ASTOLFO O. DE OLIVEIRA
FILHO
aoofilho@oconsolador.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil)
A Revue Spirite
de 1866
Allan Kardec
(Parte
7)
Continuamos a apresentar
o
estudo da Revue
Spirite
correspondente ao ano de
1866. O texto condensado
do volume citado será
aqui apresentado em 16
partes, com base na
tradução de Júlio Abreu
Filho publicada pela EDICEL.
Questões preliminares
A. Pode um Espírito
acompanhar, lúcido, o
sepultamento do seu
corpo?
Sim. Foi o que ocorreu
com o Espírito do Dr.
Cailleux, que o povo
francês chamava de
“médico dos pobres”. Na
segunda comunicação que
ele transmitiu após sua
desencarnação, disse não
ter demorado a voltar da
emoção que se segue à
morte, o que lhe
permitiu acompanhar,
perfeitamente lúcido, o
sepultamento de seu
corpo. (Revue Spirite
de 1866, pp. 148 a 151.)
B. A prece recebe de
Deus a atenção devida?
Sim, desde que pura e
desinteressada e seja
útil o seu atendimento,
a prece recebe sempre do
Criador a atenção
necessária. Coisa
diferente se dá com os
pedidos fúteis ou
inconsiderados. No
primeiro caso, os
Espíritos executores da
vontade do Pai são então
encarregados de provocar
as circunstâncias que
devem conduzir ao
resultado almejado. Como
quase sempre esse
resultado requer o
concurso de um
encarnado, os Espíritos
inspiram os que devem
nele cooperar. Não
existe, pois, o acaso
nem na assistência que
se recebe, nem nas
desgraças que se
experimentam. Desse
modo, quando alguém,
após receber uma ajuda
inesperada, exclama: “É
a Providência que a
envia”, diz uma verdade
maior do que geralmente
supõe, embora o Pai faça
com que os meios de ação
não se afastem das leis
gerais e a assistência
dos Espíritos não se
torne tão evidente a
ponto de levar os homens
a negligenciarem o
próprio esforço.
(Obra citada, pp. 153 a
156.)
C. Há alguma ligação
entre o Espiritismo e o
Cristianismo?
Sim. Segundo os
Espíritos, o Espiritismo
não é senão a aplicação
verdadeira dos
princípios de moral
ensinada por Jesus e foi
com o objetivo de
fazê-la por todos
compreendida que Deus
permite as manifestações
dos Espíritos. Ele vem,
portanto, como o
Cristianismo bem
compreendido, mostrar ao
homem a absoluta
necessidade de sua
renovação interior.
(Obra citada, pp. 156 a
159.)
Texto para leitura
79. O Espírito de Baluze,
que foi ilustre
historiógrafo nascido em
Tulle em 1630 e morto em
Paris em 1718,
reporta-se numa
comunicação às práticas
supersticiosas que ainda
se mantinham em uso na
região onde vivera e
afirma, com convicção,
que a doutrina espírita
é a única que pode mudar
o espírito das
populações chafurdadas
na ignorância,
arrancando-as à pressão
absurda dos que ignoram
as grandes leis da
erraticidade e querem
imobilizar a crença
humana num dédalo em que
eles próprios se
enredam. (Págs. 141 a
144.)
80. A Revue
noticia a morte do Dr.
Cailleux, médico e
presidente do Grupo
Espírita de
Montreuil-Sur-Mer,
ocorrida em abril de
1866. Considerado pelo
povo o “médico dos
pobres”, o falecimento
do Dr. Cailleux
consternou toda a
cidade, como prova a
participação de perto de
três mil pessoas em seus
funerais. O devotamento
do notável médico e o
respeito que a população
lhe votava não impediram
que o clero da cidade
lhe recusasse sepultura
eclesiástica, e isto por
um único motivo: o fato
de o Dr. Cailleux ser
espírita. (P. 144 a
148.)
81. Logo em seguida à
reportagem, a Revue
transcreve duas
comunicações
transmitidas pelo
Espírito do Dr. Cailleux.
Na primeira, obtida no
Grupo de Montreuil, ele
pede aos seus colegas
que perseverem em seus
propósitos até a morte,
ligando-se uns aos
outros pelos laços da
caridade, da
benevolência e da
submissão, porque essa é
a melhor maneira de
colher frutos abundantes
e doces. Na segunda
comunicação, dada na
Sociedade de Paris, o
médico disse não ter
demorado a voltar da
emoção que se segue à
morte, o que lhe
permitiu acompanhar,
perfeitamente lúcido, o
sepultamento de seu
corpo. (Págs. 148 a
150.)
82. Ciente da posição
tomada pelo clero com
relação ao seu funeral,
Dr. Cailleux afirmou:
“Perdoo a todos os que,
de um ou de outro modo,
julgaram fazer-me o mal;
quanto aos que se
recusaram a orar por mim
no templo consagrado,
serei mais caridoso que
a caridade que pregam:
oro por eles. É assim
que se deve fazer, meus
bons irmãos em crença”.
“Crede-me, e perdoai aos
que lutam contra vós,
pois não sabem o que
fazem.” (Págs. 150 e
151.)
83. Em 23 de abril de
1866, o Espírito do Dr.
Demeure, valendo-se das
faculdades mediúnicas do
Sr. Desliens, alertou o
Codificador para a
necessidade de cuidar da
própria saúde e
recomendou-lhe repouso,
esclarecendo que as
forças humanas possuem
limites que ele
infringia, movido pelo
desejo de ver progredir
o ensino. Essa atitude
era evidentemente
errônea porque, agindo
assim, não apressaria a
marcha da doutrina e
arruinaria a própria
saúde. Kardec ouviu-o,
mas alegou que havia
ainda mais de quinhentas
cartas a responder e não
sabia como atendê-las.
Dr. Demeure recomendou
que, como se diz em
linguagem comercial, as
cartas fossem levadas em
bloco à conta de lucros
e perdas e que se
publicasse sobre isso um
aviso na Revue,
para que todos se
inteirassem da medida e
a compreendessem. O
Codificador parece ter
aceitado o conselho.
(Págs. 151 a 153.)
84. Duas comunicações
mediúnicas recebidas na
Sociedade de Paris no
mês de abril de 1866
encerram o número de
maio. Na primeira,
analisando o tema prece,
um Espírito protetor faz
oportunas observações,
adiante resumidas: I –
Há quem imagine,
erroneamente, que o que
pedimos na prece deve
realizar-se por uma
espécie de milagre,
enquanto outros pensam
que, não sendo o pedido
acolhido da maneira que
se espera, a prece é
inútil. II – Deus,
evidentemente, não
altera em caso algum o
curso das leis que regem
o universo, mas para
atender à prece não é
preciso derrogar ou
modificar suas leis. III
– Obviamente, nenhuma
atenção é dada pelo Pai
aos pedidos fúteis ou
inconsiderados, mas a
prece pura e
desinteressada é sempre
escutada. IV – Quando a
prece é justa e útil o
seu atendimento, ela
recebe do Criador a
atenção devida. Os
Espíritos executores de
sua vontade são então
encarregados de provocar
as circunstâncias que
devem conduzir ao
resultado almejado. Como
quase sempre esse
resultado requer o
concurso de um
encarnado, os Espíritos
inspiram os que devem
nele cooperar. V – Não
existe, assim, acaso nem
na assistência que se
recebe, nem nas
desgraças que se
experimentam. VI – Nas
aflições, a prece não só
é uma prova de confiança
e de submissão à vontade
de Deus, mas tem por
efeito estabelecer uma
corrente fluídica que
leva longe, no espaço, o
pensamento do aflito.
VII – Esse pensamento
repercute nos corações
simpáticos ao sofrimento
e estes, como atraídos
por um poder magnético,
dirigem-se para o lugar
onde sua presença pode
ser útil. VIII – Deus
poderia socorrer
diretamente a pessoa que
ora, mas quer que os
homens pratiquem a
caridade, socorrendo-se
uns aos outros. Desse
modo, quando alguém,
após receber uma ajuda
inesperada, exclama: “É
a Providência que a
envia”, diz uma verdade
maior do que geralmente
supõe, embora o Pai faça
com que os meios de ação
não se afastem das leis
gerais e a assistência
dos Espíritos não se
torne tão evidente a
ponto de levar os homens
a negligenciarem o
próprio esforço.
(Págs. 153 a 156.)
85. Na comunicação
seguinte, sobre os
deveres do espírita, o
Espírito de Luís de
França tece, entre
outras, as seguintes
considerações: I – O
Espiritismo é uma
ciência essencialmente
moral. Os que se dizem
espíritas não podem,
pois, sem cometer uma
grave inconsequência,
subtrair-se às
obrigações que impõe. II
– Essas obrigações são
de duas sortes. A
primeira concerne ao
indivíduo que, ajudado
pelas claridades que a
doutrina espalha, pode
compreender melhor o
valor de seus atos e a
infinita bondade de
Deus. Não se compreende
que o homem esclarecido
quanto aos seus deveres
para com Deus e seus
irmãos continue cúpido,
egoísta e orgulhoso. Um
indivíduo assim só é
espírita de nome. III –
A segunda ordem de
obrigação do espírita,
que decorre da primeira
e a completa, é a do
exemplo, que é o melhor
dos meios de propagação
e de renovação. Disso
advém a obrigação moral
que tem o espírita de
conformar sua conduta à
sua crença e ser um
exemplo vivo, um modelo,
como o Cristo o foi para
a humanidade. IV – O
Espiritismo não é senão
a aplicação verdadeira
dos princípios de moral
ensinada por Jesus. Foi
com o objetivo de
fazê-la por todos
compreendida que Deus
permite as manifestações
dos Espíritos. Ele vem,
portanto, como o
Cristianismo bem
compreendido, mostrar ao
homem a absoluta
necessidade de sua
renovação interior. V –
Nenhuma emanação
fluídica, boa ou má,
escapa do coração ou do
cérebro do homem sem
deixar um sinal em
qualquer parte. A
Balança da Justiça
divina não é senão
uma figura que exprime
que cada um de nossos
atos, cada um dos nossos
sentimentos é, de certo
modo, o peso que carrega
a alma e a impede de se
elevar, ou o que traz o
equilíbrio entre o bem e
o mal. VI – As
obrigações impostas pelo
Espiritismo são, pois,
de natureza
essencialmente moral;
são uma consequência da
crença; cada um é juiz e
parte em sua própria
causa; mas as claridades
intelectuais que traz a
quem realmente quer
conhecer-se a si mesmo
e trabalhar por
melhorar-se são tais,
que amedrontam os
pusilânimes, e por isto
é ele rejeitado por
tanta gente. VII –
Outras pessoas tratam de
conciliar a reforma de
que necessitam com as
exigências da sociedade,
do que resulta uma
mistura heterogênea, uma
falta de unidade, que
faz da época atual um
estado transitório. VIII
– Se a vida de um adepto
da doutrina espírita for
um belo modelo em que
cada um possa achar bons
exemplos e sólidas
virtudes, e onde a
dignidade se alie a uma
graciosa amenidade, pode
tal confrade
rejubilar-se porque
terá, em parte,
compreendido as
obrigações que o
Espiritismo assinala aos
seus verdadeiros
adeptos. (Págs. 156 a
159.)
86. Extraído do jornal
Salut Public, de
Lyon, a Revue
refere o caso de um
criança de 4 anos e
meio, filha de honestos
operários de seda,
domiciliados em
Guillotière, que
parecia carregar no
último grau o instinto
do incêndio. Aos dezoito
meses sentia prazer em
acender fósforos; aos
dois anos punha fogo nos
quatro cantos de um
enxergão e dias antes
tentou incendiar a
alcova onde dormem seus
pais. Depois de examinar
as diversas teorias
relativas à existência
da alma e ao momento de
sua criação, Kardec
assevera que é na
preexistência da alma
que se encontra a única
solução possível do caso
e de todas as anomalias
aparentes das faculdades
humanas. As crianças que
têm instintivamente
aptidões transcendentes
para uma arte ou uma
ciência, devem ter
aprendido essas coisas
em algum lugar. Se não
foi nesta existência,
deve ter sido em outra.
Dá-se o mesmo com o
progresso moral. Os
vícios de que se desfez
não aparecem mais; os
que conservou se
reproduzem, até que
deles se corrija
definitivamente. O homem
nasce, pois, tal qual se
fez a si próprio.
(Págs. 161 a 164.)
87. Que se pode dizer do
menino incendiário?
Certamente ele nasceu
com tal instinto porque
foi incendiário em outra
existência. Se esse
instinto se manifesta de
maneira tão precoce, é
para cedo chamar a
atenção para as suas
tendências, a fim de que
os pais e os
responsáveis por sua
educação procurem
reprimi-las antes que se
desenvolvam. Talvez ele
mesmo tenha pedido que
assim se desse e que
nascesse numa família
honrada, pelo desejo de
progredir. (Págs. 164
e 165.)
88. Tendo sido o fato
apresentado à Sociedade
Espírita de Paris,
quatro comunicações,
concordantes entre si,
foram recebidas, das
quais a Revue
publica duas. Eis de
forma sucinta o que os
Espíritos informaram: I
– O passado da aludida
criança tinha sido,
efetivamente, horrível.
Suas tendências atuais
diziam bem quem foi seu
Espírito, que
reencarnara para expiar
e, desse modo, lutar
contra seus instintos
incendiários. II – O
conhecimento do
Espiritismo seria um
poderoso auxílio para
seus pais, que não
sabiam ainda como
reprimir essa funesta
inclinação. III – Os
sábios da Terra se
enganam quando tratam
casos dessa natureza
como se fossem um gênero
de loucura. As
inclinações perversas do
menino eram, antes que
uma doença, um reflexo
de seus atos anteriores.
IV – Além disso, era ele
impulsionado por suas
vítimas desencarnadas,
porquanto, para
satisfazer sua ambição,
ele não recuou diante do
incêndio, sacrificando
os que lhe podiam, no
passado, ser obstáculo.
V – A criança estava,
pois, sob a influência
de Espíritos que não lhe
perdoaram os tormentos
que os fizeram sofrer e,
por isso, se vingavam.
VI – Deus, em sua
soberana justiça, pôs
ali o remédio ao lado do
mal. O remédio estava em
sua tenra idade e na boa
influência do meio em
que se achava. Era
preciso, porém, fosse
ele educado nos
princípios do
Espiritismo, em que
colheria a força e,
compreendendo a sua
prova, teria mais
vontade para triunfar.
(Págs. 165 a 167.)
89. Diversos
ensinamentos resultaram
do estudo feito por
Kardec a propósito de
uma tentativa de
assassinato de que fora
vítima o czar Alexandre
da Rússia. No momento do
atentado, um jovem
camponês chamado Joseph
Kommissaroff interveio e
evitou que o crime fosse
consumado. Certos
indícios precursores do
crime foram mencionados
por um jornal belga. Um
deles teria sido a
notícia de que o
Espírito de Catarina II
houvera avisado numa
sessão espírita
realizada em Heildelberg
que o imperador estava
ameaçado de um grande
perigo. (Págs. 167 e
168.)
90. Kardec analisa o
fato e faz interessantes
observações sobre a
intervenção da
Providência nos
acontecimentos de nossa
vida, as quais
procuramos sintetizar
nos itens que se seguem:
I – Muitos atribuirão ao
acaso o surgimento do
jovem camponês na cena
do crime. O acaso,
porém, não existe. Como
a hora do czar não havia
chegado, o moço foi
escolhido para impedir a
realização do crime,
pois as coisas que
parecem efeito do acaso
estavam combinadas para
levar ao resultado
esperado. II – Os homens
são os instrumentos
inconscientes dos
desígnios da Providência
e é por eles que ela os
realiza, sem haver
necessidade de recorrer
para tanto a prodígios.
III – Se o jovem
Kommissaroff tivesse
resistido ao impulso
recebido dos Espíritos,
estes se valeriam de
outros meios para
frustrar o crime e
preservar a vida do
czar. IV – Uma mosca
poderia picar a mão do
assassino e desviá-la do
seu objetivo; uma
corrente fluídica
dirigida sobre seus
olhos poderia ofuscá-lo
e assim por diante. Mas,
se tivesse soado a hora
fatal para o imperador
russo, nada poderia
preservá-lo. (Págs.
168 e 169.)(Continua no próximo
número.)