– Raul, você seguiu um
chamamento, uma opção
interior, ou foram os
Espíritos que lhe
propuseram a tarefa a
que se dedica na seara
espírita?
Raul Teixeira:
Não, eu não tive nenhum
desejo pessoal de
começar alguma coisa, de
fazer alguma coisa.
Desde criança fui
chamado pelo mundo dos
espíritos. Até onde a
minha memória alcança,
tinha dois anos e meio
de idade quando comecei
a registar os espíritos
e digo até onde a minha
memória alcança porque
comecei a registar os
espíritos atravessando
as paredes, descendo o
teto, conversando com a
minha mãe; a minha mãe
ainda era encarnada e
era médium, vidente,
audiente, médium de
efeitos físicos. Eu
nasci num lar de
médiuns, eles não eram
espíritas, eram médiuns,
a minha mãe e a minha
irmã mais velha, até que
eu perguntava à minha
mãe, muito criancinha, o
que era aquilo que eu
estava vendo, quem eram
aquelas pessoas que
atravessavam paredes e
ela dizia-me
naturalmente, para
acatar a minha
mentalidade infantil,
que eram os nossos
irmãos de luz e eu
fiquei com essa frase na
minha cabeça.
A minha mãe desencarnou
quando eu tinha apenas 4
anos de idade, logo as
memórias que eu tenho
dela foram até essa data
e depois disso
envolvi-me com trabalhos
da Igreja católica. O
meu pai colocou-me junto
à Igreja católica porque
naquela época as
famílias, mesmo que
tivessem mediunidade,
que fossem médiuns, todo
o mundo se dizia
católico, porque não se
conhecia na nossa região
nenhum centro espírita.
Onde eu vivia não havia
centro espírita e depois
dos meus 17 anos,
continuando aqueles
registos, é que eu pude
conhecer o Espiritismo.
Conversando com um amigo
meu de infância que há
muito não via a respeito
das coisas que eu
sentia, dos registos, a
minha conversa com o
sacerdote e ele sempre
me orientava para ler a
Bíblia e aos 14 anos
para 15 eu tinha lido a
Bíblia cinco vezes de
ponta a ponta e ele me
dizia que o que eu via
era o Satanás e eu
dizia-lhe que via a
minha mãe e ele dizia
que era o Satanás que se
fazia passar por minha
mãe e eu dizia que eles
me davam bons conselhos
e ele afirmava-me que o
Satanás também dá bons
conselhos e então foi-me
criando uma confusão na
cabeça. Então se Deus dá
bons conselhos e Satanás
também, é difícil a
gente optar com quem
fica. Conversando com
esse amigo, José Luís
Vilaça, ele disse-me que
frequentava um grupo de
jovens espíritas e que,
se eu quisesse ir lá
visitar, ele me levaria.
E de fato, eu fui,
atendendo ao seu
convite, conhecer um
grupo de jovens
espíritas e desde 1967
eu conheci esse grupo de
jovens ao qual me
vinculei porque eu, que
tinha uma suposição
bastante equivocada a
respeito do que fosse o
Espiritismo e um grupo
de jovens espíritas para
mim parecia-me uma coisa
muito surreal, acabei
por me encantar porque
achei jovens da minha
faixa de idade alegres,
joviais, estudando,
conversando, cantando e
com muita seriedade e
toda uma mensagem que eu
vim a saber que era a
doutrina espírita.
Estudei, li avidamente
os livros da codificação
espírita, os livros que
me caíram na mão. O
primeiro livro que eu
li, antes de estudar
Kardec, foi o livro de
Léon Denis «O Problema
do Ser, do Destino e da
Dor», que me causou viva
impressão, uma paixão
imensa até hoje e só
depois de Léon Denis é
que eu comecei a estudar
os livros de Allan
Kardec. Recebi outro
impacto muito forte ao
perceber que as ideias
de Allan Kardec eram
exatamente as coisas que
eu pensava e que eu não
imaginava que estivesse
aquilo devidamente
escrito, codificado,
organizado. E nesse
primeiro dia que conheci
um centro espírita na
atual encarnação, por
ser muito tímido, eu vi
a aula daquele dia muito
bem ministrada pela
professora, até que ela
me perguntou, para me
tirar com certeza do
silêncio, o que é que eu
sabia sobre o tema
tratado. Naquela tarde
estudava-se sobre a 1ª.
Revelação de Deus ao
Ocidente, falava-se
sobre Moisés e quando eu
ouvia falar de Moisés a
minha alma fervia,
porque eu tinha lido a
Bíblia 5 vezes, eu tinha
tudo de Moisés na
cabeça, até que ela me
perguntou o que é que eu
sabia sobre Moisés.
Nesse momento tive uma
sensação muito estranha
porque a língua
pareceu-me crescida
dentro da boca, o peito
cresceu-me e eu falei
durante vinte minutos
sem respirar, sem parar,
sem pôr vírgulas, sem
pontos, sem nada. Falei
num estado de semitranse,
sem raciocinar o que eu
falava. Falei 20 minutos
e quando parei de falar
ela me anunciou, e à
classe, que não tinha
mais aula para dar,
porque eu tinha falado
tudo o que ela
programara para a aula
da tarde. E ficamos a
conversar sobre o que eu
tinha falado. Pela
primeira vez que entrei
num centro espírita
realizei a minha
primeira palestra e
nunca mais parei.
Entrevista concedida ao
Jornal de Espiritismo,
da ADEP, Portugal,
quando do 6º Congresso
Espírita Mundial,
realizado em Valência,
Espanha, em outubro de
2010.
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