O Bem e o Mal
(Parte 2 e
final)
Livrar-nos-emos
do mal
instruindo-nos e
praticando a
caridade cristã.
O estudo nos
permitirá
discernir o que
está em
concordância com
as leis de Deus
e o que não está
Encontramos,
ainda, em
O Livro dos
Espíritos:
635. Das
diferentes
posições sociais
nascem
necessidades que
não são
idênticas para
todos os homens.
Não parece poder
inferir-se daí
que a lei
natural não
constitui regra
uniforme?
“Essas
diferentes
posições são da
natureza das
coisas e
conformes à lei
do progresso.
Isso não infirma
a unidade da lei
natural, que se
aplica a tudo.”
As condições de
existência do
homem mudam de
acordo com os
tempos e os
lugares, do que
lhe resultam
necessidades
diferentes e
posições sociais
apropriadas a
essas
necessidades.
Pois que está na
ordem das
coisas, tal
diversidade é
conforme à lei
de Deus, lei que
não deixa de ser
una quanto ao
seu princípio. À
razão cabe
distinguir as
necessidades
reais das
fictícias ou
convencionais.
636. São
absolutos, para
todos os homens,
o bem e o mal?
“A lei de Deus é
a mesma para
todos; porém, o
mal depende
principalmente
da vontade que
se tenha de o
praticar. O bem
é sempre o bem e
o mal sempre o
mal, qualquer
que seja a
posição do
homem. Diferença
só há quanto ao
grau da
responsabilidade.”
637. Será
culpado o
selvagem que,
cedendo ao seu
instinto, se
nutre de carne
humana?
“Eu disse que o
mal depende da
vontade. Pois
bem! Tanto mais
culpado é o
homem, quanto
melhor sabe o
que faz.”
As
circunstâncias
dão relativa
gravidade ao bem
e ao mal. Muitas
vezes, comete o
homem faltas
que, nem por
serem
consequência da
posição em que a
sociedade o
colocou, se
tornam menos
repreensíveis.
Mas a sua
responsabilidade
é proporcionada
aos meios de que
ele dispõe para
compreender o
bem e o mal.
Assim, mais
culpado é, aos
olhos de Deus, o
homem instruído
que pratica uma
simples
injustiça, do
que o selvagem
ignorante que se
entrega aos seus
instintos.
638. Parece, às
vezes, que o mal
é uma
consequência da
força das
coisas. Tal, por
exemplo, a
necessidade em
que o homem se
vê, nalguns
casos, de
destruir, até
mesmo o seu
semelhante.
Poder-se-á dizer
que há, então,
infração da lei
de Deus?
“Embora
necessário, o
mal não deixa de
ser o mal. Essa
necessidade
desaparece,
entretanto, à
medida que a
alma se depura,
passando de uma
a outra
existência.
Então, mais
culpado é o
homem quando o
pratica, porque
melhor o
compreende.”
1.2.
Em A
Gênese,
capítulo III:
8. - Pode
dizer-se que
o mal é a
ausência do bem,
como o frio é a
ausência do
calor. Assim
como o frio não
é um fluido
especial, também
o mal não é
atributo
distinto; um é o
negativo do
outro. Onde não
existe o bem,
forçosamente
existe o mal.
Não praticar o
mal, já é um
princípio do bem.
Deus somente
quer o bem; só
do homem procede
o mal. Se na
criação houvesse
um ser preposto
ao mal, ninguém
o poderia evitar;
mas, tendo o
homem a causa do
mal em SI MESMO,
tendo
simultaneamente
o livre-arbítrio
e por guia as
leis divinas,
evitá-lo-á
sempre que o
queira.
Tomemos para
termo de
comparação um
fato vulgar.
Sabe um
proprietário que
nos confins de
suas terras há
um lugar
perigoso, onde
poderia perecer
ou ferir-se quem
por lá se
aventurasse. Que
faz, a fim de
prevenir os
acidentes? Manda
colocar perto um
aviso, tornando
defeso ao
transeunte ir
mais longe, por
motivo do
perigo. Ai está
a lei, que é
sábia e
previdente. Se,
apesar de tudo,
um imprudente
desatende o
aviso, vai além
do ponto onde
este se encontra
e sai-se mal, de
quem se pode ele
queixar, senão
de si próprio?
Outro tanto se
dá com o mal:
evitá-lo-ia o
homem, se
cumprisse as
leis divinas.
Por exemplo:
Deus pôs limite
à satisfação das
necessidades:
desse limite a
saciedade
adverte o homem;
se este o
ultrapassa,
fá-lo
voluntariamente.
As doenças, as
enfermidades, a
morte, que daí
podem resultar,
provêm da sua
imprevidência,
não de Deus.
Nesse item 8,
verifica-se que
Kardec adere à
visão
agostiniana do
mal, dizendo ser
ele a ausência
do bem. Nota-se
ainda que, assim
como Agostinho
de Hipona fez,
ele também
exclui a
possibilidade da
existência de um
“preposto do
mal”, ao
contrário da
proposta
maniqueísta.
9. - Decorrendo,
o mal, das
imperfeições do
homem, e tendo
sido este criado
por Deus,
dir-se-á que
Deus não deixa
de ter criado,
se não o mal,
pelo menos, a
causa do mal; se
houvesse criado
perfeito o
homem, o mal não
existiria.
Se fora criado
perfeito, o
homem fatalmente
penderia para o
bem.
Ora, em virtude
do seu
livre-arbítrio,
ele não pende
fatalmente nem
para o bem, nem
para o mal. Quis
Deus que ele
ficasse sujeito
à lei do
progresso e que
o progresso
resulte do seu
trabalho, a fim
de que lhe
pertença o fruto
deste, da mesma
maneira que lhe
cabe a
responsabilidade
do mal que por
sua vontade
pratique. A
questão, pois,
consiste em
saber-se qual é,
no homem, a
origem da sua
propensão para o
mal.
(1)
Aqui vemos o
ponto onde a
Doutrina
Espírita
diverge da
visão
agostiniana
do mal.
Ensina a
Codificação
que fomos
criados
“simples e
ignorantes”,
mas “dotados
de
livre-arbítrio”.
Assim, Deus
não nos
criou nem
bons nem
maus,
deixando ao
nosso
encargo os
caminhos que
iríamos
trilhar.
Somos
predestinados
à perfeição,
sim, mas
para chegar
a ela não
dependemos
da graça de
Deus, mas
somente de
nossa
vontade.
10. -
Estudando-se
todas as
paixões e,
mesmo, todos
os vícios,
vê-se que as
raízes de
umas e
outros se
acham no
instinto de
conservação,
instinto que
se encontra
em toda a
pujança nos
animais e
nos seres
primitivos
mais
próximos da
animalidade,
nos quais
ele
exclusivamente
domina, sem
o contrapeso
do senso
moral, por
não ter
ainda o ser
nascido para
a vida
intelectual.
O instinto
se
enfraquece,
à medida que
a
inteligência
se
desenvolve,
porque esta
domina a
matéria. O
Espírito tem
por destino
a vida
espiritual,
porém, nas
primeiras
fases da sua
existência
corpórea,
somente a
exigências
materiais
lhe cumpre
satisfazer
e, para tal,
o exercício
das paixões
constitui
uma
necessidade
para o
efeito da
conservação
da espécie e
dos
indivíduos,
materialmente
falando.
Mas, uma vez
saído desse
período,
outras
necessidades
se lhe
apresentam,
a princípio
semimorais e
semimateriais,
depois,
exclusivamente
morais. É
então que o
Espírito
exerce
domínio
sobre a
matéria,
sacode-lhe o
jugo, avança
pela senda
providencial
que se lhe
acha traçada
e se
aproxima do
seu destino
final.
Se, ao
contrário,
ele se deixa
dominar pela
matéria,
atrasa-se e
se
identifica
com o bruto.
Nessa
situação, o
que era
outrora um
bem, porque
era uma
necessidade
da sua
natureza,
transforma-se
num mal,
não só
porque já
não
constitui
uma
necessidade,
como porque
se torna
prejudicial
à
espiritualização
do ser.
Muita coisa,
que é
qualidade na
criança,
torna-se
defeito no
adulto. O
mal é, pois,
relativo, e
a
responsabilidade
é
proporcionada
ao grau de
adiantamento.
Todas as
paixões têm,
portanto,
uma
utilidade
providencial,
visto que, a
não ser
assim, Deus
teria feito
coisas
inúteis e,
até,
nocivas. No
abuso é que
reside o mal
e o homem
abusa em
virtude do
seu
livre-arbítrio.
Mais tarde,
esclarecido
pelo seu
próprio
interesse,
livremente
escolhe
entre o bem
e o mal.
2.
O
EXEMPLO
MAIOR
Jesus não
era um
filósofo
teórico, mas
foi entre
nós o Mestre
excelente
que viveu
com
intensidade
tudo o que
ensinou.
Dessa forma,
não há nos
evangelhos o
relato de
Jesus ter
ensinado
explicitamente
ao povo ou
aos
sacerdotes a
diferença
entre o bem
e o mal. Em
vez disso,
utilizando-se
do
entendimento
moral do
próprio
povo,
exemplificou
pelo seu
comportamento
e suas
palavras o
homem de bem
que todos
devemos
imitar.
Quanto ao
mal, deu-nos
a entender
de forma
clara que
sua causa
estava em se
transgredir
a lei de
Deus. Após
fazer sarar
doentes do
corpo e da
alma que
vinham
suplicar
pela sua
cura, certos
de sua
imensa
bondade,
muitas vezes
ele se
despedia
deles
exortando-os
para que não
voltassem a
pecar, isto
é, a
praticar o
mal. Deixava
claro com
essa
instrução
que os
responsáveis
pela nossa
saúde física
e emocional
e pela nossa
evolução
somos nós
mesmos, um
entendimento
que, como
vimos,
escapou
totalmente a
Agostinho de
Hipona, ao
propor a
doutrina da
graça. Ao
curar
doentes de
nascença, o
significado
de sua
despedida
foi ainda
mais
profundo,
pois colocou
a origem do
pecado, isto
é do erro
que lhes
tinha
causado o
mal da
doença, em
uma
existência
anterior,
corroborando
com isso a
verdade
contida na
lei da
reencarnação.
Sempre
enfatizou,
também, o
Mestre que a
responsabilidade
dos homens
da lei pelos
seus erros
era muito
maior que a
responsabilidade
do povo, o
que, dito de
outra forma,
equivale a
dizer que
cada um
responde
pelos seus
atos
conforme o
grau de seu
entendimento
das leis de
Deus.
Jesus
ensinou-nos,
ainda, que
orássemos ao
Pai pedindo
que nos
livrasse do
mal. Ora,
qual o
grande mal
do qual
precisamos
nos livrar?
Se nos
lembrarmos
da doutrina
de Agostinho
sobre o mal
e
aprofundarmos
nosso
entendimento
com o ensino
dos
Espíritos,
fica
evidente que
o mal é algo
que nos põe
em falta em
relação a
Deus, algo
que nos
permite
fazer coisas
e ter ideias
contrárias
às Suas
soberanas
leis. Ora,
qual é a mãe
de todos os
erros senão
a
ignorância?
Quando
rezamos o
Pai Nosso,
concluímos
pedindo a
Deus que nos
livre do
mal.
Entendamos,
pois, que ao
dizermos
isso,
estamos, na
verdade,
pedindo a
Deus que nos
livre da
ignorância e
das
consequências
da
ignorância,
seja da
nossa
ignorância,
seja da de
outrem cujos
efeitos nos
atinjam.
3.
CONCLUSÃO
Livrar-nos-emos
do mal
instruindo-nos
e praticando
a caridade
cristã. O
estudo nos
permitirá
discernir o
que está em
concordância
com as leis
de Deus e o
que não
está,
ensinando-nos
como agir em
cada
circunstância
para sempre
fazermos a
escolha
certa,
ficando do
lado do bem.
O exercício
da caridade
moral
colocará em
prática o
que
aprendemos,
fazendo de
nós
instrumentos
para
diminuir a
ignorância
no mundo e
suas tristes
consequências,
tão nossas
conhecidas,
pavimentando
o caminho
para o mundo
de
regeneração
que tanto
almejamos.
(1) O erro está
em pretender-se
que a alma haja
saído perfeita
das mãos do
Criador, quando
este, ao
contrário, quis
que a perfeição
resultasse da
depuração
gradual do
Espírito e fosse
obra sua. Houve
Deus por bem que
a alma, dotada
de
livre-arbítrio,
pudesse optar
entre o bem e o
mal e chegasse a
suas finalidades
últimas de forma
militante e
resistindo ao
mal. Se houvera
criado a alma
tão perfeita
quanto ele e, ao
sair-lhe ela das
mãos, a houvesse
associado à sua
beatitude
eterna, Deus
tê-la-ia feito,
não à sua
imagem, mas
semelhante a si
próprio. (Bonnamy,
A Razão do
Espiritismo,
cap. VI.)
Referências:
1. COSTA,
Renato. Adão
e Eva. In
Revista
Internacional de
Espiritismo,
outubro de 2004.
2. KARDEC,
Allan. A
Gênese, os
Milagres e as
Predições
segundo o
Espiritismo.
36. ed. Rio de
Janeiro: FEB,
1995.
3. Id. O
Livro dos
Espíritos.
76. ed. Rio de
Janeiro: FEB,
1995.
4. de LIMA,
Raymundo.
Maniqueísmo:
O Bem, o Mal e
seus Efeitos
Ontem e Hoje.
Revista Espaço
Acadêmico Ano I,
no
07, Dezembro de
2001.
5. SAMPAIO,
Rudini. Santo
Agostinho,
Elementos
Fundamentais de
sua Doutrina.
Obtido em
29/05/2006, de
http://www.ime.usp.br/~rudini/filos.agostinho.htm.