LEONARDO MARMO MOREIRA
leonardomarmo@gmail.com
São José dos Campos, São
Paulo (Brasil)
Polêmicas espíritas
A Doutrina Espírita
constitui uma estrutura científico-filosófico-religiosa
extremamente coerente,
interdependente e interrelacionada, tendo
na Codificação Kardequiana seu alicerce
teórico e orientador em
termos de metodologia e
desenvolvimento. Por
outro lado, o
Espiritismo não se
restringe às obras da
chamada “Codificação”,
implicando que o
Espiritismo começa com
as obras organizadas por
Allan Kardec, mas não é
“concluído” nessas
obras. Em outras
palavras, a Doutrina
Espírita evolui com o
passar do tempo através
da contribuição dos
estudiosos dos dois
planos da vida, uma vez
que sendo ciência não
dispensa a pesquisa e o
contínuo estudo de todos
os seus adeptos. E é
justamente devido a tais
critérios rigorosos que
o Espiritismo é
conhecimento como a
Terceira Revelação, uma
vez que representa a
busca constante pela
“Verdade”, ou seja, pelo
conhecimento das “Leis
Universais de Deus” em
suas mais variadas
manifestações. Essa
característica, aliás,
constitui um dos grandes
méritos conceituais do
Espiritismo em relação a
outras correntes de
pensamento,
principalmente no meio
religioso, pois a
Doutrina Espírita não
está encarcerada em um
determinado “livro
sagrado” ou em uma
interpretação do passado
que tenha recebido a
classificação de
infalível por homens tão
falíveis quanto nós
mesmos. Como toda
ciência, está sempre
reavaliando e expandindo
conceitos básicos e
ampliando implicações
destes conceitos através
de nuances cada vez mais
profundas e explicativas
com relação à Vida.
Vale lembrar a
Codificação Kardequiana
para frisar que “o
Espiritismo é de origem
espiritual através do
trabalho dos
encarnados”, o que
ressalta que o trabalho
de cada estudioso da
Doutrina é muito
importante na
decodificação das
informações oriundas do
mundo espiritual. De
fato, temos no Mestre
Lionês o exemplo
indelével da relevância
do papel do estudioso
encarnado face às
informações de natureza
espiritual. Ademais, a
chamada “Universalidade
do Ensino dos
Espíritos”, associada à
confirmação adicional da
Ciência Humana,
constitui-se em um
critério que exige
profundo domínio das
bases doutrinárias, sob
pena de que diferentes
médiuns, sendo
igualmente instrumentos
de informações
equivocadas,
corroborem-se
mutuamente, dando origem
a supostos “novos
avanços doutrinários”,
os quais poderiam
implicar em grandes
equívocos à luz da
Verdade. Até por que a
própria ciência humana
está sujeita às
contradições,
controvérsias e
preconceitos, inerentes
ao pensamento humano.
Assim sendo, surge a
antiga questão
concernente às chamadas
“Polêmicas” no meio
espírita. Seria lícito
fomentá-las? As
discussões em torno de
temas mais complexos ou
que ensejariam
diferentes opiniões
seria algo válido para o
desenvolvimento do
movimento espírita ou
deveriam ser evitadas
devido aos riscos de
gerar cisões e cismas
perfeitamente
dispensáveis ao nosso
movimento?
Partindo-se do
pressuposto de que
ninguém é dono da
verdade e de que nem
mesmo o extraordinário
Codificador do
Espiritismo se colocou
próximo a essa condição,
fica a dúvida: “O que
fazer para que
caminhemos
verdadeiramente para a
Verdade?”. Um guia
seguro para respondermos
a essa questão pode ser
obtido através da
orientação do Espírito
de Verdade a todos nós
espíritas, conforme O
Evangelho segundo o
Espiritismo:
“Espíritas, amai-vos!
Este é o primeiro
mandamento. E
Instruí-vos! Este é o
segundo”.
Em primeiro lugar, todas
as relações entre os
confrades espíritas
deveriam ser pautadas
pela sinceridade na Fé,
humildade no
reconhecimento dos
eventuais erros
doutrinários, troca
fraterna de informação e
conhecimento, apoio
recíproco nos trabalhos
visando ao bem coletivo,
sobretudo à Divulgação
Doutrinária,
independentemente de
diferenças de opiniões
pessoais. Basicamente,
essa análise nos
forneceria uma breve
noção do primeiro
mandamento aplicado às
atividades
doutrinárias.
Com relação ao segundo
mandamento, fica
evidente a necessidade
constante de estudo
individual e coletivo e
sistemática reavaliação
dos princípios
doutrinários
fundamentais e de seus
eventuais
desdobramentos. Ora,
esse processo, como
ocorre com quaisquer
ciências, pressupõe
troca de informações,
análises críticas e,
eventualmente,
discordâncias, pois a Fé
Espírita não é cega, mas
raciocinada, o que está
evidentemente ratificado
por suas bases
científicas. Entretanto,
nem sempre raciocinamos
com lógica ou com um
conhecimento global do
contexto em que está
inserido determinado
evento de relevância
espírita. Além disso,
nem sempre temos um
número de eventos
detalhados
suficientemente para
inferir generalizações.
Logo, apesar de termos a
consciência de que a
Doutrina Espírita
representa a luz da
Verdade em nosso
planeta, sem o estudo
sistemático, incluindo
os inevitáveis debates a
ele associados, jamais
assimilaremos
individualmente essa luz
e muito menos
contribuiremos para uma
adequada Divulgação
Espírita, a qual,
segundo Emmanuel, é a
maior caridade que
podemos fazer pelo
Espiritismo. De fato, o
próprio Léon Denis
assevera que “O
Espiritismo será aquilo
que os Espíritas fizerem
dele”. Fica evidente que
o “Apóstolo do
Espiritismo” está
analisando muito mais o
Movimento Espírita do
que a Doutrina Espírita
propriamente dita.
Entretanto, fragilidades
no Movimento Espírita
repercutem negativamente
na Divulgação
Doutrinária, de maneira
que conceitos
equivocados do ponto de
vista espírita podem se
tornar “pregações
usuais” no nosso meio.
Tal afirmação de León
Denis também denota que
por mais elevada que a
proposta espírita seja,
ela estará sempre
submetida ao trabalho de
nós espíritas e ao nosso
livre-arbítrio, como,
aliás, ocorre com todas
as coisas da vida.
Allan Kardec, em
Revista Espírita, é
bastante fiel ao
seguinte princípio: “Nós
debateremos, mas não
disputaremos”.
Essa proposta
deve ser sempre
respeitada para que o
bom senso ajude a
melhoria doutrinária de
cada adepto do Movimento
Espírita minimamente
interessado em acessar
informações fidedignas.
Assim sendo, dentro dos
limites do amor, da
educação, da
fraternidade e do ideal
superior que a todos nos
une, não debater
questões doutrinárias
mais complexas seria
estagnar o conhecimento
doutrinário, pelo menos
para grande número de
adeptos e,
conseguintemente,
nivelar por baixo o
discernimento dos
espíritas de uma forma
geral. Devemos nos
esforçar para que o
crescimento do número de
adeptos do Espiritismo,
que vem ocorrendo
sistematicamente em
nossa sociedade, não
signifique
necessariamente o
aumento da
superficialidade
doutrinária dos mesmos,
fenômeno comum a
movimentos religiosos de
massa, que não é o caso
do Espiritismo.