CHRISTINA NUNES
cfqsda@yahoo.com.br
Rio de Janeiro,
RJ (Brasil)
O Ilusionista
– mensagens
subliminares
O Ilusionista
é um dos mais
belos filmes,
rico de
significados nem
sempre
perceptíveis na
primeira vez em
que é assistido,
e menos ainda
por todos que o
assistem. De
fato, há os que
o assistirão
várias vezes
fazendo da
história apenas
a mesma leitura.
Mas muitos
outros irão mais
longe –
naturalmente, os
que detêm uma
percepção mais
espiritualizada
– e espírita –
da vida.
Edward Eisenheim,
o protagonista,
é, à primeira
vista, um
mágico; um
ilusionista, no
significado mais
estrito da
palavra, que
aprendera o seu
ofício ainda
menino de um
homem misterioso
que – e aí se
insinua o
primeiro
mistério da
história –
também realizava
coisas
extraordinárias,
como desaparecer
ele mesmo,
carregando junto
uma árvore dos
campos onde
acontecera o seu
primeiro
encontro.
Quando menino,
as artes do
aprendiz
Eisenheim atraem
justo a atenção
de uma jovem
duquesa, criança
pertencente às
camadas sociais
nobres daquele
país europeu;
logo se encantam
um do outro
e, nada obstante
as proibições
imediatas de se
encontrarem,
alegando-se as
condições
sociais díspares
entre ambos, o
que fazem é
exatamente o
contrário.
Claro, a
duquesa, embora
menina, não era
uma mentalidade
comum, menos
ainda
contaminada com
os preconceitos
do seu tempo. A
autenticidade e
pureza d'alma
são as tônicas
de sua
personalidade,
reveladas desde
o princípio.
No resto da
história, em
sendo ambos
final e
definitivamente
separados, o
jovem Edward
segue para uma
vida sem
paradeiro, onde
desaparece com
destino
incógnito para
muito mais
tarde, já
adulto,
ressurgir
realizando, não
apenas mágicas e
truques de
ilusionismo
comuns, mas
maravilhas, que
acabam por
estarrecer
platéias até aos
níveis mais
seletos da
sociedade, atraindo
a atenção do
próprio príncipe
herdeiro,
Leopold, àquela
altura da
história noivo
justamente... da
sua antiga amiga
de infância,
Sophie!
Só que o
príncipe
herdeiro, homem
de caráter
duvidoso,
despótico, e de
perfil
doentiamente
racional,
termina por
descobrir o
antigo elo de
Eisenheim com
Sophie, pois que
logo se
reconhecem e
retomam a sua
história
anteriormente
interrompida à
revelia. E,
principiando uma
perseguição
velada ao
ilusionista, em
ocasiões em que
se empenha
obcecadamente em
resolver a
contento os
segredos dos
seus supostos
truques, Leopold
acaba, antes,
com o apoio de
seu inspetor
chefe de
polícia,
transtornado por
deflagrar
denúncia de
fraude contra
Edward, a
desforrar-se do
seu envolvimento
secreto com sua
noiva!
Se abordasse as
artes comuns,
por mais
bizarras, dos
mágicos
tradicionais,
O
Ilusionista
seria apenas
mais um filme,
nada obstante
ainda e sempre
encantador.
Todavia, o que é
exibido instiga
o telespectador
na direção da
existência do
sobrenatural, na
conotação mais
adequada a esta
obsoleta
designação para
fenômenos que
apenas e ainda
hoje escapam ao
escopo analítico
da nossa
limitada
ciência. Nos
próprios
discursos de
Eisenheim às
platéias
hipnotizadas,
ele menciona as
"leis naturais
desconhecidas, a
morte, a ilusão
do tempo..."
Tudo, conceitos
com os quais são
intimamente
familiarizados
os paranormais,
sensitivos,
médiuns, e
estudiosos
profundos do
espiritualismo e
dos fenômenos
extra-sensoriais,
na sua melhor
forma.
Porque, na
verdade, as
artes de Edward
Eisenheim
afrontam as
mentalidades de
seu tempo
(circunscrito à
Viena do século
XX). Quando se
entrega aos
gran finales
de seus
espetáculos,
exibindo
Espíritos
materializados
que interagem
com o público
respondendo às
suas perguntas –
embora nunca
mencionando quem
e o que são! – e
ademais sendo
tais Espíritos
testados pelos
presentes na
platéia que,
em tentando
tocá-los,
encontram nada
mais do que uma
transparência
vaporosa, sua
situação
periclita frente
ao transtornado
Leopold, já
empenhado com
tenacidade na
sua perdição.
Eisenheim não
poderia admitir
seus dons, sua
intermediação
mediúnica em
público. As
sociedades
espiritualistas
eram malvistas
pelo status
quo e pelas
mentes
arraigadamente
cartesianas de
seu tempo. Se o
fizesse,
ofereceria a
Leopold as
ferramentas que
desesperadamente
buscava para
aprisioná-lo por
fraude. Então, o
que faz é justo
o contrário, num
desses momentos
críticos – homem
sagaz que era:
afirma em alto e
bom som perante
o público em
perigoso acesso
de fanatismo que
era preciso
desenganá-los;
que suas
apresentações,
todas, não mais
eram que
truques. Que, de
fato, não era
capaz de atrair
da morte os seus
entes
queridos...
Só que, para
desconcerto
tanto de Leopold,
a vigiá-lo
encarniçadamente,
quanto da
polícia, em duas
de suas
apresentações
finais atrai
para o palco,
diante do
espanto de
dezenas de
presentes,
justamente a
presença
espiritual de
Sophie – a quem
Leopold
supostamente
havia matado num
acesso de fúria
ciumenta (*),
embora tudo
estivesse
orquestrado pela
jovem, coadunada
com o
Ilusionista num
fantástico plano
de fuga final de
ambos para a sua
liberdade,
unidos. É esta a
gota final,
tanto para
Leopold quanto
para a polícia,
que, naquele
ápice, tenta
prendê-lo, em
plena
apresentação...
Não conto o
desfecho
entusiástico
desta cena, em
respeito aos que
ainda não viram
o filme e se
interessem em
assisti-lo.
Antecipo apenas
que a polícia
acaba
desvendando,
devido a uma
série de
circunstâncias
entrelaçadas à
trama principal,
as tentativas
criminosas do
príncipe
interessado em
usar Sophie
apenas como
instrumento para
arrebatar a
coroa do pai;
bem como também
compreendendo
não somente a
inocência de
Eisenheim, mas
também o ardil
da falsa morte
da duquesa...
O que se
compreende com
clareza nesta
bela história,
num nível
subliminar, é o
franco dilema
que enfrentava
naquelas épocas
um homem dotado
não apenas das
habilidades para
prestidigitador,
mas também dos
dons avançados
do sensitivo, ou
médium dos
tempos atuais. A
acuidade mental
de que se fazia
portador, para
driblar
investidas do
poder
estabelecido que
não podia
tolerar o manejo
de leis naturais
ainda
desconhecidas da
ciência tida
como oficial, e
ainda por um
homem das
classes mais
desfavorecidas
da população,
afrontando o
poder
estabelecido e
respeitado pelas
massas. Pois, se
se admitisse o
que toda gente
presenciava
naqueles palcos,
que espécie de
ciência era a
consagrada e
tida como douta,
na última
palavra sobre
questões graves
a respeito de
vida e de morte,
da existência,
ou da ilusão
imposta pela
contagem do
tempo, e
derivações
infindas a
partir daí?!
Mais: como lidar
com bom senso
com a verdade de
que tais dons
extemporâneos
vinham favorecer
um representante
humilde das
camadas sociais
mais baixas, e
não um nobre?! E
como admitir que
uma duquesa
prometida ao
príncipe
herdeiro da
coroa o
preterisse, e de
resto
prejudicando
seus interesses
políticos, em
favor do homem
representante
dessas classes
desprezadas, que
lhe fora amigo
de infância, a
par de primeiro
amor de
juventude?!
Sem dúvidas, a
duquesa Sophie
não nos surge
como uma mulher
comum,
representante
autêntica da
mentalidade e
das castas
daqueles tempos.
Jovem,
interessou-se
com inteireza
d'alma pelo
rapaz modesto,
mas sobre o qual
a sua
sensibilidade
pura,
cristalina,
livre de
máculas, lhe
segredou um
indivíduo
especial, dotado
de dons e de
valores que a
encantaram e,
com sinceridade,
encontraram em
seu íntimo
ressonância
perfeita.
Sophie pode ser
identificada
como a alma
gêmea de Edward
– aquele
encontro que
mais cedo ou
mais tarde se
verifica entre
duas almas em
ressonância
perfeita de
visão de vida e
de padrão
vibratório
evolutivo. E que
não encontram
obstáculos para
realizar sua
união, acima dos
ataques e
posicionamentos
em contrário de
terceiros,
devido à sua
compreensão
tácita de que a
união prescinde
de distâncias.
De fato, isto se
evidencia, na
trama, no
camafeu
confeccionado
por Edward, com
o qual a
presenteia no
início da
história, e que
jamais ela
retira do cordão
delicado que
traz ao pescoço,
denunciando os
sentimentos pelo
amigo de
infância que
nunca deixaram
de habitar seu
íntimo,
unindo-os, desta
forma
inexpugnável,
até ao instante
em que se
reencontram.
O Ilusionista
é, portanto,
tocante
história, onde o
amor e a
espiritualidade
retratada nos
primórdios da
arrancada dos
fenômenos de
ordem mediúnica
no último século
encontram palco
fascinante para
exibir ao
telespectador,
de forma
exuberante, os
lances de uma
realidade que
ainda hoje
encontra
ressonância no
dia-a-dia de
muitos. Não
talvez no de
mágicos ou
prestidigitadores
– nada embora
muitas polêmicas
girem em torno
de uns tantos,
cujas
realizações
permanecem
envoltas em
encantamento e
em mistério –,
mas no cotidiano
de seres humanos
comuns que, em
qualquer época e
em qualquer
região do mundo,
se vêem assim
aquinhoados com
a manifestação
espontânea
destas
faculdades
reveladoras da
existência das
dimensões
ignoradas, muito
mais ricas e
mais vastas da
vida, tendo que,
em decorrência,
enfrentar a ira,
o orgulho e o
despeito dos
inquisidores
cegos existentes
em todas as
épocas onde se
viram obrigados
a defrontar a
grande ameaça
representada
pela
simplicidade
soberana destas
almas de
vanguarda.
(*) Ocorria, aí,
em se tratando
de alguém ainda
em vida no corpo
físico, o
fenômeno que o
Espiritismo nos
explica como a
bicorporeidade,
manifestação
espiritual
simultânea de
uma mesma pessoa
em dois lugares
ao mesmo tempo.