MARCUS
VINICIUS DE AZEVEDO
BRAGA
acervobraga@gmail.com
Guará II, Distrito
Federal (Brasil)
Crônicas
de Natal
Faltou a
luz...
Mais um Natal na família
Nagato. Família de
bem-sucedidos
comerciantes que reúnem
anualmente toda a
família. Primos
distantes, sobrinhos,
agregados, enfim, todos
se reúnem no seu sítio
para a comemoração do
Natal. A ceia é repleta
de aves, suínos, frutas
e doces típicos da
época, e a fartura é
imensa.
Devido à diversidade de
idades, várias opções
foram estabelecidas pela
Sra. Nagato a fim de
satisfazer suas visitas.
Salas de vídeo, jogos
eletrônicos, campo de
futebol, mesa de
pingue-pongue, bar, sala
de musculação, piscina.
Tudo disponibilizado
para que todos se sintam
à vontade. Mais um ano
com a família reunida e
alegre no sítio dos
Nagatos.
Mas o imprevisível armou
uma das suas naquele
ano. Uma casa de
marimbondos se instalou
na caixa de força e,
fruto da falta de
manutenção, fez com que
todas aquelas luzes,
aqueles chuveiros e
aparelhos eletrônicos
esquentassem o
disjuntor, que entrou em
um processo
comburente-combustível
que transformou a caixa
de força (e a casa de
marimbondos) em uma
rápida e destrutiva
fogueira.
Ao iniciar-se o fogo, a
luz logo acabou e,
apesar de o Sr. Nagato
ter corrido rapidamente
com o extintor de seu
automóvel para a caixa
de força, o estrago já
havia acontecido. Gritos
tomaram conta do sítio,
imerso na escuridão da
mata que o cerca. Os que
dormiam acordaram com a
confusão. Bola recolhida
e vídeos encerrados. O
que fazer agora?
Pois na noite de Natal,
próximo da meia noite,
nenhuma loja estaria
aberta para atendê-los.
Ainda mais ali no meio
do mato!
Sr. Nagato chama a todos
para perto da mesa onde
jazia acesa uma
esquecida vela do fundo
da gaveta. Acende a luz
de seu relógio e vê que
são 23h45 e começa seu
discurso:
- Perdoem-me pelo
contratempo que estragou
o nosso Natal. A vela
que nos resta e as
lanternas levarão quem
já quiser ir dormir, e
os que tiverem fome
poderão se servir à
mesa...
Interrompendo o Sr.
Nagato, levanta-se
Pablo, namorado de
Márcia Nagato, sobrinha
do nobre anfitrião:
- Perdoem-me também a
minha intromissão... Não
pertenço a esta família
ainda (disse, sorrindo
para Márcia), mas creio
que há um equívoco aqui.
A ousadia do jovem
espanta a todos e exalta
o pai de Márcia. Mas,
sem permitir uma reação
do público, ainda
fragilizado pela
escuridão, o jovem
continua a sua
exposição:
- Vejo que todos
estávamos nos
divertindo. Todos
brincando, curtindo seus
hobbies e preferências.
E depois, à meia noite,
atacaríamos avidamente
essa mesa repleta de
quitutes e coisas
gostosas. Pelo que
Márcia me conta, é assim
ano após ano. Falamos de
futebol, de negócios,
dos amigos e, por fim,
dormimos para o fim de
mais um feriado. O Natal
não é isso!
Com essa frase o pai de
Márcia se levanta:
- Ora, rapaz, respeite
as tradições de nossa
família, pois...
A própria Sra. Nagato
interrompe o cunhado com
a voz firme:
- Permita que o rapaz se
expresse. Continue, meu
filho.
- O Natal – disse
o moço - representa a
comemoração do
nascimento de Jesus,
aquele que nos trouxe a
mensagem da paz e do
amor ao próximo. Nasceu
em uma manjedoura
simples, cercado de
animais , filho de um
carpinteiro. Mas, pelo
seu exemplo, nos mostrou
a beleza das coisas de
Deus. E com muito amor e
fraternidade é que
comemoramos esta data,
estendendo ao irmão o
nosso braço amigo. Se
mesmo em família não
existe esse sentimento
fraternal, como
estendê-los a outros?
Tomando para si a vela
que estava sobre a mesa,
o Sr. Nagato se levanta:
- Vejo que este jovem
foi iluminado em suas
palavras. Apagaram-se as
luzes, mas acenderam-se
outras em nossos
corações. Diga, jovem,
como podemos, agora,
confraternizar no Natal,
se nos falta até a
luz?
Tomando o violão, que
estava na mala de seu
carro, Pablo convida a
todos a sentar ao redor
da mesa e, sob a luz
daquela singela vela,
encerram aquela noite de
Natal cantando juntos,
de mãos entrelaçadas e
olhos úmidos, antigas
canções de Natal,
relembrando aquela
criança que um dia
nasceu sob a luz de uma
estrela.