CHRISTINA NUNES
cfqsda@yahoo.com.br
Rio de Janeiro,
RJ (Brasil)
O
que fica...
Quando alguém
conhecido parte,
é comum observar
pessoas apelando
contra o que
denominam
sentimentalismo
barato, e a
tendência
observável,
nalguns casos,
de se santificar
quem reputam
mero ser humano
comum,
distanciado da
perfeição, e que
apenas partiu,
não se achando
mais entre nós.
Convido os
leitores e
amigos a um
ângulo da
situação
diferente. O
ângulo
facilmente
acessível
quando, para com
quem foi,
guardamos no
íntimo cálido
sentimento de
ternura, de amor
ou de amizade.
Falo com base no
fato de que o
amor faz
diferença na
percepção das
coisas e
situações. É,
pois, perigosa a
comparação muito
em voga entre as
expressões dos
sentimentos
genuínos com o
que se
convencionou
denominar
"sentimentalismo
barato". Há algo
a se enfatizar
aí, porque, na
ausência da
nobreza dos
nossos melhores
sentimentos - e
não de algo que,
antes de ser
sentimento,
encobre
demagogia,
falsidade,
dissimulação -,
o mundo, está
visto, não
chegará a lugar
nenhum digno, e
nem a nada de
bom.
As recordações
evocam ocasiões
várias, em que
tive meu marido
doente sob
suspeita de
moléstia grave,
e graças a Deus
não confirmada.
Despedidas de
amigos do meio
profissional,
que se foram por
este ou aquele
motivo, ou em
busca de novos
rumos, deixando
saudades quanto
sincera
melancolia. E,
recentemente, o
episódio de
outra amiga de
trabalho que, em
nos deixando
cedo demais sob
a nossa ótica
distanciada da
devida
compreensão dos
misteriosos
desígnios de
Deus, lançou-nos
a todos, que lhe
eram próximos no
dia-a-dia, em
abrupto estado
de consternação
e tristeza.
É a partir disso
tudo que lhes
asseguro,
amigos: nenhum
dos sentimentos
experimentados
nestas variadas
ocasiões
refletia o tal
"sentimentalismo
crasso". Sem
embargo, o que
expressamos em
tais momentos,
do nosso ângulo
particular de
percepção, fora
autêntico, fora
sincero! E nada
teve a ver com
qualquer
intenção de
"santificar quem
nada mais era do
que um ser
humano que se
afastou, ou
esteve a ponto
disso". De modo
algum!
Em todos estes
casos, e noutros
mais,
semelhantes, o
que significou
para as nossas
considerações
foi o que de bom
ficou de cada
uma destas
pessoas
queridas. Porque
assomaram à tona
sobre tudo mais,
cristalinas,
insuperáveis em
importância, as
boas lembranças
de cada momento
vivido com cada
um deles. As
eventuais
alegrias;
instantes
descontraídos;
troca de ideias
e de
aprendizado.
Horas de labor
mútuo, do
compartilhamento
de importantes
vivências e de
impressões sobre
a vida.
Autêntica quão
deliciosa
terapia!
Os lances
pitorescos do
cotidiano de
cada um.
Novidades,
episódios
ríspidos, e, a
partir deles, a
impagável troca
de
solidariedade.
Palavras de
incentivo.
Piadas, atitudes
carinhosas.
Festejos,
passeios
compartilhados.
Vida em comum. A
Vida comum - a
eles, a nós, a
tudo e a todos
os que nos
cercam!...
E evocar e
valorizar estes
repertórios
únicos,
particularizados,
como justo
pretexto das
boas lembranças
de cada qual que
nos deixa,
caros, não é, de
forma alguma,
"santificar quem
está longe da
perfeição". É –
por amor,
carinho ou
amizade –
colocar, acima
de tudo o mais,
apenas o que
vale a pena. O
que ficou para
nós, de belo, de
valioso, de cada
um destes
personagens com
que Deus
presenteia a
nossa
trajetória.
A alegria e o
bom humor de um;
o sorriso largo,
o otimismo de
outra; o perfil
terno, os gestos
generosos, a
integridade e
dignidade na
lide com as
minúcias
rotineiras.
Simples,
prazeroso,
enternecedor
assim! É, pois,
o que arranca
lágrimas de
nossos olhos e
palavras
enaltecedoras
para aqueles que
nos deixaram,
pelo menos
transitoriamente.
As expressões
justas de
saudades de quem
vai, da parte de
quem fica.
Saudades daquilo
de muito bom
que, nascido de
cada um deles,
passou a habitar
para sempre os
nossos corações
e sentimentos. E
gratidão, por
toda esta
preciosa herança
que, e na maior
parte das vezes
sem plena
consciência
disso, nos
legaram, para a
nossa melhoria
íntima, para o
nosso
enriquecimento
como seres em
trajetória -
acrescidos, aqui
e ali, com a
lição dos
sorrisos de um,
da abnegação de
outros, da
ternura de
tantos mais...,
como sementes
germinando nas
terras férteis
de nossos
jardins pessoais
do futuro!
De resto, são
estas nuances,
muita vez
despercebidas,
tudo quanto
trazemos para
oferecer a este
mundo, onde
estagiamos em
permanência
fugaz. E de onde
partiremos em
dia
insuspeitado,
levando conosco,
como saldo
positivo, justo,
este algo a mais
adquirido no
aprendizado com
tantos que
compartilharam a
nossa
trajetória; e
que, adicionado
à nossa essência
a conta de
inestimável
tesouro nascido
destes a quem
muito estimamos,
em nós mesmos
germina, viceja
e floresce,
presenteando de
futuro os
incessantes
caminhos da
Vida!
E isto é, mesmo,
e a qualquer
tempo, tudo o
que fica!...