LEDA MARIA
FLABOREA
ledaflaborea@uol.com.br
São Paulo, SP
(Brasil)
Em
torno da palavra falada
“Porque não há coisa
oculta que não haja de
manifestar-se, nem
escondida que não haja
de saber-se e vir à luz.
Vede, pois, como ouvis”.
– Jesus ¹ (Lc, 8:17-18.)
Em todos os lugares
surgem pessoas que
abusam da palavra,
porque, ainda, temos
dificuldade em controlar
nossa língua. A palavra
tem força e uma vez
tendo sido dita, não
será possível apagá-la.
Entretanto, o falar não
pode ser dissociado do
ouvir. São duas
faculdades que se
completam, porque são
interdependentes entre
si. Se é importante o
cuidado com o quê e como
dizemos as coisas,
também o é com o quê e
como ouvimos aquilo que
nos é dito. A palavra é
forte fio condutor, tem
força, e uma vez dita
não poderemos mais
conter-lhe o caminho,
porque na outra ponta
desse fio está o
receptor, o ouvinte e,
por isso mesmo, ela pode
ser captada e espalhada
como bálsamo ou veneno,
paz ou discórdia, luz ou
treva. Se de um lado
temos quem fala, do
outro surge quem escuta,
ambos responsáveis por
suas atitudes. Por isso
disse Jesus que o homem
fala do que está repleto
o seu coração. E quem
ouve também.
Quando atentos,
observando as pessoas ao
nosso redor, poderemos
perceber que dentro do
nosso lar, ou mesmo fora
dele, escutamos os mais
variados comentários
acerca de tudo e de
todos. São comuns as
discussões sobre o que
acontece com a Natureza,
sobretudo em uma época
em que estamos acordando
para a necessidade de
preservá-la; comentários
sobre os atos, fatos e
boatos em torno das
autoridades
constituídas;
observações sobre a vida
alheia – pública ou
privada –,
esquecendo-se de que a
vida do outro, como a
própria palavra diz, é
do outro, e não nossa;
escutamos opiniões
diferentes, coerentes ou
descabidas, sobre os
mais diversos assuntos,
sejam eles na esfera da
ciência, da política, da
filosofia, da arte ou da
religião.
Todavia, podemos, ainda,
observar que não é
somente no campo
intelectual que surgem
descalabros,
desequilíbrios, ao lado
de colocações ponderadas
e lúcidas. A própria
sociedade é um
verdadeiro campo de
batalha nesse aspecto.
De um lado, temos
Espíritos nobres
semeando bem e luz e, de
outro, os semeadores da
discórdia, da
maledicência, da
calúnia, perturbando a
harmonia e o progresso
de todos e de tudo.
O Apóstolo Paulo nos
recorda, em sua carta a
Tito, Capítulo 2,
versículo 1, que devemos
falar para o bem em
atendimento à
recomendação de Jesus, e
para termos os ouvidos
atentos àqueles que nos
falam. Porque, muitas
vezes, seremos chamados
a falar nas mais
diferentes situações:
entre os bons, para
falarmos do bem, do
belo, do amor; entre os
maus, tentados a
caluniar, a julgar
levianamente, destacando
a maledicência como foco
nas conversações. Assim,
de desastre em desastre,
vamos criando, em torno
dos próprios passos,
todas as desventuras que
formos construindo no
nosso caminhar, pois
falamos hoje e pagamos a
conta amanhã. Isso é da
lei. Semeadura e
colheita. Dependência
perene... Resultado das
nossas escolhas...
Mas, se já possuímos
algum conhecimento
evangélico e se não
desconhecemos os valores
do Espírito, precisamos
ficar atentos para não
usarmos o verbo,
contrariamente, às
orientações de Jesus.
Falar o que o outro quer
ouvir é fácil.
Replicar-lhe o
argumento, atendendo aos
nossos interesses,
também, não é difícil.
Mas, ouvir-lhe com
paciência e entendimento
e falar-lhe com “a
prudência amorosa e com
a tolerância educativa,
como convém à sã
doutrina do Mestre, é
tarefa complexa e
enobrecedora, que
requisita a ciência do
bem no coração e o
entendimento evangélico
dos raciocínios”. ²
De tudo isso, podemos
concluir que o problema
não está no comentário
em si – quem fala
responderá pelas
consequências que
provocar –, mas na forma
como o recebemos, tendo
em vista que reagiremos
a ele de acordo com
nosso entendimento e
sentimento. Por isso se
faz tão importante
compreender a nossa
postura diante desse
fato: Como estamos
respondendo ao que
ouvimos? Estaremos
convertendo-o no bem ou
no mal? Estamos
espalhando, em
consequência daquilo que
escutamos, alegria ou
sofrimento para aqueles
que estão junto de nós?
Ouvimos com malícia ou
caridade?
A resposta honesta e
transparente a essas
questões é que nos dará
a correta medida de como
e o quanto estamos
evoluindo, espiritual e
moralmente, nesta nossa
jornada planetária, no
campo das relações
interpessoais.
Emmanuel lembra que
precisamos aprender “a
lubrificar as
engrenagens da audição
com o óleo do amor puro,
a fim de que nossa
língua traduza o idioma
da compreensão e da
paciência, do otimismo e
da caridade, porque nem
sempre o nosso
julgamento é o
julgamento da Lei Divina
e, conforme asseverou o
Cristo de Deus, não há
propósito oculto ou
atividade
transitoriamente
escondida que não hajam
de vir à luz”. ³
Porém, como não dá para
fazer tudo de uma só
vez, a proposta é a que,
num primeiro momento,
aprendamos a controlar a
língua para, depois,
modificarmos a recepção
do que ouvirmos, em
atendimento ao convite
de Jesus: caridade no
ouvir, caridade no
falar.
Consoante a essa
recomendação do Amado
Mestre, Irmão X, pela
psicografia de Francisco
Cândido Xavier, narra
uma pequena história com
o título Os Três
Crivos, que
transcrevemos. Diz-nos
ele:
Certa feita, um homem
esbaforido achegou-se a
Sócrates e sussurrou-lhe
aos ouvidos:
– Escuta, na condição de
teu amigo, tenho alguma
coisa muito grave para
dizer-te, em
particular...
– Espera!... – juntou o
sábio prudente. Já
passaste o que vais me
dizer pelos três crivos?
– Três crivos? –
perguntou o visitante,
espantado.
– Sim, meu caro amigo,
três crivos. Observemos
se tua confidência
passou por eles. O
primeiro é o crivo da
verdade. Guardas
absoluta certeza, quanto
aquilo que pretendes
comunicar?
– Bem – ponderou o
interlocutor –,
assegurar mesmo, não
posso... Mas ouvi dizer
e... então...
– Exato. Decerto
peneiraste o assunto
pelo segundo crivo, o da
bondade. Ainda que não
seja real o que julgas
saber, será pelo menos
bom o que me queres
contar?
– Hesitando, o homem
replicou:
– Isso não... Muito pelo
contrário...
– Ah! – tornou o sábio –
então recorramos ao
terceiro crivo, o da
utilidade, e notemos o
proveito do que tanto te
aflige.
– Útil?!... – aduziu o
visitante ainda agitado
– Útil não é...
– Bem – rematou o
filósofo num sorriso –,
se o que tens a
confirmar não é
verdadeiro, nem bom e
nem útil, esqueçamos o
problema e não te
preocupes com ele, já
que nada valem casos sem
edificação para nós...
Aí está, meu amigo, a
lição de Sócrates, em
questão de
maledicência...
Bibliografia:
1 –
LUCAS, 8:17-18.
2 –
EMMANUEL (Espírito).
Vinha de Luz,
[psicografado por] F. C.
Xavier – 14ª ed. FEB –
RIO DE JANEIRO/RJ -
lição 16.
3 – Id.
Palavras de Vida
Eterna,
[psicografado por] F.C.
Xavier – 20ª ed., CEC
Edições – UBERABA/MG -
pg. 122.