Entrevista:
Maria Geny
Barbosa
Seu caminhar
lento e decidido
conforta à sua
passagem
Uma breve
história da
médium mineira
cujos conselhos
e palavras de
conforto são
bálsamos que têm
minimizado as
dores de todos
os que atendeu e
vem atendendo ao
longo da vida
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Maria Geny
Barbosa
(foto), 81
anos, natural
de Ubá (MG),
radicada em Juiz
de Fora, é nossa
entrevistada da
semana. Pessoa
ímpar em sua
pureza e
simplicidade,
que nos emociona
ao toque do seu
olhar, seu
sorriso, seu
abraço apertado
e o seu
inconfundível
“Meu filho, como
está? Fazendo
coisa boa pra
nós?, D.
Geny é uma
daquelas
trabalhadoras de
Jesus que jamais
será esquecida
por aqueles que
a conheceram.
Encontrar-se com
ela é o mesmo
que ser
abençoado por
mãos de luzes
que só sabem
fazer o bem. Eu
a conheci 14
anos atrás e
jamais me
separei dela.
Impossível estar
distante, deixar
de ouvir suas
palavras
simples,
diretas e
profundas
e seus
ensinamen- |
tos que valem
para toda a vida.
|
Ela nos recebeu
numa tarde
chuvosa em sua
residência, na
Rua Joana D’Arc,
no bairro Santa
Cruz, em Juiz de
Fora. Que
história
fantástica de
vida! Pessoa de
descendência
pobre, lutou
como pôde para
criar os doze
filhos. Sua
mediunidade
aflorou quando
perdeu um dos
filhos que
desencarnou
afogado, com um
ano e cinco
meses de idade.
Sua história
mediúnica
iniciou-se ali.
Atordoada pela
morte do filho,
foi acolhida
pelo Sr. Mateus
Fernandes Fraga,
que realizava
trabalhos de
cura na Fazenda
Velha que ficava
perto do Rio
Paraopeba, em
Sobral Pinto,
próximo a
Astolfo Dutra,
Minas Gerais.
Melhor deixar
que ela mesma
nos conte:
“Era noite e o
meu filho não
aparecia. No céu
começavam a
aparecer as
primeiras
estrelas. Saí
procurando por
ele; uma voz me
disse: –
Volte que seu
filho está na
água. Levei
muito susto.
Fiquei
alucinada.
Encontraram meu
filho e eu o
agarrei. Uma
senhora começou
a tirá-lo de mim
para arrumá-lo.
Estava morto. No
terreiro havia
dez homens, eu
os joguei no
chão”.
E como foi a
sequência
daquele momento
triste?
Na minha casa
tinha um catre,
uma cama velha
que ganhei da
minha mãe.
Deitei-me nela e
fiquei dez dias
fora do corpo.
Eu saí do corpo,
mas ninguém
entendia de
Espiritismo.
Todas as manhãs
vinha uma
fazendeira fazer
meu enterro.
Quando chegava,
via que meus
sinais vitais
respondiam, que
tinha pulso, e
voltava para
casa. No final
dos dez dias
acordei e
comecei a
colocar as mãos
na parede, olhei
para o meu
marido e não o
reconheci. Olhei
meus filhos e
não os
reconheci.
Levantei-me e
sai correndo e
gritando.
Gritava tão alto
que assustava os
vizinhos.
Quais foram as
providências que
seu marido e
vizinhos
tomaram?
Fiquei
completamente
louca. Minha mãe
foi embora. Um
dia, apareceram
umas seis
pessoas lá em
casa e me
disseram: –
Da. Geny, viemos
convidá-la para
um passeio.
Eu peguei de um
cabo de vassoura
e só não matei
um deles porque
meu marido
segurou o cabo.
Então eu disse
que não iria
porque não
penteava o
cabelo nem usava
roupa. Eles
disseram que não
tinha
importância.
Aquelas pessoas
faziam uma
espécie de Culto
no Lar.
Disseram-me que
estavam ali para
me ajudar, que
eu era bonita.
E o que a
senhora fez?
Então resolvi ir
com eles para a
fazenda. No
final da
primeira sessão,
o Sr. Mateus
disse para o meu
marido que ele
teria que me
levar de novo lá
senão a obsessão
iria retornar.
Eu disse para
ele: – O
senhor não sabe
nada. Se
soubesse de
alguma coisa
teria me curado.
Seu Mateus
olhava e sorria.
E o sorriso do
Sr. Mateus
conseguiu
cativá-la?
Com o tempo
comecei a voltar
por mim própria.
Eu não sabia ler
nem escrever;
então o Sr.
Mateus me disse:
– Não tem
importância.
Tudo o que você
vir você nos
fala. Então
eu disse que no
telhado daquele
salão estava
cheio de
Espíritos
doentes, pessoas
sem braços,
amarradas,
rostos torcidos,
uma dor muito
grande. Ele me
disse que tudo
aquilo iria
melhorar, que o
Padre Antônio
Vieira iria
catequizá-los.
A senhora se
lembra do seu
primeiro
atendimento
mediúnico?
Um dia, chegou
um senhor
vestindo um
terno de linho,
coisa que eu não
conhecia na
época. Era o meu
quarto dia de
trabalho.
Naquela época eu
não sabia o que
era um Espírito
sair do corpo.
Fiquei caída na
cadeira por meia
hora mais ou
menos. Em
espírito fui a
uma cidade muito
grande. Havia um
passeio grande e
subi numa bolha.
Depois fiquei
sabendo que era
elevador. Tinha
uma placa azul e
um número em
vermelho: 222.
Entrei naquela
casa e fui a um
quarto. Lá
estava uma
senhora deitada
e amarrada na
cama com colchas
e lençóis. Ao
lado dela, duas
outras senhoras
tomavam conta,
e, nos pés, um
Espírito
estranho
vestindo uma
túnica de
veludo. Aquelas
senhoras estavam
rezando. Havia
casa em cima de
casa. Depois
entendi que era
um prédio de
apartamentos.
Aquele homem de
terno começou a
se assustar.
Seu Mateus,
então, conversou
com ele: –
Isto é seu? Este
assunto tem a
ver com você?
– Sim. Eu
moro no Rio de
Janeiro e o
número 222 é o
da minha casa.
Minha esposa
está amarrada na
cama porque teve
um filho e a
hemorragia não
para. O médico
aconselhou que a
deixássemos
imobilizada para
evitar maiores
problemas. Ela
está assim há 12
dias. Ela não
pode fazer muito
exercício. As
mulheres que
estão a seu lado
são minha mãe e
minha sogra.
Tomam conta
dela.
Quatro dias
depois recebemos
um telegrama
daquele senhor
dizendo que a
mulher já estava
bem melhor e já
havia se
levantado.
Dezoito dias
depois ela mesma
foi à fazenda.
Estava curada.
Este foi o meu
primeiro
atendimento.
Estava com vinte
e três anos de
idade e não
conhecia nada de
Espiritismo.
Fale-nos sobre a
visita do Sr.
Mateus Fraga ao
Chico Xavier.
Um dia o Sr.
Mateus e a
esposa dele
foram a Pedro
Leopoldo visitar
o Chico Xavier,
e o Chico então
disse a eles:
- Você tem em
seu trabalho uma
médium muito
boa.
O Sr. Mateus
Fraga estudava.
Eu não sabia
estudar. Só
usava minha
mediunidade para
ajudar as
pessoas.
A senhora
visitou o Chico
Xavier?
Sim. Três vezes
em Uberaba. Na
primeira, fui me
aconselhar com
ele sobre minha
mediunidade. Na
segunda vez que
fui, aconteceu
que eu fui
chamada para
participar da
mesa de
trabalhos e o
Chico colocou
três livros na
frente de cada
médium para que
eles os lessem.
Só que eu não
sei ler nem
escrever. Então
falei para ele e
ele me disse: –
Tem
importância não,
minha irmã. Há
muitos Espíritos
aí do seu lado
para ler para
você.
E lá estavam:
Scheila, André
Luiz e Dr.
Bezerra de
Menezes, entre
muitos outros
Espíritos, ao
lado dele.
Então, eles
leram para mim.
Naquela
oportunidade
visitei o
Hospital do Fogo
Selvagem e vi o
trabalho enorme
que era feito
ali. Na terceira
vez, participei
com ele e o
Divaldo Franco
de uma tarde de
estudos à sombra
do abacateiro.
Divaldo fez uma
palestra
emocionante e
Chico me olhava,
sorria e acenava
com as mãos.
E sua vida
pessoal, como
era naquela
época?
Vivia com muita
dificuldade. As
camas das
crianças eram
feitas de
caixotes com
colchão de
palha. Eu vestia
roupa de saco.
Não tinha
dinheiro para
comprar uma de
chita e por isso
não ia às
missas. Eu
começava a
trabalhar com o
Sr. Mateus às
seis da tarde e
ia até as cinco
da manhã. Quando
chegava, meu
marido estava
saindo para
trabalhar e eu
chegando para
cuidar da casa e
dos filhos.
Naquela época
não conhecia
remédios para
evitar filhos,
de forma que eu
tinha um a cada
um ano e oito
meses,
aproximadamente.
Vieram doze. Não
conhecia o que
era menstruação.
Nunca tinha ido
a um médico.
E como a senhora
ganhava seus
filhos? Alguém a
ajudava?
Eu ganhava meus
filhos no pasto.
Eu e meu marido
fazíamos os
partos. Nunca
tive uma
parteira.
Amamentava
durante um ano
cada filho e
depois comecei a
fazer partos em
toda aquela
região, fiz uns
sessenta mais ou
menos, e nunca
tive problemas
com nenhum
deles.
Mesmo ganhando
os filhos, os
trabalhos
mediúnicos
continuavam na
fazenda?
Sim. Nunca
parei. Um dia
chegou um senhor
que morava na
cidade de
Tocantins, perto
de Ubá. Ele
estava pedindo
para um familiar
muito doente.
Então eu disse:
– O senhor
pode ir embora,
porque ele já
morreu. Já estão
arrumando-o na
sala para o
velório.
Naquela época eu
não sabia que
não podia falar
assim tão
direto. As
pessoas tinham
que voltar e
muitas vezes
dirigindo, podia
acontecer alguma
coisa na estrada
por causa da
emoção. Um dia
chegou um senhor
de Ubá. Estava
atormentado. Sua
mulher o tinha
abandonado e
seus três filhos
estavam longe.
Ele os queria de
volta, inclusive
a mulher. Então
eu vi um lugar
com luzes
vermelhas
piscando. Na
porta havia um
detetive e lá
dentro muitas
pessoas nuas
dançavam, bebiam
e riam.
Perguntamos
então àquele
homem se ele
frequentava
casas noturnas.
Ele disse que
sim e que o seu
casamento estava
arruinado por
causa daquilo. A
mulher tinha
contratado um
detetive que
confirmou tudo.
Aquelas
vidências
confirmadas
pelas pessoas me
davam forças
para continuar.
Chegavam pessoas
com muitos
problemas de
saúde. Lembro-me
de uma que
chegou com
graves problemas
no estômago. A
espiritualidade
fez a raspagem e
ela vomitou
muitas coisas
estranhas e logo
melhorou.
E os filhos?
Eram muitos,
como cuidava de
todos eles?
Um dia pensei
que tinha que
fazer alguma
coisa por eles.
Eu não queria
que eles
passassem as
dificuldades
pelas quais eu
estava passando.
Era uma vida
muito pobre.
Então resolvi
que daria a eles
condições de
estudar. Era a
única coisa que
podia fazer.
Coloquei-os na
escola, fazia
uniformes de
saco e sacolas
também de saco
para eles
levarem os
materiais.
Estudavam até o
meio-dia e
depois iam
trabalhar na
roça. Eu sempre
pensava: –
Meu Deus, eu
tenho todos
estes filhos e
não tenho nada
para deixar para
eles. A única
coisa que vou
deixar é o
estudo.
E seu marido,
pensava a mesma
coisa?
Meu marido me
perguntava como
seria possível
isto se eles não
tinham nem
uniforme. Então
dizia que ia
tingir as roupas
de saco e ele
achava tudo
muito difícil.
Resolvi fazer
carvão. Fiz um
buraco no chão,
uma chaminé de
lata, lenha,
terra, e no
final da semana
tirava até dez
sacos que vendia
e comprava as
coisas. Comprava
o macarrão e
guardava para
que, quando
minha mãe viesse
me visitar, eu
tivesse o que
oferecer a ela.
Como foi sua
vinda para Juiz
de Fora?
Um dia, meu
filho Walter
veio para Juiz
de Fora
trabalhar de
ascensorista.
Depois vieram
outros, até que
eu também me
mudei para esta
cidade. Fui ao
médico pela
primeira vez aos
trinta e nove
anos de idade.
Achei aqui
muitas pessoas
boas. Muitas
vezes eu tinha
necessidade de
comprar roupas,
material escolar
para as
crianças. Mas
não falava com
ninguém. Atendia
muitas pessoas e
tinha receio que
elas me dessem o
dinheiro. Isto
não é certo.
O sonho de
educar os filhos
continuava
apesar das
dificuldades?
Sim. Comecei a
vender tudo que
tinha para
comprar
cadernos, lápis
e os materiais
escolares
necessários.
Posso dizer que
Jesus abriu as
portas para mim
nesta cidade. Um
dia meu filho
Antônio me disse
que não podia ir
à aula porque
não tinha o
livro necessário
e a professora
havia dito que
sem o livro ele
não entraria.
Então, eu disse:
– Você vai
entrar, sim.
Eu tinha uma
bacia de cobre.
Nela dava banho
nos meus filhos.
Na minha casa
daqui, no Manoel
Honório, tinha
chuveiro; então
eu não precisava
mais da bacia.
Peguei-a e fui a
um ferro velho e
perguntei ao
dono quanto ele
me dava por ela.
Ele me ofereceu
quatro mil réis.
Aceitei logo. Eu
não entendia
direito o valor
das coisas
materiais.
Aquele dinheiro
fez muita
fartura. Comprei
o livro, mais
cadernos e lápis
para os outros
filhos e todos
foram estudar. E
eu dizia para
eles: – A
única coisa que
sua mãe tem para
oferecer para
vocês é este
estudo.
Aos poucos, com
certeza, as
coisas se
ajeitaram, não é
mesmo?
Enquanto
estudavam,
trabalhavam,
ganhavam
descontos das
escolas e eu
também
trabalhava.
Todos os meus
filhos estudaram
à noite e
trabalharam
durante o dia.
Hoje são todos
formados e cada
um cuida da sua
família. A Célia
estava com seis
anos quando
começou a
estudar. Foi uma
imensa alegria
para mim.
oHoHo-çlkfsçlsçljgçsldjlçsfFoi
Hoje ela
é a responsável
pela creche que
cuida de mais de
noventa crianças
cujos pais vivem
com muitas
dificuldades. As
crianças ficam
em tempo
integral e têm
cinco
alimentações
diárias e são
felizes estando
na creche que
construímos e
mantemos com a
ajuda de muitos.
Também fazemos
várias promoções
durante o ano e
as pessoas
participam e,
com isto, nos
ajudam muito.
Depois eu me
mudei para Santa
Cruz e fui morar
numa casa que é
nossa.
Em Juiz de Fora
os trabalhos
mediúnicos
continuaram sem
interrupções?
Sim. Conheci
várias pessoas
que passaram a
trabalhar
conosco. Depois
apareceu o
terreno para
construir o
Centro Espírita
no bairro Santa
Cruz. Não tinha
o dinheiro todo
para comprá-lo.
Alguns
companheiros
ajudaram e então
construímos o
Centro. Hoje
temos reuniões
públicas às 3as.
e 5as. e, nas
2as., de quinze
em quinze dias,
outras reuniões
de estudos na
2ª., 4ª. e
sexta-feira. O
estudo da
mocidade
funciona aos
sábados às 17
horas e a
evangelização da
criança às
quintas-feiras,
às 18 horas. Não
conheço outro
Centro Espírita,
apenas o nosso.
Não conheço
outro trabalho,
apenas o que
realizamos aqui
em nome de
Deus.
D. Geny, a
senhora está
feliz? Sente-se
realizada?
Eu tenho muita
alegria de
trabalhar. Não
importa a hora
que vou sair do
Centro. Procuro
atender a todos
que me procuram.
A creche foi
mais a
realização de um
sonho. Tenho
outro que é o de
criar um abrigo
para idosos.
Acho que não vou
conseguir. Mas
Jesus sabe que
tudo o que
posso, eu faço.
Minha vida foi
de muita
dificuldade, mas
estou muito
feliz. Realizei
o que devia ser
realizado. Meu
marido e três
filhos já estão
na
espiritualidade,
os outros estão
aqui comigo.
Tenho meus netos
que me enchem de
alegria. Sempre
que possível nos
reunimos e
fazemos aquela
festa gostosa.
Sabemos que você
foi e continua
sendo muito
ligada a Chico
Xavier, Ruy
Barbosa e Padre
Antônio Vieira.
Fale-nos sobre
eles.
Chico Xavier e
Ruy Barbosa são
Espíritos que
amo e respeito.
Ruy Barbosa é o
advogado dos
pobres e Chico
Xavier, a
mensagem de luz
que ilumina a
todos. Mateus
Fraga me disse
um dia lá na
fazenda que,
quando eu
construísse um
Centro Espírita,
colocasse o nome
do Padre Antônio
Vieira. Assim,
nossa
instituição se
chama:
Associação
Espírita Padre
Antônio Vieira.
Aquele Espírito
catequizador
está conosco
ajudando a todos
os necessitados
que nos
procuram. Nossa
instituição foi
inaugurada no
dia 29 de agosto
de 1985, no dia
do aniversário
do Dr. Bezerra
de Menezes.
Todos os anos,
no dia 29 de
agosto, fazemos
uma noite
especial em
homenagem àquele
Espírito maior
que também nos
auxilia muito.
Que pena, minha
querida irmã,
que o espaço
acabou. Deixe
para nós uma
mensagem final.
Eu digo a todos
que busquem suas
espiritualidades.
Há muito
sofrimento na
Terra. Os
Espíritos de luz
precisam de
trabalhadores
que possam
ajudá-los a
curar, a
transformar
tristezas em
alegrias, dores
em curas,
infelicidades em
felicidades
permanentes.
Estudem,
trabalhem,
pratiquem os
ensinamentos do
Mestre Maior,
Jesus.