ANGÉLICA
REIS
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Londrina, Paraná
(Brasil) |
O Espiritismo perante a
Ciência
Gabriel
Delanne
(Parte
5)
Damos continuidade nesta edição
ao
estudo do livro O
Espiritismo perante a
Ciência,
de Gabriel Delanne,
conforme
tradução da obra
francesa Le
Spiritisme devant la
science,
publicada originalmente
em Paris em 1885.
Questões preliminares
A. Qual é a unidade
primordial do tecido
cerebral?
|
A célula nervosa, com
seus vários atributos e
suas configurações
definidas.
(O Espiritismo perante
a Ciência, Primeira
Parte, Cap. II - O
materialismo
positivista.)
B. As células nervosas
são capazes de sentir?
Para muitos
fisiologistas, sim. Para
Delanne, não. Diz ele
que, mesmo que as
células nervosas
tivessem essa
capacidade, não seria
fácil imaginar qual a
resultante das sensações
de cada uma. Se, pelo
contrário, admitirmos a
existência da alma,
tudo, então, se torna
claro. Temos um centro
onde se reúnem as
sensações e,
consequentemente, as
ideias a comparar. É ele
que armazena as
múltiplas impressões que
recebe, e as analisa,
pesa, compara com as que
possuía anteriormente; o
resultado de todas essas
operações é o juízo.
(Obra citada, Primeira
Parte, Cap. II – O
materialismo
positivista.)
C. Qual é, na concepção
de Claude Bernard, a
propriedade fundamental
da vida?
A irritabilidade.
Segundo suas palavras, é
a irritabilidade que
caracteriza a vida.
(Obra citada, Primeira
Parte, Cap. II -
Da sensibilidade dos
elementos nervosos.)
Texto para leitura
111. Que se encontra na
substância cerebral como
elemento anatômico fixo,
como unidade primária? A
célula nervosa, com seus
vários atributos, suas
configurações definidas;
veem-se também fibras
nervosas e um tecido que
reúne todos esses
elementos, o qual é
atravessado por vasos
sanguíneos muito
pequenos, chamados
capilares.
112. É do estudo da
célula que depende a
ciência das propriedades
do cérebro, pois que ela
é a unidade primordial
do tecido cerebral, e
quando conhecermos as
propriedades íntimas
desse elemento, teremos
uma ideia exata do papel
da matéria cortical.
113. Vemos na parte
inferior desta camada
dos hemisférios o começo
das fibras que ligam a
superfície ao centro.
Elas são, a princípio,
ramificadas ao infinito,
de forma a entrarem em
contato com grande
número de células da
camada cortical; depois
se vão condensando até a
saída do córtice dos
hemisférios, onde têm a
forma de fibras
compactas.
114. Examinando as
células nervosas, vemos
que elas têm, como toda
célula, uma forma
determinada por uma
membrana envolvente, a
maior parte das vezes
irregular, cujos
contornos parecem braços
que se prolongam em
diversos sentidos;
depois, no interior, um
núcleo apresentando um
ponto brilhante, que se
chama nucléolo.
115. Para se ter ideia
do número imenso dessas
células nervosas, basta
saber que no espaço de
um milímetro quadrado de
substância cortical, com
a espessura de um décimo
de milímetro, conta-se
cerca de cem a cento e
vinte células nervosas
de volume variado. Que
se imagine o número de
vezes que esta pequena
quantidade está contida
no todo e chegar-se-á a
muitos milhões.
116. Ficamos confusos ao
penetrar no mundo desses
infinitamente pequenos,
onde se reencontram
essas mesmas divisões
infinitas da matéria,
que impressionam tão
vivamente o espírito, no
estudo do mundo sideral.
117. Ao examinar a
estrutura de um elemento
anatômico, só visível
com um aumento de
setecentos a oitocentos
diâmetros, se pensarmos
que esse mesmo elemento
se repete por milhões,
na espessura da camada
cerebral, não podemos
deixar de ser tomados de
admiração. Refletindo-se
que cada um desses
pequenos aparelhos tem
sua autonomia, sua
individualidade, sua
sensibilidade orgânica,
íntima, que é ligado a
seus congêneres, que
participa da vida comum,
e que é o obreiro
silencioso e infatigável
que elabora
discretamente as forças
nervosas necessárias à
atividade psíquica, que
se consome
incessantemente,
reconhecer-se-á a
maravilhosa organização
que preside ao mundo dos
infinitamente pequenos.
118. Do que precede,
decorre que a substância
cortical representa
imenso aparelho formado
por elementos nervosos
dotados de sensibilidade
própria, mas solidários,
porque as séries de
células superpostas em
andares, a
correspondência delas
entre si, implicam a
ideia de que as
atividades nervosas de
cada zona podem ser
despertadas
isoladamente, que têm a
faculdade de
associar-se, de
modificar-se de uma
região para outra,
segundo a natureza das
células intermediárias
postas em vibração; que,
enfim, as ações
nervosas, como as
ondulações vibratórias,
devem propagar-se
gradativamente, conforme
a direção das células
orgânicas, no sentido
horizontal ou no
vertical, das zonas
profundas às
superficiais e
vice-versa.
119. No ponto de vista
da significação
fisiológica de certas
zonas e do modo de
distribuição da
sensibilidade e da
motilidade (faculdade de
dar o movimento), é
permitido supor,
apoiando-nos nas leis de
analogia, que as regiões
superiores, ocupadas
principalmente pelas
pequenas células, devem
achar-se, sobretudo, em
relação com as
manifestações da
sensibilidade, enquanto
as regiões profundas,
povoadas pelos grupos
das grandes células,
podem ser consideradas,
principalmente, como
centros de emissão do
fenômeno da motricidade,
isto é, das incitações
que determinam o
movimento.
120. Apoiam-se estas
deduções num fato de
observação, o de que, na
medula espinhal, os
nervos sensitivos
comunicam-se com as
pequenas células da
medula, e os nervos
motores, com as grandes
células, nas quais se
verificam as diversas
ações da motricidade.
Por analogia, estaríamos
no direito de considerar
as células superiores da
camada cortical como a
esfera de difusão da
sensibilidade geral e
especial, e, por isso
mesmo, o grande
reservatório comum,
sensorium commune,
de todas as
sensibilidades do
organismo; de outro
lado, poder-se-iam
admitir as camadas
profundas como o lugar
de emissão dos fenômenos
do movimento.
121. Quando assistimos a
uma representação
teatral, os olhos e os
ouvidos são
impressionados ao mesmo
tempo, e surge um mundo
de ideias determinadas
por milhares de
sensações, que chegam
instantaneamente ao
cérebro. Se juntarmos a
essas duas causas as
impressões produzidas
pela decoração da sala,
pelo calor, pela
representação dos
atores, pela música,
chegar-se-á a um total
enorme de ações
sensitivas percebidas
pelo cérebro.
122. Como essas diversas
vibrações conseguem
harmonizar-se? Como se
combinam os movimentos
vibratórios para
produzir no espectador o
sentimento de prazer ou
de descontentamento?
123. Em vão se nos
mostrará que cada um dos
sentidos tem um lugar
reservado no córtice
cerebral; que as
excitações exteriores,
que lhes correspondem,
dirigem-se diretamente
para a parte que lhes
compete; mal podemos
compreender como as
excitações desses
diferentes territórios
de células se vão
procurar e fundir para
produzir uma ideia.
124. Para compreender o
que se deu seria preciso
supor que as células
nervosas são capazes de
sentir, e ainda
assim não seria fácil
imaginar qual a
resultante das sensações
de cada uma. Se, pelo
contrário, admitirmos a
existência da alma,
tudo, então, se torna
claro. Temos um centro
onde se reúnem as
sensações e,
consequentemente, as
ideias a comparar. É ele
que armazena as
múltiplas impressões que
recebe, e as analisa,
pesa, compara com as que
possuía anteriormente; o
resultado de todas essas
operações é o juízo.
125. Luys entende,
porém, que não é
necessário recorrer à
intervenção da alma para
explicar todas as ações
do espírito, que se
podem deduzir das 3
propriedades
fundamentais seguintes,
que ele atribui ao
sistema nervoso: 1 – A
sensibilidade; 2 – A
fosforescência orgânica;
3 – O automatismo.
126. São essas
propriedades gerais que
Luys estuda na segunda
parte do seu trabalho.
Uma vez conhecidas e
definidas essas
propriedades, Luys entra
no estudo das diversas
combinações, às quais se
prestam, e pretende
estabelecer que as
operações do espírito
não são mais que
sensações transformadas
por meio de atos
reflexos múltiplos.
127. Se assim é para o
cérebro e para os
centros da medula
espinhal, apenas com a
diferença de que os
processos são mais
complicados, seremos, no
ponto de vista
fisiológico, autômatos,
cujas molas são movidas
por excitações externas,
quer diretamente,
suscitando reações
imediatas, quer
indiretamente, depois de
uma travessia mais ou
menos longa nos centros
nervosos.
128. É essa a opinião de
certo número de sábios
que representam, em
nossa época, a escola
positiva. A filosofia
deles não passa da forma
científica das teorias
de Hume, que não
adquiriram valor,
passando para este novo
terreno. Apesar das
declarações e do tom
doutoral que apresentam,
não no-la podem impor.
129. No tocante à
vontade, escreve Luys:
“As controvérsias dos
filósofos e metafísicos,
que vêm de longa data,
só tiveram um fim:
exprimir em fraseologia
sonora a ignorância mais
ou menos absoluta das
condições da vida
psíquica.”
130. Não sabemos até que
pontos são fundadas essa
palavras, mas o que
iremos demonstrar é que
o sábio professor
apresenta hipóteses
muito contestáveis para
explicar os fenômenos do
espírito; a um
positivista, a um homem
que vê de tão alto a
filosofia, seria
prudente não se deixar
expor ao desmentido dos
fatos.
131. Toda argumentação
de Luys assenta num
equívoco de palavras;
para ele, a
sensibilidade, a
faculdade de sentir
pertence à célula
nervosa; é um fato que
enuncia sem trazer,
aliás, a menor prova.
Assim a define: “A
sensibilidade é essa
propriedade fundamental
que caracteriza a vida
das células; graças a
ela as células vivas
entram em conflito com o
meio; reagem de modo
próprio, em virtude das
afinidades íntimas
postas em ação,
mostrando apetência
para as incitações que
as lisonjeiam e repulsa
para as que as
contrariam. A atração
para as coisas
agradáveis e a repulsa
às desagradáveis são,
pois, os corolários
indispensáveis a toda
organização apta a
viver, e a manifestação
aparente de toda a
sensibilidade.”
132. Admitindo que as
células sejam capazes de
experimentar atração e
repulsão, isto é,
supondo-as dotadas da
faculdade de discernir,
mostra Luys que, à
medida que se sobe na
escala dos seres,
somente em certas
células se especializa
essa propriedade; faz
ele ver que o
desenvolvimento da
sensibilidade marcha de
par com a extensão, cada
vez maior, do sistema
nervoso, para chegar, no
homem, ao seu máximo
poder.
133. Raciocinar assim
não é difícil e dispensa
grande esforço de
imaginação, pois se
supõe demonstrada a
questão em litígio.
Admitir que a célula
escolhe entre os
diversos elementos com
que se acha em relação,
é tão racional como
supor que, numa
combinação química, o
oxigênio escolhe
o corpo com o qual se
alia. Mas, dir-se-á, as
células são vivas, têm
um grau de capacidade e
de propriedade maior que
os corpos inorgânicos;
podem não estar,
portanto, submetidas tão
só às leis que regem os
corpos simples, e
possuir um rudimento de
consciência.
134. A
tais argumentos responde
Claude Bernard, o
ilustre fisiologista, em
suas Leçons sur les
tissus vivants, à
pág. 63: “Visto que só
os elementos anatômicos
são vivos, só eles nos
poderão dar os
caracteres da vida. Ora,
cada tecido apresenta
propriedades diferentes
e dir-se-ia, assim, que
não há caráter vital
essencial. Os
fisiologistas,
entretanto, ensaiaram
determinar esse caráter
no meio das variações de
propriedades dos
tecidos, e lhe chamaram
irritabilidade, isto é,
a aptidão a reagir,
fisiologicamente, contra
a influência das
circunstâncias externas,
como a própria palavra o
indica. Essa propriedade
não pertence nem às
matérias minerais nem às
orgânicas, é privilégio
exclusivo da matéria
organizada e viva, ou
seja, dos elementos
anatômicos vivos, que
são, por consequência,
as únicas partes
irritáveis do organismo.
Todos os seres vivos
são, pois, irritáveis
pelos elementos
histológicos que
compreendem, e perdem
essa propriedade no
momento da morte. A
propriedade de ser
irritável distingue,
portanto, a matéria
organizada da que o não
é; e, além disso, entre
as matérias organizadas,
faz reconhecer a que é
viva, e a que o deixa de
ser. Em suma, a
irritabilidade
caracteriza a vida. A
matéria, mesmo a viva,
é inerte por si
própria, no sentido de
que deve ser considerada
como desprovida de
espontaneidade. Mas
essa mesma matéria é
irritável e pode, assim,
entrar em atividade para
manifestar suas
propriedades
particulares, o que
seria impossível se
fosse, ao mesmo tempo,
desprovida de
espontaneidade e
irritabilidade. A
irritabilidade é, pois,
a propriedade
fundamental da vida.”
135. O trecho é bem
explícito; mesmo a
matéria viva é inerte; é
preciso um excitante
para que possa agir, e
quando manifesta os
caracteres da vida,
fá-lo à maneira dos
corpos inorgânicos, sem
nenhuma participação
voluntária; não pode,
pois, reagir de modo
próprio, como o quer
Luys. Uma célula nervosa
não pode mostrar
repulsão, porque lhe é
impossível escolher
entre os diferentes
corpos com os quais está
em contacto.
136. Segundo Claude
Bernard há três
categorias de
excitantes: os
irritantes físicos, os
químicos e os vitais. Se
a célula é posta em
presença de um deles,
não pode escolher nem
manifestar repulsão,
reage, porque a isso é
obrigada. Se a colocarem
em contacto com um corpo
que não entra numa
dessas categorias
indicadas, ficará
inerte, tal como dois
gases, que, não tendo
afinidades, não se
combinam.
137. A
fisiologia está, pois,
em oposição formal com
Luys; ela não admite que
nos fenômenos
manifestados pela vida
das células possa haver
intervenção de qualquer
vontade, por menor que a
possamos supor. Podemos
negar, legitimamente,
que a sensibilidade,
essa faculdade de sentir
o que se passa em nós,
seja uma propriedade das
células nervosas do
corpo. É necessário,
pois, atribuí-la à alma.
138. Vejamos a opinião
de outro sábio,
Rosenthal, exposta em
Les Mescles et les Nerfs:
“Para que a percepção
das sensações se
produza, parece
absolutamente
indispensável que a
excitação chegue até o
cérebro. É muito
duvidoso, e ainda menos
provado, que outra parte
do encéfalo, e sobretudo
a medula, possam
produzir sensações.
Quando as irritações
chegam ao cérebro, não
se produzem as sensações
somente, mas também
percepções exatas sobre
a espécie de irritação,
sua causa e o ponto onde
foi ela praticada.
Algumas vezes,
entretanto, esses
fenômenos não se
realizam, e a excitação
passa despercebida. É o
que acontece, por
exemplo, quando nossa
atenção é fortemente
atraída para outra
parte... Mas não é
possível dar a menor
explicação de como essa
percepção se forma. Pode
ser que haja produção de
fenômenos moleculares no
interior das células
nervosas, mas esses
fenômenos só podem ser
movimentos. Ora, podemos
compreender como
movimentos produzem
movimentos, mas não
sabemos absolutamente
como esses movimentos
poderiam produzir uma
percepção.”
139. Está pois
estabelecido que é
hipótese não justificada
admitir a percepção, ou
por outra, os fenômenos
da sensibilidade como
pertencentes à célula
nervosa. A ciência
positiva de Luys é
apanhada em flagrante
delito de concepções não
demonstradas e apenas
imaginada com vistas ao
fim a atingir. Assim,
também, as vibrações que
se animalizam e
depois se
espiritualizam só
foram apresentadas para
afastar a alma da
explicação do
pensamento.
140. É singular ver
tomados como sonhadores
e gente pouco científica
os que creem no
Espírito, enquanto os
representantes da
ciência oficial querem
persuadir-nos de que
existem vibrações
espirituais, mas
contestam a existência
de um princípio
imaterial.
(Continua no próximo
número.)