MARCELO BORELA DE
OLIVEIRA
mbo_imortal@yahoo.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil)
Libertação
André Luiz
(Parte
20)
Damos continuidade ao
estudo da obra
Libertação,
de André Luiz,
psicografada pelo médium
Francisco Cândido Xavier
e
publicada em 1949 pela
Federação Espírita
Brasileira.
Questões preliminares
A. Em que, segundo o
Espiritismo, consiste a
morte?
R.: À mulher suicida
que, depois de informada
de sua desencarnação,
considerava a morte uma
tragédia pior que a
vida, o Instrutor Gúbio
disse, sereno: "A morte
é simples mudança de
veste, somos o que
somos. Depois do
sepulcro, não
encontramos senão o
paraíso ou o inferno
criados por nós mesmos".
(Libertação, cap.
XII, pp. 158 a 160.)
B. Quais são as armas
justas que podemos usar
no serviço de salvação?
R.: Respondendo a esta
mesma questão, Gúbio
disse a Saldanha: "Em
todos os lugares, um
grande amor pode
socorrer o amor menor,
dilatando-lhe as
fronteiras e impelindo-o
para o Alto, e, em toda
a parte, a grande fé,
vitoriosa e sublime,
pode auxiliar a fé
pequenina e vacilante,
arrebatando-a às
culminâncias da vida".
(Obra citada, cap.
XII, pp. 161 a 163.)
C. O sono do magistrado,
pai de Margarida, era
calmo ou perturbado?
R.: O sono dele não
poderia ser tão calmo
quanto desejaria, em
virtude do grande número
de entidades sofredoras
que lhe batiam às portas
internas. Enquanto
algumas rogavam socorro
em altos brados, a
maioria reclamava
justiça. (Obra
citada, cap. XIII, pp.
164 a 166.)
Texto
para leitura
82. A
morte é simples mudança
de veste
- Apesar de despertada,
a suicida não mostrava
consciência de si mesma
e não tinha a menor
ideia de que
desencarnara. Parecia
uma sonâmbula perfeita,
acordando de súbito.
Adiantando-se na direção
do esposo, exclamou,
estentórica: "Jorge,
Jorge! ainda bem que o
veneno não me matou!
Perdoa-me o gesto
impensado...
Curar-me-ei para
vingar-te! Assassinarei
o juiz que te condenou
a tão cruéis
padecimentos!" Vendo que
o esposo não reagia, ela
implorou: "Ouve!
atende-me! onde dormi
tanto tempo? Nossa
filha! onde está?"
Jorge, contudo,
prosseguiu na mesma
atitude, sem nada
perceber, e Gúbio
abeirou-se dela,
pedindo-lhe que se
aquietasse. Irene não
entendeu a sugestão do
Instrutor e pediu-lhe
que a reconduzisse a seu
lar, visto que seu
esposo não a escutava,
nem a entendia. Gúbio,
com voz triste,
acariciando-lhe a fronte
assustadiça, falou-lhe,
sem rebuços: "Filha, as
portas de tua casa no
mundo cerraram-se para
tua alma com os olhos do
corpo que perdeste. Teu
esposo jaz liberado dos
compromissos do
matrimônio carnal e tua
filha, desde muito, foi
acolhida em outro lar. É
indispensável, pois, que
te refaças, de modo a
prestar-lhes todo o
serviço que desejas".
Irene rojou-se de
joelhos, soluçando.
"Então, morri? A morte é
uma tragédia pior que a
vida?" -- clamou,
desesperada. Gúbio
elucidou, sereno: "A
morte é simples mudança
de veste, somos o que
somos. Depois do
sepulcro, não
encontramos senão o
paraíso ou o inferno
criados por nós mesmos".
Em seguida, como um pai
falando a uma filha
querida, lamentou o seu
gesto tresloucado,
mostrando-lhe que um
momento de rebeldia pôs
um destino em perigo,
como um pequenino erro
de cálculo ameaça a
estabilidade de um
edifício inteiro. Ela
referiu-se a Deus: Onde
Ele estava que não a
socorreu a tempo? Gúbio
lembrou-lhe a
inoportunidade da
pergunta, porquanto a
bondade do Senhor jamais
se ausenta de nós. E
afirmou-lhe que, segundo
a lei maior, ela
experimentaria então a
consequência do ato
impensado, livremente
praticado, considerando
que poucas
circunstâncias lhe
atenuavam a gravidade
da falta. (Cap. XII, pp.
158 a 160)
83. As armas no
serviço de salvação
- A censura paternal de
Gúbio era impregnada de
esperança. "Vencerás,
Irene; vencerás" --
disse-lhe o Instrutor,
mas a suicida, entre o
desapontamento e a
rebeldia, não parecia
interessada em reter os
conceitos ouvidos. Foi
então que ela
identificou a presença
de Saldanha no recinto,
o que a fez gritar
medrosamente. Vencido o
medo, dirigiu-se ao
sogro, inquirindo:
"Sombra ou fantasma, que
procuras aqui? por que
não vingaste o filho
infeliz? não te dói
tanta infâmia inútil?"
Saldanha recebeu tais
perguntas como
vergastadas no íntimo, e
profunda indignação lhe
empalideceu o
semblante. Hesitante
quanto à atitude a
tomar, procurou, porém,
em Gúbio a cooperação
necessária, e o
Instrutor respondeu à
suicida: "Irene, a
certeza da vida
vitoriosa, acima da
morte, não te infunde
respeito ao coração?
supões estejamos
subordinados a um poder
que nos desconhece?
Perante a verdade nova
que te surpreende a
alma, não percebes a
infinita sabedoria de
um Supremo Doador de
todas as bênçãos? Onde
se encontra a
felicidade da vingança?
O sangue e as lágrimas
de nossos inimigos
apenas aprofundam as
chagas que nos abriram
nos corações". O
benfeitor espiritual
prosseguiu falando,
chamando a infeliz
mulher à razão, e ela
silenciou, soluçante,
enquanto Saldanha
enxugava as lágrimas
que as palavras
generosas de Gúbio lhe
haviam arrancado.
Serenados os ânimos, o
Instrutor explicou a
Saldanha que, se Jorge
melhorara, ambas as
mulheres exigiam socorro
urgente. Não seria
lícito deixá-las naquele
ambiente inóspito.
Saldanha concordou com a
observação. Gúbio disse
que poderia abrigá-las
numa instituição
socorrista próxima, mas
era indispensável a
autorização dele.
Saldanha, bastante
modificado em suas
predisposições íntimas,
aquiesceu, e o Instrutor
providenciou a
internação necessária.
De retorno à casa de
Margarida, Saldanha
perguntou, timidamente,
quais eram as armas
justas num serviço de
salvação, ao que Gúbio
retrucou atenciosamente:
"Em todos os lugares, um
grande amor pode
socorrer o amor menor,
dilatando-lhe as
fronteiras e impelindo-o
para o Alto, e, em toda
a parte, a grande fé,
vitoriosa e sublime,
pode auxiliar a fé
pequenina e vacilante,
arrebatando-a às
culminâncias da vida".
(Cap. XII, pp. 161 a
163)
84. Alencar
perturba a jovem Lia
- De novo em casa de
Margarida, Gúbio propôs
a Saldanha um contato
com o juiz, pai da
enferma, com o objetivo
de analisar a situação
da filha de Jorge, que
ali trabalhava. O
magistrado residia ali
mesmo, visto que Gabriel
e Margarida usavam
somente pequena
dependência da vasta
residência. Saldanha
concordou. Eles então
penetraram na ala
central da casa. O sono
do juiz não poderia ser
tão calmo quanto
desejaria, em virtude do
grande número de
entidades sofredoras
que lhe batiam às portas
internas. Algumas
rogavam socorro em altos
brados; a maioria
reclamava justiça. De
repente, um rapaz
encarnado lhes apareceu,
a caminho do pavimento
inferior da casa. Era
Alencar, filho do juiz,
que perseguia Lia, a
neta de Saldanha. O
jovem postou-se à
entrada de um quarto
modesto e tentava
forçá-la. Seu hálito
denunciava a noitada de
bebidas. "Todas as
noites -- comentou
Saldanha -- procura
abusar de nossa pobre
menina. Não tem o mínimo
respeito a si mesmo.
Reparando a resistência
de Lia, estende os
processos de
perseguição, com ameaças
diversas, e acredito
que, se ainda não
atingiu os fins indignos
para os quais se
orienta, é porque
permaneço a postos,
agindo na defesa com a
brutalidade que me é
característica". Dava
para notar o tom de
humildade que
transparecia, então, das
palavras do diretor da
falange; a consideração
que dispensava agora a
Gúbio indicava a súbita
transformação que nele
se operara; o obsessor
de Margarida mostrava
compreensão e doçura nos
gestos reverentes.
Percebendo que o rapaz
estava possuído de
forças degradantes,
requerendo colaboração
enérgica, Gúbio
ministrou-lhe passes
magnéticos nos órgãos
visuais, e Alencar,
passados alguns minutos,
retirou-se, algo
cambaleante, para seu
quarto, com as pálpebras
semicerradas. A filha de
Saldanha teria paz por
alguns dias. (Cap. XIII,
pp. 164 a 166)
85. As dúvidas do
magistrado - Em
seguida, o grupo
dirigiu-se ao
apartamento privado do
juiz. Este ali se
mantinha de corpo
repousado sobre o
colchão macio,
mostrando, porém, a
mente inquieta,
flagelada. Tocando-lhe
a fronte, André
auscultou-lhe os
pensamentos mais
profundos: "Onde
estariam centralizados
os supremos interesses
da vida? onde a
ambicionada paz
espiritual que não
conquistara em mais de
meio século de
experiência ativa na
Terra? por que arquivava
no coração os mesmos
sonhos e necessidades do
homem de quinze anos,
quando ultrapassara já
os sessenta? Crescera,
estudara, casara-se.
Todas as lutas, no
fundo, não lhe haviam
modificado a
personalidade.
Conquistara os títulos
que assinalam no mundo
os sacerdotes do direito
e, por centenas de
vezes, envergara a toga
para julgar processos
difíceis. Proferira
sentenças inúmeras e
tivera nas mãos, sob o
próprio desígnio, a
destinação de muitos
lares e de coletividades
inteiras. Recebera
homenagens de pobres e
ricos, grandes e
pequenos, no transcurso
da viagem pelo
encapelado mar da
experiência terrestre em
face da posição que
desfrutava no ataviado
barco do tribunal.
Respondera a milhares de
consultas em casos de
harmonia social, mas, na
vida íntima, singular
deserto lhe povoava a
alma toda. Sentia sede
de fraternidade com os
homens; todavia, a posse
do ouro e a eminência na
atividade pública
impunham-lhe grandes
obstáculos para ler a
verdade na máscara dos
semelhantes.
Experimentava
intraduzível fome de
Deus. No entanto, os
dogmas das religiões
sectárias e as
discórdias entre elas
afastavam-lhe o espírito
de qualquer acordo com
a fé atuante no mundo.
Por outro lado, a
ciência comum,
negativista e
impenitente,
ressecara-lhe o coração.
Toda a existência se
resumiria a simples
fenômenos mecânicos
dentro da natureza?"
(Cap. XIII, pp. 166 e
167)
(Continua
no próximo número.)