EUGÊNIA PICKINA
eugeniamva@yahoo.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil)
Amor e vigília
Perguntaram-me o
segredo de um
relacionamento
feliz escondido
na pergunta:
o amor existe?
Ora, o amor não
é coisa que se
possa capturar e
qualquer
conceito termina
por confiná-lo,
e sem
compreendê-lo.
Penso apenas que
o relacionamento
feliz se torna
possível para o
ser humano de
coração
transformado,
que entrou em
contato com a
paixão e foi
além do fogo e
das cinzas,
mantido aí, pelo
diálogo contínuo
e por uma
abertura para
escutar, na luz
intata, o amor
que insiste
vivo.
Ainda,
ser o que somos
no amor
para permitir
reciprocamente
estar em uma
atitude que é
capaz de acolher
e possibilitar o
cultivo da troca
comum e das
sadias
diferenças.
Cabem, aqui, a
flexibilidade e
o perdão,
evitando a
inteligência
bloqueada pelo
que sabe, pois o
relacionamento
está sempre em
construção,
enraizado na
novidade e no
contexto
maleável do
vir-a-ser.
Com efeito, não
é fácil viver o
amor. Ele não se
entrega à
primeira vista,
não inventa
histórias,
desconcerta os
jogos e os
cansativos
exercícios do
controle, pois
desabrocha no
interior do eu,
na imagem
estruturante que
apela à
qualidade de
consciência,
porque é o
melhor de nós
mesmos...
Casais felizes
encontram em
suas raízes um
ímpeto em
direção ao céu,
pois o encontro,
guiado pela
sintonia
amorosa, tem
necessidade de
ar, de luz...
Por isso,
simplesmente se
empenham em
cuidar da
partilha comum,
estendida nas
curtas e longas
conversas, no
beijo, no toque,
mas também nas
coisas simples,
como a divisão
das tarefas, o
cuidado com os
filhos, a
composição entre
receios e
conquistas, o
mútuo
autoaprimoramento,
as metas, os
sonhos, porque
tudo isso compõe
a intimidade.
Aquele que se
propõe, por
amor, a
partilhar com o
outro a sua
condição de
existente é
sempre um
grande vigilante,
disposto a
prestar atenção,
disponível ao
diálogo e à
escuta,
porquanto é
dessa
concentração que
será extraído o
viver juntos.
Isso não se
trata de
esperança,
porque
o amor nasce de
um encontro.
Seu cultivo,
contudo, depende
da renúncia ao
poder e à
intolerância, ou
seja, necessita
estar inserido
na carência
aceita de nossa
condição de
seres humanos
em devir,
o fundamento da
esperança e da
liberdade. Desse
modo, se fará
possível um
relacionamento
conservado no
Aberto e
não-reduzido a
apetites de
prazer, disputas
ou olhar
endurecido –
efeitos do
egoísmo e do
apego.
É fato: esse
amor exige
coragem,
pressupõe
vontade,
alegria, o sabor
de estar com
alguém que, além
da partilha
cotidiana, faz
evocar o estado
da
aletheia
(=
não-sonolência).
Sim, pois é este
estado de
vigília que gera
para o casal
crescimento e
felicidade,
dando
profundidade à
vida.