
– Ah! Meu
Senhor, é por
isso que tendes
tão poucos.
Ora, será
verdade que
Jesus permite
aos seus amigos
os maiores
sofrimentos? Sem
maiores
análises, à
primeira vista,
as palavras de
Jesus, escutadas
por Teresa,
parecem sugerir
um Jesus sádico
que aprecia ver
seus amigos
sofrerem para
testar sua
amizade. Como,
no entanto,
sentimentos
negativos
inexistem no
psiquismo de um
Espírito do
adiantamento de
Jesus, deve
haver outra
explicação.
Consultando a
Codificação,
vamos encontrar
parte da
explicação que
desejamos no
item 9, Capítulo
V, de O
Evangelho
segundo o
Espiritismo,
sob o título
de
“Bem-aventurados
os aflitos”:
“Não há crer, no
entanto, que
todo sofrimento
suportado neste
mundo denote a
existência de
uma determinada
falta. Muitas
vezes são
simples provas
buscadas pelo
Espírito para
concluir a sua
depuração e
ativar o seu
progresso.
“Assim, a
expiação serve
sempre de prova,
mas nem sempre a
prova é uma
expiação. Provas
e expiações,
todavia, são
sempre sinais de
relativa
inferioridade,
porquanto o que
é perfeito não
precisa ser
provado. Pode,
pois, um
Espírito haver
chegado a certo
grau de elevação
e, nada
obstante,
desejoso de
adiantar-se
mais, solicitar
uma missão, uma
tarefa a
executar, pela
qual tanto mais
recompensado
será, se sair
vitorioso,
quanto mais rude
haja sido a
luta. Tais são,
especialmente,
essas pessoas de
instintos
naturalmente
bons, de alma
elevada, de
nobres
sentimentos
inatos, que
parece nada de
mau haverem
trazido de suas
precedentes
existências e
que sofrem, com
resignação toda
cristã, as
maiores dores,
somente pedindo
a Deus que as
possam suportar
sem murmurar.
Pode-se, ao
contrário,
considerar como
expiações as
aflições que
provocam queixas
e impelem o
homem à revolta
contra Deus.
“Sem dúvida, o
sofrimento que
não provoca
queixumes pode
ser uma
expiação; mas é
indício de que
foi buscada
voluntariamente,
antes que
imposta, e
constitui prova
de forte
resolução, o que
é sinal de
progresso”.
Com o
esclarecimento
que obtivemos do
ESE, as coisas
começam a
clarear. O
sofrimento por
que passou
Teresa ao longo
de toda a sua
vida tinha um
propósito
educativo e não
lhe havia sido
imposto, mas
aceito por ela
na
espiritualidade
com o intuito de
enrijecer sua
força de vontade
direcionada para
o bem.
Resta-nos,
ainda, analisar
a segunda parte
do relato, isto
é, a afirmação
de Jesus de que
era assim que
tratava os seus
amigos. E, mais,
a terceira
parte, o
comentário final
de Teresa, ao
dizer que por
isso os teria
Jesus em tão
pequena
quantidade.
O que é ser
amigo de Jesus?
Observemos bem
que não estamos
falando de ser
Jesus nosso
amigo e sim de
ser um de nós
amigo de Jesus.
Após algumas
pesquisas na Web,
procurando por
“amigo de
Jesus”,
encontramos
inúmeras
páginas, de
diversas
religiões e
crenças,
discorrendo
sobre Jesus
amigo, nosso
amigo Jesus,
Jesus te ama,
Jesus meu
amigo... Nenhuma
página, no
entanto, falava
de “amigo de
Jesus”.
Ora, o fato de
que Jesus é
nosso amigo,
seus
ensinamentos,
seu exemplo de
vida, a
dedicação e o
amor que o
Mestre tem-nos
dedicado há
milhões de anos
são testemunho
mais do que
eloqüente. E
nós? Somos
amigos de
Jesus?
Em uma passagem
do Evangelho de
Mateus a que as
Bíblias
católicas dão o
título de “O
Juízo Final”,
mas que, sob a
ótica espírita,
se aplica
perfeitamente à
definição que
estudamos,
podemos ler como
Jesus define os
seus amigos:
"Vinde benditos
de meu Pai,
tomai posse do
Reino que vos
está preparado
desde a criação
do mundo, porque
tive fome e me
destes de comer;
tive sede e me
destes de beber;
era peregrino e
me acolhestes;
nu e me
vestistes;
enfermo e me
visitastes;
estava na prisão
e viestes a mim.
Perguntar-lhe-ão
os justos:
Senhor, quando
foi que te vimos
com fome e te
demos de comer,
com sede e te
demos de beber?
Quando foi que
te vimos
peregrino e te
acolhemos, nu e
te vestimos?
Quando foi que
te vimos enfermo
ou na prisão e
te fomos
visitar? Em
verdade vos
declaro: todas
as vezes que
fizestes isso a
um destes meus
irmãos mais
pequeninos, foi
a mim mesmo que
o fizestes"
(Mateus, 25 de
35 a 40).
Ora, se Jesus
chamou àqueles
que ajudam os
necessitados de
toda espécie,
onde quer que se
encontrem, de
“benditos de meu
Pai”, que
“tomarão o
Reino” que para
eles está
preparado; se
Jesus nos
ensinou que o
segundo
mandamento é
“Amar ao próximo
como a si mesmo”
e que, junto com
o primeiro,
“Amar a Deus
sobre todas as
coisas” resume
toda a Lei e os
Profetas, fica
claro, a nosso
ver, que quem
segue tais
diretrizes
merece ser
chamado de
“amigo de
Jesus”.
Como
concluiremos, se
analisarmos o
comportamento
nosso e o das
pessoas à nossa
volta, assim
como o da
humanidade ao
largo, são
poucos, muito
poucos os que
podem ser
chamados de
amigos de Jesus,
pois, para que
um de nós assim
possa ser
chamado, é
necessário nos
comprometermos
na
espiritualidade
a vencer todos
os obstáculos
que surjam à
nossa frente na
prática no bem
e, o que é muito
mais difícil,
sermos fiéis ao
compromisso
assumido. Então,
como poderemos
adquirir fibra
para enfrentar
todos os
obstáculos por
maiores que
sejam, de modo a
nos tornarmos
amigos de Jesus
como o próprio
Jesus os define?
Aceitando vir em
várias, muitas
vidas de
provação, de
modo a provarmos
a Jesus e,
sobretudo, a nós
mesmos, que
jamais
esmoreceremos em
nosso nobre
objetivo.
Entendemos,
assim, a fala de
Jesus para
Teresa, bem como
a sua sábia
resposta.
Bibliografia:
FÜLÖP-MILLER,
René.
Os Santos que
Abalaram o Mundo.
14.ed. Rio de
Janeiro: José
Olympio, 1999.
KARDEC, Allan.
O Evangelho
segundo o
Espiritismo.
112.ed. Rio de
Janeiro: FEB,
1996.
PAGÉS, Eudaldo e
SOLER, Amália
Domingo.
Perdôo-te.
7.ed. Brasília:
LGE, 2002.
Bíblia Sagrada.
Versão dos
Monges de
Mardesous. São
Paulo:
Ave-maria, 1997.