A Revue Spirite
de 1869
Allan Kardec
(Parte
6)
Damos prosseguimento nesta edição
ao
estudo da Revue
Spirite
correspondente ao ano de
1869. O texto condensado
do volume citado será
aqui apresentado com base na
tradução de Júlio Abreu
Filho publicada pela EDICEL.
Questões preliminares
A. Que diferença havia,
segundo Kardec, entre o
Espiritismo europeu e o
americano?
Segundo ele, as
diferenças que existiam
entre o Espiritismo
europeu e o americano
resumiam-se a questões
de palavras,
verificando-se
concordância sobre os
pontos fundamentais. A
única divergência real
entre as duas escolas
limitava-se à questão da
pluralidade das
existências, admitida
também pelos americanos,
porém em mundos cada vez
mais adiantados,
enquanto o Espiritismo
europeu admitia a
pluralidade de
existências na Terra,
até que o Espírito tenha
aqui atingido o grau de
adiantamento que
comporta este globo. O
princípio da
reencarnação na Terra
não era, contudo,
peculiar ao Espiritismo
europeu. Constituía um
ponto fundamental da
doutrina druídica e foi
proclamado antes do
Espiritismo por
filósofos ilustres, como
Dupont de Nemours,
Charles Fourier, Jean
Reynaud, Benjamin
Franklin e tantos
outros. As causas que se
opuseram à introdução
dessa lei no Espiritismo
americano já foram
explicadas
anteriormente.
(Revue Spirite de 1869,
pp. 99 a 105.)
B. A propósito da causa
dos fenômenos espíritas,
quais foram as hipóteses
emitidas ao longo dos
anos em todo o mundo?
Entre os que admitem a
realidade dos fenômenos
quatro hipóteses foram
emitidas ao longo dos
anos a respeito de sua
causa: 1a. A
ação exclusiva do fluido
nervoso, magnético,
elétrico ou qualquer
outro. 2a. O
reflexo do pensamento
dos médiuns e dos
assistentes. 3a.
A intervenção dos
demônios. 4a.
A intervenção dos
Espíritos humanos,
desprendidos do corpo
físico, sobre o mundo
corporal. O sistema
defendido pelo
Espiritismo foi, porém,
segundo Kardec, o que
encontrou maior número
de simpatizantes e o
único admitido pela
imensa maioria dos
observadores em todos os
países do mundo.
(Obra citada, pp. 105 a
108.)
C. Que fato se deu com
padre que andou fazendo
curas na região dos
Hautes-Alpes?
Um dos assinantes da
Revue residente no
departamento dos
Hautes-Alpes disse que
as curas feitas pelo
padre tiveram grande
repercussão naquela
região, mas, por
punição, o pároco fora
enviado para La Chalpe,
comuna vizinha de Abriès,
na fronteira do Piemonte.
(Obra citada, pp. 111 e
112.)
Texto para leitura
52. A
música e as harmonias
celestes são o tema de
duas comunicações
transmitidas por Rossini
em reuniões realizadas
em janeiro de 1869 em
Paris, das quais
extraímos resumidamente
os conceitos que se
seguem: I – Para ser
músico não basta alinhar
notas sobre um
pentagrama; assim só se
consegue produzir ruídos
agradáveis. Para dar
alma à música, para
fazê-la chorar, rir,
uivar, é preciso que ele
próprio tenha
experimentado esses
diferentes sentimentos,
dores, alegria, cólera.
II – A harmonia é
difícil de definir e
muitas vezes a confundem
com a música, com os
sons resultantes de um
arranjo de notas e das
vibrações dos
instrumentos. Mas a
harmonia não é isto,
como a chama não é a
luz. III – A chama
resulta da combinação de
dois gases e é tangível.
A luz que ela projeta é
um efeito dessa
combinação e é
intangível, mas o efeito
é superior à causa. IV –
Dá-se o mesmo com a
harmonia, que resulta de
um arranjo musical e é
um feito igualmente
superior à causa. V –
Pode-se conceber a luz
sem a chama e a harmonia
sem a música. A harmonia
é um sentido íntimo da
alma e é percebida em
razão do desenvolvimento
desse sentido. VI – Fora
do mundo material, a luz
e a harmonia são de
essência divina. A
harmonia do espaço é tão
complexa e tem tantos
graus, que muitos me são
ocultos. VII – O
Espírito produz efeitos
musicais agindo sobre o
éter e obtém os sons que
deseja. VIII – A
harmonia, a ciência e a
virtude são as três
grandes concepções do
Espírito. A primeira o
deslumbra, a segunda o
esclarece, a terceira o
eleva. IX – A harmonia
é, contudo, tão
indefinível quanto a
felicidade, o medo, a
cólera: é um sentimento,
que não se compreende
senão quando se possui,
e não se possui senão
quando se adquiriu. X –
A música, que é a causa
secundária da harmonia
percebida, penetra e
transporta alguns,
enquanto deixa outros
frios e indiferentes. XI
– Evidentemente, o homem
que goza as delícias da
harmonia é mais elevado,
mais depurado que aquele
que ela não consegue
penetrar. Sua alma está
mais apta para sentir,
desprende-se mais
facilmente da matéria e
a harmonia a ajuda a
desprender-se, de onde
se conclui que a música
é essencialmente
moralizadora, desde que
leva a harmonia às almas
e a harmonia as eleva e
engrandece. XII – A
influência da música
sobre a alma e sobre o
seu progresso é
reconhecida por todo o
mundo. A razão dessa
influência é que é
ignorada: a harmonia
coloca a alma sob o
poder um sentimento que
a desmaterializa. XIII –
Se a música exerce uma
influência benéfica
sobre a alma, a alma que
a concebe exerce
igualmente influência
sobre a música. É assim
que a alma virtuosa,
imbuída do sentimento do
bem, do belo, do grande,
e que adquiriu harmonia,
produzirá obras-primas
capazes de penetrar as
almas mais encouraçadas
e comovê-las. XIV – Se o
compositor estiver
terra-a-terra, como
expressará a virtude que
desdenha, o belo que
ignora e a grandeza que
não compreende? Suas
composições serão o
reflexo de seus gostos
sensuais, de sua
leviandade, de sua
despreocupação. XV –
Moralizando as
criaturas, o Espiritismo
exercerá então uma
grande influência sobre
a música, produzindo
mais compositores
virtuosos que
comunicarão suas
virtudes às suas
composições e aos que as
ouvirem. XVI – O
Espiritismo terá,
ninguém duvide, grande
influência sobre a
música futura. Seu
advento mudará a arte,
depurando-a. Como sua
fonte é divina,
tornar-se-á o ideal e o
objetivo dos artistas,
que lhe pedirão suas
inspirações. (Págs.
84 a 90)
53. Mensagem assinada
pelo Espírito de Halévy
e dada em Paris no dia
16-2-1869 encerra o
número de março.
Examinando o tema: A
mediunidade e a
inspiração, diz o
comunicante: I – A
mediunidade abarca a
humanidade inteira, como
um feixe ao qual ninguém
pode escapar. II – Não
há um só homem que possa
dizer: Não fui, não sou
ou não serei médium. III
– Sob a forma intuitiva,
cada um está em relação
com várias influências
espirituais, que podem
ser boas ou más. IV –
Quando o homem faz mais
do que ocupar-se de
pequenos detalhes de sua
existência e quando se
trata de trabalhos que
veio realizar mais
especialmente, de provas
decisivas que deva
suportar, ou de obras
destinadas à instrução e
elevação gerais, a
intuição – também
chamada de voz da
consciência – não se
limita aos conselhos,
mas atrai o Espírito
para certos assuntos,
provoca certos estudos e
colabora na obra,
fazendo ressoar certos
compartimentos cerebrais
pela inspiração. V – A
obra será, pois,
coletiva, embora só um
deva assiná-la. Mas que
importa isso? A obra
jamais é uma criação; é
sempre uma descoberta.
Por muito tempo o músico
ouviu a cotovia e o
rouxinol antes de
inventar a música. VI –
Sob este ponto de vista,
é-se médium de todos,
é-se médium da natureza,
médium da verdade, e por
vezes médium muito
imperfeito, porque ela
aparece de tal modo
desfigurada pela
tradução, que se torna
irreconhecível.
(Págs. 91 e 92)
54. Um aviso muito
importante abre o número
de abril de 1869: a
partir de 1o
de abril o escritório da
Revue Spirite
seria o mesmo da
Livraria Espírita, na
rua de Lille, no
7, onde seriam
realizadas também as
sessões da Sociedade
Espírita de Paris O
domicílio pessoal de
Kardec ficaria, a partir
da mesma data, na Avenue
et Villa Ségur, no
39, atrás dos Inválidos.
(N.R.: Como já vimos, o
número de abril foi
escrito antes da
desencarnação de Kardec,
ocorrida a 31-3-1869.)
(Pág. 95)
55. A
criação da Livraria
Espírita é noticiada em
seguida. Diz Kardec que
o interesse cada vez
maior que as ideias
espíritas tinham
despertado indicou a
necessidade de uma casa
especial para a
concentração dos
documentos concernentes
ao Espiritismo. Fora das
obras fundamentais da
doutrina espírita havia
um grande número de
livros, antigos e
modernos, úteis ao
complemento desses
estudos e que eram
ignorados do grande
público. Foi visando
preencher essa lacuna
que se fundou a Livraria
Espírita, uma empresa de
caráter não comercial,
criada por uma sociedade
de espíritas que
renunciavam, pelo
contrato que os liga, a
toda especulação
pessoal. Os lucros
auferidos pela Livraria
pertenceriam à Caixa
Geral do Espiritismo.
(Págs. 95 e 96)
56. A
Revue reproduz do
jornal Salut, de
Nova Orléans, Estados
Unidos, a declaração de
princípios aprovada na 5a
Convenção Nacional ou
Assembleia dos delegados
dos espíritas da
diversas cidades dos
Estados Unidos. A
declaração é composta de
19 itens, dos quais
destacamos, de forma
resumida, os seguintes:
I – O homem tem uma
natureza espiritual e
uma natureza corporal;
ele é, na verdade, um
Espírito revestido de
uma forma orgânica. II –
O Espírito é imortal.
III – Há um mundo ou
estado espiritual, com
suas realidades
objetivas e subjetivas.
IV – A morte não
transforma a
constituição mental ou o
caráter moral de nenhuma
pessoa. V – A
felicidade, tanto no
estado espiritual quanto
neste, depende do
caráter, das aspirações
e do grau de harmonia do
indivíduo com a lei
divina. VI – O
crescimento, o
desenvolvimento e a
progressão são o destino
infinito do espírito
humano. VII – O mundo
espiritual não está
afastado de nós, mas nos
rodeia; por conseguinte
estamos constantemente
sob a vigilância dos
seres espirituais. VIII
– Há no estado
espiritual todos os
graus de caracteres,
desde o mais baixo ao
mais elevado de
desenvolvimento
intelectual e moral. IX
– Cada indivíduo gravita
em seu próprio lugar,
por uma lei natural de
afinidade; o céu e o
inferno, a felicidade e
a infelicidade dependem
antes dos sentimentos
íntimos que das
circunstâncias
exteriores. X – As
comunicações recebidas
dos Espíritos não são
necessariamente verdades
infalíveis. XI – Todos
os seres angélicos ou
demoníacos que se
manifestaram nos
negócios dos homens, no
passado, eram simples
Espíritos humanos
desencarnados, em
diversos graus de
progressão. XII – Os
chamados milagres dos
tempos passados, a cura
das moléstias pela
imposição das mãos, a
ressurreição dos que
estavam aparentemente
mortos etc. foram
produzidos em harmonia
com as leis universais e
podem repetir-se em
todos os tempos.
(Págs. 96 a 99)
57. Kardec, para tornar
mais fácil a análise dos
princípios que compõem a
declaração aprovada
pelos espíritas
americanos, repassou, um
a um, ditos princípios
comparando-os com os
ensinamentos contidos em
O Livro dos Espíritos
e no cap. II de O que
é o Espiritismo. Em
seguida, observou que as
diferenças havidas entre
o Espiritismo europeu e
o americano resumiam-se
a questões de palavras,
verificando-se
concordância sobre os
pontos fundamentais.
(Págs. 99 a 103)
58. A
única diferença entre as
duas escolas limitava-se
à questão da pluralidade
das existências,
admitida também pelos
americanos, porém em
mundos cada vez mais
adiantados, enquanto o
Espiritismo europeu
admite a pluralidade de
existências na Terra,
até que o Espírito tenha
aqui atingido o grau de
adiantamento que
comporta este globo,
após o que o deixa por
outros mundos. O
princípio da
reencarnação na Terra
não era, contudo,
peculiar ao Espiritismo
europeu. Constituía um
ponto fundamental da
doutrina druídica e foi
proclamado antes do
Espiritismo por
filósofos ilustres, como
Dupont de Nemours,
Charles Fourier, Jean
Reynaud, Benjamin
Franklin e tantos
outros. As causas que se
opuseram à introdução
dessa lei no Espiritismo
americano já foram
explicadas
anteriormente. Faltou
aos Estados Unidos um
centro de ação para
coordenar os princípios.
É por isso que não
existe ali, a bem dizer,
um corpo metódico de
doutrina, ao contrário
do que se verificou no
movimento espírita
europeu, sobretudo na
França. (Págs. 103 a
105)
59. As conferências
proferidas pelo sr.
Chevillard sobre o
Espiritismo foram objeto
de um artigo do sr.
Pagès de Noyez,
publicado no jornal
Paris de 7-3-1869.
Comentando o fato,
Kardec diz que já havia
dado sua apreciação
sobre o assunto no
número de março e que
seria supérfluo refutar
uma teoria que nada
tinha de novo. Entre os
que admitem a realidade
dos fenômenos – que é o
caso do sr. Chevillard –
quatro hipóteses foram
emitidas ao longo dos
anos a respeito de sua
causa: 1a. A
ação exclusiva do fluido
nervoso, magnético,
elétrico ou qualquer
outro. 2a. O
reflexo do pensamento
dos médiuns e dos
assistentes. 3a.
A intervenção dos
demônios. 4a.
A intervenção dos
Espíritos humanos,
desprendidos do corpo
físico, sobre o mundo
corporal. Todas essas
hipóteses já haviam sido
amplamente discutidas.
Os que não aceitam a 4a.
hipótese, que é a
hipótese pregada pelo
Espiritismo, têm todo o
direito de
manifestar-se, cientes
de que, desses diversos
sistemas, o defendido
pelo Espiritismo é o que
encontrou maior número
de simpatizantes e é o
único admitido pela
imensa maioria dos
observadores em todos os
países do mundo.
(Págs. 105 a 108)
60. Um taumaturgo que
passara sua última
existência a brincar de
pessoa santa, em meio
aos prodígios que
realizava, quis nascer,
como menino, em
condições excepcionais
para atrair o respeito e
a veneração das pessoas.
Essa é a explicação dada
na Sociedade de Paris
pelo dr. Morel Lavallée
(Espírito) a respeito da
“criança elétrica”, o
bebê nascido na aldeia
de Saint-Urbain, nos
limites do Loire e do
Ardèche, que apresentava
desde o primeiro dia
fenômenos muito curiosos
e inusitados. Por vezes
seu berço parecia
encher-se de uma
claridade esbranquiçada;
não se podia tocá-lo sem
sentir uma viva reação;
de suas extremidades se
escapavam, por momentos,
eflúvios brilhantes que
o tornavam luminoso;
quando, em certos dias,
se aproximava dele algum
objeto, este era tomado
de um frêmito e de uma
vibração sutil, que nada
podia explicar. Dr.
Morel disse, no entanto,
que o fenômeno em si
mesmo teria pouca
duração e quem quisesse
estudá-lo deveria
apressar-se. (Págs.
109 a 111)
61. Um dos assinantes da
Revue residente
no departamento dos
Hautes-Alpes enviou a
Kardec interessante
relato sobre as curas
que um padre andava
fazendo naquela região.
O fato tivera grande
repercussão, mas, por
punição, o pároco fora
enviado para La Chalpe,
comuna vizinha de Abriès,
na fronteira do Piemonte,
onde, contudo,
continuava a curar, sem
nada receber por seu
trabalho. (Págs. 111
e 112)
(Continua no próximo
número.)