A Revue Spirite
de 1867
Allan Kardec
(Parte
12)
Continuamos a apresentar
o
estudo da Revue
Spirite
correspondente ao ano de
1867. O texto condensado
do volume citado será
aqui apresentado em 16
partes, com base na
tradução de Júlio Abreu
Filho publicada pela EDICEL.
Questões preliminares
A. Que é que o Sr.
Jacob, famoso médium
curador contemporâneo de
Kardec, dizia a respeito
das curas que fazia?
Primeiramente, o Sr.
Jacob dizia que não
podia curar todas as
pessoas e jamais afirmou
que tal ou tal doença
seria curável, visto
que, pelo fato de curar
uma pessoa de tal
enfermidade, não se
segue que pudesse curar
a mesma doença em outras
pessoas, porquanto as
condições fluídicas,
segundo ele, não eram
mais as mesmas.
(Revue Spirite de 1867,
pp. 312 a 317.)
B. Que lições transmitiu
o Abade Príncipe de
Hohenlohe (Espírito)
sobre o sofrimento e
suas causas?
O Espírito do conhecido
Abade, cujas curas o
tornaram famoso na
Europa, comunicou-se em
Paris em março de 1867,
ocasião em que fez
importantes
considerações acerca da
mediunidade de cura.
Acerca do sofrimento que
acomete os enfermos,
disse que ele tem quase
constantemente uma causa
mórbida imaterial que
reside no estado moral
do Espírito. Assim, se o
médium curador só ataca
o efeito, e a causa
primeira persiste, o
efeito pode
reproduzir-se, quer sob
a forma primordial, quer
sob qualquer outra
aparência. Aí está uma
das razões pelas quais
tal doença, subitamente
curada pela influência
de um médium, reaparece
com todos os seus
acidentes, desde que a
influência benéfica se
afaste. Para evitar
essas recidivas, é
preciso que o remédio
espiritual ataque o mal
em sua base, como o
fluido material o
destrói em seus efeitos:
numa palavra, é preciso
tratar ao mesmo tempo o
corpo e a alma.
(Obra citada, pp. 317 e
318.)
C. O Espiritismo admite
o acaso?
Não. Reportando-se a uma
carta recebida do Sr.
Bonnemère, Kardec foi
bastante claro: o
Espiritismo não admite o
acaso nem o sobrenatural
nos acontecimentos da
vida. Fora, pois,
intencionalmente que os
documentos citados pelo
Sr. Bonnemère lhe haviam
chegado às mãos, porque
nas mãos do jovem bretão
teriam, com certeza,
ficado perdidos. Era
preciso que alguém se
encarregasse de os tirar
da obscuridade. Ao Sr.
Bonnemère, sugere o
Codificador, coube essa
missão.
(Obra citada, pág. 335.)
Texto para leitura
150. A
Revue transcreve
reportagem publicada no
Tour du monde, a
respeito das curas
realizadas por um
curador tripolitano de
nome Hassan, que curava
usando o isqueiro e
outras fórmulas que
eram, na realidade,
meros acessórios da
faculdade curadora de
que ele era dotado. O
assunto foi tema de uma
comunicação mediúnica
assinada por Clélie
Duplantier, obtida na
Sociedade de Paris a 23
de fevereiro de 1867, na
qual o Espírito diz que,
no exercício da
mediunidade curadora,
podem apresentar-se dois
casos distintos: ou o
médium é curador por sua
própria vontade, ou é o
agente, mais ou menos
passivo, de um motor
extracorporal. (Págs.
308 a 311.)
151. No primeiro caso,
só poderá agir se suas
virtudes e sua força
moral assim permitirem.
O Cristo é a
personificação suprema
do curador e exemplo
clássico desse grupo.
Quanto ao curador que é
apenas médium, sendo
tão-somente um
instrumento, pode ser
mais ou menos defeituoso
e os atos operados por
seu intermédio não o
impedem de ser
imperfeito, egoísta ou
orgulhoso. Constitui
sinal de bondade da
Providência permitir que
essas faculdades se
desenvolvam em meios e
em pessoas imperfeitas.
É um meio de lhes dar a
fé que, mais cedo ou
mais tarde, as conduzirá
ao bem. “Não são os que
têm saúde que precisam
de médico”, afirmou
Jesus. (Pág. 311.)
152. Num longo artigo
sobre o Sr. Jacob,
famoso médium curador
contemporâneo de Kardec,
a Revue reuniu
sobre as atividades do
músico zuavo as
seguintes informações: I
– As sessões realizadas
pelo Sr. Jacob estão
suspensas; era, por
isso, inútil ir ao lugar
onde elas se davam, na
rua de la Roquette, em
Paris. II – O motivo da
suspensão foi o
excessivo ajuntamento de
pessoas, que dificultava
a circulação numa rua
muito frequentada e
ocupada por grande
número de industriais,
que se viam impedidos em
seus negócios. III – O
Sr. Jacob não cura todo
o mundo, como ele mesmo
expressamente declara;
só quando está diante do
doente é que julga da
ação fluídica e vê o
resultado. IV – O Sr.
Jacob não atende
convites para ir a
outras cidades, nem
mediante indenização de
suas despesas de viagem.
Não podendo previamente
responder pelos
resultados, ele
considera uma
indelicadeza induzir
pessoas em despesas sem
certeza, mesmo porque,
em casos de êxito, isso
favoreceria a crítica. V
– Ele também não cura
por correspondência, nem
diz que doenças são
curáveis, porque pelo
fato de curar uma pessoa
de tal enfermidade não
se segue que cure a
mesma doença em outras
pessoas, visto que as
condições fluídicas não
são mais as mesmas. VI –
As notícias sobre as
curas obtidas pelo Sr.
Jacob em Paris tiveram
ampla cobertura dos
jornais, o que fez com
que em quarenta e oito
horas toda a França se
inteirasse da novidade.
VII – Passado o primeiro
momento de surpresa, os
adversários do
Espiritismo, quando
viram que o Sr. Jacob
era paciente e de humor
pacífico, começaram a
atacá-lo. VIII – Ante as
curas, os espíritas são
os que testemunham menos
surpresa, porque sabem
qual é o mecanismo da
mediunidade curadora. Os
que ignoram a causa do
fenômeno fazem inúmeras
perguntas e há mesmo os
que indagam se teríamos
voltado aos tempos dos
milagres. (Págs. 312
a 317.)
153. Em três
comunicações sucessivas
transmitidas em março de
1867 na Sociedade
Espírita de Paris, o
Abade Príncipe de
Hohenlohe (Espírito) faz
importantes
considerações acerca da
mediunidade de cura.
Extraímos da primeira
delas os pontos que se
seguem: I – Todo o mundo
possui mais ou menos a
faculdade curadora, e se
cada um quisesse
consagrar-se seriamente
ao estudo dessa
faculdade, muitos
médiuns que se ignoram
poderiam prestar úteis
serviços a seus irmãos.
II – Restabelecer a
saúde material é o
menor dos serviços que a
faculdade curadora está
chamada a prestar. III –
A faculdade curadora tem
missão mais nobre e mais
extensa. Se pode dar aos
corpos o vigor da saúde,
pode também dar às almas
toda a pureza de que são
suscetíveis, e é somente
neste caso que poderá
ser chamada curativa,
no sentido absoluto da
palavra. IV – O aparente
efeito material, o
sofrimento, tem quase
constantemente uma causa
mórbida imaterial que
reside no estado moral
do Espírito. Se o médium
curador só ataca o
efeito, e a causa
primeira persiste, o
efeito pode
reproduzir-se, quer sob
a forma primordial, quer
sob qualquer outra
aparência. V – Aí está
uma das razões pelas
quais tal doença,
subitamente curada pela
influência de um médium,
reaparece com todos os
seus acidentes, desde
que a influência
benéfica se afaste. VI –
Para evitar essas
recidivas, é preciso que
o remédio espiritual
ataque o mal em sua
base, como o fluido
material o destrói em
seus efeitos: numa
palavra, é preciso
tratar ao mesmo tempo o
corpo e a alma. VII –
Para ser bom médium
curador, é preciso que o
corpo esteja apto a
servir de canal aos
fluidos materiais
reparadores e que o
Espírito possua uma
força moral que não pode
adquirir senão por seu
próprio melhoramento.
VIII – Para ser médium
curador há, então, que
se preparar para isto,
não só pela prece, mas
pela depuração de sua
alma, a fim de tratar
fisicamente o corpo
pelos meios físicos e de
influenciar a alma pela
força moral. IX – Na
questão de saúde moral
há doentes por toda a
parte e o dever do
médico é ir a toda a
parte onde o seu socorro
é necessário. Devemos,
pois, atender não
somente os pobres, mas
todos os que necessitem
de atendimento,
independentemente de sua
condição social.
(Págs. 317 e 318.)
154. Na segunda
comunicação, o Príncipe
de Hohenlohe reafirma
seu conselho de que o
tratamento moral e o
tratamento físico dos
doentes devem fundir-se
em um só, aditando os
motivos por que tal
providência se impõe. A
mediunidade curadora
pode, pois, comportar
várias formas: A) Pode
compreender unicamente o
alívio material dos
doentes e se dirige,
então, aos encarnados.
B) Pode compreender a
melhora moral dos
indivíduos e, neste
caso, se dirige tanto
aos Espíritos quanto aos
homens. C) Pode
compreender o
melhoramento moral e o
alívio material e, neste
caso, tanto a causa
quanto o efeito poderão
ser combatidos
vitoriosamente. “A
mediunidade curadora
abarca, assim e ao mesmo
tempo, a saúde moral e a
saúde física, o mundo
dos encarnados e o mundo
dos Espíritos”,
asseverou o instrutor
espiritual. (Pág.
319.)
155. Da terceira
comunicação transmitida
pelo Príncipe de
Hohenlohe apresentamos,
de forma resumida, os
pontos que se seguem: I
– Conforme o estado de
nossa alma e as aptidões
do nosso organismo,
podemos, com a permissão
de Deus, tanto curar as
dores físicas quanto os
sofrimentos morais, ou
ambos. II – Nossas
dúvidas a esse respeito
provêm de nossas
imperfeições; mas Deus
não pede a perfeição, a
pureza absoluta dos
homens. Deus pede é que
nos melhoremos, que
façamos esforços
constantes para nos
purificarmos, e leva em
conta nossa boa vontade.
III – Desde que
desejemos seriamente
aliviar nossos irmãos,
tenhamos confiança e
esperemos que o Senhor
nos conceda esse favor.
IV – Atendamos a todos
os doentes, sem fazer
acepção de pessoas;
todos, sejam ricos ou
pobres, crentes ou
incrédulos, bons ou
maus, têm direito ao
socorro. V – Não nos
magoemos pelas recusas
que encontrarmos. VI -
Melhoremo-nos pela
prece, pelo amor do
Senhor e de nossos
irmãos e não duvidemos
da assistência que o
Todo-Poderoso nos dará
no exercício de nossa
faculdade. (Págs. 320
e 321.)
156. No dia 16 de
agosto, na Sociedade de
Paris, o Sr. Morin, em
estado de sonambulismo
espontâneo, transmitiu
uma sucessão de
mensagens. A cada
interlocutor que se
apresentava, o médium
mudava de tom, de
atitude, de expressão,
de fisionomia, e pela
linguagem se reconhecia
o Espírito que falava,
antes que fosse nomeado.
Depois de cada alocução,
o médium ficava absorto
durante alguns minutos;
era o tempo de
substituição de um
Espírito por outro.
(Pág. 321.)
157. Eis os pontos mais
relevantes extraídos das
comunicações
transmitidas na sessão
citada: I – A morte nada
é. O atordoamento
sobrevém, segue-se um
esgotamento e ergo-me
mais livre e feliz ao
entrar neste mundo
invisível, que minha
alma havia pressentido.
Vi, observei, e minha
alegria delirante não
era temperada senão pelo
exagerado pesar dos
meus. Mas hoje, que lhes
pude provar a minha
existência, sou feliz,
muito feliz. (Leclerc.)
II – Para a alma que
aspira à liberdade, como
é longo o tempo na
terra... Mas, também,
uma vez partido o laço,
com que rapidez o
Espírito corre e voa
para o reino celeste,
que em vida via em
sonhos e ao qual
aspirava sem cessar!
Agora não mais espero
visitas dos que me são
caros: vou visitá-los.
(Ernestine Dozon.)
III – Obrigado por vosso
perdão sincero, obrigado
por vossas preces, pelo
interesse que me
prodigalizastes e que
abreviaram os meus
sofrimentos! (D.)
IV – Assisto aos vossos
trabalhos com uma
felicidade muito grande.
Observo, estudo e posso
ver os fluidos que em
vão tinha procurado
perceber em vida. E
nessas moléculas
fluídicas, átomos
impalpáveis, distingo as
diferentes forças
propulsoras. Reúno,
aglomero os fluidos
simpáticos e vou,
gratuitamente,
despejá-los sobre os que
deles necessitam. (E.
Quinemant.) V – A
despeito de todo o ardor
até aqui empregado, no
meio de vós e por vossos
inimigos, contra as
vossas boas intenções,
vossa falange foi a mais
forte e, se o mal fez
algumas vítimas, é que a
lepra já existia nelas.
(São Luís.) VI –
O cólera fere de novo a
humanidade; seus efeitos
são prontos e sua ação
rápida. Sem nenhum
aviso, o homem passa da
vida à morte. Esse
flagelo destruidor é
simplesmente um dos
meios para ativar a
renovação humanitária,
que se deve realizar.
Mas não vos inquieteis:
morrer é renascer. (Doutor
Demeure.) (Págs.
321 a 326.)
158. Em carta dirigida a
Kardec, o Sr. Bonnemère
revela pormenores
relacionados com a
origem da obra Roman
de l’Avenir -
Romance do Futuro -,
focalizado anteriormente
pela Revue. O
escritor confirma que,
ao escrever o livro, não
conhecia o Espiritismo e
não possuía nenhuma obra
sobre as questões
tratadas no romance. O
médium bretão – o
verdadeiro responsável
pelo livro – foi quem
lhe forneceu os
originais e explicou as
condições em que os
recebeu. “Quando devo
servir de instrumento a
algum dos amigos
desaparecidos, seu nome
ressoa em meu ouvido”,
disse-lhe o jovem
bretão. “Se for um
romance que devo
escrever, para começar
me vem o título, depois
vêm os acontecimentos;
às vezes é questão de um
ou dois dias para o
compor inteirinho.”
(Págs. 327 a 329.)
159. Bonnemère
argumenta, relativamente
à origem mediúnica do
livro: “Se um indivíduo
que jamais abriu um
livro de medicina
escreve, sem ter
consciência disso,
remédios que podem
curar, em muitos casos,
a maioria dos males
atualmente considerados
incuráveis, parece-me
incontestável que tais
coisas lhe são reveladas
por uma força
desconhecida e
misteriosa”. E, bastante
seguro de si, conclui
assim a carta: “Aqui
pode haver um mistério,
mas afirmo que não há
mistificação. Se sou
mistificado,
restar-me-ão sempre os
cento e tantos romances
e novelas desse
romancista sem o saber,
cuja publicação vai
ocupar agradavelmente os
lazeres dos últimos anos
de minha vida, e dos
quais deixarei a maior
parte para outros depois
de mim”. (Págs. 331 e
332.)
160. Comentando o caso,
Kardec recorda que
existem médiuns
inconscientes e
médiuns conscientes.
A primeira categoria, à
qual pertence o jovem
bretão citado pelo Sr.
Bonnemère, é a mais
numerosa e quase geral,
a ponto de se poder
dizer que em 100 pessoas
90 são dotados dessa
aptidão em graus mais ou
menos ostensivos. O
Romance do Futuro
era, sem dúvida, uma
obra mediúnica do jovem
bretão e o Sr. Bonnemère
agiu corretamente por
ter declinado a sua
paternidade. (Pág.
333.)
161. Um único reparo é
feito por Kardec à carta
do Sr. Bonnemère: quando
ele se felicita pelo
acaso que lhe pôs em
mãos os documentos
fornecidos pelo médium
bretão. O Espiritismo
não admite o acaso nem o
sobrenatural nos
acontecimentos da vida.
Foi, pois,
intencionalmente que
aqueles documentos lhe
haviam chegado, porque
nas mãos do jovem bretão
teriam, com certeza,
ficado perdidos. Era
preciso que alguém se
encarregasse de os tirar
da obscuridade. Ao Sr.
Bonnemère, sugere o
Codificador, coube essa
missão. (Pág. 335.)
162. Finalizando sua
análise, Kardec lembra
que o objetivo
providencial da
manifestação dos
Espíritos é atestar a
sua existência, provar
ao homem que nem tudo
acaba para ele com a
vida corporal e
instruí-lo sobre sua
condição futura.
(Pág. 336.)
163. A
Revue reproduz
notícia sobre o cura
Gassner, publicada no
jornal L’Exposition
populaire illustrée.
Nascido em 1727,
Jean-Joseph Gassner,
após quinze anos de sua
ordenação sacerdotal,
revelou-se ao mundo como
dotado de um poder
excepcional: o de curar
as doenças pela simples
aposição das mãos, sem
empregar nenhum remédio
nem exigir remuneração.
O corpo médico ergueu-se
contra ele, e também
alguns bispos da Igreja
assim agiram.
Constrangido a
submeter-se a um
inquérito determinado
pelo bispo de Constança,
Gassner disse que as
doenças podiam ser
divididas em três
grupos: 1) doenças
naturais ou lesões. 2)
doenças de obsessões. 3)
doenças complicadas de
obsessões. Gassner
morreu em 1779, aos 52
anos de idade. (Págs.
336 e 337.)
164. Em artigo publicado
em seguida, a Revue
refere diversos
fatos concernentes a
pressentimentos e
prognósticos extraídos
da reportagem sobre o
cura Gassner. (Págs.
338 a 342.) (Continua no próximo
número.)