EUGÊNIA PICKINA
eugeniamva@yahoo.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil)
Autovalorização
e
vida humana
É comum observar
pessoas que
recorrem a
subterfúgios
diversos no
anseio de que
estes as
libertem de seu
“complexo de
inferioridade” –
sintoma de uma
frágil
autoestima.
Na verdade, no
lugar de um
olhar punitivo,
o que elas
necessitam é de
um olhar
acolhedor para
se avaliarem e
reavivar a
autoestima,
naturalmente
reunida ao
projeto pessoal
de vida, que
sempre cria,
segundo as
necessidades de
cada um, os
recursos para a
conquista da
autonomia
reflexiva e, por
isso, capaz de
bem assessorar
escolhas e
relacionamentos
– meios que
servem à
evolução do ser
humano.
Qualquer que
seja a área da
vida em que se
localize esta
sensação de
autoinsuficência,
as formas de
agir espelham
mais sobre o
ter/fazer do que
sobre o
ser/valer. Desse
modo, o
sofrimento é
reforçado pela
debilidade do
amor-próprio,
veladamente
nutrido pela
presença do medo
– medo de ser.
Como a cultura
ocidental é uma
cultura
preferencialmente
masculina, os
critérios de
autoapreciação
são, no geral,
baseados na
eficácia, no
controle
produtivo e em
seus resultados
mensuráveis.
Logo, há uma
tendência
sociocultural
que reforça o
desprezo pela
sensibilidade,
afetos e
sentimentos
nascidos da
ordem do
coração,
espontaneamente
enraizados na
dimensão do ser.
Assim, como
ainda nos
encontramos sob
o signo do
androcentrismo
(*), cuja
lógica é
dirigida,
principalmente,
para a produção,
segundo uma
perspectiva
quantitativa (e
não
qualitativa), o
feminino de
nossas
consciências é
reprimido ou
menosprezado. E
isso debilita o
critério do
autoacolhimento
e nos faz
desorientados,
sem oriente,
pois iludidos
pela ânsia de
vantagens,
poder,
discriminação ou
consumo – a
cilada da
dimensão
aquisitiva da
vida, sujeita à
provisoriedade.
Qual o sentido
da vida humana?
Como é o medo
que dirige o
“complexo de
inferioridade”,
ele nos furta a
vontade de
afirmar a vida
em suas
possibilidades
criativas, nos
priva do direito
humano à
sensibilidade e
ao exercício do
autoacolhimento
– práticas
essenciais para
a conquista do
crescimento em
verdade.
Concretamente,
na direção de
uma relação
equilibrada com
a consciência,
na vida
cotidiana, uma
postura humilde
e mansa poderá
nos ajudar a
realizar uma
transformação
comprometida com
o plano de
ser.
Então, à medida
que procuramos
despertar e nos
reconciliar com
a luz que nos
habita, com os
sentimentos
nobres latentes
no coração,
ganhamos
serenidade e
senso de
orientação, pois
passamos a
valorizar a
dimensão do
cuidado com a
vida interior, e
não apenas com a
vida exterior.
Assim, mais e
mais nos
aproximamos das
realidades da
saúde e
libertação, que
criam o
sentimento de
gratidão pela
vida. E estou
pensando aqui o
que Leloup nos
conta sobre a
lição aprendida
de um índio
hopi: “Anda com
mansidão sobre a
terra – ela é
sagrada”. Ouso
complementar:
“anda com
mansidão em
direção a ti
mesmo – és
sagrado”.
O resgate do
senso de
orientação,
gerador de
confiança,
conclama a
capacidade de
acolhimento e,
consequentemente,
um critério
solidário (muito
próprio ao
feminino), e não
discriminatório
(que leva a
comparações
medíocres – para
mais ou para
menos), tomará
espaço no
itinerário de
cada um.
Esse critério
promoverá a
autoaceitação e
a aceitação dos
demais, pois o
amor por si
mesmo não está
separado do amor
pelo outro.
E nessa
benevolente
autotransformação
haverá lugar
para a
assimilação de
saber-se em um
mundo que
necessita
estimular o
múltiplo e as
personalidades
cambiantes, pois
a vida exige o
respeito pelo
direito de cada
individualidade
ser conforme à
luminosidade de
sua biografia,
que é única em
sua expressão
criativa.
(*) O
androcentrismo é
parte da
dominação
patriarcalista,
do homem sobre a
mulher, que
perdura entre
nós desde a
Idade do Cobre
(entre o
Neolítico e a
Idade do Bronze)
e tornou-se
majoritário no
mundo depois da
dominação
colonialista
europeia. O
comportamento
androcêntrico de
quem fala do
“homem” como se
fosse o ser
humano em sua
totalidade é uma
naturalização do
patriarcalismo,
absorvido pela
lógica
capitalista.