MARCELO
MARCONDES SENEDA
marcelo.seneda@gmail.com
Londrina, Paraná
(Brasil)
Aborto, direito
da mulher?
Escrevo para
sugerir uma
profunda
reflexão sobre
um argumento frequentemente
utilizado pelos
defensores do
aborto: o direito da mulher sobre
seu corpo. Toda
a preocupação em
relação aos
direitos da mulher é
muito justa e
importante, e
creio ser este direito algo
inalienável.
Certamente a mulher tem
seu direito.
Mas esse direito,
por mais
respeitável,
termina onde
começa o direito alheio,
pois o direito à
vida é algo
inquestionável
para todos os
indivíduos,
garantido pela
Constituição e
livre de
quaisquer
condições.
A constituição
orgânica de um
indivíduo está
definida a
partir da
fecundação.
Deste momento em
diante, pelo
princípio da
continuidade do
evento
biológico, são
estabelecidas
todas as
características
de uma nova
pessoa. A fase
fetal é uma das
etapas do ciclo
biológico comum
a todas as
pessoas. Todos
nós em atual
atividade
orgânica, já
passamos da fase
fetal, da fase
infantil e assim
por diante. A
fase fetal é um
contexto
temporário do
nosso atual
corpo. Assim,
compreende-se
claramente: o
feto não é uma
parte do corpo
da mulher,
assim como nós
adultos não
somos parte do
corpo de nossas
mães. O feto
apresenta sua
própria gestão
orgânica:
fígado, rins,
coração, pulmões
etc. Há apenas
uma dependência
temporária da
constituição
física da mãe.
Há uma
dependência qual
a do
recém-nascido,
de um idoso, um
enfermo, todos
podem ser
amplamente
dependentes de
outro indivíduo.
E obviamente é
inquestionável
o direito à
vida de um bebê
e de um idoso.
Portanto, o fato
de depender de
outro ser não
gera direito de
se eliminar a
vida do
dependente, seja
ele um bebê, um
enfermo, um
feto.
Em termos
evolutivos, o
modelo de
reprodução dos
mamíferos passa,
obrigatoriamente,
pela gestação no
organismo
feminino.
Gostemos ou não,
a formação de um
indivíduo dá-se
através do corpo
da mulher.
A mulher
tem o direito de
prevenir a
presença de um
novo indivíduo
em seu corpo,
pelos métodos
contraceptivos.
Mas, em havendo
a presença de
outro organismo,
o corpo da mulher deve
ser tão
respeitado
quanto o corpo
desse indivíduo
em formação.
Descriminalizar
o aborto
significa dizer
que apoiamos a
pena de morte
para um
determinado
grupo de
indivíduos,
aqueles na fase
inicial de
desenvolvimento.
Representa uma
prerrogativa
para se propor a
morte para
qualquer outra
categoria da
sociedade, pois
o direito à
vida dos
indivíduos já
existe desde a
fase fetal. Há
um agravante: na
fase fetal, o
indivíduo está
privado de se
expressar
livremente.
Portanto, propor
sua eliminação
se torna uma
situação
totalmente
contrária aos
princípios da
ética de
qualquer
sociedade
realmente
evoluída.
Além disso, é
inquestionável o
contexto de se
relativizar o
evento
intitulado
‘‘vida’’, quando
autorizamos a
‘‘morte’’, em
quaisquer
condições. Para
tratar do tema
com a devida
atenção,
aproveito o
ensejo e
pergunto: O que
é a vida? O que
é a morte? Qual
o sentido da
existência
humana? Qual a
razão do
sofrimento? Como
explicar a
extensa
diversidade
entre os
indivíduos?
Temos refletido
suficientemente
sobre essas
questões?
Podemos
respondê-las com
segurança e
serenidade?
Nos países onde
há essa
‘‘relativização’’
da vida, os
problemas
deslocaram-se
para um âmbito
muito mais
crítico e
complexo. No
Canadá, o aborto
é liberado. Esse
contexto de
banalização da
vida torna a
questão do
suicídio um
problema de
grandes
proporções, a
ponto das
escolas
primárias
desenvolverem
amplos programas
de valorização
da vida. Mas
como pregar um
discurso, se a
prática é outra?
Na Holanda, além
do aborto,
existe a
‘‘eutanásia
neonatal’’, ou
seja, os pais
podem optar pela
eliminação de
seus filhos após
o nascimento,
quando por
alguma razão
estão
descontentes com
o organismo dos
mesmos.
Refletindo sobre
tais questões,
recordo-me de
Madre Teresa de
Calcutá: ‘‘O
aborto provocado
é a maior
barbárie contra
a paz do mundo,
porque se uma
mãe é capaz de
matar seu
próprio filho, o
que pode evitar
que nos matemos
uns aos
outros?’’.
MARCELO
MARCONDES SENEDA
é professor da
Universidade
Estadual de
Londrina com
doutorado em
Biotecnologia da
Reprodução e
pós-doutorado em
Epigenética de
Gametas, pela
McGill
University.