WILSON CZERSKI
wilsonczerski@brturbo.com.br
Curitiba, Paraná
(Brasil)
Análise espírita sobre o
acidente com o avião
da Air France
Sempre que ocorre uma
tragédia com muitas
vítimas fatais, seja ela
proveniente das forças
da natureza (terremotos,
furacões, tsunamis)
ou provocada pelo homem,
certas perguntas são
inevitáveis. Por que
acontecem? É fatalidade,
destino, imprevidência
humana? Era vontade de
Deus que acontecesse?
Por que uns se salvam e
outros não, se todos são
filhos de Deus e,
portanto, onde fica a
sua justiça?
Recorremos aqui
principalmente ao Livro
dos Espíritos para
esclarecer algumas
destas dúvidas,
lembrando que muitos
casos, embora possam
guardar semelhanças
gerais, possuem também
particularidades que não
podem ser desprezadas.
Afinal, cada ser humano
é uma individualidade,
criatura de Deus sem
igualdade absoluta com
nenhum outro. Causas
internas e externas se
somam para culminar em
certos resultados e a
teoria geral que explica
o fato em si pode não
contemplar aspectos
especiais e nuanças de
certa pessoa.
Na questão 851 da obra
citada, os Espíritos
explicam que a
fatalidade só existe
quanto às escolhas que a
própria alma faz antes
de reencarnar, traçando
para si uma espécie de
destino. Eles querem
dizer com isso que, no
fundo, em linhas gerais,
é o próprio homem que,
ao exercer o seu
livre-arbítrio,
determina o tipo de
experiências que deseja
e/ou necessita vivenciar
para o bem de seu
progresso espiritual.
Acrescentam os Espíritos
na q. 866 que mesmo a
fatalidade aparente, às
vezes observada nos
fatos materiais – isto
porque no que diz
respeito aos aspectos
morais, decididamente
ela não existe; por
exemplo, ninguém nasce
predestinado a matar
alguém, cometer furtos
ou estupro – aqueles
acontecimentos decorrem
da nossa liberdade de
escolha e se constituem
em provas escolhidas e
não necessariamente só
expiações, como muita
gente supõe.
Mas é bom conhecermos
mais duas facetas dessa
problemática. Uma
contida na questão 259
quando nos é informado
que apesar destas
escolhas prévias
chamadas de
“planejamento
reencarnatório”, pelas
quais determinamos nosso
futuro, nem todas as
atribulações que nos
ocorrem foram previstas.
Definimos os pilares das
existências, os
pontos-chave, o gênero
das provas e/ou
expiações, mas os
detalhes serão
elaborados ao longo da
vida, conforme a
dinâmica de cada momento
e situação.
Como consequência deste
raciocínio, a q. 860
complementa,
trazendo-nos a segunda
faceta mencionada. O
homem, mediante o
seu livre-arbítrio,
sempre presente, pode
mudar muitos dos
acontecimentos já
previstos desde que
isso não implique
rompimento com o
planejamento básico
anterior. Podemos
desertar de compromissos
assumidos, de missões
que julgávamos ser
capazes de cumprir e
agora titubeamos. Provas
e expiações podem ser
atenuadas, adiadas e
mesmo canceladas, tudo
dependendo da nossa
conduta atual, de nossas
disposições interiores,
do nosso esforço e
mérito no caminho do
bem. Não podemos
esquecer que, se
por um lado, estamos
sujeitos a colher hoje
reações de atos
praticados no passado,
no presente também
executamos novas ações
que, por sua vez,
trarão reflexos no
futuro. Resumindo: nem
tudo é carma como se
diz.
No caso da queda em
pleno Atlântico do voo
447 da Air France
as evidências são no
sentido de uma conjunção
de fatores – aliás, é o
que sempre aprendemos em
28 anos de Força Aérea
Brasileira – climáticos
e mecânicos ou técnicos
e talvez mesmo humanos.
Mas a pergunta é: Deus
não pode mais? Os
Espíritos que o ajudam
na administração do
universo não poderiam
ter intuído os pilotos
para perceber as falhas
e corrigi-las a tempo?
Todos os que morreram
“tinham” que morrer? E
por quê?
Deus não determinou a
ocorrência
que poderia ser evitada.
Mas, como em tudo, ele
extrai benefícios onde o
homem só enxerga
desgraça e dor. Deus não
intervém diretamente em
tudo o que ocorre. Para
isso estabeleceu leis
sábias e justas,
imutáveis, porém
flexíveis. Cabe ao homem
conhecê-las e
cumpri-las. Se houve
imprudência, por exemplo
– é apenas uma
possibilidade – ao se
tentar atravessar a
perigosa área de
tempestade em vez de
contorná-la, ou fracasso
de desempenho nos
sofisticados
equipamentos de bordo
construídos pela
inteligência humana,
Deus não pode ser
culpado por isso.
Permitir Deus que algo
aconteça não significa
que desejasse que
ocorresse. Mesmo assim
alguns podem alegar que,
se Ele sabia que poderia
acontecer e, podendo
intervir, não o fez,
então foi omisso e
indiferente ao
sofrimento de algumas
centenas de seus filhos.
Para nós fatos como
esses são muito trágicos
e dolorosos e ninguém
tem o direito de usar de
frieza para minimizar o
sentimento de dor
experimentado pelas
vítimas – pois que
continuam a viver
conscientes de si mesmos
–, familiares e amigos.
Mas para tranquilizar,
lembramos que Deus a
tudo provê, porém com a
visão infinita. Para
a grandiosidade de sua
obra e mesmo da evolução
de cada ser, o acidente
não passou de um
incidente isolado que em
nada afetará o conjunto.
Observemos que nestas
ocorrências quase sempre
há exceções. Adultos, às
vezes, um bebê ou um
idoso encontrado vivo
muitos dias após nos
escombros de um
terremoto; pessoas
“salvas” por
contratempos triviais
como um pneu furado,
etc. Como há o inverso.
No voo 1907 da Gol, que
colidiu com o jatinho
Legacy em 2006,
estava uma mulher que já
sofrera um queda de
avião na infância. Outra
antecipou a viagem com o
filho em um dia; o
marido não os
acompanhou. Um
passageiro decidiu adiar
o voo devido ao número
de escalas. Segunda vez
em que foi poupado, pois
escapara de outro
acidente em 2004 no
estado de Mato Grosso
quando 33 pessoas
pereceram.
Neste da Air France
tivemos outro caso
curioso. Uma turista
italiana, que passava
férias no Brasil com o
marido, chegou atrasada
ao aeroporto e perdeu o
voo. Retornaram à Europa
três dias depois. Onze
dias depois morreu em um
acidente automobilístico
na Áustria. Parece que,
no caso dela, houve
apenas adiamento do
momento da
desencarnação, talvez
uma espécie de moratória
para que resolvesse
alguma pendência ou
realizasse algum último
desejo. Já o marido
sobreviveu às duas
situações.
Deus não dá preferência
para poupar uns e outros
não;
não há milagres. Apenas
o planejamento
reencarnatório desse ou
daquele não previa a
partida da vida física
naquele momento. Os que
sobrevivem não é por
privilégio divino ou
mesmo questão de mais ou
menos fé. Simplesmente
foram afastados da
circunstância porque seu
destino era diferente.
Suas experiências no
corpo ainda não haviam
chegado a termo.
Finalmente, outra
interrogação. Se o fato
ocorreu por falhas
humanas, se estas não
tivessem ocorrido, as
228 pessoas não
morreriam? A questão 738
de O Livro dos Espíritos
dá-nos a resposta.
Dizem-nos os Benfeitores
que Deus pode empregar
outros meios para
cumprimento de suas leis
e objetivos, visando
sempre o
aprimoramento
(grifo nosso) da
humanidade. Afinal, tais
leis são sempre
educativas e não
punitivas e têm por alvo
proporcionar o progresso
espiritual que conduzirá
o homem à verdadeira
felicidade.
O respeito do Criador
para com o
livre-arbítrio e as
necessidades dos homens
perpetra condições da
execução apropriada. Se
não fosse assim em
grupo, seria
individualmente. Se
não fosse de avião
poderia ser de
automóvel; se não fosse
naquele dia, seria em
outro qualquer.
Aliás, esta questão
esclarece também que o
conceito que os
espíritos libertos do
corpo físico possuem da
vida material é muito
diferente do que o
nosso. Eles não
emprestam o mesmo valor
superlativo a ela porque
sabem que todos somos
imortais, que já tivemos
e teremos muitas outras
existências carnais e,
de resto, muito mais
felizes seremos quando
delas pudermos
prescindir.
Se
apesar disso,
esclarecem-nos os
Mentores ainda nesta
questão, eventualmente
uma ou mais
pessoas que ali
desencarnaram não
tivessem que perecer,
constituindo o que
costumamos denominar de
‘vítimas inocentes’
“(...) estas
encontrarão em outra
existência larga
compensação aos seus
sofrimentos desde que
saibam suportá-los sem
murmurar.”.
Resumindo: algumas
vítimas ali deviam estar
“pagando” dívidas
contraídas no passado
enquanto outras podiam
estar “adquirindo
créditos” para o futuro.