B. Qual foi o
diagnóstico médico do
mal que acometeu a jovem
Ester?
O diagnóstico foi
esquizofrenia, que,
não obstante as
excelentes experiências
realizadas pelo
psiquiatra americano
Dr. Sakel, em Viena, em
1933, prosseguia sendo
dos mais complexos
quadros da patologia
mental, em suas quatro
fases cíclicas e
graves: Autismo,
Hebefrenia, Catatonia e
Paranoia.
(Obra citada, cap. 2, pp. 33 e 34.)
C. Que reação teve o pai
de Ester ao receber do
psiquiatra o
diagnóstico?
Ante a informação prestada pelo psiquiatra, o pai de Ester
fez-se taciturno e
arredio. Intimamente ele
não aceitava a
conjuntura que o
alcançava, absurda sob
qualquer ângulo em que
fosse examinada. Por
mais reflexionasse, não
alcançava as matrizes
patológicas que
justificassem o tormento
que excruciava a filha.
Ninguém, em sua família,
fora portador de
alienação mental de
qualquer natureza. Seu
lar sustentava-se sobre
admiráveis bases de
equilíbrio moral,
emocional e econômico, e
a jovem jamais revelara
qualquer traço de
desequilíbrio,
insegurança ou neurose.
(Obra citada, cap. 3,
pp. 39 a 42.)
D. Diz o autor da obra
que o caso de Ester
parecia enquadrar-se na
descrição que Kardec fez
sobre a possessão
espiritual. Que é que o
Codificador do
Espiritismo escreveu a
respeito?
Nos seus estudos sobre a possessão, Kardec ensina (A Gênese,
cap. XIV, item 48) que a
possessão pode ser
produzida por um bom
Espírito ou por um
Espírito mau: "Quando é
mau o Espírito possessor,
as coisas se passam de
outro modo. Ele não toma
moderadamente o corpo do
encarnado, arrebata-o,
se este não possui
bastante força moral
para lhe resistir.
Fá-lo por maldade para
com este, a quem tortura
e martiriza de todas as
formas, indo ao extremo
de tentar exterminá-lo,
já por estrangulação, já
atirando-o ao fogo ou a
outros lugares
perigosos. Servindo-se
dos órgãos e dos membros
do infeliz paciente,
blasfema, injuria e
maltrata os que o
cercam; entrega-se a
excentricidades e a atos
que apresentam todos os
caracteres da loucura
furiosa".
(Obra citada, cap. 4,
pp. 45 e 46.)
Texto para leitura
18. A agressão - Tudo ia bem na festa de Ester, que, convidada por seu
pai, tomou posição junto
ao piano, executando
suave melodia de Brahms,
delicada música de
câmara, envolvente e
enternecedora. O casal
anfitrião não cabia em
si de felicidade. De
repente, porém, tudo
mudou. Ester se
perturbou
momentaneamente, o corpo
delicado pareceu vergar
sob inesperado choque
elétrico e ela se
voltou, de inopino,
fixando os olhos muito
abertos, quase além das
órbitas, no genitor. A
jovem estava
desfigurada: palidez
marmórea cobria-lhe o
semblante e, na testa
maquilada, e por todo o
rosto, o suor começou a
porejar abundante.
Ester ergueu-se algo
cambaleante, fez-se
rígida. O fácies
era de pessoa
tresloucada. Ninguém
compreendia o que estava
acontecendo. Foi quando
a adolescente avançou na
direção do pai,
aparvalhado, sem ânimo
de a acudir, e, sem
maior preâmbulo,
acercou-se dele,
estrugindo-lhe na face
ruidosa bofetada. O pai
se ergueu,
congestionado, e a filha
o agrediu segunda vez.
Armou-se tremendo
escândalo. Algumas
senhoras mais sensíveis
puseram-se a gritar, e o
coronel, atoleimado,
revidou o golpe
recebido,
surpreendendo-se a si
mesmo, ante gesto tão
infeliz. Ester,
alucinada, pôs-se a
gritar, sendo conduzida
à força a seu quarto. Um
médico presente
prontificou-se a
atendê-la. Foi-lhe
aplicado então um
sedativo injetável de
quase nenhum efeito
imediato. Aplicou-se
nova dose de calmante e,
enquanto a festa se
desmanchava de forma
dolorosa, a família
mergulhou num abissal
mundo de aflições sem
nome. (Cap. 1, pp. 28 e
29)
19. Desequilíbrio
total - O
desequilíbrio assumira
proporções alarmantes,
porque Ester, muito
agitada, blasfemava e
esbordoava moralmente o
genitor, com expressões
lamentáveis. Os verbetes
infamantes escorriam-lhe
dos lábios, insultuosos,
ferintes, desconexos. A
presença do pai mais a
exaltava, como se fora
acometida de loucura
total, na qual se
evidenciava rancor
acentuado, de longo
curso, retido a custo
por muito tempo e que
agora espocava de forma
assustadora. Somente de
madrugada, em estado de
cansaço extenuante,
Ester caiu em torpor
agitado, sacudida de
quando em quando por
convulsões muito
dolorosas. A estranha
agressão sombreou de
pesados crepes a família
surpreendida,
transformando em quase
tragédia os festivos
júbilos da noite
requintada. Os
convidados se foram, uns
de forma discreta,
outros tumultuados. E
acompanhados apenas pelo
médico da família, os
anfitriões se
recolheram ao leito,
profundamente aflitos no
moral e fisicamente
abatidos, em
desfalecimento, sem
compreenderem o
ocorrido. (Cap. 1, pág.
29)
20. Ester é
internada -
Examinando a
problemática da
subjugação obsessional,
ensina Kardec (O Livro
dos Médiuns, cap. XXIII,
item 240): "No segundo
caso (subjugação
corporal), o Espírito
atua sobre os órgãos
materiais e provoca
movimentos
involuntários". Ester
não recobrou a lucidez
e, apesar dos sedativos
que lhe foram aplicados,
as crises voltaram
terrificantes,
tornando-se a jovem
espécie legítima da
desequilibrada.
Palavras obscenas e
gestos vis repetiam-se
ininterruptamente.
Gritos e gargalhadas
constantes terminaram
por enrouquecê-la.
Bastante pálida, com
olheiras arroxeadas e
manchas nas faces, Ester
tinha os lábios escuros
e uma expressão de olhar
dura, sem luminosidade.
Quando saía desse
estado, parecia recobrar
a razão, para desvairar
outra vez, a mostrar que
alguém a lapidava com
longo relho de que não
se conseguia evadir.
Nesse ponto, tornava-se
rubra e, observada mais
detidamente, poder-se-ia
verificar que alguns
vergalhões lhe
intumesciam a pele
delicada e marcavam sua
face. Logo retornava ao
desequilíbrio, ao
sarcasmo, e as ofensas
se sucediam mordazes...
O clínico explicou que,
se houvesse recidiva,
seria preciso convidar
um especialista em
doenças nervosas, pois
tudo indicava tratar-se
de uma crise histeropata,
com agravantes para um
longo curso. "Aquele –
dissera – era o período
da transição, em que se
fixam os caracteres da
personalidade e nos
quais desbordam as
expressões da
sexualidade, em maior
intensidade." E, como
bom discípulo das
doutrinas de Freud,
teceu considerações
sobre a libido e sua
ação enérgica nas
engrenagens da
emotividade. O
tratamento psiquiátrico
teve início no próprio
lar, sem que diminuíssem
os sintomas do
desequilíbrio ou se
modificasse o quadro
patológico. Ester estava
cada vez pior, pois que
recusava,
sistematicamente,
qualquer alimentação.
Três dias depois, sem
que qualquer resultado
fosse atingido, o
psiquiatra aconselhou
internamento em Casa de
Saúde especializada,
onde poderia aplicar
técnicas próprias, a par
do isolamento do grupo
doméstico, em que, com
certeza, estavam as
causas inconscientes
dos traumas e distonias.
(Cap. 2, pp. 31 e 32)
21. O diagnóstico
psiquiátrico -
Um mês depois, a
psicopata era
frangalhos. Ester
reagia negativamente aos
melhores recursos da
moderna Psiquiatria. Em
alucinação demorada,
irreversível, dia a dia
registravam-se
distúrbios novos e, no
monólogo da distonia,
não cessava de
referir-se à vingança,
à necessidade imperiosa
de lavar a desonra com o
sangue, à justiça
demorada, ao desforço
pessoal... A técnica do
eletrochoque, além de
não produzir qualquer
resultado, fê-la
hebetada, o que poderia
indicar um recuo da
loucura, quando, em
verdade, ante a
impossibilidade de
reações nervosas, em
face das pesadas cargas
recebidas, frenava
temporariamente o
desalinho psíquico. Sem
formação religiosa
segura, os pais
entregaram-se a orações
formuladas por palavras
que redundavam em
exorbitantes exigências
à Divindade, sem com
isso conseguir lenir o
coração na prece
confortadora. Sem terem
o hábito superior da
meditação, em que se
haurem expressões de
vida e paz
indispensáveis ao
equilíbrio orgânico,
retornavam das
experiências da prece
com o espírito
ressequido e o
sentimento revoltado.
Uma surda mágoa contra
tudo e todos
aumentava-lhes o
aniquilamento íntimo.
Feridos no orgulho e
esmagados na
suscetibilidade,
passaram a experimentar
sentimentos
controvertidos em
relação à própria filha,
motivo da aflição que os
compungia. Uma situação
de apatia abateu-se
sobre o lar de Ester,
tal como já ocorria
entre os médicos que a
assistiam no Sanatório,
até que veio o
diagnóstico alarmante,
irreversível:
esquizofrenia, que,
não obstante as
excelentes experiências
realizadas pelo
psiquiatra americano
Dr. Sakel, em Viena, em
1933, prosseguia sendo
dos mais complexos
quadros da patologia
mental, em suas quatro
fases cíclicas e
graves: Autismo,
Hebefrenia, Catatonia e
Paranoia. (Cap. 2, pp.
33 e 34)
22. Porque o
tratamento é às vezes
inócuo - A
loucura, apesar dos
avanços obtidos,
continua desafiador
enigma para as mais
cultivadas
inteligências, porque
os métodos exitosas nuns
pacientes são inócuos e
às vezes perniciosos
noutros. A razão,
segundo o Espiritismo, é
óbvia: a terapia
aplicada, apesar de
dirigida ao espírito (psique),
não é conduzida, em
verdade, às fontes
geratrizes da loucura –
o espírito reencarnado
e os que o martirizam,
no caso das obsessões. A
psicoterapia e os
métodos psicanalíticos,
como as orientações
psicológicas, têm
logrado, algumas vezes,
resultados favoráveis,
quando as causas da
loucura, do
desequilíbrio psíquico
ou emocional são
individuais ou gerais,
psíquicas e físicas.
Merece considerar,
porém, os fatos em que
se encontram presentes
causas cármicas,
aquelas que precedem a
vida atual e que vêm
impressas no psicossoma
(ou perispírito) do
enfermo, vinculado pelos
débitos passados àqueles
a quem usurpou ou
prejudicou, ainda que
mortos, pois eles apenas
perderam a forma
tangível, mas não se
aniquilaram. Atualmente,
graças ao Espiritismo, a
alma humana, ou
Espírito, é um ser
perfeitamente
identificável, com
características e
constituição próprias,
que se movimenta à
vontade e edifica o
próprio destino, graças
às realizações em que se
empenha. Por
conseguinte, a vida
espiritual deixou de ser
imaginária ou uma
concepção ingênua, como
antigamente se pensava.
(Cap. 2, pp. 34 a 36)
23. A necessidade da terapia espiritual
- Ante a terapêutica da
Psiquiatria Moderna,
que desdenha a
contribuição dos
conceitos filosóficos e
religiosos, diz Manoel
Philomeno de Miranda ser
preciso evoquemos o
pensamento do Dr. Felipe
Pinel, o eminente mestre
e diretor de L'
Hospice de la Bicêtre,
a cuja audácia muito
deve a ciência
psiquiátrica: `A
higiene remonta
exatamente aos tempos
dos mais antigos
filósofos'. "Isto,
porque, da observação
empírica à racional, –
assevera Philomeno –
nasceram as experiências
de laboratório que, a
princípio estribada em
conceitos
ético-filosóficos,
resultantes do acúmulo
de fatos, passou ao
campo científico como
estruturação da
realidade..."
Entretanto, o ceticismo
nesse meio ainda impera.
Não faz muito, o Dr.
Wilde Penfield, do
Instituto Neurológico de
Montreal, realizando uma
cirurgia cerebral com
anestesia local,
percebeu que,
estimulando
eletricamente
determinados centros do
encéfalo, fazia que a
paciente recordasse
lembranças mortas,
como se as estivesse
vivendo outra vez.
Penfield concluiu,
então, que a memória
retém as lembranças por
um mecanismo de
impulsos elétricos
encarregados de
registrar todas as
ocorrências. Mais
tarde, outros
pesquisadores
encontraram compostos
químicos nas células
dos nervos encarregados
de tal mister,
concebendo, assim, que
tais arquivamentos eram
fruto da presença desses
compostos, já que os
modestos impulsos
elétricos, que se
descarregam com
facilidade, não
poderiam possuir
durabilidade para
conservar evocações de
longa distância. Mas
ninguém verificou aí a
possibilidade de
lembranças de outras
vidas, igualmente
impressas no cérebro,
hoje largamente evocadas
através da hipnose
provocada como da
recordação espontânea,
testadas em diversos
laboratórios. Dia virá,
porém, em que a Doutrina
Espírita se adentrará
pelos Sanatórios, Casas
de Saúde e
Universidades,
libertando da ignorância
os que jazem nos elos
estreitos da escravidão
de uma ou de outra
natureza, sugerindo e
aplicando a terapêutica
espiritual de que todos
precisamos para elucidar
o próprio ser atribulado
nos diversos
departamentos da vida.
(Cap. 2, pp. 36 e 37)
24. O diagnóstico
verdadeiro -
Kardec, aludindo às
causas anteriores das
aflições humanas,
assevera (O Evangelho
segundo o Espiritismo,
cap. V, item 6): "Ora,
ao efeito precedendo
sempre a causa, se esta
não se encontra na vida
atual, há de ser
anterior a essa vida,
isto é, há de estar numa
existência precedente".
Essa informação,
evidentemente, era
desconhecida do Coronel
Constâncio Medeiros de
Santamaria e sua mulher,
para quem o
desequilíbrio que
vitimara Ester
significava inominável
tragédia. O fantasma do
desespero rondava,
portanto, a família
vencida, em prostração
moral indescritível e o
tempo parecia
transcorrer lentamente,
traumatizante,
desanimador. Ester não
reagia a nada: atendida
pelo eletrochoque, após
a convulsão e o repouso,
não retornava à lucidez,
como seria de desejar. À
prostração sucedia,
surpreendentemente,
maior tresvario. Ester
fora educada com
refinamento e, por
isso, jamais proferira
expressões obscenas;
agora, porém, esbordoava
moralmente seu pai, com
palavras vis e
infelizes, qual se
estivesse dominada por
poderosa força
inteligente que a
governava,
desgovernando-a. O
médico estava surpreso,
pois o caso da jovem lhe
parecia ímpar, especial,
visto que Ester mudava
de características a
todo instante, como se
animasse diversas
personalidades
estranhas. A jovem
reagia à convulsoterapia
de forma negativa, e a
terapêutica do sono não
conseguira o êxito
cobiçado. Recusava-se
ainda à alimentação,
como se estivesse com a
boca impedida, sendo
necessário obrigá-la a
alimentar-se contra sua
vontade. Em suma, as
terapias aplicadas
naquele primeiro mês
foram inócuas, quando
não perniciosas. O
médico deu ciência disso
ao Coronel, informando
haver pacientes que só
apresentavam melhoras
após um longo
tratamento. A realidade,
porém, era outra. O
problema psíquico de
Ester se enquadrava
noutra diagnose, que em
nada interessa ao
academicismo vigente,
porquanto diz respeito a
outras questões, como a
vida espiritual, a
sobrevivência
post-mortem e a
obsessão. (Cap. 3, pp.
39 e 40)
25. A dor consumia os pais de Ester
- Com a informação
prestada pelo
psiquiatra, o senhor
Coronel fez-se taciturno
e arredio. Intimamente
ele não aceitava a
conjuntura que o
alcançava, absurda sob
qualquer ângulo em que
fosse examinada. Formado
na Academia Militar, com
excelente folha de
serviços à Pátria e à
Arma a que se dedicara,
o genitor de Ester
podia, aos 56 anos de
idade, considerar-se uma
pessoa feliz, até que
acontecera aquela
tragédia. Era ele
consorciado em segundas
núpcias com dona
Margarida Sepúlveda de
Santamaria, de
tradicional família
fluminense, após perder
a primeira esposa,
vítima de breve
enfermidade. D.
Margarida, educada em
elegante colégio
carioca, era portadora
de invejável cultura.
Poetisa sensível,
cultuava seus autores
prediletos e os poetas
românticos no original.
Desde que se casara,
fizera do lar o
agradável tabernáculo
dos saraus culturais
entre amigos e
admiradores do
Romantismo, da
literatura refinada. O
transe, por isso,
dilacerava-a
mortalmente. Por mais
reflexionasse, não
alcançava as matrizes
patológicas que
justificassem o tormento
que excruciava a filha.
Ninguém, em sua família,
fora portador de
alienação mental de
qualquer natureza. Seu
lar sustentava-se sobre
admiráveis bases de
equilíbrio moral,
emocional e econômico, e
a jovem jamais revelara
qualquer traço de
desequilíbrio,
insegurança ou neurose.
Contemplar a filha
desfigurada no leito do
hospital constituía para
sua mãe uma dor
inqualificável. O
Coronel, por sua vez,
refletia revoltado, ante
a cruel vicissitude em
que se sentia
emaranhado... Aquilo
parecia um pesadelo. A
filha adorada não
poderia estar
encarcerada num
hospício! E aquele
homem, que raras vezes
umedecera os olhos no
fragor da guerra de 44,
surpreendia-se agora com
as lágrimas abundantes,
que extravasavam da
ânfora do coração sob
camarteladas contínuas.
(Cap. 3, pp. 41 e 42)
26. A importância da fé e da humildade
- O sofrimento de D.
Margarida e seu marido
era indescritível. Não
raramente eles saíam,
abraçados, caminhando em
frente ao mar, a meditar
sobre os estranhos
acontecimentos que os
martirizavam. Quê não
dariam, para poupar sua
filha a tais
padecimentos! Muitas
vezes o Coronel, após
inúteis peregrinações
mentais através dos
meandros da lógica
materialista,
resmungava: "Deus não
existe!". Essa ira mal
contida e o desespero
revoltado, todavia, mais
lhe perturbavam a alma
combalida, e o que se
lhe afigurava pior, nos
desvarios da filha
alucinada, é que ele
surgia na condição de
algoz impenitente,
odiento, aterrador...
Uma vez desejou vê-la,
para lenir-se um pouco
e amenizar a saudade. Ao
formular esse desejo ao
médico, que,
evidentemente, não
aquiesceu ao pedido,
veio a saber, mais
tarde, que Ester parecia
adivinhar-lhe a
cogitação,
apresentando-se então
mais transtornada, mais
agressiva. O Coronel, na
sua amargura, prometia a
si mesmo: "Se ela
morrer, suicidar-me-ei".
Parecia aliviar-se com
esse pensamento
pernicioso, mas, na
verdade, o infortúnio é
mais sombrio quando se
faz acompanhar dos
sorvos contínuos do
ácido da revolta. O
homem orgulhoso reage
negativamente quando
penetrado pela verruma
das Leis divinas, e
imagina, erroneamente,
que o autocídio lhe
trará o conforto moral
ante os padecimentos da
vida, quando, na
realidade, ele apenas
os agravará, sem nada
resolver. O homem forte
nos embates externos
somente afere as
potencialidades quando
luta sem quartel nos
campos morais em que se
consagra vencedor. Para
isso, porém, a humildade
e a fé constituem
valores indispensáveis.
Acostumado às alturas
do prestígio e da
bajulação requintada, o
casal Santamaria não
tivera tempo para as
reflexões em torno do
sofrimento, que não
constitui patrimônio
exclusivo da ralé e dos
miseráveis. A religião
deveria ter-lhe dito que
ninguém vive na Terra em
regime de exceção. As
meditações que não foram
experimentadas antes
faziam-se indispensáveis
agora, ao lado da
resignação e da
paciência. (Cap. 3, pp.
42 a 44)
27. Ester é
declarada incurável
- Nos seus estudos sobre
a possessão, Kardec
esclarece (A Gênese,
cap. XIV, item 48):
"Quando é mau o
Espírito possessor, as
coisas se passam de
outro modo. Ele não toma
moderadamente o corpo
do encarnado,
arrebata-o, se este não
possui bastante
força moral para lhe
resistir. Fá-lo por
maldade para com este, a
quem tortura e martiriza
de todas as formas, indo
ao extremo de tentar
exterminá-lo, já por
estrangulação, já
atirando-o ao fogo ou a
outros lugares
perigosos. Servindo-se
dos órgãos e dos membros
do infeliz paciente,
blasfema, injuria e
maltrata os que o
cercam; entrega-se a
excentricidades e a atos
que apresentam todos os
caracteres da loucura
furiosa". O caso de
Ester parecia
enquadrar-se
perfeitamente na
descrição acima feita
pelo Codificador do
Espiritismo. Os meses
amontoavam-se e a jovem
não recobrara a razão.
Seus olhos azulados e
brilhantes de outrora
possuíam agora expressão
asselvajada num rosto
pálido-cinéreo sem
vida, despido da auréola
dos cabelos, cortados à
escovinha,
transmudada num
autêntico espectro que
sobrevive animado por
ignota vitalidade. O
desvario era-lhe então
condição normal e, por
isso, muitas vezes sua
agressividade recebia
dos servidores do
hospital a
contrapartida, com
bordoadas homéricas, com
que supunham acalmá-la,
enfraquecendo-a mais
ainda. As equimoses e a
falta de alguns dentes,
decorrência das
repetidas cenas de
pugilato, mostravam-na
como uma megera. Como a
família estava impedida
de visitá-la e era
impossível qualquer
diálogo,
exacerbando-se-lhe o
delírio especialmente
quando alguém se referia
a seu pai, Ester foi
rotulada incurável e
propositadamente
esquecida, por dar mais
trabalho aos
enfermeiros. Philomeno
refere-se, nesse
sentido, às Casas de
Saúde onde a dignidade
profissional e a humana
há muito desapareceram,
arrastando consigo os
sentimentos do amor, da
piedade e da caridade.
Muitas delas mantêm seus
pacientes pelo que
representam na receita
orçamentária.
Extorquem, sem dar
quase nada em troca. E
ele adverte: "Quem se
locupleta, todavia, com
tais mercantilismos da
saúde, da vida e da alma
humana, volverá aos
mesmos sítios, a expiar
nas suas celas,
regougando impropérios,
esgrouvinhado, em
aturdimento inominável".
(Cap. 4, pp. 45 e 46)
(Continua no próximo
número.)