A Revue Spirite
de 1868
Allan Kardec
(Parte
4)
Continuamos a apresentar
o
estudo da Revue
Spirite
correspondente ao ano de
1868. O texto condensado
do volume citado será
aqui apresentado com base na
tradução de Júlio Abreu
Filho publicada pela EDICEL.
Questões preliminares
A. Que se deve entender
por estas palavras: fim
do mundo?
Segundo o Espiritismo,
por fim do mundo devemos
entender o fim do mundo
da superstição, do
despotismo, dos abusos;
o fim do mundo egoísta e
orgulhoso, do
pauperismo, de tudo o
que é vil e que rebaixa
o homem; numa palavra,
de todos os sentimentos
baixos e cúpidos, que
são o triste apanágio de
nosso mundo. Entre o
velho mundo e o novo não
haverá, porém, solução
de continuidade.
(Revue Spirite de 1868,
pp. 114 a 116.)
B. O Espírito modifica
no mundo espiritual as
ideias que nutria quando
encarnado?
Sim. Os fatos espíritas
confirmam três grandes
princípios revelados
pelo Espiritismo: 1o
– Que a alma conserva no
mundo espiritual, por um
tempo mais ou menos
longo, as ideias e os
preconceitos que tinha
na vida terrestre. 2o
– Que ela se modifica,
progride e adquire novos
conhecimentos no mundo
dos Espíritos. 3o
– Que os encarnados
podem contribuir para o
progresso dos Espíritos
desencarnados. Em face
disso, progredindo o
Espírito fora da
encarnação, disso
resulta que, ao voltar à
Terra, ele traz o
produto do que adquiriu
nas existências
anteriores e no estado
de erraticidade. É assim
que se realiza o
progresso das gerações.
(Obra citada, pp. 141 e
142.)
C. O Espiritismo ensina
que é preciso esperar,
amar, perdoar. É preciso
esperar o quê? Perdoar a
quem? Amar a quem?
Numa reunião íntima de
família, manifestou-se
um médico distinto,
morto há pouco e que, em
vida, fizera abertamente
profissão do mais
absoluto materialismo. O
médico fez diversas
perguntas, que foram
respondidas por outro
Espírito, que assinou
Sainte Victoire. A
primeira pergunta do
médico foi: “O
Espiritismo me ensina
que é preciso esperar,
amar, perdoar; eu faria
tudo isto se soubesse
como me haver para
começar. É preciso
esperar o quê? Perdoar o
quê e a quem? Amar a
quem?” A resposta foi
bem clara: “Há que
esperar na misericórdia
de Deus, que é infinita;
há que perdoar aos que
vos ofenderam; há que
amar ao próximo como a
si mesmo; há que amar a
Deus, a fim de que Deus
vos ame e vos perdoe; há
que orar e lhe render
graças por todas as suas
bondades, por todas as
vossas misérias, porque
miséria e bondade, tudo
nos vem dele, isto é,
tudo nos vem dele
conforme o que tenhamos
merecido”.
(Obra citada, pp. 142 e
143.)
Texto para leitura
43. Tendo sido o assunto
comentado na Sociedade
Espírita de Paris, o
Espírito de Jobard deu
espontaneamente a 28 de
fevereiro uma
comunicação
esclarecedora, de que
extraímos as observações
que se seguem: I – O fim
do mundo está, sim,
próximo; mas, o fim de
que mundo? II – Será o
fim do mundo da
superstição, do
despotismo, dos abusos;
será o fim do mundo
egoísta e orgulhoso, do
pauperismo, de tudo o
que é vil e que rebaixa
o homem; numa palavra,
de todos os sentimentos
baixos e cúpidos, que
são o triste apanágio do
vosso mundo. III – Se
refletirmos em tudo o
que se passa em volta de
vós, vereis que esses
sinais precursores são o
sinal de começo de um
novo mundo, quero dizer
de um outro mundo moral,
antes que a destruição
do mundo material. IV –
Sim, um período de
depuração terrestre
termina neste momento;
um outro vai começar...
Tudo concorre para o fim
do velho mundo, e os que
se esforçam por
sustê-lo, trabalham, sem
o querer, para a sua
destruição. V – Sim, o
fim do mundo está
próximo para eles que o
pressentem e, por isso,
se apavoram. Entre o
velho mundo e o novo não
haverá, porém, solução
de continuidade. VI – É
assim que se deve
entender o fim do mundo,
que tantos sinais
precursores pressagiam.
(Págs. 114 a 116.)
44. Um dos
correspondentes da
Revue relatou a
Kardec o fato seguinte.
O padre de certa
localidade, tendo sabido
que uma de suas
paroquianas tinha em seu
poder O Livro dos
Espíritos, foi à sua
casa e, depois de
ofendê-la e ameaçá-la,
tomou-lhe o livro e
levou-o. Dias depois,
sem se abalar com os
impropérios recebidos, a
senhora foi à casa
paroquial reclamar o
livro, dizendo de si
para consigo que, caso
ele não o devolvesse,
não seria difícil
adquirir outro. O cura
restituiu-lhe a obra,
mas num estado que
provava que uma santa
cólera se havia
descarregado sobre ela.
O livro estava rasurado
e cheio de anotações em
que os Espíritos eram
chamados de mentirosos,
de demônios e de
estúpidos. A fé daquela
mulher, longe de ficar
abalada, foi mais do que
fortificada porque, como
reza o ditado,
apanham-se mais moscas
com mel do que com
vinagre. O sacerdote
apresentou-lhe vinagre;
ela preferiu o mel, e
ainda disse:
“Perdoai-lhe, Senhor,
porque ele não sabe o
que fez”. (Pág. 117.)
45. Cenas desta
natureza, informa o
Codificador, eram muito
frequentes há sete ou
oito anos, e tinham por
vezes um caráter de
violência que caía no
burlesco. Houve certa
vez um missionário que
espumava de raiva
pregando contra o
Espiritismo, e se
agitava com tanto furor
que os fiéis temiam que
ele caísse do púlpito.
Outro pregador convidava
todos os que possuíssem
obras espíritas que as
trouxessem, para fazer
uma fogueira em praça
pública. Um escritor
moderno lamentou há
pouco que não tivessem
queimado Lutero,
pensando que dessa forma
o protestantismo seria
destruído em suas
raízes. Ora, se o
tivessem feito, o
protestantismo talvez
estivesse duas vezes
mais espalhado. João
Huss foi queimado vivo e
que ganhou com isto o
concílio de Constança?
Apenas uma nódoa
indelével, enquanto que
as ideias do mártir não
foram queimadas,
constituindo-se num dos
fundamentos da Reforma.
A posteridade conferiu a
glória a João Huss e a
vergonha ao concílio.
(Págs. 117 a 121.)
46. Desde muito tempo,
diz Kardec, sabia-se que
Cadiz (Espanha) era a
sede de um importante
centro espírita. Mas não
só isto; os espíritas de
Cadiz reivindicam algo
mais: a honra de ter
sido aquela cidade uma
das primeiras, se não a
primeira, na Europa, a
possuir uma reunião
espírita constituída,
que recebia comunicações
regulares dos Espíritos,
pela escrita e pela
tiptologia, sobre temas
de moral e filosofia. Um
livro impresso em Cadiz
em 1854 dá inteira razão
aos confrades espanhóis.
Em seu prefácio se
explica como foram
descobertas as mesas
falantes e a maneira de
as utilizar. O livro
traz, em seguida, o
relato das respostas
dadas a perguntas feitas
aos Espíritos numa série
de sessões realizadas em
1853. O processo
consistia no emprego de
uma mesinha de três pés
e de um alfabeto
dividido em três séries,
correspondendo cada uma
a um dos pés da mesinha.
(Págs. 122 a 126.)
47. Kardec reproduz
vários trechos contidos
no livro, dos quais
extraímos as informações
seguintes: I – Há um
outro modo de nos
comunicarmos com os
Espíritos? – Sim, pelo
pensamento. II – E como
poderíamos nos entender
com o pensamento dos
Espíritos? – Pela
concentração. III – Como
se obtém a felicidade? –
Amando-vos uns aos
outros. IV - Que forma
revestem os Espíritos? –
A forma humana. Há dois
corpos: um material,
outro de luz. V – O
corpo de luz é o
Espírito? – Não; é uma
agregação de éter;
fluidos leves formam o
corpo de luz. VI – Que é
um Espírito? – Um homem
em estado de essência.
VII – Qual o seu
destino? – Organizar o
movimento material
cósmico; cooperar com
Deus para a ordem e nas
leis dos mundos no
universo. VIII – Existem
outros mundos habitados?
– Cada globo do sistema
solar é habitado por uma
humanidade como a vossa.
IX – Por que nem sempre
os Espíritos vêm ao
nosso apelo? – Porque
estão muito ocupados. X
– Como distinguir os
Espíritos levianos dos
Espíritos sérios? – Por
suas respostas. XI –
Podem os Espíritos
tornar-se visíveis? –
Algumas vezes. XII –
Qual a verdadeira
religião? – Amar-vos uns
aos outros. (Págs.
122 a 124.)
48. A
respeito dos trabalhos
atuais da Sociedade
Espírita de Cadiz, o
correspondente da
Revue diz que o
grupo se reunia cinco
vezes por semana. Em
cada noite a sessão era
aberta pelo Espírito do
Dr. Gardoqui, que fora
médico na cidade. Depois
de dar conselhos aos
presentes, o Dr.
Gardoqui visita os
doentes relacionados
pelo grupo e indica os
remédios necessários,
quase sempre com
sucesso. Em seguida,
comunica-se o Espírito
familiar do círculo, que
traz outros Espíritos,
tanto superiores para os
instruir, quanto
inferiores para serem
ajudados com os
conselhos e o
encorajamento dos
encarnados. (Págs.
124 a 126.)
49. Finalizando o
artigo, Kardec observa
que o pioneirismo de
Cadiz no tocante aos
estudos espíritas é mais
uma prova de que o
movimento regenerador
recebe seu impulso de
mais alto que a Terra e
que seu foco está em
toda a parte, sendo pois
temerário tentar
abafá-lo, visto que, em
falta de uma saída, há
mil outras pelas quais
será feita a luz. Para
que servem as barreiras
contra aquilo que vem do
alto? (Pág. 126.)
50. Comunicação
mediúnica recebida em
Joinville, Haute-Marne,
a 10 de março de 1868,
diz que soou a hora da
libertação da mulher,
que deseja ser livre e
para isto precisa
libertar sua
inteligência dos erros e
dos preconceitos do
passado. Esclarece o
instrutor espiritual que
é pelo estudo que ela
alargará o círculo de
seus conhecimentos
estreitos e mesquinhos.
Conhecendo as leis que
regem os mundos, ela
compreenderá Deus de
modo diferente do que
lhe ensinam, e não mais
acreditará em um Deus
vingador, parcial e
cruel, porquanto sua
razão lhe dirá que a
vingança, a parcialidade
e a crueldade não podem
conciliar-se com a
justiça e a bondade.
Finalizando a mensagem,
o amigo espiritual disse
estas palavras
proféticas: “Ela reclama
sua parte de
atividade intelectual,
e a obterá, porque há
uma lei mais poderosa do
que todas as leis
humanas; é a lei do
progresso, à qual toda a
criação está submetida”.
(Págs. 126 e 127.)
51. Na abertura da
Revue de maio lê-se
a sexta e última carta
enviada por Lavater à
Imperatriz Maria. Com a
carta, Lavater enviou
uma longa mensagem
mediúnica datada de 1798
em que o comunicante
fala das relações
existentes entre os
Espíritos e os seres que
eles amaram na Terra.
Segundo ele, existem
relações imperecíveis
entre os mundos visível
e invisível e uma ação
benéfica recíproca de
cada um desses mundos
sobre o outro. (Págs.
129 a 135.)
52. Seria supérfluo, diz
Kardec, ressaltar a
importância das cartas
de Lavater, que, por
toda a parte, excitaram
o mais vivo interesse.
Elas atestam não só o
conhecimento dos
princípios fundamentais
do Espiritismo, mas uma
justa apreciação de suas
consequências morais.
Apenas sobre alguns
pontos as ideias de
Lavater diferiam das que
o Espiritismo ensina,
fato reconhecido pelo
próprio Lavater em
comunicação dada
verbalmente a 13 de
março de 1868 na
Sociedade Espírita de
Paris. (Págs. 135 e
136.)
53. Nessa comunicação,
Lavater diz que os
estudos realizados pelos
Espíritos são mais
vastos que os estudos
dos homens, mas partem
sempre dos conhecimentos
adquiridos e do ponto
culminante do progresso
moral e intelectual do
tempo e do meio em que
vivem. O Espiritismo,
diz Lavater, não foi
revelado abruptamente,
mas desenvolveu-se
lenta, segura e
progressivamente. O
Espiritismo – que está
fadado a fazer muito
grandes revoluções –
será, um dia, a fé
universal, e os povos
admirar-se-ão de que não
tenha sido sempre assim.
(Págs. 136 a 140.)
54. Em Caen, uma senhora
e suas três filhas,
querendo estudar a
doutrina espírita, não
podiam ler duas páginas
sem sentir um mal-estar,
de que não davam conta.
Um dia, uma jovem
médium, posta em estado
sonambúlico, viu na casa
um Espírito de um padre
da localidade, morto
havia dez anos. Era ele
que impedia a família de
ler. Algum tempo depois,
devidamente esclarecido
no grupo espírita da
cidade, ele se
transformou por
completo, a ponto de
exclamar: “Sim, agora
sou espírita, dizei-o a
todos os que ensinam.
Ah! eu queria que
compreendesse Deus como
este anjo mo fez
conhecer!” O ex-padre
referia-se a Cárita, que
tinha vindo até ele e
diante da qual
prostrou-se de joelhos,
dizendo dela que não era
um Espírito, mas um
anjo. (Págs. 140 e
141.)
55. Este caso e um outro
pertinente ao Espírito
do Dr. X..., que fora um
médico céptico e se
transformara após a
morte com os
esclarecimentos
recebidos no grupo
espírita de Caen,
confirmam três grandes
princípios revelados
pelo Espiritismo: 1o
– Que a alma conserva no
mundo espiritual, por um
tempo mais ou menos
longo, as ideias e os
preconceitos que tinha
na vida terrestre. 2o
– Que ela se modifica,
progride e adquire novos
conhecimentos no mundo
dos Espíritos. 3o
– Que os encarnados
podem contribuir para o
progresso dos Espíritos
desencarnados. (Págs.
141 e 142.)
56. Progredindo o
Espírito fora da
encarnação, disso
resulta que, ao voltar à
Terra, ele traz o
produto do que adquiriu
nas existências
anteriores e no estado
de erraticidade. É assim
que se realiza o
progresso das gerações.
Quando o médico e o
padre citados acima
reencarnarem, trarão
ideias e opiniões
diversas das que tinham
na existência
recém-finda. Um não será
mais fanático, o outro
não será mais
materialista, e ambos
serão espíritas. Há,
pois, utilidade para o
futuro da sociedade em
nos ocuparmos também com
a educação dos
Espíritos. (Pág.
142.)
57. Numa reunião íntima
de família, em que se
faziam exercícios de
tiptologia,
manifestou-se um médico
distinto, morto há pouco
e que, em vida, fizera
abertamente profissão do
mais absoluto
materialismo. O médico
(designado pelo
pseudônimo Philippeau)
fez diversas perguntas,
que foram respondidas
por outro Espírito, que
assinou Sainte Victoire.
A primeira pergunta do
médico foi: “O
Espiritismo me ensina
que é preciso esperar,
amar, perdoar; eu faria
tudo isto se soubesse
como me haver para
começar. É preciso
esperar o quê? Perdoar o
quê e a quem? Amar a
quem?” A resposta foi
bem clara: “Há que
esperar na misericórdia
de Deus, que é infinita;
há que perdoar aos que
vos ofenderam; há que
amar ao próximo como a
si mesmo; há que amar a
Deus, a fim de que Deus
vos ame e vos perdoe; há
que orar e lhe render
graças por todas as suas
bondades, por todas as
vossas misérias, porque
miséria e bondade, tudo
nos vem dele, isto é,
tudo nos vem dele
conforme o que tenhamos
merecido”. (Págs. 142
e 143.)
(Continua no próximo
número.)