EUGÊNIA PICKINA
eugeniamva@yahoo.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil)
Além das amarras
do medo
e da
letargia
Que distingues,
além disso, no
escuro do
passado e no
seio do tempo?
Shakespeare,
A Tempestade.
Faz parte do
nosso
conhecimento
intuitivo de
Espírito que
fomos (re)
enviados a este
mundo para nos
dedicar à
dimensão
evolutiva, isto
é, para realizar
o que Jung chama
de individuação,
um processo que
não deve ser
confundido com o
narcisismo ou os
desejos do ego
por conforto e
segurança,
porquanto
comprometido com
a vida real, que
nos garante
atingir, cedo ou
mais tarde, a
perfeição e a
felicidade.
Mas o que nos
bloqueia são
geralmente a
letargia e o
medo. Em uma de
suas narrativas
mais
importantes,
Jung afirma:
“O espírito
do mal é o medo,
a proibição, o
antagonista que
se opõe à vida
que almeja a
duração eterna
assim como toda
grande ação
isolada, que
instila no corpo
o veneno da
fraqueza e da
idade por meio
da traiçoeira
picada de
serpente; ele é
toda tendência
ao retrocesso,
que ameaça
fixar-se na
mãe*, bem como
dissolver e
extinguir o
inconsciente.
Para o indivíduo
heroico, o medo
é um desafio e
uma missão, pois
só a audácia
pode libertar do
medo. E quando o
homem não ousa,
alguma coisa se
rompe no sentido
da vida e todo o
futuro está
condenado a uma
mediocridade vã,
a um crepúsculo
iluminado só por
fogos-fátuos”.
(1)
Nenhum de nós
está a salvo de
momentos de medo
ou letargia. A
questão
significativa é
se essa atitude,
medo ou
letargia, está
muito presente
na conduta geral
de nossas vidas.
Sempre que há
uma fixação por
uma fobia, uma
aderência a
algum
preconceito, ou
uma necessidade
de controle que
trazemos para
nossas relações,
uma recusa de
tornar-se
independente se
apropria de
nossa vontade e
mina nosso
destino de seres
compromissados
com a instrução
e sua prática
correspondente.
Uma evitação da
possibilidade de
expandir a
consciência, ou
abrir o coração,
nos manterá
circunscritos em
uma forma de
infância
espiritual,
diariamente
reativada pelo
desejo de
cuidados, o que
sugere uma
dificuldade de
caminhar com os
próprios pés.
Mas, quando uma
pessoa decide
tomar o caminho
do
autoconhecimento,
a ela se unirá a
coragem, apta a
impedir a
sabotagem dos
relacionamentos
e das boas
oportunidades,
embora dentro de
si mesma
continue
existindo a
parte dependente
e preguiçosa,
sempre pronta a
embaraçar e
desvalorizar as
chances para a
individuação.
O ser humano é
muito vasto e
complexo. E é
nesse sentido
que a
perpetuação do
medo (e da
letargia),
sintoma também
da indisciplina,
tem causado
tantos danos. É
importante,
então, enfrentar
os medos e os
apegos para, de
fato, perder as
ilusões e com
isso passar a
responder à
orientação do Eu
superior (ou do
Self) que exige
aquisição de
novos valores e
de um suporte
interior,
segundo a tarefa
pessoal/coletiva,
pois inspirada
pela ideia de
futuridade e de
esperança:
“Viajantes do
espaço,
não há descanso,
antes do último
suspiro
da obra em
construção”
(Roberto Crema).
Referência:
(1) JUNG, C. G.
Símbolos da
transformação.
Petrópolis:
Vozes, 1989,
vol. 5,
parágrafo 398.
(*) A “mãe” que
Jung se refere
aqui é o
complexo materno
em sua forma
genérica, ou
seja, o desejo
de ser cuidado e
protegido e que,
mesmo
compreensível,
resulta na
recusa ou
abandono da
individuação,
isto é, no
evitar crescer.