ALTAMIRANDO CARNEIRO
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São Paulo, SP (Brasil)
A sentença que
condenou Jesus
João Batista
Pereira,
advogado de
renome em São
Paulo,
desencarnado
nesta Capital em
21 de setembro
de 1956, foi
presidente do
Conselho
Deliberativo da
Sociedade
Metapsíquica de
São Paulo, tendo
exercido a
presidência da
FEESP de 20 de
novembro de 1938
a 10 de dezembro
de 1939.
Orador fluente,
pronunciou,
certa vez, uma
conferência na
FEESP, sobre o
tema A
sentença que
condenou Jesus, documento
que patenteia um
dos mais
flagrantes erros
de justiça da
História da
Humanidade,
escrito em
hebreu e que se
supõe teria sido
lavrado por Anás.
O documento
mereceu a
atenção de Rui
Barbosa, que o
comentou, num de
seus escritos.
Após a
apresentação da
sentença, diz
João Batista
Pereira: “Era
mister que se
encontrasse
algum
fundamento,
frágil que
fosse, para que
se consumasse a
horrorosa
condenação do
inocente. Isso
acontece,
sempre, na
justiça dos
homens iníquos
da Terra,
consoante a
fábula do lobo e
do cordeiro, de
La Fontaine: “Se
não foi você que
turvou as águas,
foi algum de
seus parentes. E
devorou o
cordeiro...”
Teor da sentença
No ano XIX de
Tibério César, o
imperador romano
de todo o mundo,
monarca
invencível, na
Olimpíada de
CXXI e na Élida
XXIV, na criação
do mundo,
segundo o número
e o cômputo dos
hebreus quatro
vezes mil cento
e oitenta e
sete, da
progênie do
romano império
no ano LXXIII e
da liberdade do
cativeiro da
Babilônia no ano
MCCVII, sendo
governador da
Judeia Quinto
Sérvio, sob o
regime e o
governo da
cidade de
Jerusalém,
presidente
gratíssimo
Pôncio Pilatos;
regente da Baixa
Galileia,
Herodes Ântipas;
Pontífice do
sumo sacerdócio,
Caifás; Alis
Almael, magno do
Templo; Roban
Achabel,
Franchino
Centaurio,
cônsules romanos
da cidade de
Jerusalém;
Quinto Cornélio
Sublima e Sexto
Pompílio Rusto;
no mês de março
e dia 25 do
mesmo. Eu,
Pôncio Pilatos,
aqui Presidente
do Império
Romano, dentro
do palácio da
arqui-residência,
julgo, condeno e
sentencio à
morte Jesus,
chamado pela
plebe Cristo
Nazareno e
Galileu de
nação, homem
sedicioso contra
a lei mosaica,
contrário ao
grande imperador
Tibério César.
Determino e
ordeno por esta
que se lhe dê a
morte na cruz,
sendo pregado
com cravos como
os réus, porque
congregando e
ajuntando aqui
muitos homens
ricos e pobres
não tem cessado
de promover
tumultos por
toda a Judeia,
dizendo-se filho
de Deus, rei de
Israel,
ameaçando com a
ruína de
Jerusalém e do
sacro templo,
negando o
tributo a César,
tendo ainda o
atrevimento de
entrar com ramos
e em triunfo e
com parte da
plebe dentro da
cidade de
Jerusalém e no
seu sacro
templo. E mando
que seja
conduzido Jesus
Cristo pela
cidade de
Jerusalém ligado
e açoitado e que
seja vestido de
púrpura e
coroado de
alguns espinhos
com a própria
cruz aos ombros,
para que sirva
de exemplo a
todos os
malfeitores ; e
quero juntamente
com ele sejam
conduzidos dois
ladrões
homicidas; e
sairão pela
porta Jargada,
hoje Antoniana,
e que se conduza
Jesus Cristo ao
monte público da
Justiça, chamado
Calvário, donde
crucificado e
morto ficará seu
corpo na cruz
como espetáculo
para todos os
malvados e que
sobre a cruz
seja posto este
título em três
línguas
(hebraica, grega
e latina): Jesus
Nazarenus, Rex
Judeorum. Mando
também que
nenhuma pessoa
de qualquer
estado ou
condição se
atreva
temerariamente a
impedir a
justiça por mim
mandada,
administrada e
executada com
todo o rigor,
segundo os
decretos e leis
romanas e
hebraicas, sob
as penas de
rebelião contra
o império
romano.
Seguem-se os
nomes das
testemunhas.
Comentários de
Rui Barbosa
Em vão alguns
desavisados
tacham Rui
Barbosa de
materialista e
ateu. Os
pronunciamentos
que fez em
várias
oportunidades
provam que ele
acreditava num
Ser Supremo,
criador de todas
as coisas. É
dele esta
belíssima
afirmação: “Deus
é a necessidade
das
necessidades;
Deus é a chave
inevitável do
Universo; Deus é
incógnita dos
grandes
problemas
insolúveis.”
Rui traduziu a
obra O
Papa e o
Concílio, de
Janus (Editora
Leopoldo
Machado,
Londrina - PR),
tendo escrito um
prefácio maior
do que a própria
obra.
Rui era crente
em Deus. E não
sabemos a que
ponto da sua
vida se tornou
espírita. Na
vasta biblioteca
deixada por ele,
foram
encontradas as
Obras da
Codificação
Espírita. Seu
notável escrito
A Oração dos
Moços – pode
ser classificada
como uma peça
espírita.
Vejamos alguns
comentários de
Rui Barbosa à
sentença que
condenou Jesus:
“Repontava a
manhã, quando à
sua primeira
claridade se
congregava o
Sinedrin. Era o
plenário que se
ia celebrar.
Reunira-se o
conselho
inteiro. In
universo
concilio, diz
Marcos. Deste
modo, se dava a
primeira
satisfação às
garantias
judaicas. Com a
deliberação da
assembleia
judicial, o
requisito da
competência. Era
essa a ocasião
judaica. Esses
eram os juízes
legais. Mas
juízes que
tinham comprado
testemunhas
contra o réu,
não podiam
representar
senão uma infame
hipocrisia da
justiça. Estavam
mancomunados,
para condenar,
deixando ao
mundo o exemplo,
tantas vezes
depois imitado
até hoje, desses
tribunais que se
conchavam de
véspera nas
trevas, para
simular, mais
tarde, na
assentada
pública, a
figura oficial
do julgamento.”
Prossegue Rui
Barbosa nos seus
comentários,
revividos por
João Batista
Pereira, em sua
palestra: “O
Sinedrin não
tinha poderes
para decretar a
pena de morte.
Era uma espécie
de júri, cujo
veredito, porém,
antes opinião
jurídica do que
julgado, não
obrigava os
juízes romanos.
Pilatos estava,
portanto, de
mãos livres,
para condenar ou
absolver. Não
querendo ser
executor num
processo que não
conhecera,
pretende evitar
a dificuldade,
entregando a
vítima. O fim é
a morte, e sem
a morte
não se contenta
a depravada
justiça dos
perseguidores.”
Prossegue Rui:
“Aqui, já o
libelo se
trocou. Não é
mais de
blasfêmia contra
a lei sagrada,
mas de atentado
contra a lei
política. Jesus
não é o impostor
que inculca a
lei de Deus; é o
conspirador, que
se coroa Rei da
Judeia. ‘Meu
Reino não é
deste mundo.’A
resposta de
Cristo frustra,
ainda uma vez, a
manhã dos
caluniadores.
Seu reino não
era deste mundo.
Não ameaçava a
segurança das
instituições
nacionais, nem a
estabilidade da
conquista
romana. ‘Ao
mundo vim, para
dar testemunho
da verdade.’
‘Mas o que é a
verdade?’
pergunta,
cinicamente,
Pilatos. Não
cria na verdade,
mas a da
inocência de
Cristo até o
fundo sinistro
dessas almas,
onde reinava o
poder absoluto
das trevas. ‘Não
acho delito
neste homem’,
disse o
procurador
romano, saindo
outra vez ao
meio dos
judeus.”
Finalmente, diz
Rui: “Devia
estar a salvo o
inocente. Não
estava. A
opinião pública faz
questão da sua
vítima. Jesus
tinha agitado o
povo, não só
ali, no
território de
Pilatos, mas desde
a Galileia, de
Herodes Ântipas,
com quem estava
de relações
cortadas o
governador da
Judeia.
Excelente
ocasião para
Pilatos, de lhe
reaver a
amizade,
pondo-se, ao
mesmo tempo, de
boa avença com a
multidão
inflamada pelo
príncipe dos
sacerdotes. A
Galileia era o fórum
originis
do
Nazareno.
Pilatos envia o
rei a Herodes,
lisonjeando-lhe,
com essa
homenagem, a
vaidade. Desde
aquele dia, um e
outro se fizeram
amigos, de
inimigos que
eram.”