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Crônicas e Artigos
Ano 3 - N° 110 - 7 de Junho de 2009

EUGÊNIA PICKINA 
eugeniamva@yahoo.com.br 
Londrina, Paraná (Brasil)
 
 

Volte-se para dentro


Em uma cultura guiada, sobretudo, pelo exterior, o acesso ao interior torna-se difícil, obstruído, causando diversos desequilíbrios à existência humana. Sim, pois a maior parte de nós vive o imediatismo e as preocupações inerentes ao inquieto campo da necessidade, diariamente reinventado.

E, sem escuta, múltiplas vozes rejeitadas, viventes no interior, mobilizam atenção sob a forma sintomas ou de feridas vivas, que se manifestam no exterior – no indivíduo particular, na família, nas instituições públicas, nas deformações diversas que causam tumulto na vida social.

Mas quando nos abrimos ao interior (reino da psique), mudamos nossos valores e a dimensão do Eu profundo (Self) passa a ser prioridade. Há espaço, então, para o vínculo com a finalidade aceitável do ser humano, cadenciada por uma subjetividade que enriqueça, de modo contínuo, sua relação com o Si-mesmo e com o mundo.

A tarefa essencial é o ato da vida arriscando a si mesmo, opondo-se a uma agenda narcisista, guiada pela fuga da realidade e pelo desejo de conforto. Vida é mais...

Como o cuidado com a aparência pode camuflar a supressão da vida no aparente gesto de cultivo da vida (mas sem vivê-la), penso na menina que nega seu feminino e se identifica em demasia com as energias masculinas. Essa menina irá crescer e poderá variar de uma eterna mimada a uma profissional tomada pela carreira, que não dá felicidade nem para si mesma, nem para sua equipe de trabalho. E ela preferirá os homens, pois se reconhece como um deles, a explorar sua natureza feminina, reduzida que é ao papel profissional (cristalizada pela identificação com o masculino).

Muita da riqueza humana é perdida na regressão à infância idílica ou nas fugas das complexidades da vida adulta – nos seus inúmeros afazeres, seguidos pelos vazios do não-sentir e do querer mais.

O ego é preso ao relógio e o racionalista, condenado à finitude da matéria, poderá cair na nostalgia (passado) ou sofrer, caso seja sensível, pelas especulações mentais que não encontram saídas além das molduras mentais (o girar em círculos).

Um argumento a favor de uma existência distinta da mecanicista apenas implica um fato: nós não sabemos aquilo que não sabemos. Dito de outro modo: não estamos conscientes daquilo que estamos inconscientes. Então, essencialmente, bastaria que aceitássemos, como Sócrates, que a vida permanece, sempre, uma curiosidade e um mistério.

Talvez seja preciso mais poesia. Um poema pode ensinar que bastaria encarnar os versos em uma apreensão consciente, mas que mobiliza a aliança razão-sentimento, senão a parceria entre sujeito e poema não é empreendida, resulta em fracasso, pois não estabelece o elo poema-Eu profundo. Sim, não nos enganemos. A arte de poetar é sempre tecida no mistério, simultaneamente fonte e matéria-prima própria à criatividade dos poetas.

Com uma ardente paciência e uma confiança serena, devemos desenvolver nossos dons e nos manter abertos ao mistério que nos faz curiosos e criativos. Do contrário, podemos nos tornar “uma pobre alma condenada a carregar um cadáver” (Epicteto).                 


 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita