DAVILSON SILVA
davsilva.sp@gmail.com
São Paulo, SP (Brasil)
Reconhecer, assumir e
seguir direito
Benício era um
filantropo e tanto,
exímio tribuno espírita.
Sensível à pobreza, à
velhice e infância
desamparadas, propunha
chás beneficentes,
campanhas do agasalho,
da fome, etc. Só lhe
faltava algo:
assistir a si mesmo.
Benício não conseguia
tolerar seus confrades,
alguns dos quais adeptos
de um certo conceito
relativo ao “corpo de
Jesus Cristo”. Ademais,
o propagandista das
verdades eternas
preferia que o chamassem
de “doutor Benício” por
causa da sua posição
social.
O fidelíssimo purista
doutrinário era
aplaudido por multidões
em toda a parte, um poço
de cultura! Sua memória,
extraordinariamente
prodigiosa, remetia-o a
datas, detalhes e
circunstâncias
históricos; citava
frases, parágrafos e até
textos inteiros de
cabeça. Muitas lágrimas
fez rolar ao descrever
fatos de lindas
passagens da vida de
Jesus Cristo e da vida
daqueles que O seguiram:
engrandecia a “corajosa
mudança de Maria de
Magdala”, “antes, serva
de Gênios rudes e
viciosos”, segundo ele;
a “piedade de Simão
Pedro” era enaltecida,
“apesar de vítima da sua
própria covarde
negligência”, conforme
palavras suas; louvores
a Paulo de Tarso eram
indispensáveis, “muito
embora tenha sido
fanático e cruel”, em
seu parecer; quanto a
Judas, considerava-o “um
desafortunado
irresponsável” afora
outros conceitos acerca
de outros personagens
relacionados a Jesus.
Algum tempo depois, Dr.
Benício veio do Além
para caridosa reunião
socorrista após o seu
dramático desenlace
sentido por todos. Lá
estava ele, invisível, à
espera do auxílio
fraterno na exígua sala
reservada, estritamente
para esse fim, de um
modesto centro espírita.
Em circunstância
aflitiva e a debulhar-se
em pranto, acabara de
ser trazido por certo
Benfeitor Espiritual
para que o ajudassem a
sair do estado “tão
vexatório quanto
tormentoso”, segundo ele
mesmo disse.
Dr. Benício usava,
naquele instante, é
claro, da faculdade
psicofônica de um
médium. Um tanto
abatido, o tom de sua
fala perdera a maciez e
a peculiar eloqüência
quando dos discursos da
tribuna para as grandes
multidões:
—
Irmã! Vejo-me como se
estivesse em
complicadíssimo
labirinto... Sinto-me
rebaixado, humilhado por
não lhe descobrir a
saída, ainda tendo de
suportar risos irônicos
seguidos de contínuas
chufas e zombarias que
me apoquentam o juízo...
Diga-me o que faltou em
mim! Eu que tanto
apontara a saída para as
dúvidas e angústias
humanas; eu que, fiel a
Kardec e ao Mestre
Jesus, honrei o Fora
da caridade não há
salvação; eu que
denunciei, em artigos e
crônicas literárias,
romances e relatos do
Além psicografados em
detrimento da pureza
da Doutrina
Espírita!
Dona Lia, a
doutrinadora, espírita
convicta, de ilibada
conduta exemplar,
sentada ao lado do
medianeiro através do
qual a desditosa
Entidade expressava-se,
respondeu:
—
Tal como os famosos
remidos do Evangelho o
irmão
despertou... Sim!
Como aqueles cujos
esforços heróicos o
irmão costumava lhes
exaltar em admiráveis
inferências... “Só que,
como Judas”, me diz o
Amigo Espiritual que o
trouxe até nós,
“infelizmente, o
irmão acordou tarde
demais”... “Apesar de
suas elucidativas
palestras, do amparo aos
mais necessitados”,
lamenta o Amigo José
Grosso,*
“você não
assimilou muito bem este
princípio:
Reconhece-se o
verdadeiro espírita pela
sua transformação moral
e pelos esforços que faz
para domar as suas más
inclinações”...**
Ninguém padece
injustamente aqui ou no
Além... A parte mais
fácil das Cinco Obras
Básicas é o conhecimento
e o reconhecimento da
grandeza moral e do
saber nelas encerrados.
Há diferença entre
filantropia e caridade,
embora sejam palavras
sinônimas. Ao apontarmos
erros doutrinários, em
respeito à pureza
doutrinária, por
sinal “um dever que
manda a caridade”,
segundo o Espírito São
Luís,***
ainda assim,
devemos fazê-lo com
moderação, tendo cuidado
de não provocar
antagonismos, fugindo a
um comportamento
inflexível, apaixonado,
capaz de desacreditar
pessoas.
Ficou bem claro, e
estamos certos de que
Jesus representa para
nós o maior modelo a ser
seguido; contudo, é
imprescindível a nossa
sincera mudança
interior, enquanto aqui
estivermos. Mudemos!
Melhor assim que
extraviarmos mais esta
existência, consoante
nos alertam os
“Espíritos do Senhor”,
os executores da Sua
vontade que, em Seu
nome, “vieram
restabelecer todas as
coisas no seu verdadeiro
sentido, dissipar as
trevas, confundir os
orgulhosos e glorificar
os justos”.
Notas:
*
O Espírito José Grosso é
uma bondosa Entidade
ligada à “cura
espiritual”, que também
muito faz pela
regeneração de Espíritos
sofredores, em nome da
caridade e amor ao
próximo por amor a Deus.
Ele tem se comunicado
por meio de alguns
médiuns brasileiros,
desde 1949,
especialmente pela
notável mediunidade de
efeitos físicos de
Francisco Peixoto Lins,
Peixotinho (1905/1966).
Leia Dossiê
Peixotinho, de
Lamartine Palhano Jr. e
Wallace Fernando Neves,
e Materializações
Luminosas, de R. A.
Ranieri, para saber a
respeito de Peixotinho e
sobre o referido Mentor
que, até os dias de
hoje, atua em nossa
instituição espírita,
dando-nos caridoso apoio
nas reuniões de efeitos
físicos para tratamentos
à distância.
**
KARDEC, Allan. O
Evangelho segundo o
Espiritismo, 62. ed.
São Paulo, Lake
— Livraria Allan
Kardec Editora, 2001,
capítulo 17, item 4, p.
224.
***
IDEM, Ibidem, cap. 10°,
item 19 ao 21, p. 143.
O autor é
jornalista,
presidente-fundador da
Fraternidade Espírita
Aurora da Paz (Feap)
(www.feap.udesp.org.br),
e membro da União dos
Delegados de Polícia
Espíritas do Estado de
São Paulo
(www.udesp.org.br).
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