JOANA ABRANCHES
joanaabranches@gmail.com
Vitória, Espírito Santo
(Brasil)
Quem não se comunica...
Há 152 anos a
Doutrina Espírita vem
consolidando a sua
credibilidade no mundo,
sobretudo porque as
descobertas científicas
têm caminhado, passo a
passo, com muitas das
verdades já há tanto
propagadas por Kardec.
Avançamos. Se ontem as
pessoas corriam dos
espíritas, hoje correm
para nós, atrás de
respostas que só “O
Consolador” pode dar.
Mais que nunca, é
preciso divulgar o
Espiritismo. Mas
divulgar não é empurrar
material doutrinário
goela abaixo. É antes de
tudo comunicar-se,
estabelecer empatia
imediata com o receptor,
despertar interesse
inicial, contínuo e
gradativo pelo material
apresentado, é fazer-se
entender e sentir.
Assim, há que se ter uma
abordagem minimamente
adequada, para que se
consiga tocar a alma e
chegar à razão.
Neste ponto, faz-se
urgente uma reflexão.
Conseguiremos nós,
espíritas, alcançar
corações e mentes, em
pleno século XXI, sem
atualizar nossas formas
de comunicação?
A pretexto de fidelidade
doutrinária, campeia
entre nós um linguajar
monótono e obsoleto.
Incrivelmente, ainda há
quem acredite que ser
fiel à codificação se
resume à manutenção da
linguagem utilizada pelo
codificador no século
retrasado ou, quando
muito, à continuidade
das mesmas formas de
expressão utilizadas nas
décadas de 40 a 60 –
apogeu da produção
mediúnica de Chico
Xavier – causando a
incômoda impressão de
que estamos parados no
tempo.
Outro dia, lendo o
editorial de um
periódico federativo,
dei de cara com a
palavra “efemérides” -
entre outras expressões
arcaicas que recheavam o
texto - e fiquei a
pensar que se a mim, que
já passei dos cinquenta,
soa estranho, imagine ao
pessoal da nova
geração!... Tendo que
dar tratos à bola para
decifrar o que significa
tal “palavrão”, já
praticamente extinto nos
dias de hoje. Essas
situações comprometem,
de pronto, a
continuidade da leitura,
pois a chamada leva a
pressupor – e com razão
– um texto maçante. Quem
vai se interessar por
matérias cujos termos
remetem ao tempo dos
nossos bisavós, o que –
com todo o respeito que
devemos aos nossos
ascendentes – nada tem a
ver com os anseios do
momento presente?
Como podemos querer o
aval da comunidade
científico-tecnológica,
se em plena era virtual
ainda insistimos em
chamar planeta de
“orbe”, só porque
Emmanuel, na década de
50 – quando esse termo
ainda estava em uso –
assim o fez? Se, rebuscadamente, nos
referimos à sociedade
“hodierna” – citada por
Joanna de Ângelis –
quando poderíamos
simplesmente utilizar o
termo “moderna”, de
muito mais fácil
compreensão? Passa da
hora de aposentarmos os
ósculos, amplexos,
destras e outras
expressões “jurássicas”.
Ou a gente acompanha os
novos tempos ou vai
ficando para trás, sob a
pecha da alienação.
Não pretendemos aqui
fazer a apologia das
gírias, do modernismo inconsequente. Mesmo
porque a palavra escrita
ou falada na norma
culta, dentro de uma
relativa formalidade, é
passaporte certo para a
credibilidade. Mas
precisamos repensar o
nosso linguajar enquanto
palestrantes e redatores
espíritas, para que não
nos escondamos numa
espécie de dialeto
esquisito que só leva à
estagnação e ao
isolamento. Se não
devemos vulgarizar a
palavra a pretexto de
atingir a massa,
tampouco devemos
permanecer como se o
tempo não tivesse
passado para nós.
Se tudo o que mais
almejamos é
universalizar o
conhecimento espírita,
por que não utilizar uma
linguagem mais coloquial
e interessante? Desde
que se tenha o zelo
necessário para que não
haja distorções no
conteúdo doutrinário,
por que não adaptar
textos antigos para uma
linguagem moderna,
facilitando assim o seu
entendimento às novas
gerações e àqueles que
têm maior limitação
intelectual?
Alguns companheiros são
resistentes às
adaptações, por entender
que a manutenção de
termos difíceis provoca
um enriquecimento da
linguagem. Mas,
imaginemos alguém, ainda
engatinhando no
conhecimento espírita,
que, buscando consolo
num momento de dor, se
depara com uma linda e
consoladora mensagem,
porém, cheia de termos
rebuscados, que exijam o
uso do dicionário. Esta
interrupção certamente
esvaziará o impacto
emocional do conteúdo,
esfriando o coração do
leitor ante a
necessidade de parar e
buscar tantos sinônimos.
Emoção cortada, alma
frustrada, objetivo
perdido.
O nosso compromisso é
com a formação
espiritual e não
acadêmica. Embora
tenhamos o dever de nos
expressar elegantemente
e estimular
doutrinariamente o
aprimoramento do saber,
contribuindo assim – e
muito – também para a
intelectualização do
ser, o que precisamos
entender é que,
definitivamente,
trabalhar aquisição de
vocabulário e erudição
não é a nossa
prioridade. Nossa
prioridade é esclarecer
e consolar, com vistas
ao progresso moral dos
seres, e ninguém
esclarece ou consola sem
usar de clareza e
simplicidade. Portanto,
didaticamente,
simplifiquemos a nossa
fala, a nossa escrita,
façamos o nosso papel de
facilitadores das
verdades espirituais e
deixemos às escolas do
mundo o papel que lhes
cabe.
Sob pena de perdermos o
trem da história, há uma
contradição que precisa
ser vencida pelo
movimento espírita. Uma
doutrina evolucionista
por princípio não pode e
não deve ficar parada no
tempo. Termos novos são
criados a todo o momento
para coisas novas.
Termos antigos são
substituídos a todo
instante por outras
nomenclaturas.
Caminhamos, hoje, para
uma democratização do
conhecimento. O que
antes era privilégio de
uma casta intelectual,
agora é direito de
todos. Isto significa
distribuição mais justa
da informação e
oportunidades
igualitárias,
correspondendo aos
ideais de justiça e
igualdade defendidos
pelo Espiritismo. Então,
não faz sentido uma
elitização que só
retarda a colheita dos
frutos semeados.
O mundo gira, o
progresso está aí, e a
lei é de evolução em
todos os sentidos.
Descomplicar é a palavra
de ordem para quem quer
“colocar a candeia sobre
o alqueire”. Não há mais
espaço para termos
antiquados, que soam até
mesmo de forma ridícula
a quem os lê. É
inadiável escolher. Ou
continuamos a bater na
tecla de uma erudição
exibicionista a fim de,
aqui mesmo, receber o
galardão, ou optamos
pela pedagogia simples
de Jesus, cujas
parábolas demonstram
estratégia impar para
alcançar o interesse e o
entendimento daquela
população ainda tão
rudimentar, quanto às
verdades espirituais que
veio trazer.
Nesse momento difícil de
transição, em que
milhares de irmãos
nossos precisam,
desesperadamente,
estabelecer um link
emocional e cognitivo
imediato com as verdades
consoladoras do
Espiritismo, não há mais
lugar para
comportamentos
arraigados a tradições
pueris.
Deixemos fluir a
simplicidade culta que
nos fará fiéis
articuladores da
verdadeira divulgação,
aquela que de fato
acontece, que dá
resultados palpáveis,
pois fala
simultaneamente ao
cérebro e à
sensibilidade. Só assim
estaremos cumprindo
efetivamente o papel de
colaboradores do mundo
invisível, junto ao
aprimoramento moral
contínuo da sociedade na
qual estamos inseridos,
aqui e agora. Coloquemos
em prática, na íntegra,
as recomendações
contidas no cap. XII,
item 10, do ESE, à
página “O Homem no
Mundo”, que nos chama à
realidade temporal em
que vivemos na Terra, ao
conclamar: “Vivei com os
homens do vosso tempo,
como devem viver os
homens”.
E – há que se admitir –
numa vida de
interrelação, respeito e
comunicação fazem toda a
diferença.