O Espiritismo perante a
Ciência
Gabriel
Delanne
(Parte
10)
Damos continuidade nesta edição
ao
estudo do livro O
Espiritismo perante a
Ciência,
de Gabriel Delanne,
conforme
tradução da obra
francesa Le
Spiritisme devant la
science,
publicada originalmente
em Paris em 1885.
Questões preliminares
A. Que disse Charles
Richet a respeito do
sonambulismo? |
Richet, com toda a sua
autoridade de cientista,
autenticou esse fenômeno
e é dele a seguinte
declaração: “Desde 1875,
os numerosos autores que
se deram ao estudo do
magnetismo tiraram
todos, sem exceção
nenhuma, a conclusão de
que o sonambulismo é um
fato indiscutível”.
(O Espiritismo perante
a Ciência, Segunda
Parte, Cap. III –
O sonambulismo
magnético.)
B. Quem primeiro se
ocupou da doutrina que
seria mais tarde chamada
de hipnotismo?
Foi o abade Faria, que
teve como continuadores
o General Noizet e o Dr.
Bertrand. Em 1841,
Jenner Braid, cirurgião
em Manchester, a
princípio muito cético,
acabou por descobrir, na
fixidez prolongada do
olhar, a causa dos
fenômenos que tinha
visto produzidos por um
magnetizador francês, o
Sr. Lafontaine. Foi
assim que tudo começou.
(Obra citada, Segunda
Parte, Cap. IV –
O hipnotismo.)
C. Em seus primeiros
anos, que é que os
cientistas procuravam
por meio do hipnotismo?
Procurava-se então um
meio de provocar a
anestesia, mas logo se
viu que era difícil
mergulhar os doentes no
sono nervoso, por causa
da emoção que causa
sempre a expectativa de
uma operação grave.
(Obra citada, Segunda
Parte, Cap. IV –
O hipnotismo.)
Texto
para leitura
251. Chegamos, agora, ao
relatório de Husson,
sobre as experiências
magnéticas feitas pela
comissão da Academia de
Medicina, durante três
anos, e lido nas sessões
de 21 a 28 de junho de
1831. Nele descobriremos
um terceiro caráter do
sonambulismo: a previsão
do futuro.
252. A
comissão se reuniu no
Gabinete de Bourdois no
dia 6 de outubro, ao
meio-dia, hora em que
chegou Cazot. Foissac, o
magnetizador, tinha sido
convidado a vir às doze
e trinta; ele ficou no
salão, sem Cazot o saber
e sem nenhuma
comunicação conosco.
Delanne descreve, na
sequência, como se
desenvolveu a
experiência e, no final,
diz que a previsão de
Cazot não foi rigorosa,
absoluta, mas
condicional.
253. O Doutor Husson
define perfeitamente o
papel do sonâmbulo na
previsão. É o de um
espectador que examina o
jogo dos órgãos de uma
máquina e percebe que,
em dado momento,
produzir-se-á um
acidente. Neste exemplo,
a alma afirma-se
independente do corpo,
pois que julga, calcula,
raciocina, e indica
exatamente as crises que
se realizarão em um
tempo muito afastado.
254. Deve-se convir que
o preconceito está
profundamente enraizado
no coração humano,
porque esses fatos se
produzem há um século,
claramente, não
isolados, mas na Europa
inteira, e ainda se
encontram sábios, pouco
ciosos do seu nome, que
ridicularizam tais
práticas e lhes chamam
simples imposturas
charlatanescas.
255. Os casos que
relatamos têm,
entretanto, tanta
autenticidade como
qualquer fenômeno físico
ou químico. Sábios de
primeira ordem, uma
comissão da Academia,
proclamaram a verdade e
o caráter científico
desses estudos; eis por
que nos assiste o
direito de afirmar que
temos em mãos a prova
experimental da
existência da alma.
256. Quando se vê um
homem ou uma mulher em
sonambulismo, isto é, em
um estado tal que as
mais violentas ações
físicas são incapazes de
lhe produzir a menor
impressão; quando se
verifica que este ser,
que se acreditaria
morto, vê, ouve o
magnetizador, designa os
objetos colocados atrás
de si; indica o que se
passa, não só na casa,
mas também a grande
distância, como duvidar
que reside nele um
agente que não obedece
às leis da matéria, como
recusar a evidência?
257. Esse indivíduo, no
qual os órgãos
sensoriais são inativos,
tem uma percepção mais
viva, mais nítida que em
estado ordinário; prevê
os acidentes que hão de
sobreviver no curso de
sua doença; enfim, dá
todos os sinais de uma
atividade intelectual
mais intensa, mais
penetrante que a dos
assistentes.
Francamente, perante
esse conjunto esmagador
de provas, diremos que é
impossível negar a alma.
258. Bersot entende de
modo diverso e pretende
explicar os fatos
maravilhosos que
verificamos, mas não
nega o sono sonambúlico:
“No magnetismo animal o
que parece incontestável
é o sono, a
insensibilidade e a
obediência ao
magnetizador. Não
falemos da
insensibilidade, que é
um fato comum; o sono é
artificial e não é menos
real por isso; só há que
discutir o artifício.”
259. Declara ele não
acreditar na vista
através dos corpos, mas
não tem repugnância em
admitir a comunicação de
espírito a espírito,
embora não creia que ela
se estabeleça entre
magnetizador e
sonâmbulo, porque, diz
ele, quando a alma está
no corpo, só se pode
comunicar sob certas
condições físicas, que
não se desprezam à
vontade.
260. Com efeito, se
quisermos, no estado
normal, ler o pensamento
de outrem, haveria
alguma dificuldade na
operação, apesar de ter
Cumberland dado provas
de que isso não é
impraticável. Mas, no
caso em foco, o
sonâmbulo se acha em
estado especial, com a
alma desprendida, ou
menos ligada ao corpo, o
que lhe permite a
radiação à distância, a
clarividência.
261, As objeções aos
fatos do sonambulismo
são, como as de Bersot,
muito frágeis.
Entretanto, de duas uma:
ou o fato existe ou não
existe. Se existe, cabe
ao investigador
imparcial o trabalho de
o verificar
cuidadosamente e trazer
argumentos plausíveis,
em vez de meras negações
que sobre nada repousam;
se ele não existe, é
inútil, então, discutir.
262. A
despeito de todas as
críticas, fiquemos,
porém, com Charles
Richet: – “Desde 1875,
os numerosos autores que
se deram ao estudo do
magnetismo tiraram
todos, sem exceção
nenhuma, a conclusão de
que o sonambulismo é um
fato indiscutível.”
263. Há alguns anos
fala-se muito, nos
hospitais e no mundo
médico, de um novo
estado nervoso chamado
hipnotismo. Definamos
primeiro o que se
entende por esta
palavra. Se um paciente
fixa durante algum tempo
um objeto brilhante, de
vidro ou metal, colocado
acima da fronte, a
fadiga nervosa que
resulta dessa tensão do
olhar produz,
insensivelmente, um sono
particular,
caracterizado pela
insensibilidade total ou
parcial que se manifesta
em todo o corpo, pela
tendência a conservar a
posição que se dá aos
membros, e por uma dupla
vista análoga à que
determina o magnetismo.
264. Quem primeiro se
ocupou desta doutrina
foi o abade Faria, que
teve como continuadores
o General Noizet e o Dr.
Bertrand. Em 1841,
Jenner Braid, cirurgião
em Manchester, a
princípio muito cético,
acabou por descobrir, na
fixidez prolongada do
olhar, a causa dos
fenômenos que tinha
visto produzidos por um
magnetizador francês, o
Sr. Lafontaine.
265. Ele tentou
demonstrar que nem um
fluido nem a vontade
eram comunicados pelo
operador ao paciente, e
que tudo se passava no
cérebro deste. Em 1843,
publicou uma obra
intitulada A
Neuripnologia, onde
expunha suas vistas
sobre o estado produzido
pelo esgotamento
nervoso. Essas pesquisas
tiveram pouca
repercussão; o trabalho
de Braid é, entretanto,
assinalado pela primeira
vez por Carpenter, em
1849, na Enciclopédia de
Tood. Em França, só em
1855 é que o dicionário
de Robin e Littré o
mencionaram, e a obra do
médico inglês só foi
traduzida para a língua
francesa em 1883, pelo
Doutor Jules Simon.
(1)
266. Azam, professor na
Escola de medicina de
Bordéus, tinha, contudo,
em 1859, reproduzido com
êxito algumas
experiências descritas
por Braid, e o doutor
Broca comunicou o
resultado delas à
Academia de Medicina,
nesse mesmo ano. Desde
então, foi lançada a
nova ciência e dela
começaram a ocupar-se.
267. Como não se
procurava nessa época,
no hipnotismo, senão um
meio de provocar a
anestesia,
reconheceu-se, desde
logo, que era difícil
mergulhar os doentes no
sono nervoso, por causa
da emoção que causa
sempre a expectativa de
uma operação grave.
268. Foi em vão que, em
1866, o Doutor Durand de
Gros publicou, sob o
pseudônimo de Philips,
um curso teórico e
prático do Braidismo.
Essa obra, as
conferências públicas e
as conferencias
interessantes feitas
pelo autor em Paris e em
algumas grandes cidades
deixaram o mundo médico
hostil ou indiferente.
269. É preciso chegar-se
ao ano de 1875, para se
encontrarem novas
pesquisas na matéria.
Foram elas empreendidas
por Charcot, Bourneville,
Regnard e Paul Richer,
seus discípulos. Eles
operaram em histéricas,
na Salpêtrière.
270. Eis, sucintamente,
os resultados a que
chegaram:
1º - O doente é colocado
diante do foco de uma
lâmpada de Drummond ou
em face de um arco
voltaico; pede-se-lhe
que fixe os olhos nessa
luz viva e, ao fim de
algum tempo, que pode
variar de alguns
segundos a alguns
minutos, ele entra em
estado cataléptico,
caracterizado pelos
seguintes sintomas: o
olhar fixo e muito
aberto, o corpo em
insensibilidade
completa, os membros na
postura que se lhes
queira dar. A
comunicação com o Mundo
exterior é interceptada;
ele não vê e não ouve
mais nada. Circunstância
notável a assinalar é
que a fisionomia
reproduz, fielmente, a
expressão do gesto. Se
dá ao corpo uma atitude
trágica, imediatamente o
rosto toma uma expressão
dura; se, ao contrário,
se lhe aproximam as mãos
dos lábios, como para
enviar um beijo, logo o
paciente apresenta um ar
sorridente. Podem-se
variar ao infinito as
causas que constituem o
que se chamam sugestões.
Esse estado cataléptico
dura o tempo em que a
retina estiver
influenciada pelos raios
luminosos.
2º - Se suprimir
bruscamente o foco de
luz, apagando-o,
velando-o, ou fechando
as pálpebras do doente,
verifica-se,
instantaneamente, uma
alteração no estado do
hipnotizado. A
catalepsia cessa; se o
doente estiver de pé,
cai de costas, com o
pescoço para frente.
Fica ele, então, numa
espécie de sonolência
particular, que Charcot
chama letargia, e que
não passa do verdadeiro
sonambulismo. A rigidez
dos membros desaparece,
os olhos se fecham.
Salvo a anestesia, que
continua completa,
nenhum dos antigos
caracteres subsiste. Se
o chamam, o paciente
dirige-se para o
observador, apesar de
ter os olhos fechados.
Podem fazê-lo ler,
escrever, coser... Nesse
estado, responde, com
mais precisão que de
comum, às perguntas que
se lhe fazem; a
inteligência parece mais
desenvolvida que na vida
habitual.
271. É útil lembrar que
Braid fez experiências
sobre esse estado
particular, e que, em
1860, aditou a seu livro
um curioso relato. O
médico inglês não crê
nos fluidos
magnetizadores; atribui
tudo que descreve à
grande sensibilidade dos
sentidos. Diz que os
hipnotizados, não
doentes, de forma
alguma histéricos,
podem, tendo os olhos
fechados, escrever,
desenhar, descobrir
objetos ocultos,
designar os indivíduos a
quem esses objetos
pertencem, ouvir uma
conversa em voz baixa,
num aposento vizinho,
enfim, predizer o
futuro.
272. Esses fatos se
assemelham aos do
sonambulismo magnético,
tanto mais quanto o
paciente não conserva a
menor lembrança do que
disse ou fez durante o
sono hipnótico. (Continua no próximo
número.)
(1)
Neuripnologia, segundo o
Dicionário Aulete,
significa:
s. f., estudo dos
estados hipnóticos;
teoria nervosa do
hipnotismo.